O embaixador israelense em Brasília, Daniel Zonshine, sugeriu que tanto Brasil quanto Israel precisam escolher as palavras com cautela e baixar a temperatura da crise diplomática detonada pela comparação feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre a guerra em Gaza e o Holocausto.
A entrevista foi publicada pelo portal UOL nesta quarta-feira, 21, em meio à especulação de que ele poderia ser expulso do País após uma série de críticas da chancelaria israelense ao petista. Zonshine disse que a fala do presidente foi “problemática”, mas que não se pode cancelar 75 anos de relação entre Brasil e Israel e sugeriu que agora é hora de baixar o tom.
“Temos que escolher as palavras com mais cautela, com essa visão de longo prazo na cabeça, e agir de uma maneira — não quero dizer mais responsável— mas olhando o longo prazo. Não quero usar palavras difíceis, mas baixar o tom das palavras, baixar o tom dos discursos para olhar o longo prazo”, disse à coluna de Thais Bilenky.
Como mostrou o Estadão, a expulsão de Zonshine foi defendida por aliados de Lula e chegou a ser discutida com o presidente em conversas reservadas. O governo, no entanto, quer evitar a escalada da crise e afastou a possibilidade neste momento. A medida drástica, que poderia resultar no rompimento de relações, será levada adiante apenas em último caso.
Lula foi declarado ‘persona non-grata’ por Tel-Aviv até que se retrate pela comparação com o holocausto. O governo brasileiro, por outro lado, vê uso político da crise por parte de Israel, que enfrenta a pressão internacional contra iminente operação em Rafah - último reduto ao sul de Gaza para mais de 1 milhão de palestinos deslocados pelo conflito.
Ontem, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, chamou de “insólita” e “ofensiva” as declarações do chanceler Israel Katz sobre Lula. “São inaceitáveis na forma, e mentirosas no conteúdo”, disse. “Uma chancelaria dirigir-se dessa forma a um chefe de Estado, de um país amigo, o presidente Lula, é algo insólito e revoltante”, protestou.
Katz havia chamado a comparação com o Holocausto de “promíscua, delirante. Vergonha para o Brasil e um cuspe no rosto dos judeus brasileiros” em publicação no X (antigo Twitter). O texto foi escrito em português e direcionado ao presidente brasileiro.
A diplomacia israelense ainda acusou Lula de ser uma “negacionista do Holocausto”. E, mesmo depois das críticas de Vieira, o chanceler israelense voltou a se dirigir a Lula nesta quarta. Desta vez, com um vídeo ao lado da brasileira Rafaela Triestman, sobrevivente do ataque terrorista do Hamas.
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Também irritou o governo a reprimenda pública ao embaixador do Brasil em Tel-Aviv, Frederico Meyer, no Memorial do Holocausto, no lugar de uma conversa a portas fechadas, como seria de praxe. A quebra de protocolo foi vista como uma humilhação para o brasileiro, considerada “inaceitável” por Lula e Vieira. Em resposta, Brasília chamou Zonshine para expressar sua insatisfação e trouxe Meyer de volta por tempo indeterminado.
Zonshine, na entrevista para o UOL, se esquivou das perguntas sobre o tratamento ao homólogo brasileiro e as publicações da chancelaria israelense nas redes sociais. Disse apenas que não foi o responsável pelas decisões e insistiu: “Tudo pode ser superado, depende de boa vontade, longo prazo, olhar as coisas com um pouco de distância e baixar as temperaturas. Tudo é superado. Com diplomacia, com certeza”.
Ele também evitou falar sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro e negou que vá ao ato convocado por ele no domingo. No ano passado, o embaixador já havia sido convocado para dar explicações por participar de uma reunião com o próprio Bolsonaro e parlamentares da oposição. Ao todo, a chancelaria brasileira já teve quatro encontros com Zonshine para manifestar desagrado.