Desde o início da guerra na Ucrânia, o gás se tornou uma arma econômica exposta em várias ocasiões entre a Rússia e a Europa. Os russos são responsáveis por 40% das importações de gás feitas pelo continente, e essa dependência torna o combustível uma peça fundamental para compreender os rumos e as consequências do conflito.
Cinco meses após o início do conflito, os países já mostraram que não têm condições de substituir as fontes primárias de energia, como o gás, tão rapidamente e passaram a temer um corte total russo, o que causaria um impacto econômico inevitável. As autoridades correm para substituir o combustível, mas têm enfrentado dificuldades do processo.
E à medida que a guerra se alastra, o medo de que ela chegue ao inverno, período em que a demanda de gás aumenta, cresce. Nesta semana, a Europa enfatizou o risco de uma crise energética iminente, a necessidade de encher os estoques para o fim do ano (inverno no Hemisfério Norte) e chamou Putin de chantagista por usar o combustível como arma. “Os próximos meses serão críticos”, afirmou Fatih Birol, diretor-executivo da Agência Internacional de Energia, na segunda-feira.
Para entender o papel que o gás exerceu na guerra nos últimos cinco meses, reveja abaixo a linha do tempo com os principais fatos relacionados ao combustível:
Abandono do Nord Stream 2
Em 22 de fevereiro de 2022, o chanceler alemão, Olaf Scholz, anunciou a suspensão do gasoduto Nord Stream 2, que ligava Rússia e Alemanha, como represália pelo reconhecimento oficial de Moscou dos territórios separatistas do leste da Ucrânia.
No centro de uma batalha geopolítica e econômica, esse projeto faraônico iniciado em 2011 colocou a Alemanha (que importa metade de seu gás da Rússia) contra os Estados Unidos e parte dos países europeus.
Foi também uma fonte de tensão entre Rússia e Ucrânia, levando este último a temer a perda dos lucros que obtém com o trânsito de gás russo pelo seu território através de outros gasodutos.
Disparada do preço do gás
A Rússia proporciona cerca de 40% das importações de gás da Europa. Com a invasão na Ucrânia, em 24 de fevereiro, o preço do gás natural e do petróleo disparou devido ao medo de cortes de fornecimento – que pode comprometer o abastecimento de energia em diversos países.
Em 2 de março, a União Europeia (UE) “desligou” sete bancos russos do sistema financeiro internacional Swift, que agiliza pagamentos internacionais. Entretanto, manteve dois grupos financeiros vinculados ao setor dos hidrocarbonetos, devido à grande dependência do gás russo por parte de países como Alemanha, Itália, Áustria e Hungria.
Embargo do gás pelos Estados Unidos
Em 8 de março, o presidente americano, Joe Biden, proibiu as importações de petróleo e gás russos como uma maneira de atingir a economia da Rússia, em retaliação à guerra. O combustível russo era responsável por 5% do consumido nos EUA, mas as sanções elevaram os preços e atingiram os consumidores americanos.
Quase no mesmo momento, o Reino Unido anunciou o fim das importações de energia russa para 2022, enquanto a União Europeia estabeleceu o objetivo de reduzir suas compras em dois terços este ano.
Resposta russa
Em 23 de março, o presidente russo, Vladimir Putin, decidiu proibir os europeus de pagarem o gás russo em dólar, ou em euro, em resposta ao congelamento de cerca de US$ 300 bilhões das reservas de moeda estrangeira da Rússia.
Também anunciou que os países “hostis” que consomem gás russo teriam de abrir contas bancárias em entidades russas para pagar suas contas em rublos, caso contrário seu fornecimento poderia ser cortado.
A Comissão Europeia, órgão executivo da UE, considera essa opção uma violação das sanções internacionais contra Moscou, por isso buscou alternativas com os Estados Unidos. Biden prometeu enviar à Europa mais 15 bilhões de metros cúbicos de gás natural liquefeito (GNL) este ano.
Corte do gás russo
Em 27 de abril, a gigante russa Gazprom suspendeu todos os seus envios para Bulgária e Polônia, dois países com grande dependência do gás russo, já que não lhe pagaram em rublos.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, denunciou uma “chantagem do gás” e explicou que ambos os países (membros da UE e da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan) receberão o gás “por meio de seus vizinhos da União Europeia”.
Em 21 de maio, a Rússia cortou o gás de sua vizinha Finlândia, que também se recusou a pagar em rublos. O país provocou a ira de Moscou com seu pedido de adesão à Otan. Depois, o gesto se repetiu contra Holanda e Dinamarca.
UE não quer embargo
Em 30 de maio, os líderes dos 27 países da UE concordaram em reduzir em cerca de 90% suas importações de petróleo russo para o final do ano, mas não quiseram impor um embargo ao gás de Moscou.
O embargo ao petróleo russo afeta a importação por via marítima, mas permite o petróleo que chega ao bloco por oleoduto, atendendo uma demanda da Hungria apoiada pela Eslováquia e pela República Checa.
Europa pressionada
Em meados de junho, citando um problema técnico, a Gazprom reduziu em 60% seus envios de gás, principalmente para a Alemanha através do Nord Stream 1. Com isso, os preços voltaram a subir.
Em 23 de junho, a Alemanha ativou o “nível de alerta” do abastecimento de gás, o que aproxima a possibilidade de racionamento no país.
Plano da UE
Em 11 de julho, a Gazprom anunciou que fecharia o gasoduto Nord Stream 1 durante 10 dias por motivos de manutenção.
Uma semana depois, no dia 18, a UE anunciou um acordo com o Azerbaijão para dobrar em “alguns anos” suas importações de gás natural. A União também buscou novos fornecedores em países como Catar, Noruega e Argélia.
Em 20 de julho, Bruxelas propôs um plano para reduzir em 15% o consumo europeu de gás e enfrentar a redução de fornecimento russo. “A Rússia está usando o gás como arma. Em caso de uma interrupção total, a Europa terá que estar preparada”, frisou Von der Leyen. /AFP