Brasil pode ajudar Equador no combate às facções criminosas, diz ex-vice-presidente do país


Em entrevista ao ‘Estadão’, Otto Sonnenholzner apontou que o presidente do Equador, Daniel Noboa, tem uma oportunidade de melhorar a situação da segurança do país e que o Equador precisa de prisões de segurança máxima para que as forças do país voltem a controlar os presídios, que estão dominados pelo narcotráfico

Por Daniel Gateno
Atualização:
Foto: Otto Sonnenholzner/Facebo
Entrevista comOtto SonnenholznerEx-vice-presidente do Equador

Em momentos de crise, existem oportunidades que o presidente do Equador, Daniel Noboa, precisa aproveitar. Esta é a opinião do ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner. O político de centro foi vice-presidente do país entre 2018 e 2020, na gestão de Lenín Moreno, e se candidatou nas eleições presidenciais do Equador em 2023, obtendo 7% dos votos no primeiro turno, o que não foi suficiente para alavancar sua candidatura ao segundo turno.

Em entrevista ao Estadão, Sonnenholzner apontou que Noboa começou bem ao decretar que o ataque dos narcotraficantes a diversas cidades no Equador representa um “conflito armado interno”. O decreto considera as facções como organizações terroristas e autoriza as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos. Por conta dos ataques de narcotraficantes, 13 pessoas morreram no Equador.

O ex-vice equatoriano avalia que o país necessita de prisões de segurança máxima, com menos detentos e mais fiscalização. “Prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário”.

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Ele também avalia que o Brasil pode ajudar o Equador a combater o crime organizado. “Precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento”, diz. “Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.”

Confira trechos da entrevista:

O ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner, foi candidato a presidência no ano passado, mas não passou para o segundo turno  Foto: Mauricio Dueñas Castañeda / EFE
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O que é possível fazer no curto prazo para reduzir a escala de violência no Equador?

Temos uma situação complexa no Equador neste momento. A decisão do presidente Daniel Noboa de declarar que o ataque dos narcotraficantes representa um conflito armado interno foi acertada pois permite que você tenha maior liberdade para usar as capacidades operacionais do Exército junto com a polícia, já que a polícia está sobrecarregada.

Além disso, o número de mortes violentas aumentou muito no Equador de 2020 para cá e houve um aumento de crimes como extorsão, sequestro e o uso de assassinos de aluguel.

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O importante é que estas decisões sejam acompanhadas de uma boa gestão, a parte mais difícil é acabar com as conexões do crime organizado com as instituições do país e acabamos de ver isso claramente em um caso que o Ministério Público revelou há duas semanas um caso chamado ‘metástase’, no qual uma investigação mostrou que as organizações criminosas tem uma relação forte com as forças políticas, com capacidade de comprar juízes e de dominar as prisões. Então tudo isto mostra a gravidade do problema.

Narcotraficantes rendem funcionários de uma emissora de TV em Guayaquil, Equador  Foto: TC Television / AP

Precisamos melhorar também o controle das prisões, sem este controle não haverá controle nas ruas. O crime opera dentro do sistema carcerário, não existem prisões de segurança máxima no Equador, no papel elas existem, mas elas não funcionam de verdade e as prisões não estão sob o controle do Estado. As forças do Equador praticamente tomam controle apenas do perímetro externo, o restante está a cargo das organizações criminosas.

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O Equador precisa de prisões com regimes de segurança máxima e que funcionem, sem cair nas mãos das organizações criminosas. O nosso sistema judicial também foi muito afetado pelas organizações criminosas, precisamos de juízes honestos e precisamos proteger os juízes que estão combatendo o crime organizado.

Além disso, o Equador é um dos países que ainda não se recuperou do impacto social e econômico da pandemia da covid-19.

Forças de Segurança do Equador patrulham as ruas da cidade de Quito  Foto: AFP / AFP
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O mandato de Daniel Noboa vai até 2025. É um tempo curto, não é um mandato inteiro. É possível fazer todas as reformas necessárias até 2025 ou é uma mudança que deve ser feita no longo prazo?

Se eu afirmasse que este problema pode ser resolvido em um ano ou em quatro eu estaria mentindo. Mas a crise, apesar de todos os momentos ruins, também representa uma oportunidade. O presidente Noboa tem uma oportunidade de tomar as decisões certas, de liderar e pensar em uma estratégia clara para melhorar a situação do Equador.

Precisamos melhorar, desde 2021 tudo só piora e eu não gosto de dizer que estamos no fundo do poço porque sempre dá para piorar mais.

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Mas o governo de Noboa tem essa oportunidade, espero que ele aproveite.

A classe política está apoiando o presidente Noboa? O ex-presidente Rafael Correa publicou um vídeo em que afirma que irá apoiar as decisões do presidente equatoriano

Muitos políticos no Equador dizem certas coisas porque é o politicamente correto e depois fazem outra coisa completamente diferente. Eu sou uma pessoa que lidei com uma crise muito difícil, que foi a pandemia da covid-19 no Equador. Tivemos uma situação muito difícil, especialmente na cidade de Guayaquil. Foi uma tragédia que o mundo inteiro ficou sabendo.

Naquele momento, muitos políticos afirmavam que me apoiavam, mas por outro lado difundiam notícias falsas sobre a gestão do Estado e faziam acusações. Infelizmente muitos políticos oposicionistas acreditam que crises são oportunidades políticas de fazer mal ao governo para se apresentarem como uma solução e não é o momento de fazer isso.

Seria muito bom que o Equador tivesse uma classe política com maturidade para ter união, se ajudar nos momentos difíceis, como eu pedi durante a pandemia. Quem não quer ajudar, que pelo menos não atrapalhe. Infelizmente esta é a natureza de muitos políticos do Equador e dificilmente vejo algum tipo de união política ou ajuda ao governo.

Da minha parte, estou aberto para ajudar ao governo de Daniel Noboa, com conselhos de manejo de crises e eu mandei uma mensagem a ele ontem com esta mensagem. Desejo que ele faça um ótimo trabalho e nos tire desta situação.

Noboa ordenou a construção de duas prisões de “segurança máxima”, similar ao que foi feito pelo presidente de El Salvador, Nayib Bukele. Acredita que está é a resposta?

Eu não sei muito sobre a situação penitenciária de El Salvador antes do mandato do presidente Nayib Bukele. No Equador, existem grandes prisões, o que foi um erro na minha opinião porque controlar grandes prisões é muito mais difícil e deveria existir uma maior separação dos detentos por nível de risco.

Por isso, prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário.

Então precisamos de prisões de segurança máxima, com menos presos e mais restrições a eles.

O presidente do Equador, Daniel Noboa, apontou que gostaria de criar prisões no "estilo" de El Salvador Foto: Assessoria de imprensa do governo de El Salvador / AP

O que os governos anteriores fizeram para que a situação atual esteja desta forma?

Em 2007 e 2008 o governo do Equador ( na gestão de Rafael Correa) tomou uma decisão que na minha avaliação tornou o Equador um país muito mais atrativo para o crime organizado quando retirou uma base americana que fazia um sobrevoo permanente no Oceano Pacífico para reduzir o narcotráfico com a justificativa de soberania.

E pode ser que tenham razão sobre a questão da soberania, mas esta capacidade operacional não foi substituída por nada, de modo que a costa do Equador ficou sem vigilância aérea contra o tráfico de drogas durante mais de 10 anos.

Além disso, o Equador adotou uma política de não restringir a imigração, não exigiu vistos ou antecedentes criminais de ninguém e isto fez com o que o Equador chamasse a atenção, não apenas de organizações que ajudavam imigrantes ilegais a irem para os Estados Unidos, como também a cartéis internacionais do México e da Europa.

Em 2019, o governo do Equador retomou um convênio de cooperação com o governo dos Estados Unidos e eles conseguiram aumentar o número de toneladas de droga que foram apreendidas.

Então isso mudou o mapa do crime no Equador e deu início a uma briga entre gangues cujo primeiro efeito foi o massacre na prisão de 2021, o primeiro que também virou notícia. Foi uma briga entre gangues que disputavam espaços dentro do narcotráfico, porque ele se fragilizou.

Temos também um Estado sem recursos desde 2016 que está endividado e no dia que ocorreu o massacre nas prisões, eu sabia que isso iria chegar às ruas e entraríamos em uma espiral de violência. A resposta está no fortalecimento do Estado e das políticas públicas.

Como uma maior cooperação com os Estados Unidos pode ajudar o Equador neste momento?

O Equador precisa de mais apoio no setor de inteligência, que está muito debilitado. Temos capacidade operativa, força pública entre polícia e militares. O Equador possui um contingente de 100 mil soldados que estão armados, mas precisam de mais treinamento e equipamentos.

O principal é inteligência, se não temos inteligência não vamos conseguir avançar na interceptação da comunicação destas organizações e não será possível desmantelar estas organizações de dentro.

Soldados equatorianos patrulham o centro de Quito em um tanque  Foto: GALO PAGUAY / AFP

E o que o Brasil pode fazer para ajudar?

O Brasil tem muita experiência em conflitos deste tipo, em muitos casos possui experiências bem sucedidas e acredito que qualquer oferta de ajuda em termos de cooperação e formação é bem-vinda.

O Equador nunca teve esse problema, o país sempre foi um país bastante pacífico, então precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento.

Seria necessário uma maior cooperação entre os países da região para lidar com a violência?

Seria necessário que isto ocorresse, o crime organizado não é um problema apenas do Equador, tem muita coordenação internacional. As organizações criminosas dialogam mais do que os próprios políticos. A região precisa lidar com o problema de forma conjunta, precisamos reciclar a maneira que lidamos com isso porque estamos fracassando.

Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.

Em momentos de crise, existem oportunidades que o presidente do Equador, Daniel Noboa, precisa aproveitar. Esta é a opinião do ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner. O político de centro foi vice-presidente do país entre 2018 e 2020, na gestão de Lenín Moreno, e se candidatou nas eleições presidenciais do Equador em 2023, obtendo 7% dos votos no primeiro turno, o que não foi suficiente para alavancar sua candidatura ao segundo turno.

Em entrevista ao Estadão, Sonnenholzner apontou que Noboa começou bem ao decretar que o ataque dos narcotraficantes a diversas cidades no Equador representa um “conflito armado interno”. O decreto considera as facções como organizações terroristas e autoriza as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos. Por conta dos ataques de narcotraficantes, 13 pessoas morreram no Equador.

O ex-vice equatoriano avalia que o país necessita de prisões de segurança máxima, com menos detentos e mais fiscalização. “Prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário”.

Ele também avalia que o Brasil pode ajudar o Equador a combater o crime organizado. “Precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento”, diz. “Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.”

Confira trechos da entrevista:

O ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner, foi candidato a presidência no ano passado, mas não passou para o segundo turno  Foto: Mauricio Dueñas Castañeda / EFE

O que é possível fazer no curto prazo para reduzir a escala de violência no Equador?

Temos uma situação complexa no Equador neste momento. A decisão do presidente Daniel Noboa de declarar que o ataque dos narcotraficantes representa um conflito armado interno foi acertada pois permite que você tenha maior liberdade para usar as capacidades operacionais do Exército junto com a polícia, já que a polícia está sobrecarregada.

Além disso, o número de mortes violentas aumentou muito no Equador de 2020 para cá e houve um aumento de crimes como extorsão, sequestro e o uso de assassinos de aluguel.

O importante é que estas decisões sejam acompanhadas de uma boa gestão, a parte mais difícil é acabar com as conexões do crime organizado com as instituições do país e acabamos de ver isso claramente em um caso que o Ministério Público revelou há duas semanas um caso chamado ‘metástase’, no qual uma investigação mostrou que as organizações criminosas tem uma relação forte com as forças políticas, com capacidade de comprar juízes e de dominar as prisões. Então tudo isto mostra a gravidade do problema.

Narcotraficantes rendem funcionários de uma emissora de TV em Guayaquil, Equador  Foto: TC Television / AP

Precisamos melhorar também o controle das prisões, sem este controle não haverá controle nas ruas. O crime opera dentro do sistema carcerário, não existem prisões de segurança máxima no Equador, no papel elas existem, mas elas não funcionam de verdade e as prisões não estão sob o controle do Estado. As forças do Equador praticamente tomam controle apenas do perímetro externo, o restante está a cargo das organizações criminosas.

O Equador precisa de prisões com regimes de segurança máxima e que funcionem, sem cair nas mãos das organizações criminosas. O nosso sistema judicial também foi muito afetado pelas organizações criminosas, precisamos de juízes honestos e precisamos proteger os juízes que estão combatendo o crime organizado.

Além disso, o Equador é um dos países que ainda não se recuperou do impacto social e econômico da pandemia da covid-19.

Forças de Segurança do Equador patrulham as ruas da cidade de Quito  Foto: AFP / AFP

O mandato de Daniel Noboa vai até 2025. É um tempo curto, não é um mandato inteiro. É possível fazer todas as reformas necessárias até 2025 ou é uma mudança que deve ser feita no longo prazo?

Se eu afirmasse que este problema pode ser resolvido em um ano ou em quatro eu estaria mentindo. Mas a crise, apesar de todos os momentos ruins, também representa uma oportunidade. O presidente Noboa tem uma oportunidade de tomar as decisões certas, de liderar e pensar em uma estratégia clara para melhorar a situação do Equador.

Precisamos melhorar, desde 2021 tudo só piora e eu não gosto de dizer que estamos no fundo do poço porque sempre dá para piorar mais.

Mas o governo de Noboa tem essa oportunidade, espero que ele aproveite.

A classe política está apoiando o presidente Noboa? O ex-presidente Rafael Correa publicou um vídeo em que afirma que irá apoiar as decisões do presidente equatoriano

Muitos políticos no Equador dizem certas coisas porque é o politicamente correto e depois fazem outra coisa completamente diferente. Eu sou uma pessoa que lidei com uma crise muito difícil, que foi a pandemia da covid-19 no Equador. Tivemos uma situação muito difícil, especialmente na cidade de Guayaquil. Foi uma tragédia que o mundo inteiro ficou sabendo.

Naquele momento, muitos políticos afirmavam que me apoiavam, mas por outro lado difundiam notícias falsas sobre a gestão do Estado e faziam acusações. Infelizmente muitos políticos oposicionistas acreditam que crises são oportunidades políticas de fazer mal ao governo para se apresentarem como uma solução e não é o momento de fazer isso.

Seria muito bom que o Equador tivesse uma classe política com maturidade para ter união, se ajudar nos momentos difíceis, como eu pedi durante a pandemia. Quem não quer ajudar, que pelo menos não atrapalhe. Infelizmente esta é a natureza de muitos políticos do Equador e dificilmente vejo algum tipo de união política ou ajuda ao governo.

Da minha parte, estou aberto para ajudar ao governo de Daniel Noboa, com conselhos de manejo de crises e eu mandei uma mensagem a ele ontem com esta mensagem. Desejo que ele faça um ótimo trabalho e nos tire desta situação.

Noboa ordenou a construção de duas prisões de “segurança máxima”, similar ao que foi feito pelo presidente de El Salvador, Nayib Bukele. Acredita que está é a resposta?

Eu não sei muito sobre a situação penitenciária de El Salvador antes do mandato do presidente Nayib Bukele. No Equador, existem grandes prisões, o que foi um erro na minha opinião porque controlar grandes prisões é muito mais difícil e deveria existir uma maior separação dos detentos por nível de risco.

Por isso, prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário.

Então precisamos de prisões de segurança máxima, com menos presos e mais restrições a eles.

O presidente do Equador, Daniel Noboa, apontou que gostaria de criar prisões no "estilo" de El Salvador Foto: Assessoria de imprensa do governo de El Salvador / AP

O que os governos anteriores fizeram para que a situação atual esteja desta forma?

Em 2007 e 2008 o governo do Equador ( na gestão de Rafael Correa) tomou uma decisão que na minha avaliação tornou o Equador um país muito mais atrativo para o crime organizado quando retirou uma base americana que fazia um sobrevoo permanente no Oceano Pacífico para reduzir o narcotráfico com a justificativa de soberania.

E pode ser que tenham razão sobre a questão da soberania, mas esta capacidade operacional não foi substituída por nada, de modo que a costa do Equador ficou sem vigilância aérea contra o tráfico de drogas durante mais de 10 anos.

Além disso, o Equador adotou uma política de não restringir a imigração, não exigiu vistos ou antecedentes criminais de ninguém e isto fez com o que o Equador chamasse a atenção, não apenas de organizações que ajudavam imigrantes ilegais a irem para os Estados Unidos, como também a cartéis internacionais do México e da Europa.

Em 2019, o governo do Equador retomou um convênio de cooperação com o governo dos Estados Unidos e eles conseguiram aumentar o número de toneladas de droga que foram apreendidas.

Então isso mudou o mapa do crime no Equador e deu início a uma briga entre gangues cujo primeiro efeito foi o massacre na prisão de 2021, o primeiro que também virou notícia. Foi uma briga entre gangues que disputavam espaços dentro do narcotráfico, porque ele se fragilizou.

Temos também um Estado sem recursos desde 2016 que está endividado e no dia que ocorreu o massacre nas prisões, eu sabia que isso iria chegar às ruas e entraríamos em uma espiral de violência. A resposta está no fortalecimento do Estado e das políticas públicas.

Como uma maior cooperação com os Estados Unidos pode ajudar o Equador neste momento?

O Equador precisa de mais apoio no setor de inteligência, que está muito debilitado. Temos capacidade operativa, força pública entre polícia e militares. O Equador possui um contingente de 100 mil soldados que estão armados, mas precisam de mais treinamento e equipamentos.

O principal é inteligência, se não temos inteligência não vamos conseguir avançar na interceptação da comunicação destas organizações e não será possível desmantelar estas organizações de dentro.

Soldados equatorianos patrulham o centro de Quito em um tanque  Foto: GALO PAGUAY / AFP

E o que o Brasil pode fazer para ajudar?

O Brasil tem muita experiência em conflitos deste tipo, em muitos casos possui experiências bem sucedidas e acredito que qualquer oferta de ajuda em termos de cooperação e formação é bem-vinda.

O Equador nunca teve esse problema, o país sempre foi um país bastante pacífico, então precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento.

Seria necessário uma maior cooperação entre os países da região para lidar com a violência?

Seria necessário que isto ocorresse, o crime organizado não é um problema apenas do Equador, tem muita coordenação internacional. As organizações criminosas dialogam mais do que os próprios políticos. A região precisa lidar com o problema de forma conjunta, precisamos reciclar a maneira que lidamos com isso porque estamos fracassando.

Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.

Em momentos de crise, existem oportunidades que o presidente do Equador, Daniel Noboa, precisa aproveitar. Esta é a opinião do ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner. O político de centro foi vice-presidente do país entre 2018 e 2020, na gestão de Lenín Moreno, e se candidatou nas eleições presidenciais do Equador em 2023, obtendo 7% dos votos no primeiro turno, o que não foi suficiente para alavancar sua candidatura ao segundo turno.

Em entrevista ao Estadão, Sonnenholzner apontou que Noboa começou bem ao decretar que o ataque dos narcotraficantes a diversas cidades no Equador representa um “conflito armado interno”. O decreto considera as facções como organizações terroristas e autoriza as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos. Por conta dos ataques de narcotraficantes, 13 pessoas morreram no Equador.

O ex-vice equatoriano avalia que o país necessita de prisões de segurança máxima, com menos detentos e mais fiscalização. “Prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário”.

Ele também avalia que o Brasil pode ajudar o Equador a combater o crime organizado. “Precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento”, diz. “Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.”

Confira trechos da entrevista:

O ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner, foi candidato a presidência no ano passado, mas não passou para o segundo turno  Foto: Mauricio Dueñas Castañeda / EFE

O que é possível fazer no curto prazo para reduzir a escala de violência no Equador?

Temos uma situação complexa no Equador neste momento. A decisão do presidente Daniel Noboa de declarar que o ataque dos narcotraficantes representa um conflito armado interno foi acertada pois permite que você tenha maior liberdade para usar as capacidades operacionais do Exército junto com a polícia, já que a polícia está sobrecarregada.

Além disso, o número de mortes violentas aumentou muito no Equador de 2020 para cá e houve um aumento de crimes como extorsão, sequestro e o uso de assassinos de aluguel.

O importante é que estas decisões sejam acompanhadas de uma boa gestão, a parte mais difícil é acabar com as conexões do crime organizado com as instituições do país e acabamos de ver isso claramente em um caso que o Ministério Público revelou há duas semanas um caso chamado ‘metástase’, no qual uma investigação mostrou que as organizações criminosas tem uma relação forte com as forças políticas, com capacidade de comprar juízes e de dominar as prisões. Então tudo isto mostra a gravidade do problema.

Narcotraficantes rendem funcionários de uma emissora de TV em Guayaquil, Equador  Foto: TC Television / AP

Precisamos melhorar também o controle das prisões, sem este controle não haverá controle nas ruas. O crime opera dentro do sistema carcerário, não existem prisões de segurança máxima no Equador, no papel elas existem, mas elas não funcionam de verdade e as prisões não estão sob o controle do Estado. As forças do Equador praticamente tomam controle apenas do perímetro externo, o restante está a cargo das organizações criminosas.

O Equador precisa de prisões com regimes de segurança máxima e que funcionem, sem cair nas mãos das organizações criminosas. O nosso sistema judicial também foi muito afetado pelas organizações criminosas, precisamos de juízes honestos e precisamos proteger os juízes que estão combatendo o crime organizado.

Além disso, o Equador é um dos países que ainda não se recuperou do impacto social e econômico da pandemia da covid-19.

Forças de Segurança do Equador patrulham as ruas da cidade de Quito  Foto: AFP / AFP

O mandato de Daniel Noboa vai até 2025. É um tempo curto, não é um mandato inteiro. É possível fazer todas as reformas necessárias até 2025 ou é uma mudança que deve ser feita no longo prazo?

Se eu afirmasse que este problema pode ser resolvido em um ano ou em quatro eu estaria mentindo. Mas a crise, apesar de todos os momentos ruins, também representa uma oportunidade. O presidente Noboa tem uma oportunidade de tomar as decisões certas, de liderar e pensar em uma estratégia clara para melhorar a situação do Equador.

Precisamos melhorar, desde 2021 tudo só piora e eu não gosto de dizer que estamos no fundo do poço porque sempre dá para piorar mais.

Mas o governo de Noboa tem essa oportunidade, espero que ele aproveite.

A classe política está apoiando o presidente Noboa? O ex-presidente Rafael Correa publicou um vídeo em que afirma que irá apoiar as decisões do presidente equatoriano

Muitos políticos no Equador dizem certas coisas porque é o politicamente correto e depois fazem outra coisa completamente diferente. Eu sou uma pessoa que lidei com uma crise muito difícil, que foi a pandemia da covid-19 no Equador. Tivemos uma situação muito difícil, especialmente na cidade de Guayaquil. Foi uma tragédia que o mundo inteiro ficou sabendo.

Naquele momento, muitos políticos afirmavam que me apoiavam, mas por outro lado difundiam notícias falsas sobre a gestão do Estado e faziam acusações. Infelizmente muitos políticos oposicionistas acreditam que crises são oportunidades políticas de fazer mal ao governo para se apresentarem como uma solução e não é o momento de fazer isso.

Seria muito bom que o Equador tivesse uma classe política com maturidade para ter união, se ajudar nos momentos difíceis, como eu pedi durante a pandemia. Quem não quer ajudar, que pelo menos não atrapalhe. Infelizmente esta é a natureza de muitos políticos do Equador e dificilmente vejo algum tipo de união política ou ajuda ao governo.

Da minha parte, estou aberto para ajudar ao governo de Daniel Noboa, com conselhos de manejo de crises e eu mandei uma mensagem a ele ontem com esta mensagem. Desejo que ele faça um ótimo trabalho e nos tire desta situação.

Noboa ordenou a construção de duas prisões de “segurança máxima”, similar ao que foi feito pelo presidente de El Salvador, Nayib Bukele. Acredita que está é a resposta?

Eu não sei muito sobre a situação penitenciária de El Salvador antes do mandato do presidente Nayib Bukele. No Equador, existem grandes prisões, o que foi um erro na minha opinião porque controlar grandes prisões é muito mais difícil e deveria existir uma maior separação dos detentos por nível de risco.

Por isso, prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário.

Então precisamos de prisões de segurança máxima, com menos presos e mais restrições a eles.

O presidente do Equador, Daniel Noboa, apontou que gostaria de criar prisões no "estilo" de El Salvador Foto: Assessoria de imprensa do governo de El Salvador / AP

O que os governos anteriores fizeram para que a situação atual esteja desta forma?

Em 2007 e 2008 o governo do Equador ( na gestão de Rafael Correa) tomou uma decisão que na minha avaliação tornou o Equador um país muito mais atrativo para o crime organizado quando retirou uma base americana que fazia um sobrevoo permanente no Oceano Pacífico para reduzir o narcotráfico com a justificativa de soberania.

E pode ser que tenham razão sobre a questão da soberania, mas esta capacidade operacional não foi substituída por nada, de modo que a costa do Equador ficou sem vigilância aérea contra o tráfico de drogas durante mais de 10 anos.

Além disso, o Equador adotou uma política de não restringir a imigração, não exigiu vistos ou antecedentes criminais de ninguém e isto fez com o que o Equador chamasse a atenção, não apenas de organizações que ajudavam imigrantes ilegais a irem para os Estados Unidos, como também a cartéis internacionais do México e da Europa.

Em 2019, o governo do Equador retomou um convênio de cooperação com o governo dos Estados Unidos e eles conseguiram aumentar o número de toneladas de droga que foram apreendidas.

Então isso mudou o mapa do crime no Equador e deu início a uma briga entre gangues cujo primeiro efeito foi o massacre na prisão de 2021, o primeiro que também virou notícia. Foi uma briga entre gangues que disputavam espaços dentro do narcotráfico, porque ele se fragilizou.

Temos também um Estado sem recursos desde 2016 que está endividado e no dia que ocorreu o massacre nas prisões, eu sabia que isso iria chegar às ruas e entraríamos em uma espiral de violência. A resposta está no fortalecimento do Estado e das políticas públicas.

Como uma maior cooperação com os Estados Unidos pode ajudar o Equador neste momento?

O Equador precisa de mais apoio no setor de inteligência, que está muito debilitado. Temos capacidade operativa, força pública entre polícia e militares. O Equador possui um contingente de 100 mil soldados que estão armados, mas precisam de mais treinamento e equipamentos.

O principal é inteligência, se não temos inteligência não vamos conseguir avançar na interceptação da comunicação destas organizações e não será possível desmantelar estas organizações de dentro.

Soldados equatorianos patrulham o centro de Quito em um tanque  Foto: GALO PAGUAY / AFP

E o que o Brasil pode fazer para ajudar?

O Brasil tem muita experiência em conflitos deste tipo, em muitos casos possui experiências bem sucedidas e acredito que qualquer oferta de ajuda em termos de cooperação e formação é bem-vinda.

O Equador nunca teve esse problema, o país sempre foi um país bastante pacífico, então precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento.

Seria necessário uma maior cooperação entre os países da região para lidar com a violência?

Seria necessário que isto ocorresse, o crime organizado não é um problema apenas do Equador, tem muita coordenação internacional. As organizações criminosas dialogam mais do que os próprios políticos. A região precisa lidar com o problema de forma conjunta, precisamos reciclar a maneira que lidamos com isso porque estamos fracassando.

Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.

Em momentos de crise, existem oportunidades que o presidente do Equador, Daniel Noboa, precisa aproveitar. Esta é a opinião do ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner. O político de centro foi vice-presidente do país entre 2018 e 2020, na gestão de Lenín Moreno, e se candidatou nas eleições presidenciais do Equador em 2023, obtendo 7% dos votos no primeiro turno, o que não foi suficiente para alavancar sua candidatura ao segundo turno.

Em entrevista ao Estadão, Sonnenholzner apontou que Noboa começou bem ao decretar que o ataque dos narcotraficantes a diversas cidades no Equador representa um “conflito armado interno”. O decreto considera as facções como organizações terroristas e autoriza as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos. Por conta dos ataques de narcotraficantes, 13 pessoas morreram no Equador.

O ex-vice equatoriano avalia que o país necessita de prisões de segurança máxima, com menos detentos e mais fiscalização. “Prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário”.

Ele também avalia que o Brasil pode ajudar o Equador a combater o crime organizado. “Precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento”, diz. “Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.”

Confira trechos da entrevista:

O ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner, foi candidato a presidência no ano passado, mas não passou para o segundo turno  Foto: Mauricio Dueñas Castañeda / EFE

O que é possível fazer no curto prazo para reduzir a escala de violência no Equador?

Temos uma situação complexa no Equador neste momento. A decisão do presidente Daniel Noboa de declarar que o ataque dos narcotraficantes representa um conflito armado interno foi acertada pois permite que você tenha maior liberdade para usar as capacidades operacionais do Exército junto com a polícia, já que a polícia está sobrecarregada.

Além disso, o número de mortes violentas aumentou muito no Equador de 2020 para cá e houve um aumento de crimes como extorsão, sequestro e o uso de assassinos de aluguel.

O importante é que estas decisões sejam acompanhadas de uma boa gestão, a parte mais difícil é acabar com as conexões do crime organizado com as instituições do país e acabamos de ver isso claramente em um caso que o Ministério Público revelou há duas semanas um caso chamado ‘metástase’, no qual uma investigação mostrou que as organizações criminosas tem uma relação forte com as forças políticas, com capacidade de comprar juízes e de dominar as prisões. Então tudo isto mostra a gravidade do problema.

Narcotraficantes rendem funcionários de uma emissora de TV em Guayaquil, Equador  Foto: TC Television / AP

Precisamos melhorar também o controle das prisões, sem este controle não haverá controle nas ruas. O crime opera dentro do sistema carcerário, não existem prisões de segurança máxima no Equador, no papel elas existem, mas elas não funcionam de verdade e as prisões não estão sob o controle do Estado. As forças do Equador praticamente tomam controle apenas do perímetro externo, o restante está a cargo das organizações criminosas.

O Equador precisa de prisões com regimes de segurança máxima e que funcionem, sem cair nas mãos das organizações criminosas. O nosso sistema judicial também foi muito afetado pelas organizações criminosas, precisamos de juízes honestos e precisamos proteger os juízes que estão combatendo o crime organizado.

Além disso, o Equador é um dos países que ainda não se recuperou do impacto social e econômico da pandemia da covid-19.

Forças de Segurança do Equador patrulham as ruas da cidade de Quito  Foto: AFP / AFP

O mandato de Daniel Noboa vai até 2025. É um tempo curto, não é um mandato inteiro. É possível fazer todas as reformas necessárias até 2025 ou é uma mudança que deve ser feita no longo prazo?

Se eu afirmasse que este problema pode ser resolvido em um ano ou em quatro eu estaria mentindo. Mas a crise, apesar de todos os momentos ruins, também representa uma oportunidade. O presidente Noboa tem uma oportunidade de tomar as decisões certas, de liderar e pensar em uma estratégia clara para melhorar a situação do Equador.

Precisamos melhorar, desde 2021 tudo só piora e eu não gosto de dizer que estamos no fundo do poço porque sempre dá para piorar mais.

Mas o governo de Noboa tem essa oportunidade, espero que ele aproveite.

A classe política está apoiando o presidente Noboa? O ex-presidente Rafael Correa publicou um vídeo em que afirma que irá apoiar as decisões do presidente equatoriano

Muitos políticos no Equador dizem certas coisas porque é o politicamente correto e depois fazem outra coisa completamente diferente. Eu sou uma pessoa que lidei com uma crise muito difícil, que foi a pandemia da covid-19 no Equador. Tivemos uma situação muito difícil, especialmente na cidade de Guayaquil. Foi uma tragédia que o mundo inteiro ficou sabendo.

Naquele momento, muitos políticos afirmavam que me apoiavam, mas por outro lado difundiam notícias falsas sobre a gestão do Estado e faziam acusações. Infelizmente muitos políticos oposicionistas acreditam que crises são oportunidades políticas de fazer mal ao governo para se apresentarem como uma solução e não é o momento de fazer isso.

Seria muito bom que o Equador tivesse uma classe política com maturidade para ter união, se ajudar nos momentos difíceis, como eu pedi durante a pandemia. Quem não quer ajudar, que pelo menos não atrapalhe. Infelizmente esta é a natureza de muitos políticos do Equador e dificilmente vejo algum tipo de união política ou ajuda ao governo.

Da minha parte, estou aberto para ajudar ao governo de Daniel Noboa, com conselhos de manejo de crises e eu mandei uma mensagem a ele ontem com esta mensagem. Desejo que ele faça um ótimo trabalho e nos tire desta situação.

Noboa ordenou a construção de duas prisões de “segurança máxima”, similar ao que foi feito pelo presidente de El Salvador, Nayib Bukele. Acredita que está é a resposta?

Eu não sei muito sobre a situação penitenciária de El Salvador antes do mandato do presidente Nayib Bukele. No Equador, existem grandes prisões, o que foi um erro na minha opinião porque controlar grandes prisões é muito mais difícil e deveria existir uma maior separação dos detentos por nível de risco.

Por isso, prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário.

Então precisamos de prisões de segurança máxima, com menos presos e mais restrições a eles.

O presidente do Equador, Daniel Noboa, apontou que gostaria de criar prisões no "estilo" de El Salvador Foto: Assessoria de imprensa do governo de El Salvador / AP

O que os governos anteriores fizeram para que a situação atual esteja desta forma?

Em 2007 e 2008 o governo do Equador ( na gestão de Rafael Correa) tomou uma decisão que na minha avaliação tornou o Equador um país muito mais atrativo para o crime organizado quando retirou uma base americana que fazia um sobrevoo permanente no Oceano Pacífico para reduzir o narcotráfico com a justificativa de soberania.

E pode ser que tenham razão sobre a questão da soberania, mas esta capacidade operacional não foi substituída por nada, de modo que a costa do Equador ficou sem vigilância aérea contra o tráfico de drogas durante mais de 10 anos.

Além disso, o Equador adotou uma política de não restringir a imigração, não exigiu vistos ou antecedentes criminais de ninguém e isto fez com o que o Equador chamasse a atenção, não apenas de organizações que ajudavam imigrantes ilegais a irem para os Estados Unidos, como também a cartéis internacionais do México e da Europa.

Em 2019, o governo do Equador retomou um convênio de cooperação com o governo dos Estados Unidos e eles conseguiram aumentar o número de toneladas de droga que foram apreendidas.

Então isso mudou o mapa do crime no Equador e deu início a uma briga entre gangues cujo primeiro efeito foi o massacre na prisão de 2021, o primeiro que também virou notícia. Foi uma briga entre gangues que disputavam espaços dentro do narcotráfico, porque ele se fragilizou.

Temos também um Estado sem recursos desde 2016 que está endividado e no dia que ocorreu o massacre nas prisões, eu sabia que isso iria chegar às ruas e entraríamos em uma espiral de violência. A resposta está no fortalecimento do Estado e das políticas públicas.

Como uma maior cooperação com os Estados Unidos pode ajudar o Equador neste momento?

O Equador precisa de mais apoio no setor de inteligência, que está muito debilitado. Temos capacidade operativa, força pública entre polícia e militares. O Equador possui um contingente de 100 mil soldados que estão armados, mas precisam de mais treinamento e equipamentos.

O principal é inteligência, se não temos inteligência não vamos conseguir avançar na interceptação da comunicação destas organizações e não será possível desmantelar estas organizações de dentro.

Soldados equatorianos patrulham o centro de Quito em um tanque  Foto: GALO PAGUAY / AFP

E o que o Brasil pode fazer para ajudar?

O Brasil tem muita experiência em conflitos deste tipo, em muitos casos possui experiências bem sucedidas e acredito que qualquer oferta de ajuda em termos de cooperação e formação é bem-vinda.

O Equador nunca teve esse problema, o país sempre foi um país bastante pacífico, então precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento.

Seria necessário uma maior cooperação entre os países da região para lidar com a violência?

Seria necessário que isto ocorresse, o crime organizado não é um problema apenas do Equador, tem muita coordenação internacional. As organizações criminosas dialogam mais do que os próprios políticos. A região precisa lidar com o problema de forma conjunta, precisamos reciclar a maneira que lidamos com isso porque estamos fracassando.

Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.

Em momentos de crise, existem oportunidades que o presidente do Equador, Daniel Noboa, precisa aproveitar. Esta é a opinião do ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner. O político de centro foi vice-presidente do país entre 2018 e 2020, na gestão de Lenín Moreno, e se candidatou nas eleições presidenciais do Equador em 2023, obtendo 7% dos votos no primeiro turno, o que não foi suficiente para alavancar sua candidatura ao segundo turno.

Em entrevista ao Estadão, Sonnenholzner apontou que Noboa começou bem ao decretar que o ataque dos narcotraficantes a diversas cidades no Equador representa um “conflito armado interno”. O decreto considera as facções como organizações terroristas e autoriza as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos. Por conta dos ataques de narcotraficantes, 13 pessoas morreram no Equador.

O ex-vice equatoriano avalia que o país necessita de prisões de segurança máxima, com menos detentos e mais fiscalização. “Prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário”.

Ele também avalia que o Brasil pode ajudar o Equador a combater o crime organizado. “Precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento”, diz. “Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.”

Confira trechos da entrevista:

O ex-vice-presidente do Equador, Otto Sonnenholzner, foi candidato a presidência no ano passado, mas não passou para o segundo turno  Foto: Mauricio Dueñas Castañeda / EFE

O que é possível fazer no curto prazo para reduzir a escala de violência no Equador?

Temos uma situação complexa no Equador neste momento. A decisão do presidente Daniel Noboa de declarar que o ataque dos narcotraficantes representa um conflito armado interno foi acertada pois permite que você tenha maior liberdade para usar as capacidades operacionais do Exército junto com a polícia, já que a polícia está sobrecarregada.

Além disso, o número de mortes violentas aumentou muito no Equador de 2020 para cá e houve um aumento de crimes como extorsão, sequestro e o uso de assassinos de aluguel.

O importante é que estas decisões sejam acompanhadas de uma boa gestão, a parte mais difícil é acabar com as conexões do crime organizado com as instituições do país e acabamos de ver isso claramente em um caso que o Ministério Público revelou há duas semanas um caso chamado ‘metástase’, no qual uma investigação mostrou que as organizações criminosas tem uma relação forte com as forças políticas, com capacidade de comprar juízes e de dominar as prisões. Então tudo isto mostra a gravidade do problema.

Narcotraficantes rendem funcionários de uma emissora de TV em Guayaquil, Equador  Foto: TC Television / AP

Precisamos melhorar também o controle das prisões, sem este controle não haverá controle nas ruas. O crime opera dentro do sistema carcerário, não existem prisões de segurança máxima no Equador, no papel elas existem, mas elas não funcionam de verdade e as prisões não estão sob o controle do Estado. As forças do Equador praticamente tomam controle apenas do perímetro externo, o restante está a cargo das organizações criminosas.

O Equador precisa de prisões com regimes de segurança máxima e que funcionem, sem cair nas mãos das organizações criminosas. O nosso sistema judicial também foi muito afetado pelas organizações criminosas, precisamos de juízes honestos e precisamos proteger os juízes que estão combatendo o crime organizado.

Além disso, o Equador é um dos países que ainda não se recuperou do impacto social e econômico da pandemia da covid-19.

Forças de Segurança do Equador patrulham as ruas da cidade de Quito  Foto: AFP / AFP

O mandato de Daniel Noboa vai até 2025. É um tempo curto, não é um mandato inteiro. É possível fazer todas as reformas necessárias até 2025 ou é uma mudança que deve ser feita no longo prazo?

Se eu afirmasse que este problema pode ser resolvido em um ano ou em quatro eu estaria mentindo. Mas a crise, apesar de todos os momentos ruins, também representa uma oportunidade. O presidente Noboa tem uma oportunidade de tomar as decisões certas, de liderar e pensar em uma estratégia clara para melhorar a situação do Equador.

Precisamos melhorar, desde 2021 tudo só piora e eu não gosto de dizer que estamos no fundo do poço porque sempre dá para piorar mais.

Mas o governo de Noboa tem essa oportunidade, espero que ele aproveite.

A classe política está apoiando o presidente Noboa? O ex-presidente Rafael Correa publicou um vídeo em que afirma que irá apoiar as decisões do presidente equatoriano

Muitos políticos no Equador dizem certas coisas porque é o politicamente correto e depois fazem outra coisa completamente diferente. Eu sou uma pessoa que lidei com uma crise muito difícil, que foi a pandemia da covid-19 no Equador. Tivemos uma situação muito difícil, especialmente na cidade de Guayaquil. Foi uma tragédia que o mundo inteiro ficou sabendo.

Naquele momento, muitos políticos afirmavam que me apoiavam, mas por outro lado difundiam notícias falsas sobre a gestão do Estado e faziam acusações. Infelizmente muitos políticos oposicionistas acreditam que crises são oportunidades políticas de fazer mal ao governo para se apresentarem como uma solução e não é o momento de fazer isso.

Seria muito bom que o Equador tivesse uma classe política com maturidade para ter união, se ajudar nos momentos difíceis, como eu pedi durante a pandemia. Quem não quer ajudar, que pelo menos não atrapalhe. Infelizmente esta é a natureza de muitos políticos do Equador e dificilmente vejo algum tipo de união política ou ajuda ao governo.

Da minha parte, estou aberto para ajudar ao governo de Daniel Noboa, com conselhos de manejo de crises e eu mandei uma mensagem a ele ontem com esta mensagem. Desejo que ele faça um ótimo trabalho e nos tire desta situação.

Noboa ordenou a construção de duas prisões de “segurança máxima”, similar ao que foi feito pelo presidente de El Salvador, Nayib Bukele. Acredita que está é a resposta?

Eu não sei muito sobre a situação penitenciária de El Salvador antes do mandato do presidente Nayib Bukele. No Equador, existem grandes prisões, o que foi um erro na minha opinião porque controlar grandes prisões é muito mais difícil e deveria existir uma maior separação dos detentos por nível de risco.

Por isso, prisões de segurança máxima são importantes, com mil pessoas no máximo, não mais que isso. Precisamos controlar as prisões. Do jeito que é hoje, os chefes do narcotráfico que estão na prisão têm privilégios, moram em suítes, fazem festas e operam as organizações criminosas de dentro do sistema penitenciário.

Então precisamos de prisões de segurança máxima, com menos presos e mais restrições a eles.

O presidente do Equador, Daniel Noboa, apontou que gostaria de criar prisões no "estilo" de El Salvador Foto: Assessoria de imprensa do governo de El Salvador / AP

O que os governos anteriores fizeram para que a situação atual esteja desta forma?

Em 2007 e 2008 o governo do Equador ( na gestão de Rafael Correa) tomou uma decisão que na minha avaliação tornou o Equador um país muito mais atrativo para o crime organizado quando retirou uma base americana que fazia um sobrevoo permanente no Oceano Pacífico para reduzir o narcotráfico com a justificativa de soberania.

E pode ser que tenham razão sobre a questão da soberania, mas esta capacidade operacional não foi substituída por nada, de modo que a costa do Equador ficou sem vigilância aérea contra o tráfico de drogas durante mais de 10 anos.

Além disso, o Equador adotou uma política de não restringir a imigração, não exigiu vistos ou antecedentes criminais de ninguém e isto fez com o que o Equador chamasse a atenção, não apenas de organizações que ajudavam imigrantes ilegais a irem para os Estados Unidos, como também a cartéis internacionais do México e da Europa.

Em 2019, o governo do Equador retomou um convênio de cooperação com o governo dos Estados Unidos e eles conseguiram aumentar o número de toneladas de droga que foram apreendidas.

Então isso mudou o mapa do crime no Equador e deu início a uma briga entre gangues cujo primeiro efeito foi o massacre na prisão de 2021, o primeiro que também virou notícia. Foi uma briga entre gangues que disputavam espaços dentro do narcotráfico, porque ele se fragilizou.

Temos também um Estado sem recursos desde 2016 que está endividado e no dia que ocorreu o massacre nas prisões, eu sabia que isso iria chegar às ruas e entraríamos em uma espiral de violência. A resposta está no fortalecimento do Estado e das políticas públicas.

Como uma maior cooperação com os Estados Unidos pode ajudar o Equador neste momento?

O Equador precisa de mais apoio no setor de inteligência, que está muito debilitado. Temos capacidade operativa, força pública entre polícia e militares. O Equador possui um contingente de 100 mil soldados que estão armados, mas precisam de mais treinamento e equipamentos.

O principal é inteligência, se não temos inteligência não vamos conseguir avançar na interceptação da comunicação destas organizações e não será possível desmantelar estas organizações de dentro.

Soldados equatorianos patrulham o centro de Quito em um tanque  Foto: GALO PAGUAY / AFP

E o que o Brasil pode fazer para ajudar?

O Brasil tem muita experiência em conflitos deste tipo, em muitos casos possui experiências bem sucedidas e acredito que qualquer oferta de ajuda em termos de cooperação e formação é bem-vinda.

O Equador nunca teve esse problema, o país sempre foi um país bastante pacífico, então precisamos de fato aprender a combater e lidar com este tipo de conflito urbano que não estamos muito acostumados. Seremos gratos com qualquer ajuda neste momento.

Seria necessário uma maior cooperação entre os países da região para lidar com a violência?

Seria necessário que isto ocorresse, o crime organizado não é um problema apenas do Equador, tem muita coordenação internacional. As organizações criminosas dialogam mais do que os próprios políticos. A região precisa lidar com o problema de forma conjunta, precisamos reciclar a maneira que lidamos com isso porque estamos fracassando.

Não podemos tratar isso como um problema interno de cada país.

Entrevista por Daniel Gateno

Repórter da editoria de internacional do Estadão

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