As manifestações contra o governo de Guillermo Lasso, no Equador, chegam nesta terça-feira, 28, ao 16º dia consecutivo. Liderada por indígenas e presentes em todo o país, elas pressionam Lasso a reduzir o preço dos combustíveis e dos alimentos, perdoar dívidas de pequenos agricultores e camponeses e realizar mudanças em diversos setores, da economia à educação.
O presidente equatoriano anunciou nesta segunda-feira algumas medidas na direção do que os manifestantes pedem, mas até o momento isso não foi o suficiente para aplacar os protestos. Na última semana, a tensão em torno deles cresceu em virtude dos conflitos entre indígenas e a polícia nacional, que resultaram em pelo menos sete mortos e centenas de feridos. As mobilizações respingam na Assembleia Nacional, que analisa desde a sexta-feira, 24, um pedido da oposição de destituir o presidente.
O pedido repete um longo histórico do Equador em derrubar presidentes após mobilizações sociais. No dia 21, o ministro de Defesa do país, Luis Lara, disse que temia que os rumos do protestos colocassem “a democracia em risco” e garantiu que os militares não iriam permitir tentativas “que se tente romper a ordem constitucional”. Guillermo Lasso, político de direita e ex-banqueiro eleito para a presidência em abril do ano passado, diz que os manifestantes querem “sequestrar a democracia”.
Abaixo, entenda quem são os líderes dos protestos, o que eles querem e como o país reage.
Como e por que os protestos começaram?
As manifestações foram mobilizadas no início de junho por organizações indígenas do Equador, sobretudo a Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie). Além de marchas em Quito, capital equatoriana, houve bloqueios em estradas e outras ações que interromperam o abastecimento do país.
O líder da Conaie, Leonidas Iza, é o principal porta-voz dos manifestantes e descreve os atos como reação a “diálogos enganosos por mais de um ano, sem respostas ou resultados”. Em uma carta enviada a Guillermo Lasso no dia 13 deste mês, a entidade cita os efeitos da crise socioeconômica do país entre a população indígena e rural como justificativa para os atos.
A carta também lista 10 demandas e propostas para encerrar os protestos. Entre elas, estão a redução dos preços dos combustíveis e de alimentos do campo; renegociação de dívidas dos trabalhadores rurais com banco; medidas para a geração de emprego; e o fim da concessão de licenças de mineração em territórios indígenas. Também há demandas relacionadas à saúde e a educação no país.
As manifestações lembram os protestos de outubro 2019, que começaram com um decreto que eliminou subsídios à gasolina - posteriormente revogados para acalmar os manifestantes -- e durou 10 dias. Na ocasião, uma dúzia de pessoas morreram e mais de 1,5 mil ficaram feridas, incluindo 435 membros das forças de segurança.
O que o presidente Guillermo Lasso fez desde o início dos protestos?
No início dos protestos, Guillermo Lasso decretou estado de exceção, que habilita o presidente mobilizar as Forças Armadas para manter a ordem interna; suspender direitos dos cidadãos; e decretar toque de recolher. A medida não parou as mobilizações, que aumentaram a pressão sobre o presidente e o levaram a novas decisões.
As primeiras foram medidas econômicas que aumentaram o auxílio econômico para famílias de baixa renda de US$ 50 (R$ 257,7) para US$ 55 (R$ 283,45). O Executivo também anunciou subsídio em até 50% do preço da ureia agrícola, um fertilizante utilizado no campo, para pequenos e médios produtores; e ordenou perdão de dívidas de até US$ 3 mil (R$ 15,5 mil) que foram concedidos pelo banco de desenvolvimento produtivo.
Na quinta passada, Lasso deu o primeiro passo para tentar retomar o diálogo com os manifestantes e dois dias depois, no sábado, realizou a primeira conversa formal com as lideranças indígenas.
O governo se comprometeu a encerrar o estado de exceção e disse que está disposto a “garantir a criação de espaços para a paz”. Do outro lado, Leonidas Iza disse que os bloqueios nas estradas seriam desfeitos de forma gradual para restabelecer o transporte de alimentos a Quito, onde os moradores relatam falta de suprimentos, mas reiterou que os indígenas permanecerão na capital até conseguiram uma resposta satisfatória das demandas apresentadas.
Nesta segunda-feira, 27, Guillermo Lasso reduziu o preço dos combustíveis, uma das principais razões para o início dos protestos, mas não conseguiu a garantia do fim dos protestos. A redução foi de US$ 0,10, descrita pela Conaie como “insuficiente e insensível”. Lasso rebateu e disse que “10 centavos não é pouco”. “A redução do custo do combustível representa uma economia de quase um salário mínimo por ano”, tuitou.
O preço do diesel no país chegou US$ 1,80 após a redução, e o da gasolina, US$ 2,45. Os manifestantes, no entanto, exigem que o governo reduza os preços a US$ 1,50 para o galão de diesel e US$ 2,10 para gasolina comum.
As outras demandas dos indígenas, apresentadas na carta da Conaie, continuam não-atendidas, segundo a entidade. “A luta não para (...) e o protesto ainda está em vigor”, declarou Iza.
Como a Assembleia Nacional responde aos protestos?
Os parlamentares do Equador analisam um pedido de destituição do presidente Guillermo Lasso, assinado pela oposição na sexta-feira, 24. O direitista já não possuía uma boa relação com a Assembleia Nacional, que bloqueou as principais propostas econômicas que foram tentadas, e o cenário piorou após os protestos.
O pedido foi feito por 47 deputados que fazem parte do movimento de oposição Unes, ligado ao ex-presidente de esquerda Rafael Correa. Eles pedem o impeachment por “grave comoção interna”, uma justificativa existente na Constituição do Equador que permite que parlamentares removam presidentes e façam novas eleições durante uma crise política.
Para avançar, o pedido precisa do apoio de pelo menos 92 dos 137 legisladores da Assembleia. A oposição é maioria, mas está dividida. Se o pedido for aprovado, o vice-presidente, Alfredo Borreno, assumirá o governo do Equador e deverá convocar novas eleições presidenciais e legislativas no prazo de uma semana.
Antes da solicitação, Lasso e o ministro da Defesa do país, Luis Lara, afirmaram que os protestos ameaçavam a democracia. O país tem um histórico de derrubar presidentes após grandes mobilizações sociais. /AFP, REUTERS, EFE