Análise|Diplomacia da guerra na Ucrânia é mais uma questão de armamentos do que uma negociação de paz


Para Ucrânia e Rússia, ganhos no campo de batalha podem fornecer uma vantagem em quaisquer negociações posteriores, e isso impacta discussões sobre armas com aliados

Por Edward Wong e Marc Santora
Atualização:

O presidente Volodmir Zelenski, da Ucrânia, pediu a realização de uma nova cúpula de paz em novembro, aberta à participação da Rússia. Autoridades americanas e europeias se perguntam reservadamente se os militares ucranianos e russos estão esgotados a ponto de pararem a luta. E diplomatas ocidentais estão discutindo que tipo de aliança de defesa seus países poderiam prometer à Ucrânia para ajudar a se chegar a um acordo, dizem autoridades.

Esse tipo de conversa de fundo parece indicar uma maior disposição da Ucrânia e seus aliados de se envolver em negociações de paz com a Rússia futuramente. Mas a diplomacia mais urgente que está ocorrendo agora — e a questão discutida intensamente esta semana em Kiev, Washington e Londres — é a respeito de como moldar o campo de batalha a favor da Ucrânia.

Autoridades ucranianas e ocidentais dizem que o presidente Vladimir Putin ainda não mostra sinais de estar disposto a se envolver de boa fé em negociações de paz. Autoridades americanas e europeias, falando sob condição de anonimato para discutir pontos sensíveis da diplomacia, deixaram claro na semana passada que estão operando com a ideia de que a Ucrânia deve consolidar e expandir seus ganhos no campo de batalha para incentivar Putin a buscar a mesa de negociações — e ter um poder de barganha significativo se as negociações começarem.

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As discussões foram energizadas pela ocupação militar ucraniana do território russo em Kursk, um ataque que surpreendeu tanto a Rússia quanto os parceiros da Ucrânia depois que teve início no mês passado.

A Ucrânia também intensificou os ataques contra algumas instalações de produção de petróleo russas, atingindo a essência da economia de seu inimigo. E neutralizou amplamente a frota naval russa do Mar Negro.

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As discussões diplomáticas desta semana se concentraram na possibilidade de Estados Unidos, Reino Unido e França darem à Ucrânia permissão para usar mísseis de longo alcance que eles forneceram para atacar o território da Rússia em profundidade. No momento, esses países só permitem que a Ucrânia atinja alvos militares adjacentes à fronteira russa.

Reino Unido e França estão prontas para permitir ataques mais distantes com suas próprias armas, mas estão esperando a adesão de Joe Biden, o que ele está prestes a fazer, dizem autoridades dos EUA. Biden continua hesitante em permitir que a Ucrânia use armas americanas para ataques em profundidade, dizem as autoridades.

Zelenski, junto com lideranças como o o secretário de Relações Exteriores britânico, David Lammy, na Quarta Cúpula de Líderes da Plataforma da Crimeia em Kiev. Foto: Leon Neal/Pool via AP
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Biden e Keir Starmer, o primeiro-ministro britânico, discutiram a questão quando se reuniram em Washington nesta sexta feira, 13.

Em Kiev, na quarta feira, 11, Zelenski pediu ao secretário de Estado Antony Blinken e a David Lammy, o secretário das relações exteriores britânico, que afrouxassem as restrições ao uso dos armamentos. E Blinken disse depois em coletivas de imprensa em Kiev e Varsóvia, Polônia, que os Estados Unidos iriam “se ajustar e se adaptar” às condições no campo de batalha.

“Estamos determinados a garantir que eles tenham o que precisam para ter sucesso”, disse Blinken a repórteres em Kiev.

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O sucesso no campo de batalha é a base de qualquer esperança de negociação de um acordo, disse Tymofiy Mylovanov, presidente da Escola de Economia de Kiev e ex-ministro do desenvolvimento econômico. É precisamente esse tipo de capacidade militar aprimorada, ele disse em uma entrevista, que poderia levar Putin à mesa de negociações e ajudar a sustentar uma eventual trégua resultante, especialmente porque as sanções econômicas não conseguiram mudar seu comportamento.

Para ter poder de barganha, ele disse, a Ucrânia precisa ser capaz de atacar rapidamente portos, campos de aviação e instalações de petróleo — e até mesmo ameaçar Moscou com ataques de mísseis, se necessário.

“Putin não acredita em nenhuma diplomacia; ele está apenas jogando este jogo”, disse Mylovanov. “Mas acho que ele também quer ver evidências. Quer analisar os recibos. E então, a Ucrânia tem essas capacidades, afinal?”

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Putin, junto do secretário do Conselho de Segurança do país, Sergei Shoigu, se encontra com Ali Akbar Ahmadian, secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã. Foto: Kristina Kormilitsyna via AFP

Os objetivos da Rússia também dependem do cumprimento das necessidades do campo de batalha, e suas discussões diplomáticas com parceiros giram em torno desse ponto. Isso foi ressaltado esta semana pela acusação pública de Blinken e Lammy de que o Irã havia começado a enviar mísseis balísticos de curto alcance para a Rússia.

Blinken disse em Londres que a Rússia usaria os mísseis para atingir a Ucrânia “em questão de semanas”. Embora o Irã e a Rússia tenham negado a existência dos carregamentos, o que ficou claro durante a guerra é que a diplomacia da Rússia tem se concentrado em reforçar o exército russo, principalmente com a ajuda da China, Coreia do Norte e Irã.

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Por anos, Biden, temendo uma escalada na direção a uma guerra entre Rússia e Otan, concordou com muitos dos pedidos específicos de armas de Zelenski somente após muita negociação e debate interno.

Os críticos da abordagem gradual de Biden dizem que ela acaba minando a diplomacia de longo prazo de algumas maneiras: primeiro, ao contribuir para uma atmosfera de frustração e desconfiança entre autoridades americanas e ucranianas; e segundo, ao não dar aos ucranianos as capacidades de que precisam para acumular fichas de barganha que forçariam Putin a negociar.

Na verdade, eles dizem, Biden e seus assessores permitiram que Putin moldasse a guerra a seu favor ao incutir em Washington o medo de cruzar “linhas vermelhas” desconhecidas na cabeça do líder russo.

“De repente, estávamos em uma guerra em que muitos de nós estamos convencidos de que é normal que os russos estejam na Ucrânia, mas não é normal que os ucranianos estejam na Rússia, o que é uma inovação total na história da guerra”, disse Timothy Snyder, um historiador de Yale que estava na Ucrânia esta semana como representante do United 24, um grupo de captação de fundos do estado ucraniano. “Ninguém nunca afirmou isso antes, muito menos fez seus inimigos acreditarem nisso.”

“Esse é um sucesso psicológico incrível do lado russo”, disse ele. “E não havia como os ucranianos nos fazerem pensar de outra forma, a não ser provando, e foi isso que aconteceu em Kursk, certo?”

Edifício danificado por destroços de mísseis em queda na capital regional russa de Kursk. Foto: Nanna Heitmann/The New York Times

O avanço ucraniano em Kursk diminuiu conforme as forças russas contra-atacam, mas, se Kiev puder manter sua presença lá e talvez até tomar mais território russo, então a Ucrânia teria cartas melhores na mão em quaisquer futuras negociações de paz.

William H. McRaven, um almirante aposentado dos EUA que foi comandante de forças de operações especiais no governo Obama, disse que, até Kursk, ele pensava que o melhor que a Ucrânia poderia esperar era um armistício, garantias de segurança de aliados e dinheiro de ativos russos congelados para sua reconstrução. Mas a invasão de Kursk o surpreendeu, e pode dar a Zelenski uma nova carta para jogar, disse ele.

“Isso aumenta o moral na Ucrânia agora”, disse ele na semana passada no Texas Tribune Festival, em Austin. “O moral é sempre importante, mas provavelmente mais importante agora do que nunca.”

Os contornos da diplomacia também passarão pela eleição presidencial dos EUA em novembro. A vice-presidente Kamala Harris prometeu continuar o apoio do governo Biden à Ucrânia. O ex-presidente Donald Trump liderou muitos legisladores republicanos na tentativa de bloquear a ajuda à Ucrânia.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim.

Trump disse que poderia acabar com a guerra, sem dar detalhes. Talvez ele veja a interrupção da ajuda militar à Ucrânia como uma maneira de forçar Zelenski a sentar à mesa com Putin — em grande desvantagem.

Em uma entrevista ao “The Shawn Ryan Show” publicada na quinta0feira, o candidato a vice-presidente de Trump, J.D. Vance, expôs sua visão de um acordo de paz para a Ucrânia. Ele se alinha com os desejos de Putin: a Ucrânia cede território que os militares russos ocupam; as duas nações permanecem separadas por uma zona desmilitarizada; e a Ucrânia promete não se juntar à Otan ou outras “instituições aliadas”.

Recentemente, Zelenski tem falado mais abertamente na possibilidade de um eventual acordo, mas apenas em termos que ele e a maioria dos cidadãos ucranianos possam aceitar. A Ucrânia considera as condições declaradas por Putin como uma demanda por rendição.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim. Foto: Doug Mills/The New York Times

O presidente ucraniano disse que apresentará a Biden, a Kamala e a Trump este mês um “plano de vitória” que “influenciaria a decisão da Rússia de encerrar esta guerra”. A estratégia envolveria colocar pressão psicológica, política, diplomática e — mais imediatamente — militar sobre Moscou. Zelenski também planeja falar em uma cúpula internacional de paz em novembro, a segunda deste ano.

Esta é uma guerra de atrito e, em última análise, a chave para as negociações de paz é enfatizar para Putin que a Ucrânia e seus aliados estão comprometidos e são capazes de travar uma campanha militar de longo prazo, disse Oleksandr Merezhko, presidente do comitê de relações exteriores do Parlamento da Ucrânia.

“Quando Putin vir que a sociedade ucraniana não está dividida, está determinada a sobreviver e, esperançosamente, a vencer, que o Ocidente está determinado a fornecer todo o equipamento necessário, que podemos atingir alvos militares russos em profundidade no território russo, então ele começará a pensar em algo”, disse Merezhko./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

O presidente Volodmir Zelenski, da Ucrânia, pediu a realização de uma nova cúpula de paz em novembro, aberta à participação da Rússia. Autoridades americanas e europeias se perguntam reservadamente se os militares ucranianos e russos estão esgotados a ponto de pararem a luta. E diplomatas ocidentais estão discutindo que tipo de aliança de defesa seus países poderiam prometer à Ucrânia para ajudar a se chegar a um acordo, dizem autoridades.

Esse tipo de conversa de fundo parece indicar uma maior disposição da Ucrânia e seus aliados de se envolver em negociações de paz com a Rússia futuramente. Mas a diplomacia mais urgente que está ocorrendo agora — e a questão discutida intensamente esta semana em Kiev, Washington e Londres — é a respeito de como moldar o campo de batalha a favor da Ucrânia.

Autoridades ucranianas e ocidentais dizem que o presidente Vladimir Putin ainda não mostra sinais de estar disposto a se envolver de boa fé em negociações de paz. Autoridades americanas e europeias, falando sob condição de anonimato para discutir pontos sensíveis da diplomacia, deixaram claro na semana passada que estão operando com a ideia de que a Ucrânia deve consolidar e expandir seus ganhos no campo de batalha para incentivar Putin a buscar a mesa de negociações — e ter um poder de barganha significativo se as negociações começarem.

As discussões foram energizadas pela ocupação militar ucraniana do território russo em Kursk, um ataque que surpreendeu tanto a Rússia quanto os parceiros da Ucrânia depois que teve início no mês passado.

A Ucrânia também intensificou os ataques contra algumas instalações de produção de petróleo russas, atingindo a essência da economia de seu inimigo. E neutralizou amplamente a frota naval russa do Mar Negro.

As discussões diplomáticas desta semana se concentraram na possibilidade de Estados Unidos, Reino Unido e França darem à Ucrânia permissão para usar mísseis de longo alcance que eles forneceram para atacar o território da Rússia em profundidade. No momento, esses países só permitem que a Ucrânia atinja alvos militares adjacentes à fronteira russa.

Reino Unido e França estão prontas para permitir ataques mais distantes com suas próprias armas, mas estão esperando a adesão de Joe Biden, o que ele está prestes a fazer, dizem autoridades dos EUA. Biden continua hesitante em permitir que a Ucrânia use armas americanas para ataques em profundidade, dizem as autoridades.

Zelenski, junto com lideranças como o o secretário de Relações Exteriores britânico, David Lammy, na Quarta Cúpula de Líderes da Plataforma da Crimeia em Kiev. Foto: Leon Neal/Pool via AP

Biden e Keir Starmer, o primeiro-ministro britânico, discutiram a questão quando se reuniram em Washington nesta sexta feira, 13.

Em Kiev, na quarta feira, 11, Zelenski pediu ao secretário de Estado Antony Blinken e a David Lammy, o secretário das relações exteriores britânico, que afrouxassem as restrições ao uso dos armamentos. E Blinken disse depois em coletivas de imprensa em Kiev e Varsóvia, Polônia, que os Estados Unidos iriam “se ajustar e se adaptar” às condições no campo de batalha.

“Estamos determinados a garantir que eles tenham o que precisam para ter sucesso”, disse Blinken a repórteres em Kiev.

O sucesso no campo de batalha é a base de qualquer esperança de negociação de um acordo, disse Tymofiy Mylovanov, presidente da Escola de Economia de Kiev e ex-ministro do desenvolvimento econômico. É precisamente esse tipo de capacidade militar aprimorada, ele disse em uma entrevista, que poderia levar Putin à mesa de negociações e ajudar a sustentar uma eventual trégua resultante, especialmente porque as sanções econômicas não conseguiram mudar seu comportamento.

Para ter poder de barganha, ele disse, a Ucrânia precisa ser capaz de atacar rapidamente portos, campos de aviação e instalações de petróleo — e até mesmo ameaçar Moscou com ataques de mísseis, se necessário.

“Putin não acredita em nenhuma diplomacia; ele está apenas jogando este jogo”, disse Mylovanov. “Mas acho que ele também quer ver evidências. Quer analisar os recibos. E então, a Ucrânia tem essas capacidades, afinal?”

Putin, junto do secretário do Conselho de Segurança do país, Sergei Shoigu, se encontra com Ali Akbar Ahmadian, secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã. Foto: Kristina Kormilitsyna via AFP

Os objetivos da Rússia também dependem do cumprimento das necessidades do campo de batalha, e suas discussões diplomáticas com parceiros giram em torno desse ponto. Isso foi ressaltado esta semana pela acusação pública de Blinken e Lammy de que o Irã havia começado a enviar mísseis balísticos de curto alcance para a Rússia.

Blinken disse em Londres que a Rússia usaria os mísseis para atingir a Ucrânia “em questão de semanas”. Embora o Irã e a Rússia tenham negado a existência dos carregamentos, o que ficou claro durante a guerra é que a diplomacia da Rússia tem se concentrado em reforçar o exército russo, principalmente com a ajuda da China, Coreia do Norte e Irã.

Por anos, Biden, temendo uma escalada na direção a uma guerra entre Rússia e Otan, concordou com muitos dos pedidos específicos de armas de Zelenski somente após muita negociação e debate interno.

Os críticos da abordagem gradual de Biden dizem que ela acaba minando a diplomacia de longo prazo de algumas maneiras: primeiro, ao contribuir para uma atmosfera de frustração e desconfiança entre autoridades americanas e ucranianas; e segundo, ao não dar aos ucranianos as capacidades de que precisam para acumular fichas de barganha que forçariam Putin a negociar.

Na verdade, eles dizem, Biden e seus assessores permitiram que Putin moldasse a guerra a seu favor ao incutir em Washington o medo de cruzar “linhas vermelhas” desconhecidas na cabeça do líder russo.

“De repente, estávamos em uma guerra em que muitos de nós estamos convencidos de que é normal que os russos estejam na Ucrânia, mas não é normal que os ucranianos estejam na Rússia, o que é uma inovação total na história da guerra”, disse Timothy Snyder, um historiador de Yale que estava na Ucrânia esta semana como representante do United 24, um grupo de captação de fundos do estado ucraniano. “Ninguém nunca afirmou isso antes, muito menos fez seus inimigos acreditarem nisso.”

“Esse é um sucesso psicológico incrível do lado russo”, disse ele. “E não havia como os ucranianos nos fazerem pensar de outra forma, a não ser provando, e foi isso que aconteceu em Kursk, certo?”

Edifício danificado por destroços de mísseis em queda na capital regional russa de Kursk. Foto: Nanna Heitmann/The New York Times

O avanço ucraniano em Kursk diminuiu conforme as forças russas contra-atacam, mas, se Kiev puder manter sua presença lá e talvez até tomar mais território russo, então a Ucrânia teria cartas melhores na mão em quaisquer futuras negociações de paz.

William H. McRaven, um almirante aposentado dos EUA que foi comandante de forças de operações especiais no governo Obama, disse que, até Kursk, ele pensava que o melhor que a Ucrânia poderia esperar era um armistício, garantias de segurança de aliados e dinheiro de ativos russos congelados para sua reconstrução. Mas a invasão de Kursk o surpreendeu, e pode dar a Zelenski uma nova carta para jogar, disse ele.

“Isso aumenta o moral na Ucrânia agora”, disse ele na semana passada no Texas Tribune Festival, em Austin. “O moral é sempre importante, mas provavelmente mais importante agora do que nunca.”

Os contornos da diplomacia também passarão pela eleição presidencial dos EUA em novembro. A vice-presidente Kamala Harris prometeu continuar o apoio do governo Biden à Ucrânia. O ex-presidente Donald Trump liderou muitos legisladores republicanos na tentativa de bloquear a ajuda à Ucrânia.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim.

Trump disse que poderia acabar com a guerra, sem dar detalhes. Talvez ele veja a interrupção da ajuda militar à Ucrânia como uma maneira de forçar Zelenski a sentar à mesa com Putin — em grande desvantagem.

Em uma entrevista ao “The Shawn Ryan Show” publicada na quinta0feira, o candidato a vice-presidente de Trump, J.D. Vance, expôs sua visão de um acordo de paz para a Ucrânia. Ele se alinha com os desejos de Putin: a Ucrânia cede território que os militares russos ocupam; as duas nações permanecem separadas por uma zona desmilitarizada; e a Ucrânia promete não se juntar à Otan ou outras “instituições aliadas”.

Recentemente, Zelenski tem falado mais abertamente na possibilidade de um eventual acordo, mas apenas em termos que ele e a maioria dos cidadãos ucranianos possam aceitar. A Ucrânia considera as condições declaradas por Putin como uma demanda por rendição.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim. Foto: Doug Mills/The New York Times

O presidente ucraniano disse que apresentará a Biden, a Kamala e a Trump este mês um “plano de vitória” que “influenciaria a decisão da Rússia de encerrar esta guerra”. A estratégia envolveria colocar pressão psicológica, política, diplomática e — mais imediatamente — militar sobre Moscou. Zelenski também planeja falar em uma cúpula internacional de paz em novembro, a segunda deste ano.

Esta é uma guerra de atrito e, em última análise, a chave para as negociações de paz é enfatizar para Putin que a Ucrânia e seus aliados estão comprometidos e são capazes de travar uma campanha militar de longo prazo, disse Oleksandr Merezhko, presidente do comitê de relações exteriores do Parlamento da Ucrânia.

“Quando Putin vir que a sociedade ucraniana não está dividida, está determinada a sobreviver e, esperançosamente, a vencer, que o Ocidente está determinado a fornecer todo o equipamento necessário, que podemos atingir alvos militares russos em profundidade no território russo, então ele começará a pensar em algo”, disse Merezhko./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

O presidente Volodmir Zelenski, da Ucrânia, pediu a realização de uma nova cúpula de paz em novembro, aberta à participação da Rússia. Autoridades americanas e europeias se perguntam reservadamente se os militares ucranianos e russos estão esgotados a ponto de pararem a luta. E diplomatas ocidentais estão discutindo que tipo de aliança de defesa seus países poderiam prometer à Ucrânia para ajudar a se chegar a um acordo, dizem autoridades.

Esse tipo de conversa de fundo parece indicar uma maior disposição da Ucrânia e seus aliados de se envolver em negociações de paz com a Rússia futuramente. Mas a diplomacia mais urgente que está ocorrendo agora — e a questão discutida intensamente esta semana em Kiev, Washington e Londres — é a respeito de como moldar o campo de batalha a favor da Ucrânia.

Autoridades ucranianas e ocidentais dizem que o presidente Vladimir Putin ainda não mostra sinais de estar disposto a se envolver de boa fé em negociações de paz. Autoridades americanas e europeias, falando sob condição de anonimato para discutir pontos sensíveis da diplomacia, deixaram claro na semana passada que estão operando com a ideia de que a Ucrânia deve consolidar e expandir seus ganhos no campo de batalha para incentivar Putin a buscar a mesa de negociações — e ter um poder de barganha significativo se as negociações começarem.

As discussões foram energizadas pela ocupação militar ucraniana do território russo em Kursk, um ataque que surpreendeu tanto a Rússia quanto os parceiros da Ucrânia depois que teve início no mês passado.

A Ucrânia também intensificou os ataques contra algumas instalações de produção de petróleo russas, atingindo a essência da economia de seu inimigo. E neutralizou amplamente a frota naval russa do Mar Negro.

As discussões diplomáticas desta semana se concentraram na possibilidade de Estados Unidos, Reino Unido e França darem à Ucrânia permissão para usar mísseis de longo alcance que eles forneceram para atacar o território da Rússia em profundidade. No momento, esses países só permitem que a Ucrânia atinja alvos militares adjacentes à fronteira russa.

Reino Unido e França estão prontas para permitir ataques mais distantes com suas próprias armas, mas estão esperando a adesão de Joe Biden, o que ele está prestes a fazer, dizem autoridades dos EUA. Biden continua hesitante em permitir que a Ucrânia use armas americanas para ataques em profundidade, dizem as autoridades.

Zelenski, junto com lideranças como o o secretário de Relações Exteriores britânico, David Lammy, na Quarta Cúpula de Líderes da Plataforma da Crimeia em Kiev. Foto: Leon Neal/Pool via AP

Biden e Keir Starmer, o primeiro-ministro britânico, discutiram a questão quando se reuniram em Washington nesta sexta feira, 13.

Em Kiev, na quarta feira, 11, Zelenski pediu ao secretário de Estado Antony Blinken e a David Lammy, o secretário das relações exteriores britânico, que afrouxassem as restrições ao uso dos armamentos. E Blinken disse depois em coletivas de imprensa em Kiev e Varsóvia, Polônia, que os Estados Unidos iriam “se ajustar e se adaptar” às condições no campo de batalha.

“Estamos determinados a garantir que eles tenham o que precisam para ter sucesso”, disse Blinken a repórteres em Kiev.

O sucesso no campo de batalha é a base de qualquer esperança de negociação de um acordo, disse Tymofiy Mylovanov, presidente da Escola de Economia de Kiev e ex-ministro do desenvolvimento econômico. É precisamente esse tipo de capacidade militar aprimorada, ele disse em uma entrevista, que poderia levar Putin à mesa de negociações e ajudar a sustentar uma eventual trégua resultante, especialmente porque as sanções econômicas não conseguiram mudar seu comportamento.

Para ter poder de barganha, ele disse, a Ucrânia precisa ser capaz de atacar rapidamente portos, campos de aviação e instalações de petróleo — e até mesmo ameaçar Moscou com ataques de mísseis, se necessário.

“Putin não acredita em nenhuma diplomacia; ele está apenas jogando este jogo”, disse Mylovanov. “Mas acho que ele também quer ver evidências. Quer analisar os recibos. E então, a Ucrânia tem essas capacidades, afinal?”

Putin, junto do secretário do Conselho de Segurança do país, Sergei Shoigu, se encontra com Ali Akbar Ahmadian, secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã. Foto: Kristina Kormilitsyna via AFP

Os objetivos da Rússia também dependem do cumprimento das necessidades do campo de batalha, e suas discussões diplomáticas com parceiros giram em torno desse ponto. Isso foi ressaltado esta semana pela acusação pública de Blinken e Lammy de que o Irã havia começado a enviar mísseis balísticos de curto alcance para a Rússia.

Blinken disse em Londres que a Rússia usaria os mísseis para atingir a Ucrânia “em questão de semanas”. Embora o Irã e a Rússia tenham negado a existência dos carregamentos, o que ficou claro durante a guerra é que a diplomacia da Rússia tem se concentrado em reforçar o exército russo, principalmente com a ajuda da China, Coreia do Norte e Irã.

Por anos, Biden, temendo uma escalada na direção a uma guerra entre Rússia e Otan, concordou com muitos dos pedidos específicos de armas de Zelenski somente após muita negociação e debate interno.

Os críticos da abordagem gradual de Biden dizem que ela acaba minando a diplomacia de longo prazo de algumas maneiras: primeiro, ao contribuir para uma atmosfera de frustração e desconfiança entre autoridades americanas e ucranianas; e segundo, ao não dar aos ucranianos as capacidades de que precisam para acumular fichas de barganha que forçariam Putin a negociar.

Na verdade, eles dizem, Biden e seus assessores permitiram que Putin moldasse a guerra a seu favor ao incutir em Washington o medo de cruzar “linhas vermelhas” desconhecidas na cabeça do líder russo.

“De repente, estávamos em uma guerra em que muitos de nós estamos convencidos de que é normal que os russos estejam na Ucrânia, mas não é normal que os ucranianos estejam na Rússia, o que é uma inovação total na história da guerra”, disse Timothy Snyder, um historiador de Yale que estava na Ucrânia esta semana como representante do United 24, um grupo de captação de fundos do estado ucraniano. “Ninguém nunca afirmou isso antes, muito menos fez seus inimigos acreditarem nisso.”

“Esse é um sucesso psicológico incrível do lado russo”, disse ele. “E não havia como os ucranianos nos fazerem pensar de outra forma, a não ser provando, e foi isso que aconteceu em Kursk, certo?”

Edifício danificado por destroços de mísseis em queda na capital regional russa de Kursk. Foto: Nanna Heitmann/The New York Times

O avanço ucraniano em Kursk diminuiu conforme as forças russas contra-atacam, mas, se Kiev puder manter sua presença lá e talvez até tomar mais território russo, então a Ucrânia teria cartas melhores na mão em quaisquer futuras negociações de paz.

William H. McRaven, um almirante aposentado dos EUA que foi comandante de forças de operações especiais no governo Obama, disse que, até Kursk, ele pensava que o melhor que a Ucrânia poderia esperar era um armistício, garantias de segurança de aliados e dinheiro de ativos russos congelados para sua reconstrução. Mas a invasão de Kursk o surpreendeu, e pode dar a Zelenski uma nova carta para jogar, disse ele.

“Isso aumenta o moral na Ucrânia agora”, disse ele na semana passada no Texas Tribune Festival, em Austin. “O moral é sempre importante, mas provavelmente mais importante agora do que nunca.”

Os contornos da diplomacia também passarão pela eleição presidencial dos EUA em novembro. A vice-presidente Kamala Harris prometeu continuar o apoio do governo Biden à Ucrânia. O ex-presidente Donald Trump liderou muitos legisladores republicanos na tentativa de bloquear a ajuda à Ucrânia.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim.

Trump disse que poderia acabar com a guerra, sem dar detalhes. Talvez ele veja a interrupção da ajuda militar à Ucrânia como uma maneira de forçar Zelenski a sentar à mesa com Putin — em grande desvantagem.

Em uma entrevista ao “The Shawn Ryan Show” publicada na quinta0feira, o candidato a vice-presidente de Trump, J.D. Vance, expôs sua visão de um acordo de paz para a Ucrânia. Ele se alinha com os desejos de Putin: a Ucrânia cede território que os militares russos ocupam; as duas nações permanecem separadas por uma zona desmilitarizada; e a Ucrânia promete não se juntar à Otan ou outras “instituições aliadas”.

Recentemente, Zelenski tem falado mais abertamente na possibilidade de um eventual acordo, mas apenas em termos que ele e a maioria dos cidadãos ucranianos possam aceitar. A Ucrânia considera as condições declaradas por Putin como uma demanda por rendição.

Quando perguntado por um moderador do debate na terça-feira se ele queria que a Ucrânia vencesse, Trump evitou dizer sim. Foto: Doug Mills/The New York Times

O presidente ucraniano disse que apresentará a Biden, a Kamala e a Trump este mês um “plano de vitória” que “influenciaria a decisão da Rússia de encerrar esta guerra”. A estratégia envolveria colocar pressão psicológica, política, diplomática e — mais imediatamente — militar sobre Moscou. Zelenski também planeja falar em uma cúpula internacional de paz em novembro, a segunda deste ano.

Esta é uma guerra de atrito e, em última análise, a chave para as negociações de paz é enfatizar para Putin que a Ucrânia e seus aliados estão comprometidos e são capazes de travar uma campanha militar de longo prazo, disse Oleksandr Merezhko, presidente do comitê de relações exteriores do Parlamento da Ucrânia.

“Quando Putin vir que a sociedade ucraniana não está dividida, está determinada a sobreviver e, esperançosamente, a vencer, que o Ocidente está determinado a fornecer todo o equipamento necessário, que podemos atingir alvos militares russos em profundidade no território russo, então ele começará a pensar em algo”, disse Merezhko./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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