A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu nesta segunda-feira, 1º, que o ex-presidente Donald Trump tem direito a receber imunidade parcial nos processos em que ele responde na Justiça americana.
A decisão, vista como uma vitória para Trump, determina que ex-presidentes dos EUA tem imunidade em atos oficiais, mas não em ações pessoas do período em que ocuparam a Casa Branca. Isso deve atrasar os julgamentos dos processos de Donald Trump no momento em que ele tenta voltar à presidência.
Na prática, significa que a a juíza de Washington Tanya Chutkan terá que realizar audiências sobre as queixas apresentadas pelo procurador especial Jack Smith ao denunciar o líder republicano pela tentativa de reverter a derrota para Joe Biden na última eleição. As audiências devem traçar uma linha entre os atos oficiais de Donald Trump enquanto presidente, portanto passíveis de imunidade, e o que diz respeito à sua conduta pessoal.
O tribunal de Washington levará tempo não só para realizar as audiências como também para prepará-las o que torna improvável que Donald Trump volte a ser condenado antes das eleições. Em caso de vitória, ele poderia ordenar que o Departamento de Justiça derrube as acusações federais contra ele ou conceder perdão a si mesmo.
“Significa que Trump não vai ser julgado até as eleições”, avalia o cientista político Carlos Gustavo Poggio, professor no Berea College do Kentucky.
“Vai se tornando cada vez mas difícil sustentar as acusações que são feitas contra ele porque o que a Suprema Corte tem feito é estreitar a interpretação desses crimes, muitos deles inéditos”, acrescentou em referência à decisão anterior do tribunal, que limitou o escopo da lei usada contra centenas de réus pela invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, incluindo o próprio Donald Trump.
Em outro julgamento que teve resultado favorável ao líder republicano, a Suprema Corte decidiu de forma unânime, que os Estados não podem desqualificar candidatos para eleição nacional. Com isso, reverteu a decisão do Colorado, que havia considerado Trump inelegível pelo ataque ao Capitólio com base no dispositivo criado após a Guerra Civil para impedir que pessoas envolvidas em “insurreição” ocupassem cargos públicos.
Trump postou em sua rede social logo após a decisão ser divulgada: “Grande vitória para nossa constituição e democracia. Orgulhoso de ser americano!”
Rapidamente, a campanha de Donald Trump à reeleição passou a enviar e-mails para angariar fundos. “Atos oficiais não podem ser processados ilegalmente – GRANDE VITÓRIA PARA A DEMOCRACIA E NOSSA CONSTITUIÇÃO!”, dizia um deles.
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Divisão da Suprema Corte
A decisão de hoje remonta o julgamento do caso contra ele por acusações de conspiração para tentar subverter o resultado da eleição de 2020.
Trump entrou com o argumento que tinha direito à imunidade absoluta das acusações, baseando-se em uma ampla interpretação da separação dos poderes e um precedente da Suprema Corte de 1982 que reconheceu tal imunidade em casos civis para ações tomadas por presidentes dentro do “perímetro externo” de suas responsabilidades oficiais. Tribunais inferiores haviam rejeitado a alegação.
No parecer, de 119 páginas, a Suprema Corte destacou o ineditismo do julgamento. “É o primeiro processo criminal de um ex-presidente por ações tomadas durante a sua presidência na história da nação”, afirma o documento ao justificar que é necessário avaliar o escopo do poder presidencial para determinar se o caso pode avançar.
E conclui: “Um ex-presidente tem direito a imunidade absoluta contra processos criminais por ações dentro de sua ‘autoridade constitucional’”, ponderando que “não há imunidade para atos não oficiais”.
O resultado favorável a Donald Trump na Suprema Corte por seis votos a três reflete a divisão do tribunal, que tem maioria de seis juízes conservadores, sendo três deles indicados pelo próprio Trump, e três liberais.
A juíza Sonia Sotomayor, da ala liberal, expressou a divergência em dum discurso com tons dramáticos. “Como nossa Constituição não protege um ex-presidente de responder por atos criminosos e de traição, eu discordo”, disse de forma enfática.
“Irônico, não é? O homem encarregado de fazer cumprir as leis agora pode simplesmente violá-las”, acrescentou a juíza que, em alguns momentos balançou a cabeça ao criticar as conclusões da maioria como “totalmente indefensáveis”.
Diante da clara divisão dentro da Suprema Corte, o analista Carlos Gustavo Poggio pondera que, embora seja considerada uma vitória momentânea para Donald Trump, a decisão pode ter um impacto político favorável a Joe Biden à medida em que chama atenção para a composição do tribunal.
“Já são seis juízes conservadores. Se Donald Trump for eleito e puder indicar mais juízes, o balanço da Suprema Corte fica muito complicado. Essa talvez seria a Suprema Corte mais desequilibrada da história. Então isso traz o tema à tona para eleição”, afirma.
Como exemplo, ele cita Roe versus Wade, entendimento que garantiu o aborto legal nos Estados Unidos por 50 anos e foi revertido por essa mesma Suprema Corte.
Donald Trump costuma tomar o crédito por ter indicado os juízes responsáveis pela mudança. Entretanto, o tema do aborto contribuiu para mobilizar eleitores democratas na eleição de meio de mandato e frustrar a “onda vermelha” que Trump prometia para o partido Republicano. Agora, ele tem defendido que a decisão deve ficar a cargo dos Estados no que parece ser uma tentativa de se dirigir aos eleitores mais moderados.
Logo após a decisão, a equipe que trabalha para reeleição de Joe Biden começou a soar o alarme. “Eles simplesmente deram a Donald Trump a chave para uma ditadura”, disse o vice-gerente de campanha Quentin Fulks. “Temos que fazer tudo que estiver ao nosso alcance para pará-lo.”
Na mesma linha, democratas têm expressado preocupação com o futuro da democracia e consternação com a decisão da Suprema Corte enquanto republicanos celebram. “Uma grande vitória, não apenas para Trump, mas para o estado de direito”, declarou o senador JD Vance, de Ohio, cotado para vice na chapa republicana./COM AP E NY TIMES