‘Estamos em crise diplomática’, diz embaixador de Israel no Brasil sobre relação com governo Lula


Em entrevista ao Estadão, Daniel Zonshine, embaixador de Israel no Brasil, avalia que Israel está otimista e confortável com a volta de Trump a Casa Branca; o embaixador apontou que as relações com o governo brasileiro estão bloqueadas

Por Daniel Gateno
Atualização:
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Entrevista comDaniel Zonshine Embaixador de Israel no Brasil

A expectativa em Israel é de que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, será mais acessível e irá apoiar o país em assuntos importantes, segundo Daniel Zonshine, embaixador de Israel no Brasil, em entrevista ao Estadão.

“Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington”, aponta o embaixador, em uma sala de reuniões do Hilton Morumbi, na capital paulista. “A relação seria forte independente de quem estivesse na Casa Branca, mas a expectativa é que o republicano seja mais confortável para Israel”.

Zonshine esteve em São Paulo durante o final de semana para participar da convenção nacional da Confederação Israelita do Brasil (CONIB). Ele avalia que a relação entre Israel e o governo brasileiro está bloqueada desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou a atuação do Exército de Israel na Faixa de Gaza com soldados da Alemanha Nazista, em fevereiro.

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O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, participa de um comício em Palm Beach, Flórida  Foto: Evan Vucci/AP

Lula é considerado persona non grata em Israel e retirou o então embaixador Frederico Meyer de Tel-Aviv após o enviado brasileiro ser convocado a participar de um evento ao lado do então chanceler israelense Israel Katz no Museu do Holocausto, em Jerusalém.

“Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto”, diz Zonshine. “Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil”.

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Confira trechos da entrevista:

Depois de mais de um ano de guerra, o conflito parece estar cada vez mais complicado. O senhor acredita que é possível chegar a um cessar-fogo em Gaza ou no Líbano?

Quando falamos sobre a Faixa de Gaza, a situação é mais complexa. Não existe nenhum governo em Gaza que possa governar no território, é diferente do Líbano onde existe um governo libanês.

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Infelizmente o Hamas ainda é forte em Gaza, não tanto militarmente, mas no quesito governo o Hamas ainda é forte. Quando falamos de ajuda humanitária, o Hamas controla o que entra no enclave e também a distribuição disso.

Não queremos que o Hamas continue em Gaza porque eles não mudaram o seu principal objetivo: matar judeus em qualquer lugar.

Não existe nenhuma entidade em Gaza pronta para governar no lugar do Hamas. É necessário discutir a questão entre todos os parceiros, países árabes. Precisamos de uma entidade palestina, o Egito também pode fazer parte disso.

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Mas no momento as nossas forças estão lá até que haja uma decisão sobre esta questão.

101 reféns israelenses ainda estão lá, o que complica as coisas. O nosso primeiro objetivo é libertar estes reféns. Como fazemos isso? provavelmente através de um acordo.

Neste acordo provavelmente haveria um cessar-fogo e troca de prisioneiros, mas os detalhes não foram definidos.

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Israel bombardeia posições do Hezbollah no sul de Beirute, Líbano  Foto: AFP/AFP

No Líbano a situação é diferente. Existe um governo lá, mas eles não controlam o sul do país. As forças da UNIFIL estão lá e tínhamos um acordo desde 2006, mas o Hezbollah não respeitou este acordo, ocupou a região e planejou a invasão de Israel. Isso é inaceitável.

Nossas forças estão lutando basicamente em áreas próximas da fronteira com Israel, onde o Hezbollah lançou milhares de foguetes. Nós encontramos instalações de mísseis e munições na região.

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Atualmente estamos destruindo essa infraestrutura. Não queremos ficar na região mais do que o necessário. A ideia é terminar esta fase da guerra o mais rápido possível para que as pessoas do norte de Israel possam voltar para suas casas.

Ouvimos notícias de que um acordo está próximo no Líbano, mas até os países chegarem a um acordo e até haver uma implementação do acordo são muitos passos.

Na sua avaliação, quem poderia governar Gaza em um futuro sem o Hamas?

Faz mais sentido que uma entidade palestina governe Gaza. Não sei se a Autoridade Palestina ou outra entidade, junto com envolvimento internacional. Pode ser com a ajuda do Egito ou de outros países do Golfo.

Mas não é fácil. É preciso fazer muito por Gaza para que haja uma reconstrução. Estados Unidos e outros países do Ocidente também podem ajudar.

A entidade que governar Gaza precisa querer melhorar a vida dos palestinos em Gaza e não destruir Israel.

Palestinos caminham no centro de Deir al-Balah, na Faixa de Gaza  Foto: Abdel Kareem Hana/AP

O que muda para o governo de Israel com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos?

A relação entre Estados Unidos e Israel é muito importante para nós e continuaria boa independente de quem ganhasse nos Estados Unidos.

A expectativa de muitas pessoas em Israel é que Trump seja mais acessível e que irá apoiar questões que são importantes para Israel.

Mas precisamos esperar. Existe uma incerteza muito grande sobre o que Trump vai fazer. Temos que esperar. Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington.

Nada deve mudar tão dramaticamente, mas a expectativa é que a administração Trump seja mais confortável para Israel.

A relação de Israel com o Brasil deve mudar com Trump na Casa Branca?

É difícil dizer. Não acho que as relações do Brasil com os Estados Unidos vão mudar tanto assim. Os políticos brasileiros sabem do papel dos Estados Unidos no mundo.

Não sabemos ainda o que vai mudar na relação entre Brasil e Israel, depende muito da posição brasileira. A expectativa é que o Brasil se ajuste a Washington e não o contrário, então precisamos esperar para ver.

O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, discursa no Parlamento israelense, em Jerusalém, Israel  Foto: Ohad Zwigenberg/AP

Com Trump na Casa Branca, o senhor acredita que é possível que Israel e Arábia Saudita cheguem a um acordo de paz?

A Arábia Saudita é o próximo país que poderia aderir aos Acordos de Abraão, segundo as últimas conversas. Seria muito importante para nós e para todo o Oriente Médio. Eles tem uma ótima economia e muita influência na região. Estamos otimistas.

Como Israel deve responder ao aumento de casos de antissemitismo em outros países como o Brasil ou, no caso mais recente, a Holanda?

Nós vemos um aumento nos casos de antissemitismo no mundo inteiro, incluindo aqui no Brasil. Israel em parceria com as comunidades judaicas está tentando monitorar este aumento de casos e combater com medidas educacionais e de segurança.

Estamos sempre em contato com as autoridades brasileiras. Além disso, temos uma grande coordenação com a Confederação Israelita do Brasil (Conib) e buscamos que todos os Estados brasileiros adotem a definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto. Até agora 11 Estados brasileiros adotaram a definição e esperamos que mais Estados adotem a medida. Esperamos que o governo federal também adote esta definição.

Como o senhor responde aos mandados de prisão emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e o ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant?

É uma situação muito preocupante. Líderes de um país democrático foram condenados à prisão. A corte tomou uma decisão que foi mais política do que jurídica. Israel tem o direito de se defender e o TPI não pode tirar este direito de Israel.

A reação no quesito político é pedir para que governos amigos não adotem esta decisão e também devemos realizar uma campanha nas redes sociais contando a verdade, os fatos sobre esta guerra e sobre esta situação.

Como é a relação do senhor com o governo do Brasil? O presidente Lula segue criticando constantemente a postura do Exército de Israel na guerra em Gaza e no Líbano?

Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto.

Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil. A relação continua, mas quando pensamos nas pessoas envolvidas agora, a situação está problemática. Eu espero que seja possível passar por isso para que o relacionamento volte ao normal.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, discursa em um evento do G-20 social, no Rio de Janeiro  Foto: Luis Robayo/AFP

Israel tem muitas empresas que ajudam o Brasil em setores como a agricultura e tratamentos médicos. Existem outros setores que podemos cooperar mais. É uma pena que toda esta cooperação esteja bloqueada neste momento.

O governo de Israel chegou a pedir que o senhor voltasse ao país para consultas?

Se eles consideraram esta possibilidade, eles não me disseram. Eu não tenho nenhuma intenção de deixar meu posto até a minha aposentadoria do serviço diplomático.

A expectativa em Israel é de que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, será mais acessível e irá apoiar o país em assuntos importantes, segundo Daniel Zonshine, embaixador de Israel no Brasil, em entrevista ao Estadão.

“Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington”, aponta o embaixador, em uma sala de reuniões do Hilton Morumbi, na capital paulista. “A relação seria forte independente de quem estivesse na Casa Branca, mas a expectativa é que o republicano seja mais confortável para Israel”.

Zonshine esteve em São Paulo durante o final de semana para participar da convenção nacional da Confederação Israelita do Brasil (CONIB). Ele avalia que a relação entre Israel e o governo brasileiro está bloqueada desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou a atuação do Exército de Israel na Faixa de Gaza com soldados da Alemanha Nazista, em fevereiro.

O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, participa de um comício em Palm Beach, Flórida  Foto: Evan Vucci/AP

Lula é considerado persona non grata em Israel e retirou o então embaixador Frederico Meyer de Tel-Aviv após o enviado brasileiro ser convocado a participar de um evento ao lado do então chanceler israelense Israel Katz no Museu do Holocausto, em Jerusalém.

“Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto”, diz Zonshine. “Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil”.

Confira trechos da entrevista:

Depois de mais de um ano de guerra, o conflito parece estar cada vez mais complicado. O senhor acredita que é possível chegar a um cessar-fogo em Gaza ou no Líbano?

Quando falamos sobre a Faixa de Gaza, a situação é mais complexa. Não existe nenhum governo em Gaza que possa governar no território, é diferente do Líbano onde existe um governo libanês.

Infelizmente o Hamas ainda é forte em Gaza, não tanto militarmente, mas no quesito governo o Hamas ainda é forte. Quando falamos de ajuda humanitária, o Hamas controla o que entra no enclave e também a distribuição disso.

Não queremos que o Hamas continue em Gaza porque eles não mudaram o seu principal objetivo: matar judeus em qualquer lugar.

Não existe nenhuma entidade em Gaza pronta para governar no lugar do Hamas. É necessário discutir a questão entre todos os parceiros, países árabes. Precisamos de uma entidade palestina, o Egito também pode fazer parte disso.

Mas no momento as nossas forças estão lá até que haja uma decisão sobre esta questão.

101 reféns israelenses ainda estão lá, o que complica as coisas. O nosso primeiro objetivo é libertar estes reféns. Como fazemos isso? provavelmente através de um acordo.

Neste acordo provavelmente haveria um cessar-fogo e troca de prisioneiros, mas os detalhes não foram definidos.

Israel bombardeia posições do Hezbollah no sul de Beirute, Líbano  Foto: AFP/AFP

No Líbano a situação é diferente. Existe um governo lá, mas eles não controlam o sul do país. As forças da UNIFIL estão lá e tínhamos um acordo desde 2006, mas o Hezbollah não respeitou este acordo, ocupou a região e planejou a invasão de Israel. Isso é inaceitável.

Nossas forças estão lutando basicamente em áreas próximas da fronteira com Israel, onde o Hezbollah lançou milhares de foguetes. Nós encontramos instalações de mísseis e munições na região.

Atualmente estamos destruindo essa infraestrutura. Não queremos ficar na região mais do que o necessário. A ideia é terminar esta fase da guerra o mais rápido possível para que as pessoas do norte de Israel possam voltar para suas casas.

Ouvimos notícias de que um acordo está próximo no Líbano, mas até os países chegarem a um acordo e até haver uma implementação do acordo são muitos passos.

Na sua avaliação, quem poderia governar Gaza em um futuro sem o Hamas?

Faz mais sentido que uma entidade palestina governe Gaza. Não sei se a Autoridade Palestina ou outra entidade, junto com envolvimento internacional. Pode ser com a ajuda do Egito ou de outros países do Golfo.

Mas não é fácil. É preciso fazer muito por Gaza para que haja uma reconstrução. Estados Unidos e outros países do Ocidente também podem ajudar.

A entidade que governar Gaza precisa querer melhorar a vida dos palestinos em Gaza e não destruir Israel.

Palestinos caminham no centro de Deir al-Balah, na Faixa de Gaza  Foto: Abdel Kareem Hana/AP

O que muda para o governo de Israel com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos?

A relação entre Estados Unidos e Israel é muito importante para nós e continuaria boa independente de quem ganhasse nos Estados Unidos.

A expectativa de muitas pessoas em Israel é que Trump seja mais acessível e que irá apoiar questões que são importantes para Israel.

Mas precisamos esperar. Existe uma incerteza muito grande sobre o que Trump vai fazer. Temos que esperar. Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington.

Nada deve mudar tão dramaticamente, mas a expectativa é que a administração Trump seja mais confortável para Israel.

A relação de Israel com o Brasil deve mudar com Trump na Casa Branca?

É difícil dizer. Não acho que as relações do Brasil com os Estados Unidos vão mudar tanto assim. Os políticos brasileiros sabem do papel dos Estados Unidos no mundo.

Não sabemos ainda o que vai mudar na relação entre Brasil e Israel, depende muito da posição brasileira. A expectativa é que o Brasil se ajuste a Washington e não o contrário, então precisamos esperar para ver.

O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, discursa no Parlamento israelense, em Jerusalém, Israel  Foto: Ohad Zwigenberg/AP

Com Trump na Casa Branca, o senhor acredita que é possível que Israel e Arábia Saudita cheguem a um acordo de paz?

A Arábia Saudita é o próximo país que poderia aderir aos Acordos de Abraão, segundo as últimas conversas. Seria muito importante para nós e para todo o Oriente Médio. Eles tem uma ótima economia e muita influência na região. Estamos otimistas.

Como Israel deve responder ao aumento de casos de antissemitismo em outros países como o Brasil ou, no caso mais recente, a Holanda?

Nós vemos um aumento nos casos de antissemitismo no mundo inteiro, incluindo aqui no Brasil. Israel em parceria com as comunidades judaicas está tentando monitorar este aumento de casos e combater com medidas educacionais e de segurança.

Estamos sempre em contato com as autoridades brasileiras. Além disso, temos uma grande coordenação com a Confederação Israelita do Brasil (Conib) e buscamos que todos os Estados brasileiros adotem a definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto. Até agora 11 Estados brasileiros adotaram a definição e esperamos que mais Estados adotem a medida. Esperamos que o governo federal também adote esta definição.

Como o senhor responde aos mandados de prisão emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e o ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant?

É uma situação muito preocupante. Líderes de um país democrático foram condenados à prisão. A corte tomou uma decisão que foi mais política do que jurídica. Israel tem o direito de se defender e o TPI não pode tirar este direito de Israel.

A reação no quesito político é pedir para que governos amigos não adotem esta decisão e também devemos realizar uma campanha nas redes sociais contando a verdade, os fatos sobre esta guerra e sobre esta situação.

Como é a relação do senhor com o governo do Brasil? O presidente Lula segue criticando constantemente a postura do Exército de Israel na guerra em Gaza e no Líbano?

Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto.

Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil. A relação continua, mas quando pensamos nas pessoas envolvidas agora, a situação está problemática. Eu espero que seja possível passar por isso para que o relacionamento volte ao normal.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, discursa em um evento do G-20 social, no Rio de Janeiro  Foto: Luis Robayo/AFP

Israel tem muitas empresas que ajudam o Brasil em setores como a agricultura e tratamentos médicos. Existem outros setores que podemos cooperar mais. É uma pena que toda esta cooperação esteja bloqueada neste momento.

O governo de Israel chegou a pedir que o senhor voltasse ao país para consultas?

Se eles consideraram esta possibilidade, eles não me disseram. Eu não tenho nenhuma intenção de deixar meu posto até a minha aposentadoria do serviço diplomático.

A expectativa em Israel é de que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, será mais acessível e irá apoiar o país em assuntos importantes, segundo Daniel Zonshine, embaixador de Israel no Brasil, em entrevista ao Estadão.

“Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington”, aponta o embaixador, em uma sala de reuniões do Hilton Morumbi, na capital paulista. “A relação seria forte independente de quem estivesse na Casa Branca, mas a expectativa é que o republicano seja mais confortável para Israel”.

Zonshine esteve em São Paulo durante o final de semana para participar da convenção nacional da Confederação Israelita do Brasil (CONIB). Ele avalia que a relação entre Israel e o governo brasileiro está bloqueada desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou a atuação do Exército de Israel na Faixa de Gaza com soldados da Alemanha Nazista, em fevereiro.

O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, participa de um comício em Palm Beach, Flórida  Foto: Evan Vucci/AP

Lula é considerado persona non grata em Israel e retirou o então embaixador Frederico Meyer de Tel-Aviv após o enviado brasileiro ser convocado a participar de um evento ao lado do então chanceler israelense Israel Katz no Museu do Holocausto, em Jerusalém.

“Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto”, diz Zonshine. “Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil”.

Confira trechos da entrevista:

Depois de mais de um ano de guerra, o conflito parece estar cada vez mais complicado. O senhor acredita que é possível chegar a um cessar-fogo em Gaza ou no Líbano?

Quando falamos sobre a Faixa de Gaza, a situação é mais complexa. Não existe nenhum governo em Gaza que possa governar no território, é diferente do Líbano onde existe um governo libanês.

Infelizmente o Hamas ainda é forte em Gaza, não tanto militarmente, mas no quesito governo o Hamas ainda é forte. Quando falamos de ajuda humanitária, o Hamas controla o que entra no enclave e também a distribuição disso.

Não queremos que o Hamas continue em Gaza porque eles não mudaram o seu principal objetivo: matar judeus em qualquer lugar.

Não existe nenhuma entidade em Gaza pronta para governar no lugar do Hamas. É necessário discutir a questão entre todos os parceiros, países árabes. Precisamos de uma entidade palestina, o Egito também pode fazer parte disso.

Mas no momento as nossas forças estão lá até que haja uma decisão sobre esta questão.

101 reféns israelenses ainda estão lá, o que complica as coisas. O nosso primeiro objetivo é libertar estes reféns. Como fazemos isso? provavelmente através de um acordo.

Neste acordo provavelmente haveria um cessar-fogo e troca de prisioneiros, mas os detalhes não foram definidos.

Israel bombardeia posições do Hezbollah no sul de Beirute, Líbano  Foto: AFP/AFP

No Líbano a situação é diferente. Existe um governo lá, mas eles não controlam o sul do país. As forças da UNIFIL estão lá e tínhamos um acordo desde 2006, mas o Hezbollah não respeitou este acordo, ocupou a região e planejou a invasão de Israel. Isso é inaceitável.

Nossas forças estão lutando basicamente em áreas próximas da fronteira com Israel, onde o Hezbollah lançou milhares de foguetes. Nós encontramos instalações de mísseis e munições na região.

Atualmente estamos destruindo essa infraestrutura. Não queremos ficar na região mais do que o necessário. A ideia é terminar esta fase da guerra o mais rápido possível para que as pessoas do norte de Israel possam voltar para suas casas.

Ouvimos notícias de que um acordo está próximo no Líbano, mas até os países chegarem a um acordo e até haver uma implementação do acordo são muitos passos.

Na sua avaliação, quem poderia governar Gaza em um futuro sem o Hamas?

Faz mais sentido que uma entidade palestina governe Gaza. Não sei se a Autoridade Palestina ou outra entidade, junto com envolvimento internacional. Pode ser com a ajuda do Egito ou de outros países do Golfo.

Mas não é fácil. É preciso fazer muito por Gaza para que haja uma reconstrução. Estados Unidos e outros países do Ocidente também podem ajudar.

A entidade que governar Gaza precisa querer melhorar a vida dos palestinos em Gaza e não destruir Israel.

Palestinos caminham no centro de Deir al-Balah, na Faixa de Gaza  Foto: Abdel Kareem Hana/AP

O que muda para o governo de Israel com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos?

A relação entre Estados Unidos e Israel é muito importante para nós e continuaria boa independente de quem ganhasse nos Estados Unidos.

A expectativa de muitas pessoas em Israel é que Trump seja mais acessível e que irá apoiar questões que são importantes para Israel.

Mas precisamos esperar. Existe uma incerteza muito grande sobre o que Trump vai fazer. Temos que esperar. Se olharmos para as nomeações do presidente eleito até agora, acreditamos que nossa vida será um pouco mais fácil em Washington.

Nada deve mudar tão dramaticamente, mas a expectativa é que a administração Trump seja mais confortável para Israel.

A relação de Israel com o Brasil deve mudar com Trump na Casa Branca?

É difícil dizer. Não acho que as relações do Brasil com os Estados Unidos vão mudar tanto assim. Os políticos brasileiros sabem do papel dos Estados Unidos no mundo.

Não sabemos ainda o que vai mudar na relação entre Brasil e Israel, depende muito da posição brasileira. A expectativa é que o Brasil se ajuste a Washington e não o contrário, então precisamos esperar para ver.

O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, discursa no Parlamento israelense, em Jerusalém, Israel  Foto: Ohad Zwigenberg/AP

Com Trump na Casa Branca, o senhor acredita que é possível que Israel e Arábia Saudita cheguem a um acordo de paz?

A Arábia Saudita é o próximo país que poderia aderir aos Acordos de Abraão, segundo as últimas conversas. Seria muito importante para nós e para todo o Oriente Médio. Eles tem uma ótima economia e muita influência na região. Estamos otimistas.

Como Israel deve responder ao aumento de casos de antissemitismo em outros países como o Brasil ou, no caso mais recente, a Holanda?

Nós vemos um aumento nos casos de antissemitismo no mundo inteiro, incluindo aqui no Brasil. Israel em parceria com as comunidades judaicas está tentando monitorar este aumento de casos e combater com medidas educacionais e de segurança.

Estamos sempre em contato com as autoridades brasileiras. Além disso, temos uma grande coordenação com a Confederação Israelita do Brasil (Conib) e buscamos que todos os Estados brasileiros adotem a definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto. Até agora 11 Estados brasileiros adotaram a definição e esperamos que mais Estados adotem a medida. Esperamos que o governo federal também adote esta definição.

Como o senhor responde aos mandados de prisão emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e o ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant?

É uma situação muito preocupante. Líderes de um país democrático foram condenados à prisão. A corte tomou uma decisão que foi mais política do que jurídica. Israel tem o direito de se defender e o TPI não pode tirar este direito de Israel.

A reação no quesito político é pedir para que governos amigos não adotem esta decisão e também devemos realizar uma campanha nas redes sociais contando a verdade, os fatos sobre esta guerra e sobre esta situação.

Como é a relação do senhor com o governo do Brasil? O presidente Lula segue criticando constantemente a postura do Exército de Israel na guerra em Gaza e no Líbano?

Estamos em uma crise diplomática. O Brasil não tem embaixador em Israel. O último embaixador foi chamado para consultas e agora ele está em outro posto.

Não temos acesso ao governo federal e o trabalho fica mais difícil. A relação continua, mas quando pensamos nas pessoas envolvidas agora, a situação está problemática. Eu espero que seja possível passar por isso para que o relacionamento volte ao normal.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, discursa em um evento do G-20 social, no Rio de Janeiro  Foto: Luis Robayo/AFP

Israel tem muitas empresas que ajudam o Brasil em setores como a agricultura e tratamentos médicos. Existem outros setores que podemos cooperar mais. É uma pena que toda esta cooperação esteja bloqueada neste momento.

O governo de Israel chegou a pedir que o senhor voltasse ao país para consultas?

Se eles consideraram esta possibilidade, eles não me disseram. Eu não tenho nenhuma intenção de deixar meu posto até a minha aposentadoria do serviço diplomático.

Entrevista por Daniel Gateno

Repórter da editoria de internacional do Estadão

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