Efeito Milei: desconexão de políticos tradicionais com demandas da população impulsiona libertário


Economista capturou insatisfação dos argentinos e saiu como grande vencedor das primárias, que funcionam como termômetro para eleição de outubro

Por Luciana Taddeo
Atualização:

ESPECIAL PARA O ESTADÃO, DE BUENOS AIRES - Jaqueta de couro, pouca familiaridade com pente de cabelo, promessas de mudanças radicais na economia e muitos gritos. O modo com que Javier Milei se apresentou para a sociedade argentina para chegar à presidência, quase caricatural, acabou conquistando boa parte do eleitorado e surpreendeu muitos, gerou diversas análises e provocou um tremor economico na segunda pós-eleitoral.

“Foi um dia muito complexo e movimentado”, afirma Santiago Manoukian, chefe de Research da consultora Ecolatina. “O mercado esperava um triunfo moderado da aliança Juntos por el Cambio [Juntos pela Mudança], e que depois haveria um governismo competitivo, mas que Milei não seria competitivo em um segundo turno. Esse cenário totalmente diferente cria um desvio muito importante que afetou a economia”, explica ao Estadão.

Os títulos da dívida argentinos caíram entre 3 e 12%. O Banco Central aumentou a taxa de juros do país de 97 para 118% ao ano e o peso sofreu sua maior desvalorização em um dia desde 2019.

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Javier Milei fala com apoiadores depois se sair como vencedor das primárias na Argentina, 13 de agosto de 2023.  Foto: AP Photo/Natacha Pisarenko

Há um consenso de que o voto em Milei deriva da irritação com políticos tradicionais que não dão respostas às necessidades da população, num país que não cresce há 12 anos, onde os assalariados veem seu poder aquisitivo se deteriorar de forma constante e brusca diante de uma inflação que chega a 115% anuais. Por outro lado, o dólar, moeda de refúgio dos argentinos que conseguem economizar, saltou de 60 para 700 pesos em quatro anos.

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“A deterioração da renda do argentino é clara e depois de tanto tempo nessa situação, gera muita irritação e ansiedade, o que faz com que propostas que soam simples, como a de Milei de dolarizar a economia, tenham tanta aceitação na sociedade. A população não é especialista em economia, então quando alguém lhes promete uma solução simples e rápida, acaba captando votos”, explica o economista Guido Zack, do think tank Fundar.

Para a cientista política Lara Goyburu, o voto em Milei se centralizou principalmente entre jovens com reclamações comuns no século passado, como carreira profissional, acesso à moradia, educação e bons salários. “Essas demandas não foram as propostas dos candidatos, nem discussões que eles propuseram nos últimos 2 anos”, explica, sobre a desconexão dos políticos tradicionais com as demandas da população.

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Além disso, ela lembra que Milei ganhou em quase todas as províncias do país, inclusive onde o peronismo elegeu governadores, o que evidencia um descontentamento da cidadania local com uma política nacional que não os representa. “Ele é o candidato que expressa a braveza, o cansaço, a fadiga”, diz, afirmando que continua havendo uma politização da sociedade argentina, mas de uma forma menos progressista.

Para o cientista político Pablo Touzon, diretor da consultora Escenarios, o fenômeno Milei começou na pandemia, quando a Argentina enfrentou uma das quarentenas mais rígidas do mundo, e os jovens tiveram que ficar em casa cerca de um ano e meio. “A afirmação ‘o Estado te salva’ mostrou ser o contrário, e para os libertários, a visão do Estado autoritário e repressivo acabou se mostrando real”, explica.

A isso, segundo ele, se somou o descontentamento com o governo Macri, que não conseguiu implementar reformas econômicas que prometeu, o que gerou mais radicalização em um setor da direita, e a crise do governo peronista, que não conseguiu atenuar a gravidade da derrocada econômica.

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“Por essa mistura de fatores, o que poderia ter sido somente um fenômeno lateral, midiático, começou a se aprofundar e ganhou um impulso eleitoral em 2021, quando Milei teve uma boa eleição para deputado da cidade de Buenos Aires, inclusive em bairros mais populares, nas favelas”, analisa.

Touzon explica que se as eleições fossem hoje, Milei ganharia entre os menores de 30 anos, principalmente entre homens, segundo diversas pesquisas. Entre as mulheres, a receptividade ao candidato é menor, por seu discurso contra o que qualifica como “ideologia de gênero”, contrário à educação sexual nas escolas e contra a legalização do aborto.

“Agora temos que ver como isso decanta, se a Bullrich vai disputar com o Milei o espaço da direita, ou se terminará em uma briga direta entre o Milei e o Massa, com um desbotamento da figura de Bullrich. Acho que no transcurso dos próximos dias, passado a sacudida e a surpresa do Milei, vamos entender melhor como serão as campanhas”, avalia Goyburu.

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Ela ainda considera que pode haver um aumento da participação, que foi de 69.62%, a menor entre as primárias presidenciais até agora. “Não acho que haverá uma votação massiva em outubro, não sou tão otimista, mas acho que chegaremos a porcentagem similares às anteriores, que superaram 70% de participação”, explica.

ESPECIAL PARA O ESTADÃO, DE BUENOS AIRES - Jaqueta de couro, pouca familiaridade com pente de cabelo, promessas de mudanças radicais na economia e muitos gritos. O modo com que Javier Milei se apresentou para a sociedade argentina para chegar à presidência, quase caricatural, acabou conquistando boa parte do eleitorado e surpreendeu muitos, gerou diversas análises e provocou um tremor economico na segunda pós-eleitoral.

“Foi um dia muito complexo e movimentado”, afirma Santiago Manoukian, chefe de Research da consultora Ecolatina. “O mercado esperava um triunfo moderado da aliança Juntos por el Cambio [Juntos pela Mudança], e que depois haveria um governismo competitivo, mas que Milei não seria competitivo em um segundo turno. Esse cenário totalmente diferente cria um desvio muito importante que afetou a economia”, explica ao Estadão.

Os títulos da dívida argentinos caíram entre 3 e 12%. O Banco Central aumentou a taxa de juros do país de 97 para 118% ao ano e o peso sofreu sua maior desvalorização em um dia desde 2019.

Javier Milei fala com apoiadores depois se sair como vencedor das primárias na Argentina, 13 de agosto de 2023.  Foto: AP Photo/Natacha Pisarenko

Há um consenso de que o voto em Milei deriva da irritação com políticos tradicionais que não dão respostas às necessidades da população, num país que não cresce há 12 anos, onde os assalariados veem seu poder aquisitivo se deteriorar de forma constante e brusca diante de uma inflação que chega a 115% anuais. Por outro lado, o dólar, moeda de refúgio dos argentinos que conseguem economizar, saltou de 60 para 700 pesos em quatro anos.

“A deterioração da renda do argentino é clara e depois de tanto tempo nessa situação, gera muita irritação e ansiedade, o que faz com que propostas que soam simples, como a de Milei de dolarizar a economia, tenham tanta aceitação na sociedade. A população não é especialista em economia, então quando alguém lhes promete uma solução simples e rápida, acaba captando votos”, explica o economista Guido Zack, do think tank Fundar.

Para a cientista política Lara Goyburu, o voto em Milei se centralizou principalmente entre jovens com reclamações comuns no século passado, como carreira profissional, acesso à moradia, educação e bons salários. “Essas demandas não foram as propostas dos candidatos, nem discussões que eles propuseram nos últimos 2 anos”, explica, sobre a desconexão dos políticos tradicionais com as demandas da população.

Além disso, ela lembra que Milei ganhou em quase todas as províncias do país, inclusive onde o peronismo elegeu governadores, o que evidencia um descontentamento da cidadania local com uma política nacional que não os representa. “Ele é o candidato que expressa a braveza, o cansaço, a fadiga”, diz, afirmando que continua havendo uma politização da sociedade argentina, mas de uma forma menos progressista.

Para o cientista político Pablo Touzon, diretor da consultora Escenarios, o fenômeno Milei começou na pandemia, quando a Argentina enfrentou uma das quarentenas mais rígidas do mundo, e os jovens tiveram que ficar em casa cerca de um ano e meio. “A afirmação ‘o Estado te salva’ mostrou ser o contrário, e para os libertários, a visão do Estado autoritário e repressivo acabou se mostrando real”, explica.

A isso, segundo ele, se somou o descontentamento com o governo Macri, que não conseguiu implementar reformas econômicas que prometeu, o que gerou mais radicalização em um setor da direita, e a crise do governo peronista, que não conseguiu atenuar a gravidade da derrocada econômica.

“Por essa mistura de fatores, o que poderia ter sido somente um fenômeno lateral, midiático, começou a se aprofundar e ganhou um impulso eleitoral em 2021, quando Milei teve uma boa eleição para deputado da cidade de Buenos Aires, inclusive em bairros mais populares, nas favelas”, analisa.

Touzon explica que se as eleições fossem hoje, Milei ganharia entre os menores de 30 anos, principalmente entre homens, segundo diversas pesquisas. Entre as mulheres, a receptividade ao candidato é menor, por seu discurso contra o que qualifica como “ideologia de gênero”, contrário à educação sexual nas escolas e contra a legalização do aborto.

“Agora temos que ver como isso decanta, se a Bullrich vai disputar com o Milei o espaço da direita, ou se terminará em uma briga direta entre o Milei e o Massa, com um desbotamento da figura de Bullrich. Acho que no transcurso dos próximos dias, passado a sacudida e a surpresa do Milei, vamos entender melhor como serão as campanhas”, avalia Goyburu.

Ela ainda considera que pode haver um aumento da participação, que foi de 69.62%, a menor entre as primárias presidenciais até agora. “Não acho que haverá uma votação massiva em outubro, não sou tão otimista, mas acho que chegaremos a porcentagem similares às anteriores, que superaram 70% de participação”, explica.

ESPECIAL PARA O ESTADÃO, DE BUENOS AIRES - Jaqueta de couro, pouca familiaridade com pente de cabelo, promessas de mudanças radicais na economia e muitos gritos. O modo com que Javier Milei se apresentou para a sociedade argentina para chegar à presidência, quase caricatural, acabou conquistando boa parte do eleitorado e surpreendeu muitos, gerou diversas análises e provocou um tremor economico na segunda pós-eleitoral.

“Foi um dia muito complexo e movimentado”, afirma Santiago Manoukian, chefe de Research da consultora Ecolatina. “O mercado esperava um triunfo moderado da aliança Juntos por el Cambio [Juntos pela Mudança], e que depois haveria um governismo competitivo, mas que Milei não seria competitivo em um segundo turno. Esse cenário totalmente diferente cria um desvio muito importante que afetou a economia”, explica ao Estadão.

Os títulos da dívida argentinos caíram entre 3 e 12%. O Banco Central aumentou a taxa de juros do país de 97 para 118% ao ano e o peso sofreu sua maior desvalorização em um dia desde 2019.

Javier Milei fala com apoiadores depois se sair como vencedor das primárias na Argentina, 13 de agosto de 2023.  Foto: AP Photo/Natacha Pisarenko

Há um consenso de que o voto em Milei deriva da irritação com políticos tradicionais que não dão respostas às necessidades da população, num país que não cresce há 12 anos, onde os assalariados veem seu poder aquisitivo se deteriorar de forma constante e brusca diante de uma inflação que chega a 115% anuais. Por outro lado, o dólar, moeda de refúgio dos argentinos que conseguem economizar, saltou de 60 para 700 pesos em quatro anos.

“A deterioração da renda do argentino é clara e depois de tanto tempo nessa situação, gera muita irritação e ansiedade, o que faz com que propostas que soam simples, como a de Milei de dolarizar a economia, tenham tanta aceitação na sociedade. A população não é especialista em economia, então quando alguém lhes promete uma solução simples e rápida, acaba captando votos”, explica o economista Guido Zack, do think tank Fundar.

Para a cientista política Lara Goyburu, o voto em Milei se centralizou principalmente entre jovens com reclamações comuns no século passado, como carreira profissional, acesso à moradia, educação e bons salários. “Essas demandas não foram as propostas dos candidatos, nem discussões que eles propuseram nos últimos 2 anos”, explica, sobre a desconexão dos políticos tradicionais com as demandas da população.

Além disso, ela lembra que Milei ganhou em quase todas as províncias do país, inclusive onde o peronismo elegeu governadores, o que evidencia um descontentamento da cidadania local com uma política nacional que não os representa. “Ele é o candidato que expressa a braveza, o cansaço, a fadiga”, diz, afirmando que continua havendo uma politização da sociedade argentina, mas de uma forma menos progressista.

Para o cientista político Pablo Touzon, diretor da consultora Escenarios, o fenômeno Milei começou na pandemia, quando a Argentina enfrentou uma das quarentenas mais rígidas do mundo, e os jovens tiveram que ficar em casa cerca de um ano e meio. “A afirmação ‘o Estado te salva’ mostrou ser o contrário, e para os libertários, a visão do Estado autoritário e repressivo acabou se mostrando real”, explica.

A isso, segundo ele, se somou o descontentamento com o governo Macri, que não conseguiu implementar reformas econômicas que prometeu, o que gerou mais radicalização em um setor da direita, e a crise do governo peronista, que não conseguiu atenuar a gravidade da derrocada econômica.

“Por essa mistura de fatores, o que poderia ter sido somente um fenômeno lateral, midiático, começou a se aprofundar e ganhou um impulso eleitoral em 2021, quando Milei teve uma boa eleição para deputado da cidade de Buenos Aires, inclusive em bairros mais populares, nas favelas”, analisa.

Touzon explica que se as eleições fossem hoje, Milei ganharia entre os menores de 30 anos, principalmente entre homens, segundo diversas pesquisas. Entre as mulheres, a receptividade ao candidato é menor, por seu discurso contra o que qualifica como “ideologia de gênero”, contrário à educação sexual nas escolas e contra a legalização do aborto.

“Agora temos que ver como isso decanta, se a Bullrich vai disputar com o Milei o espaço da direita, ou se terminará em uma briga direta entre o Milei e o Massa, com um desbotamento da figura de Bullrich. Acho que no transcurso dos próximos dias, passado a sacudida e a surpresa do Milei, vamos entender melhor como serão as campanhas”, avalia Goyburu.

Ela ainda considera que pode haver um aumento da participação, que foi de 69.62%, a menor entre as primárias presidenciais até agora. “Não acho que haverá uma votação massiva em outubro, não sou tão otimista, mas acho que chegaremos a porcentagem similares às anteriores, que superaram 70% de participação”, explica.

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