ENVIADA ESPECIAL A BOGOTÁ - Com forte apoio dos jovens, Gustavo Petro foi eleito o primeiro presidente de esquerda da história da Colômbia em junho de 2022. Passados 18 meses, não é fácil encontrar até mesmo entre esse grupo de eleitores alguém que ainda esteja otimista com seu governo. Nas universidades de Bogotá, estudantes parecem apáticos em relação ao presidente.
“Houve uma idealização grande antes da eleição, como se Petro fosse o salvador. Mas as mudanças no país têm sido muito lentas”, diz Juan Felipe Duarte, um estudante de 20 anos de Letras da Universidad Nacional de Colombia. “Sinto que vamos ter mais quatro anos do mesmo. Mas também acho que ele está sendo odiado exageradamente”, acrescenta o eleitor de Petro.
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O desânimo com Petro, até mesmo entre a esquerda, cresce em meio às dificuldades do governo para aprovar reformas no Congresso e a escândalos de corrupção envolvendo nomes como o do filho mais velho do presidente, Nicolás Petro Burgos, além da violência persistente no país. Diante desse cenário, a reprovação de Petro passou de 20%, em agosto de 2022, quando ele assumiu a presidência, para 66% em dezembro, de acordo com pesquisa da Invamer.
Segundo o estrategista Camilo Granada, consultor para comunicações do ex-presidente Juan Manuel Santos, Petro hoje tem o apoio apenas de sua base cativa, que varia entre 22% e 27% dos eleitores. “Ele perdeu o apoio de quem lhe havia dado uma chance, de gente que se identifica com o centro, e até de parte dos jovens.”
Nas eleições – com a crise decorrente da pandemia, após protestos tomarem as ruas contra o então presidente, Iván Duque, e diante da reprovação de parte dos colombianos ao outro candidato que chegou ao segundo turno, Rodolfo Hernández (conhecido no país como “Trump tropical”) –, Santos havia conseguido somar votos de 50,4% dos eleitores.
Para Granada, não se pode dizer que o governo Petro fracassou há apenas um ano e meio de seu início. Mas, sim, é possível afirmar que está debilitado. O consultor ainda vê espaço para que o presidente aprove as reformas que pretende (de saúde, trabalhista e da previdência), mas de forma menos ambiciosa.
A agenda de reformas era uma das grandes promessas de Petro. Mas, nesses primeiros 18 meses de governo, apenas a tributária foi aprovada – o que é visto como uma grande derrota. A de saúde passou pela Câmara dos Deputados em dezembro e deve ser votada no Senado em fevereiro. O presidente tem se mostrado pouco aberto às negociações, dificultando as tramitações, e, com um país historicamente conservador, sofre para implementar projetos de maior intervenção estatal.
Granada aponta ainda que a derrota do presidente nas eleições regionais de outubro, que deram vitória para direita e centro-direita nas principais cidades e departamentos (o equivalente a estados) do país, indica que Petro não conseguiu que sua coligação, o Pacto Histórico, se consolidasse como uma força política.
“Quando foi eleito, Petro falou que era o início de uma transformação histórica. Para ele, o Pacto Histórico tinha de virar um partido forte e permanente, como os tradicionais da Colômbia. Isso está fracassando”, diz Granada.
As crises no governo começaram em fevereiro do ano passado, quando o governo tentava aprovar a reforma da saúde, o que incluía uma redução da participação do setor privado no sistema. O então ministro da Educação, Alejandro Gaviria, questionou o projeto e seu impacto nas contas públicas do país. As críticas à reforma da saúde custaram o cargo de Gaviria e, em uma reforma de gabinete, também saíram as ministras de Esportes, María Isabel Urrutia, e de Cultura, Patricia Ariza.
Ex-reitor da Universidad de los Andes (uma instituição de ensino prestigiada voltada à elite), Gaviria havia sido ministro da Saúde de Juan Manuel Santos e candidato a presidente no primeiro turno das eleições de 2022. No segundo turno, apoiou Petro – apesar das divergências ideológicas entre eles - e, após a eleição, sua participação no governo foi um dos sinais de que uma frente ampla comandaria o país.
Forte crítico de Petro hoje, Gaviria afirma que o presidente nunca teve uma estratégia política e que não está mais disposto a ceder – diferentemente do que ocorreu nos primeiros meses após sua chegada à presidência, quando negociou para aprovar uma reforma tributária que elevou a arrecadação.
“Há duas pessoas em Petro. Uma que quer ser fiel à militância e outra que quer ser negociadora. Às vezes, ele convoca essa pessoa negociadora. Mas, nos momentos cruciais, ele é a outra pessoa”, diz Gaviria.
O consultor político Andrés Mejía Vergnaud vê Petro de forma semelhante. Para ele, o presidente é um idealista, pouco pragmático. “Ele não quer fazer pequenas mudanças, quer mudar a sociedade. É um homem de sonhos e parece ter ficado frustrado com a pessoa prática que foi (quando a reforma tributária foi aprovada).”
Para o futuro do governo Petro, Gaviria, o ex-ministro, vê duas possibilidades. A primeira seria uma espécie de paralisação: nada avança e as discussões ficam em torno dos tweets do presidente. “Seria uma decadência tranquila.” Outra possibilidade seria que Petro avançasse em medidas intervencionistas no setor privado, o que, segundo Gaviria, poderia causar uma instabilidade política grande.
Recém-formadas em Governo e Assuntos Públicos na universidade que era comandada por Gaviria, Lina Rubiano e Angela Segura, de 24 anos, votaram no ex-reitor no primeiro turno e em Petro no segundo. Angela acabou apoiando o atual presidente porque considerava que Hernández (o “Trump tropical”) não respeitava as instituições, enquanto Lina, devido à “proximidade de Petro com o povo”.
Angela diz “não estar nem contra nem a favor” de Petro. “Ele não é pior nem melhor que os anteriores. Mas há uma imagem, da qual discordo, de que ele é muito pior.” Lina afirma que, no começo do governo, Petro “parecia querer fazer muitas coisas, mas agora está tudo travado”. Ela critica ainda o fato de o presidente não ter mantido a frente ampla, e as duas concordam que o dirigente perde tempo em polêmicas nas redes sociais, em vez de se concentrar no país.
Tanto as recém-formadas da Universidad de Los Andes como o estudante da Universidad Nacional de Colombia dizem ter perdido o otimismo com o governo por causa dos casos de corrupção que rodeiam o presidente. “Petro representava uma mudança. Agora o povo pensa que ele vai ser igual aos outros. Já não compramos mais tudo que ele diz”, acrescenta o estudante de desenho industrial Carlos Lara, de 25 anos.
Um dos maiores escândalos de corrupção da Colômbia atualmente é o que envolve o filho mais velho de Petro. Segundo as acusações, Nicolás Petro Burgos recebeu dinheiro de traficantes para financiar a campanha eleitoral de seu pai e para inclui-los no programa Paz Total – que previa negociações de paz com a guerrilha Exército de Libertação Nacional (ELN), com dissidentes do acordo firmado com as Farc em 2016 e com facções criminosas, além da ampliação do sistema de Justiça reparatória. O presidente nega ter conhecimento de qualquer atividade ilegal, mas Nicolás responde às acusações na Justiça.
Na visão de Andrés Mejía Vergnaud, o escândalo envolvendo o filho de Petro diminuiu ainda mais a capacidade do governo de aprovar reformas no Congresso, dado que houve uma perda de credibilidade. “Era possível aprovar várias reformas nesse começo de mandato, mas Petro não conseguiu. Petro é muito bom no discurso, mas ruim na execução. Acho que a queda de popularidade é também a percepção da ineficiência do governo”, diz. “O governo não está com dificuldades, está em crise”, acrescenta ele.
Mais pessimista e crítico que outros analistas, Mejía Vergnaud afirma ainda que crises políticas costumam ser resolvidas com negociações e mudanças nos ministérios de um governo – o que não tem acontecido na presidência de Petro. “Para mim, é uma crise irreversível, e ainda falta muito para o governo acabar.” Petro ainda tem 30 meses na Casa de Nariño, a sede do Executivo colombiano.
Procurado, o governo de Petro não respondeu a reportagem.