Eles não votaram em 2016. E não pretendem votar este ano


Entre um terço e metade de todos os eleitores com direito de votar, geralmente, ficam em casa durante uma eleição presidencial nos EUA

Por Sabrina Tavernise e Robert Gebeloff
Atualização:

EAST STROUDSBURG, Pensilvânia - Como praticamente a metade dos eleitores habilitados a votar no seu condado em 2016, Keyana Fedrick não o fez.

Quatro anos depois, políticos se direcionaram a esta região no nordeste da Pensilvânia. Alguém fez um furo num grande cartaz de Trump perto de onde ela trabalha. O cartório eleitoral do condado está tão sobrecarregado que absorveu o instituto médico legal que fica ao lado. Seus pais, democratas nascidos em 1950, insistem para ela votar em Joe Biden. Qualquer coisa é melhor do que Trump, afirmam.

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Os candidatos Donald Trump e Joe Biden se enfrentam em último debate antes das eleições Foto: Jonathan Ernst/REUTERS

Mas Keyana, que tem dois empregos, num hotel e em uma loja de departamentos, não acredita em nenhum dos dois partidos políticos pois nada, nos seus 35 anos de vida, levou-a a achar que deveria. Na sua opinião, eles abandonaram os eleitores "como uma péssima mãe ou um péssimo pai que prometem vir visitá-lo e você fica sentado com as malas prontas e eles nunca aparecem".

Por isso, ela não lamenta sua decisão de não votar em 2016. E na verdade pretende agir da mesma maneira este ano - o que ela e um amigo procuram esconder das pessoas.

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"Nós dizemos 'ah, sim, já votei'. Não quero ser crucificada pelo que penso".

Com a campanha presidencial chegando à semana final, os números de votos antecipados em vários estados têm sido maiores do que da última vez, os pedidos de cédulas por e-mail vêm aumentando e algumas pessoas preveem que neste ano se observará a maior participação dos eleitores já vista em décadas. Mas se a história indicar alguma coisa, uma parte significativa de americanos não votará, sinal da desconfiança e da desilusão com o sistema político que ampliou a divisão partidária.

Eleitores da Geórgia formam fila para votar, em Marietta: democratas empolgados justificam a presença maior Foto: Ron Harris/AP
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Votar é fundamentalmente um ato de esperança. Mas, desde os anos 1960, entre um terço e metade dos eleitores habilitados não compareceu às urnas em eleições presidenciais. Desde a década de 1900, o ponto alto da eleição presidencial foi em 1960, quando 63,8% dos eleitores adultos votaram, de acordo com o United States Elections Projects que monitora os dados das eleições desde 1789. Mais recentemente a proporção mais alta de pessoas que votaram foi em 2008, quando 61,6% foram às urnas.

Uma análise de dados do Census Bureau (escritório de estatísticas do governo americano) da eleição de 2016 mostrou uma profunda divisão de classes: os americanos que não votaram no geral eram pobres, sem formação superior e normalmente solteiros com filhos. E também desempregados.

Os dados dão uma imagem ampla de quem votou ou não, e embora duas eleições nunca sejam as mesmas, indicam alguns fatores pelos quais algumas pessoas tendem a votar mais do que outras.

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Com margens mínimas nos Estados considerados decisivos numa eleição, os não eleitores adquiriram uma importância descomunal. Mesmo uma pequena vitória na conversão de alguns deles faz pender a balança.

Na Pensilvânia, por exemplo, mais de 3,5 milhões de eleitores habilitados no Estado não votaram para presidente na eleição de 2016, um número que fez encolher a margem já delgada de 44.292 votos de Trump. O condado de Monroe, um local de férias em Pocono Mountain, onde Keyana Fedrick vive, é um microcosmo dentro do Estado. Cerca de 56 mil eleitores não foram às urnas em 2016, mais de 100 vezes a margem de 532 votos recebidos por Hillary Clinton que lhe garantiu a vitória ali.

Em entrevistas feitas no Condado este mês, algumas pessoas que não votaram em 2016 disseram que pretendem votar este ano, pois hoje há muita coisa em jogo para se omitirem.

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"Nunca achei que iria me preocupar com esta porcaria, mas agora é realmente importante", disse Jack Breglia, 49 anos, motorista de caminhão aposentado que vive em Kunkleton. Ele não lembra a última vez em que votou, mas pretende votar agora em Donald Trump.

Mas muitas pessoas não votarão, manifestando sua profunda desconfiança nos políticos e duvidando que seu voto terá algum efeito. Elas pressagiam um futuro ameaçador para o país e consideram a política uma das principais forças contribuindo para isto. Muitas são apartidárias e se afastaram das pessoas que defendem algum partido.

"Procuro evitar porque tudo é inflamado e asqueroso", disse Susan Miller, 42 anos, garçonete no Pancake House de Compton, em Stroudsburg, que votou uma única vez em sua vida, para Barack Obama em 2008.

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Um indicador do envolvimento político vem se intensificando numa família que sempre discutiu política, é o fato de SusanMiller não querer saber de política. Está tão farta com o fato de uma única pessoa em sua vida estar insistindo para ela votar -sua tia que apoia Trump - que simplesmente passou a fingir que o fará.

Como muitas pessoas entrevistadas, Susan Miller luta para pagar seu aluguel e fazer o supermercado. O desemprego no condado de Monroe era de 13% em agosto, com a pandemia afetando o setor de turismo local. Suas gorjetas caíram à metade e agora ela trabalha para a Instacart para cobrir a diferença. Dois parentes seus morreram por causa da covid-19.

"Política? É a última das minhas preocupações", disse ela. E só votará novamente "se aparecer a pessoa certa".

Mas Biden não é essa pessoa, afirmou. Ela não assistiu aos debates e nem tem acompanhado nenhum dos candidatos.

Nas últimas décadas, as pessoas mais instruídas, mais ricas, são as que costumam votar. Na análise feita em 2016, três quartos das pessoas em famílias com renda de no mínimo US$ 150 mil por ano votaram, em comparação com menos da metade das com uma renda inferior a US$ 25 mil. 76% dos eleitores com curso superior votaram, em comparação com os 52% que tinham apenas ensino secundário. E somente 45% das mulheres solteiras com filhos estavam habilitadas a votar, em comparação com 70% das casadas.

Jennifer Martin, 46 anos, mãe solteira, que aguardava no seu carro na fila para entrar na Valley Ecumenical Network, um centro de distribuição de alimentos em Sciota, Pensilvânia, disse que tinha 20 anos na última vez que votou. A política tem pouca relevância em sua vida. Para ela os dois partidos são a mesma coisa.

Segundo um estudo recente, pessoas como Jennifer Martin, que não acompanham a política de perto, têm preocupações distintas daquelas que o fazem. Por exemplo, para elas os baixos salários são um dos problemas mais importantes do país. Para os mais ligados à política e partidos, mais propensos a votar, essa é uma questão irrelevante.

"Trabalho numa creche onde pagam quase nada para os empregados", disse ela. "Por isto tenho de vir a lugares como este para conseguir alimentar minha família".

A eleição pode mudar as coisas? "Não estou interessada nisto", ela respondeu. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

EAST STROUDSBURG, Pensilvânia - Como praticamente a metade dos eleitores habilitados a votar no seu condado em 2016, Keyana Fedrick não o fez.

Quatro anos depois, políticos se direcionaram a esta região no nordeste da Pensilvânia. Alguém fez um furo num grande cartaz de Trump perto de onde ela trabalha. O cartório eleitoral do condado está tão sobrecarregado que absorveu o instituto médico legal que fica ao lado. Seus pais, democratas nascidos em 1950, insistem para ela votar em Joe Biden. Qualquer coisa é melhor do que Trump, afirmam.

Os candidatos Donald Trump e Joe Biden se enfrentam em último debate antes das eleições Foto: Jonathan Ernst/REUTERS

Mas Keyana, que tem dois empregos, num hotel e em uma loja de departamentos, não acredita em nenhum dos dois partidos políticos pois nada, nos seus 35 anos de vida, levou-a a achar que deveria. Na sua opinião, eles abandonaram os eleitores "como uma péssima mãe ou um péssimo pai que prometem vir visitá-lo e você fica sentado com as malas prontas e eles nunca aparecem".

Por isso, ela não lamenta sua decisão de não votar em 2016. E na verdade pretende agir da mesma maneira este ano - o que ela e um amigo procuram esconder das pessoas.

"Nós dizemos 'ah, sim, já votei'. Não quero ser crucificada pelo que penso".

Com a campanha presidencial chegando à semana final, os números de votos antecipados em vários estados têm sido maiores do que da última vez, os pedidos de cédulas por e-mail vêm aumentando e algumas pessoas preveem que neste ano se observará a maior participação dos eleitores já vista em décadas. Mas se a história indicar alguma coisa, uma parte significativa de americanos não votará, sinal da desconfiança e da desilusão com o sistema político que ampliou a divisão partidária.

Eleitores da Geórgia formam fila para votar, em Marietta: democratas empolgados justificam a presença maior Foto: Ron Harris/AP

Votar é fundamentalmente um ato de esperança. Mas, desde os anos 1960, entre um terço e metade dos eleitores habilitados não compareceu às urnas em eleições presidenciais. Desde a década de 1900, o ponto alto da eleição presidencial foi em 1960, quando 63,8% dos eleitores adultos votaram, de acordo com o United States Elections Projects que monitora os dados das eleições desde 1789. Mais recentemente a proporção mais alta de pessoas que votaram foi em 2008, quando 61,6% foram às urnas.

Uma análise de dados do Census Bureau (escritório de estatísticas do governo americano) da eleição de 2016 mostrou uma profunda divisão de classes: os americanos que não votaram no geral eram pobres, sem formação superior e normalmente solteiros com filhos. E também desempregados.

Os dados dão uma imagem ampla de quem votou ou não, e embora duas eleições nunca sejam as mesmas, indicam alguns fatores pelos quais algumas pessoas tendem a votar mais do que outras.

Com margens mínimas nos Estados considerados decisivos numa eleição, os não eleitores adquiriram uma importância descomunal. Mesmo uma pequena vitória na conversão de alguns deles faz pender a balança.

Na Pensilvânia, por exemplo, mais de 3,5 milhões de eleitores habilitados no Estado não votaram para presidente na eleição de 2016, um número que fez encolher a margem já delgada de 44.292 votos de Trump. O condado de Monroe, um local de férias em Pocono Mountain, onde Keyana Fedrick vive, é um microcosmo dentro do Estado. Cerca de 56 mil eleitores não foram às urnas em 2016, mais de 100 vezes a margem de 532 votos recebidos por Hillary Clinton que lhe garantiu a vitória ali.

Em entrevistas feitas no Condado este mês, algumas pessoas que não votaram em 2016 disseram que pretendem votar este ano, pois hoje há muita coisa em jogo para se omitirem.

"Nunca achei que iria me preocupar com esta porcaria, mas agora é realmente importante", disse Jack Breglia, 49 anos, motorista de caminhão aposentado que vive em Kunkleton. Ele não lembra a última vez em que votou, mas pretende votar agora em Donald Trump.

Mas muitas pessoas não votarão, manifestando sua profunda desconfiança nos políticos e duvidando que seu voto terá algum efeito. Elas pressagiam um futuro ameaçador para o país e consideram a política uma das principais forças contribuindo para isto. Muitas são apartidárias e se afastaram das pessoas que defendem algum partido.

"Procuro evitar porque tudo é inflamado e asqueroso", disse Susan Miller, 42 anos, garçonete no Pancake House de Compton, em Stroudsburg, que votou uma única vez em sua vida, para Barack Obama em 2008.

Um indicador do envolvimento político vem se intensificando numa família que sempre discutiu política, é o fato de SusanMiller não querer saber de política. Está tão farta com o fato de uma única pessoa em sua vida estar insistindo para ela votar -sua tia que apoia Trump - que simplesmente passou a fingir que o fará.

Como muitas pessoas entrevistadas, Susan Miller luta para pagar seu aluguel e fazer o supermercado. O desemprego no condado de Monroe era de 13% em agosto, com a pandemia afetando o setor de turismo local. Suas gorjetas caíram à metade e agora ela trabalha para a Instacart para cobrir a diferença. Dois parentes seus morreram por causa da covid-19.

"Política? É a última das minhas preocupações", disse ela. E só votará novamente "se aparecer a pessoa certa".

Mas Biden não é essa pessoa, afirmou. Ela não assistiu aos debates e nem tem acompanhado nenhum dos candidatos.

Nas últimas décadas, as pessoas mais instruídas, mais ricas, são as que costumam votar. Na análise feita em 2016, três quartos das pessoas em famílias com renda de no mínimo US$ 150 mil por ano votaram, em comparação com menos da metade das com uma renda inferior a US$ 25 mil. 76% dos eleitores com curso superior votaram, em comparação com os 52% que tinham apenas ensino secundário. E somente 45% das mulheres solteiras com filhos estavam habilitadas a votar, em comparação com 70% das casadas.

Jennifer Martin, 46 anos, mãe solteira, que aguardava no seu carro na fila para entrar na Valley Ecumenical Network, um centro de distribuição de alimentos em Sciota, Pensilvânia, disse que tinha 20 anos na última vez que votou. A política tem pouca relevância em sua vida. Para ela os dois partidos são a mesma coisa.

Segundo um estudo recente, pessoas como Jennifer Martin, que não acompanham a política de perto, têm preocupações distintas daquelas que o fazem. Por exemplo, para elas os baixos salários são um dos problemas mais importantes do país. Para os mais ligados à política e partidos, mais propensos a votar, essa é uma questão irrelevante.

"Trabalho numa creche onde pagam quase nada para os empregados", disse ela. "Por isto tenho de vir a lugares como este para conseguir alimentar minha família".

A eleição pode mudar as coisas? "Não estou interessada nisto", ela respondeu. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

EAST STROUDSBURG, Pensilvânia - Como praticamente a metade dos eleitores habilitados a votar no seu condado em 2016, Keyana Fedrick não o fez.

Quatro anos depois, políticos se direcionaram a esta região no nordeste da Pensilvânia. Alguém fez um furo num grande cartaz de Trump perto de onde ela trabalha. O cartório eleitoral do condado está tão sobrecarregado que absorveu o instituto médico legal que fica ao lado. Seus pais, democratas nascidos em 1950, insistem para ela votar em Joe Biden. Qualquer coisa é melhor do que Trump, afirmam.

Os candidatos Donald Trump e Joe Biden se enfrentam em último debate antes das eleições Foto: Jonathan Ernst/REUTERS

Mas Keyana, que tem dois empregos, num hotel e em uma loja de departamentos, não acredita em nenhum dos dois partidos políticos pois nada, nos seus 35 anos de vida, levou-a a achar que deveria. Na sua opinião, eles abandonaram os eleitores "como uma péssima mãe ou um péssimo pai que prometem vir visitá-lo e você fica sentado com as malas prontas e eles nunca aparecem".

Por isso, ela não lamenta sua decisão de não votar em 2016. E na verdade pretende agir da mesma maneira este ano - o que ela e um amigo procuram esconder das pessoas.

"Nós dizemos 'ah, sim, já votei'. Não quero ser crucificada pelo que penso".

Com a campanha presidencial chegando à semana final, os números de votos antecipados em vários estados têm sido maiores do que da última vez, os pedidos de cédulas por e-mail vêm aumentando e algumas pessoas preveem que neste ano se observará a maior participação dos eleitores já vista em décadas. Mas se a história indicar alguma coisa, uma parte significativa de americanos não votará, sinal da desconfiança e da desilusão com o sistema político que ampliou a divisão partidária.

Eleitores da Geórgia formam fila para votar, em Marietta: democratas empolgados justificam a presença maior Foto: Ron Harris/AP

Votar é fundamentalmente um ato de esperança. Mas, desde os anos 1960, entre um terço e metade dos eleitores habilitados não compareceu às urnas em eleições presidenciais. Desde a década de 1900, o ponto alto da eleição presidencial foi em 1960, quando 63,8% dos eleitores adultos votaram, de acordo com o United States Elections Projects que monitora os dados das eleições desde 1789. Mais recentemente a proporção mais alta de pessoas que votaram foi em 2008, quando 61,6% foram às urnas.

Uma análise de dados do Census Bureau (escritório de estatísticas do governo americano) da eleição de 2016 mostrou uma profunda divisão de classes: os americanos que não votaram no geral eram pobres, sem formação superior e normalmente solteiros com filhos. E também desempregados.

Os dados dão uma imagem ampla de quem votou ou não, e embora duas eleições nunca sejam as mesmas, indicam alguns fatores pelos quais algumas pessoas tendem a votar mais do que outras.

Com margens mínimas nos Estados considerados decisivos numa eleição, os não eleitores adquiriram uma importância descomunal. Mesmo uma pequena vitória na conversão de alguns deles faz pender a balança.

Na Pensilvânia, por exemplo, mais de 3,5 milhões de eleitores habilitados no Estado não votaram para presidente na eleição de 2016, um número que fez encolher a margem já delgada de 44.292 votos de Trump. O condado de Monroe, um local de férias em Pocono Mountain, onde Keyana Fedrick vive, é um microcosmo dentro do Estado. Cerca de 56 mil eleitores não foram às urnas em 2016, mais de 100 vezes a margem de 532 votos recebidos por Hillary Clinton que lhe garantiu a vitória ali.

Em entrevistas feitas no Condado este mês, algumas pessoas que não votaram em 2016 disseram que pretendem votar este ano, pois hoje há muita coisa em jogo para se omitirem.

"Nunca achei que iria me preocupar com esta porcaria, mas agora é realmente importante", disse Jack Breglia, 49 anos, motorista de caminhão aposentado que vive em Kunkleton. Ele não lembra a última vez em que votou, mas pretende votar agora em Donald Trump.

Mas muitas pessoas não votarão, manifestando sua profunda desconfiança nos políticos e duvidando que seu voto terá algum efeito. Elas pressagiam um futuro ameaçador para o país e consideram a política uma das principais forças contribuindo para isto. Muitas são apartidárias e se afastaram das pessoas que defendem algum partido.

"Procuro evitar porque tudo é inflamado e asqueroso", disse Susan Miller, 42 anos, garçonete no Pancake House de Compton, em Stroudsburg, que votou uma única vez em sua vida, para Barack Obama em 2008.

Um indicador do envolvimento político vem se intensificando numa família que sempre discutiu política, é o fato de SusanMiller não querer saber de política. Está tão farta com o fato de uma única pessoa em sua vida estar insistindo para ela votar -sua tia que apoia Trump - que simplesmente passou a fingir que o fará.

Como muitas pessoas entrevistadas, Susan Miller luta para pagar seu aluguel e fazer o supermercado. O desemprego no condado de Monroe era de 13% em agosto, com a pandemia afetando o setor de turismo local. Suas gorjetas caíram à metade e agora ela trabalha para a Instacart para cobrir a diferença. Dois parentes seus morreram por causa da covid-19.

"Política? É a última das minhas preocupações", disse ela. E só votará novamente "se aparecer a pessoa certa".

Mas Biden não é essa pessoa, afirmou. Ela não assistiu aos debates e nem tem acompanhado nenhum dos candidatos.

Nas últimas décadas, as pessoas mais instruídas, mais ricas, são as que costumam votar. Na análise feita em 2016, três quartos das pessoas em famílias com renda de no mínimo US$ 150 mil por ano votaram, em comparação com menos da metade das com uma renda inferior a US$ 25 mil. 76% dos eleitores com curso superior votaram, em comparação com os 52% que tinham apenas ensino secundário. E somente 45% das mulheres solteiras com filhos estavam habilitadas a votar, em comparação com 70% das casadas.

Jennifer Martin, 46 anos, mãe solteira, que aguardava no seu carro na fila para entrar na Valley Ecumenical Network, um centro de distribuição de alimentos em Sciota, Pensilvânia, disse que tinha 20 anos na última vez que votou. A política tem pouca relevância em sua vida. Para ela os dois partidos são a mesma coisa.

Segundo um estudo recente, pessoas como Jennifer Martin, que não acompanham a política de perto, têm preocupações distintas daquelas que o fazem. Por exemplo, para elas os baixos salários são um dos problemas mais importantes do país. Para os mais ligados à política e partidos, mais propensos a votar, essa é uma questão irrelevante.

"Trabalho numa creche onde pagam quase nada para os empregados", disse ela. "Por isto tenho de vir a lugares como este para conseguir alimentar minha família".

A eleição pode mudar as coisas? "Não estou interessada nisto", ela respondeu. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

EAST STROUDSBURG, Pensilvânia - Como praticamente a metade dos eleitores habilitados a votar no seu condado em 2016, Keyana Fedrick não o fez.

Quatro anos depois, políticos se direcionaram a esta região no nordeste da Pensilvânia. Alguém fez um furo num grande cartaz de Trump perto de onde ela trabalha. O cartório eleitoral do condado está tão sobrecarregado que absorveu o instituto médico legal que fica ao lado. Seus pais, democratas nascidos em 1950, insistem para ela votar em Joe Biden. Qualquer coisa é melhor do que Trump, afirmam.

Os candidatos Donald Trump e Joe Biden se enfrentam em último debate antes das eleições Foto: Jonathan Ernst/REUTERS

Mas Keyana, que tem dois empregos, num hotel e em uma loja de departamentos, não acredita em nenhum dos dois partidos políticos pois nada, nos seus 35 anos de vida, levou-a a achar que deveria. Na sua opinião, eles abandonaram os eleitores "como uma péssima mãe ou um péssimo pai que prometem vir visitá-lo e você fica sentado com as malas prontas e eles nunca aparecem".

Por isso, ela não lamenta sua decisão de não votar em 2016. E na verdade pretende agir da mesma maneira este ano - o que ela e um amigo procuram esconder das pessoas.

"Nós dizemos 'ah, sim, já votei'. Não quero ser crucificada pelo que penso".

Com a campanha presidencial chegando à semana final, os números de votos antecipados em vários estados têm sido maiores do que da última vez, os pedidos de cédulas por e-mail vêm aumentando e algumas pessoas preveem que neste ano se observará a maior participação dos eleitores já vista em décadas. Mas se a história indicar alguma coisa, uma parte significativa de americanos não votará, sinal da desconfiança e da desilusão com o sistema político que ampliou a divisão partidária.

Eleitores da Geórgia formam fila para votar, em Marietta: democratas empolgados justificam a presença maior Foto: Ron Harris/AP

Votar é fundamentalmente um ato de esperança. Mas, desde os anos 1960, entre um terço e metade dos eleitores habilitados não compareceu às urnas em eleições presidenciais. Desde a década de 1900, o ponto alto da eleição presidencial foi em 1960, quando 63,8% dos eleitores adultos votaram, de acordo com o United States Elections Projects que monitora os dados das eleições desde 1789. Mais recentemente a proporção mais alta de pessoas que votaram foi em 2008, quando 61,6% foram às urnas.

Uma análise de dados do Census Bureau (escritório de estatísticas do governo americano) da eleição de 2016 mostrou uma profunda divisão de classes: os americanos que não votaram no geral eram pobres, sem formação superior e normalmente solteiros com filhos. E também desempregados.

Os dados dão uma imagem ampla de quem votou ou não, e embora duas eleições nunca sejam as mesmas, indicam alguns fatores pelos quais algumas pessoas tendem a votar mais do que outras.

Com margens mínimas nos Estados considerados decisivos numa eleição, os não eleitores adquiriram uma importância descomunal. Mesmo uma pequena vitória na conversão de alguns deles faz pender a balança.

Na Pensilvânia, por exemplo, mais de 3,5 milhões de eleitores habilitados no Estado não votaram para presidente na eleição de 2016, um número que fez encolher a margem já delgada de 44.292 votos de Trump. O condado de Monroe, um local de férias em Pocono Mountain, onde Keyana Fedrick vive, é um microcosmo dentro do Estado. Cerca de 56 mil eleitores não foram às urnas em 2016, mais de 100 vezes a margem de 532 votos recebidos por Hillary Clinton que lhe garantiu a vitória ali.

Em entrevistas feitas no Condado este mês, algumas pessoas que não votaram em 2016 disseram que pretendem votar este ano, pois hoje há muita coisa em jogo para se omitirem.

"Nunca achei que iria me preocupar com esta porcaria, mas agora é realmente importante", disse Jack Breglia, 49 anos, motorista de caminhão aposentado que vive em Kunkleton. Ele não lembra a última vez em que votou, mas pretende votar agora em Donald Trump.

Mas muitas pessoas não votarão, manifestando sua profunda desconfiança nos políticos e duvidando que seu voto terá algum efeito. Elas pressagiam um futuro ameaçador para o país e consideram a política uma das principais forças contribuindo para isto. Muitas são apartidárias e se afastaram das pessoas que defendem algum partido.

"Procuro evitar porque tudo é inflamado e asqueroso", disse Susan Miller, 42 anos, garçonete no Pancake House de Compton, em Stroudsburg, que votou uma única vez em sua vida, para Barack Obama em 2008.

Um indicador do envolvimento político vem se intensificando numa família que sempre discutiu política, é o fato de SusanMiller não querer saber de política. Está tão farta com o fato de uma única pessoa em sua vida estar insistindo para ela votar -sua tia que apoia Trump - que simplesmente passou a fingir que o fará.

Como muitas pessoas entrevistadas, Susan Miller luta para pagar seu aluguel e fazer o supermercado. O desemprego no condado de Monroe era de 13% em agosto, com a pandemia afetando o setor de turismo local. Suas gorjetas caíram à metade e agora ela trabalha para a Instacart para cobrir a diferença. Dois parentes seus morreram por causa da covid-19.

"Política? É a última das minhas preocupações", disse ela. E só votará novamente "se aparecer a pessoa certa".

Mas Biden não é essa pessoa, afirmou. Ela não assistiu aos debates e nem tem acompanhado nenhum dos candidatos.

Nas últimas décadas, as pessoas mais instruídas, mais ricas, são as que costumam votar. Na análise feita em 2016, três quartos das pessoas em famílias com renda de no mínimo US$ 150 mil por ano votaram, em comparação com menos da metade das com uma renda inferior a US$ 25 mil. 76% dos eleitores com curso superior votaram, em comparação com os 52% que tinham apenas ensino secundário. E somente 45% das mulheres solteiras com filhos estavam habilitadas a votar, em comparação com 70% das casadas.

Jennifer Martin, 46 anos, mãe solteira, que aguardava no seu carro na fila para entrar na Valley Ecumenical Network, um centro de distribuição de alimentos em Sciota, Pensilvânia, disse que tinha 20 anos na última vez que votou. A política tem pouca relevância em sua vida. Para ela os dois partidos são a mesma coisa.

Segundo um estudo recente, pessoas como Jennifer Martin, que não acompanham a política de perto, têm preocupações distintas daquelas que o fazem. Por exemplo, para elas os baixos salários são um dos problemas mais importantes do país. Para os mais ligados à política e partidos, mais propensos a votar, essa é uma questão irrelevante.

"Trabalho numa creche onde pagam quase nada para os empregados", disse ela. "Por isto tenho de vir a lugares como este para conseguir alimentar minha família".

A eleição pode mudar as coisas? "Não estou interessada nisto", ela respondeu. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

EAST STROUDSBURG, Pensilvânia - Como praticamente a metade dos eleitores habilitados a votar no seu condado em 2016, Keyana Fedrick não o fez.

Quatro anos depois, políticos se direcionaram a esta região no nordeste da Pensilvânia. Alguém fez um furo num grande cartaz de Trump perto de onde ela trabalha. O cartório eleitoral do condado está tão sobrecarregado que absorveu o instituto médico legal que fica ao lado. Seus pais, democratas nascidos em 1950, insistem para ela votar em Joe Biden. Qualquer coisa é melhor do que Trump, afirmam.

Os candidatos Donald Trump e Joe Biden se enfrentam em último debate antes das eleições Foto: Jonathan Ernst/REUTERS

Mas Keyana, que tem dois empregos, num hotel e em uma loja de departamentos, não acredita em nenhum dos dois partidos políticos pois nada, nos seus 35 anos de vida, levou-a a achar que deveria. Na sua opinião, eles abandonaram os eleitores "como uma péssima mãe ou um péssimo pai que prometem vir visitá-lo e você fica sentado com as malas prontas e eles nunca aparecem".

Por isso, ela não lamenta sua decisão de não votar em 2016. E na verdade pretende agir da mesma maneira este ano - o que ela e um amigo procuram esconder das pessoas.

"Nós dizemos 'ah, sim, já votei'. Não quero ser crucificada pelo que penso".

Com a campanha presidencial chegando à semana final, os números de votos antecipados em vários estados têm sido maiores do que da última vez, os pedidos de cédulas por e-mail vêm aumentando e algumas pessoas preveem que neste ano se observará a maior participação dos eleitores já vista em décadas. Mas se a história indicar alguma coisa, uma parte significativa de americanos não votará, sinal da desconfiança e da desilusão com o sistema político que ampliou a divisão partidária.

Eleitores da Geórgia formam fila para votar, em Marietta: democratas empolgados justificam a presença maior Foto: Ron Harris/AP

Votar é fundamentalmente um ato de esperança. Mas, desde os anos 1960, entre um terço e metade dos eleitores habilitados não compareceu às urnas em eleições presidenciais. Desde a década de 1900, o ponto alto da eleição presidencial foi em 1960, quando 63,8% dos eleitores adultos votaram, de acordo com o United States Elections Projects que monitora os dados das eleições desde 1789. Mais recentemente a proporção mais alta de pessoas que votaram foi em 2008, quando 61,6% foram às urnas.

Uma análise de dados do Census Bureau (escritório de estatísticas do governo americano) da eleição de 2016 mostrou uma profunda divisão de classes: os americanos que não votaram no geral eram pobres, sem formação superior e normalmente solteiros com filhos. E também desempregados.

Os dados dão uma imagem ampla de quem votou ou não, e embora duas eleições nunca sejam as mesmas, indicam alguns fatores pelos quais algumas pessoas tendem a votar mais do que outras.

Com margens mínimas nos Estados considerados decisivos numa eleição, os não eleitores adquiriram uma importância descomunal. Mesmo uma pequena vitória na conversão de alguns deles faz pender a balança.

Na Pensilvânia, por exemplo, mais de 3,5 milhões de eleitores habilitados no Estado não votaram para presidente na eleição de 2016, um número que fez encolher a margem já delgada de 44.292 votos de Trump. O condado de Monroe, um local de férias em Pocono Mountain, onde Keyana Fedrick vive, é um microcosmo dentro do Estado. Cerca de 56 mil eleitores não foram às urnas em 2016, mais de 100 vezes a margem de 532 votos recebidos por Hillary Clinton que lhe garantiu a vitória ali.

Em entrevistas feitas no Condado este mês, algumas pessoas que não votaram em 2016 disseram que pretendem votar este ano, pois hoje há muita coisa em jogo para se omitirem.

"Nunca achei que iria me preocupar com esta porcaria, mas agora é realmente importante", disse Jack Breglia, 49 anos, motorista de caminhão aposentado que vive em Kunkleton. Ele não lembra a última vez em que votou, mas pretende votar agora em Donald Trump.

Mas muitas pessoas não votarão, manifestando sua profunda desconfiança nos políticos e duvidando que seu voto terá algum efeito. Elas pressagiam um futuro ameaçador para o país e consideram a política uma das principais forças contribuindo para isto. Muitas são apartidárias e se afastaram das pessoas que defendem algum partido.

"Procuro evitar porque tudo é inflamado e asqueroso", disse Susan Miller, 42 anos, garçonete no Pancake House de Compton, em Stroudsburg, que votou uma única vez em sua vida, para Barack Obama em 2008.

Um indicador do envolvimento político vem se intensificando numa família que sempre discutiu política, é o fato de SusanMiller não querer saber de política. Está tão farta com o fato de uma única pessoa em sua vida estar insistindo para ela votar -sua tia que apoia Trump - que simplesmente passou a fingir que o fará.

Como muitas pessoas entrevistadas, Susan Miller luta para pagar seu aluguel e fazer o supermercado. O desemprego no condado de Monroe era de 13% em agosto, com a pandemia afetando o setor de turismo local. Suas gorjetas caíram à metade e agora ela trabalha para a Instacart para cobrir a diferença. Dois parentes seus morreram por causa da covid-19.

"Política? É a última das minhas preocupações", disse ela. E só votará novamente "se aparecer a pessoa certa".

Mas Biden não é essa pessoa, afirmou. Ela não assistiu aos debates e nem tem acompanhado nenhum dos candidatos.

Nas últimas décadas, as pessoas mais instruídas, mais ricas, são as que costumam votar. Na análise feita em 2016, três quartos das pessoas em famílias com renda de no mínimo US$ 150 mil por ano votaram, em comparação com menos da metade das com uma renda inferior a US$ 25 mil. 76% dos eleitores com curso superior votaram, em comparação com os 52% que tinham apenas ensino secundário. E somente 45% das mulheres solteiras com filhos estavam habilitadas a votar, em comparação com 70% das casadas.

Jennifer Martin, 46 anos, mãe solteira, que aguardava no seu carro na fila para entrar na Valley Ecumenical Network, um centro de distribuição de alimentos em Sciota, Pensilvânia, disse que tinha 20 anos na última vez que votou. A política tem pouca relevância em sua vida. Para ela os dois partidos são a mesma coisa.

Segundo um estudo recente, pessoas como Jennifer Martin, que não acompanham a política de perto, têm preocupações distintas daquelas que o fazem. Por exemplo, para elas os baixos salários são um dos problemas mais importantes do país. Para os mais ligados à política e partidos, mais propensos a votar, essa é uma questão irrelevante.

"Trabalho numa creche onde pagam quase nada para os empregados", disse ela. "Por isto tenho de vir a lugares como este para conseguir alimentar minha família".

A eleição pode mudar as coisas? "Não estou interessada nisto", ela respondeu. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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