TEL AVIV - O ex-primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu ampliou sua vantagem com 87,6% dos votos contados no país nesta quarta-feira, 2, e caminhava para uma vitória ampla e uma maioria estável no parlamento do país com seus aliados da extrema-direita.
Análises
Os votos ainda estavam sendo contados e os resultados finais só devem ser divulgados na sexta-feira. Mas se as indicações preliminares estiverem corretas, Israel deve eleger o governo mais à direita da sua história, reforçado por uma forte vitória do partido ultranacionalista Sionismo Religioso, cujos membros usam uma retórica anti-árabe e anti-LGBTQ.
Os resultados iniciais apontaram para uma contínua mudança para a direita no eleitorado israelense, diminuindo ainda mais as esperanças de paz com os palestinos e preparando o terreno para um possível conflito com o governo Biden e os apoiadores de Israel nos Estados Unidos.
A votação, como as eleições anteriores, foi apertada, mas as indicações iniciais mostraram que Netanyahu estava voltando ao cargo de primeiro-ministro com uma maioria firme no parlamento de 120 assentos de Israel.
Com Netanyahu e seus aliados projetados para ganhar mais do que a maioria de 61 assentos necessária para formar um governo, a prolongada crise política do país pode estar chegando ao fim, mas o país continua dividido como sempre.
Independentemente do destino de Netanyahu, os resultados já constituem uma vitória decisiva para uma aliança de extrema-direita que se tornará o terceiro maior bloco do Parlamento e o segundo maior da coalizão de Netanyahu, atrás do seu partido, o Likud.
A aliança de extrema-direita busca reduzir freios e contrapesos aos legisladores, dar aos políticos mais controle sobre a nomeação de juízes, acabar com a autonomia palestina em partes da Cisjordânia ocupada e legalizar uma forma de corrupção que Netanyahu é acusado de cometer.
A figura mais proeminente da aliança, Itamar Ben-Gvir, quer conceder imunidade legal a soldados israelenses que atirarem em palestinos e deportar legisladores rivais que ele acusa de terrorismo. Até recentemente, ele pendurou em sua casa um retrato de Baruch Goldstein, que matou 29 palestinos em uma mesquita da Cisjordânia em 1994.
“Chegou a hora de sermos os proprietários de nosso país”, disse Ben-Gvir em um discurso na manhã de quarta-feira, enquanto os apoiadores gritavam “morte aos terroristas”.
Falando mais tarde, Netanyahu adotou um tom mais conciliador em seu próprio discurso. “Se os verdadeiros resultados refletirem as projeções, estabelecerei um governo nacional que cuidará de todos”, disse Netanyahu. Ele falou em “restaurar o orgulho nacional” no estado judeu, mas acrescentou que Israel era um país que “respeita todos os seus cidadãos”.
No entanto, analistas dizem que Netanyahu provavelmente precisará adotar algumas das políticas de linha dura para manter Ben-Gvir e seus aliados de extrema direita fieis à coalizão. A aliança de Ben-Gvir está pressionando pelo controle de ministérios que supervisionam o exército e a polícia, e Netanyahu não mencionou as propostas polêmicas de seus aliados para reformar e enfraquecer o sistema de justiça.
O resultado do bloco de Netanyahu indica como ele teve sucesso em apresentar a eleição como uma chance de reforçar a identidade judaica do país.
O governo que se encerra, do primeiro-ministro Yair Lapid, uniu oponentes políticos da direita, esquerda e centro, e incluiu o primeiro partido árabe independente a se juntar a uma coalizão governamental israelense.
Essa diversidade incomodou os eleitores judeus mais conservadores, que sentiram que isso minou o caráter judaico de Israel. O governo de Lapid também irritou os eleitores ultraortodoxos ao aumentar os impostos sobre bens frequentemente usados por sua comunidade e ao tentar reduzir a influência de seus líderes sobre aspectos da vida pública.
“Mais da metade das pessoas estava farta do governo anterior”, disse Arye Deri, líder de um partido ultraortodoxo no bloco de Netanyahu, a repórteres durante a noite. “Um governo que não os viu”, acrescentou Deri. “Um governo que não os considerou. Um governo que pôs em perigo o caráter judaico do Estado. Tudo isso acabou”, disse ele.
Vitória da extrema direita em Israel
A comemoração mais forte da noite foi da coalizão chamada Sionismo Religioso, anti-LGBT, defensora da segregação de árabes e do fim da cidadania israelense para não-judeus, liderada pelo legislador de extrema-direita Itamar Ben-Gvir. O partido emergiu como o terceiro maior do Parlamento. Em uma reunião de campanha exclusiva para homens, todos vestindo trajes religiosos, usando o quipá e agitando bandeiras israelenses, os eleitores de Gvir dançaram em comemoração e gritaram “Morte aos terroristas”.
Ben-Gvir é o herdeiro ideológico de Meir Kahane, um rabino nascido nos Estados Unidos que se tornou um líder religioso de extrema direita e cujo partido extremista, Kach, foi banido. Assassinado em 1990 em Nova York por um ultra-ordoxo, Kahane queria que os judeus adotassem o “poder judaico”, inspirado nos Panteras Negras e outros grupos militantes étnicos da época.
O partido de Kahane tinha uma plataforma para “proteger a honra de Israel contra insultos dos negros”, defendia o fim da cidadania israelense para não judeus e a expulsão de árabes do país e dos territórios controlados por Israel. Ele também queria proibir os casamentos mistos e as relações sexuais entre judeus e não judeus. Kahane alertava para os riscos de “mulheres judias sendo seduzidas por árabes” e propôs sentenças de prisão para “todo árabe que tiver relações sexuais com uma judia”.
Ben-Gvir afirmou que o partido dele, o Poder Judeu, “não é uma continuação” da ideologia de Kahane, mas disse que considerava o homem “um santo, que lutou em guerras pelo povo de Israel e foi morto santificando o nome de Deus”.
Mas enquanto Kahane era visto como um pária, Ben-Gvir é um dos políticos mais populares de Israel, graças às suas frequentes aparições na mídia, comportamento alegre, talento para desviar de críticas e apelos por uma linha mais dura contra os palestinos em um momento de intensos combates no país e na Cisjordânia ocupada. Os jovens ultraortodoxos estão entre seus mais fortes apoiadores.
Ben-Gvir vive no assentamento de Kiryat Arba, na Cisjordânia, e é um forte defensor da construção de assentamentos. Ele descreveu colegas árabes no parlamento como “terroristas”, pediu a deportação daqueles que são “desleais” e recentemente brandiu uma arma em um bairro palestino de Jerusalém enquanto pedia à polícia que matasse os “atiradores de pedras palestinos”.
“Queremos fazer uma separação total entre aqueles que são leais ao Estado de Israel – e não temos nenhum problema com eles – e aqueles que minam nosso querido país”, disse ele.
Muhammad Shtayyeh, o primeiro-ministro palestino, disse que a ascensão da extrema direita de Israel foi “um resultado natural das crescentes manifestações de extremismo e racismo na sociedade israelense”. / NYT, AP e AFP