Vinicius NederESPECIAL PARA O ESTADO / MIAMI E ATLANTA
O discurso anti-imigrantes e a proposta de construir um muro na fronteira com o México deveriam fazer o candidato do Partido Republicano à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump, perder de goleada na Flórida, Estado que se destaca pelo tamanho da população hispânica. A complexidade das eleições presidenciais americanas, porém, desafia a lógica.
Pesquisas recentes mostram Hillary Clinton, do Partido Democrata, à frente na Flórida, mas com um desempenho inferior ao do presidente democrata Barack Obama nas eleições de 2008 e 2012, ameaçando uma vitória dada como certa.
Analistas ouvidos pelo Estado explicam que o eleitorado hispânico é diverso, com múltiplos posicionamentos políticos, o que torna ainda mais acirrada a disputa nesse Estado.
Os migrantes latinos que se instalaram por lá são predominantemente cubanos e porto-riquenhos, duas comunidades que não estão preocupadas com a questão dos direitos dos imigrantes, lembrou o colunista Andrés Oppenheimer, do jornal Miami Herald - nos dois casos, eles têm cidadania americana garantida.
O acirramento da disputa ficou evidente na última pesquisa da Universidade Monmouth: Hillary tem a preferência de 46% dos eleitores da Flórida e Trump tem 41%. Na edição de agosto da pesquisa, a diferença a favor de Hillary era de nove pontos: 48% a 39%.
Vencer na Flórida é crucial para se chegar à Casa Branca. Em razão de seus 20,3 milhões de habitantes, o Estado tem 29 votos no Colégio Eleitoral - no sistema de votação indireta, quem ganha num Estado leva todos os seus votos. Além disso, é considerado um dos Estados-chave, uma vez que seus eleitores ora preferem democratas, ora republicanos. "A Flórida é um Estado em que Trump tem de vencer. Se ele perder em Ohio ou na Flórida, está fora", disse Alan Abramowitz, professor de ciência política da Universidade Emory, em Atlanta.
O presidente Barack Obama venceu na Flórida em 2008 e 2012 com forte votação entre os hispânicos. Mas além de perder vantagem para o adversário Donald Trump, a candidata de seu partido, Hillary Clinton, parece menos popular do que Obama entre esses eleitores. Pesquisa encomendada pelo canal de TV Univision mostra que ela tem 53% da preferência dessa comunidade na Flórida, enquanto Trump tem 29%. Em 2012, Obama levou 60% dos votos dos hispânicos na Flórida.
"Obama venceu a Flórida em razão de uma mudança no voto hispânico", afirmou Fernand Amandi, sócio da Bendixen & Amandi International, que já foi estrategista de campanha do Partido Democrata.
"Ainda que Hillary esteja indo bem, ela não está indo tão bem quanto deveria. Ainda é cedo, mas neste momento ela precisaria fazer melhor para ganhar a Flórida", afirmou o consultor, que trabalhou na pesquisa encomendada pela Univision.
Para Amandi, a campanha de Hillary está menos atenta ao eleitorado hispânico do que a de Obama. "Ela só começou a fazer anúncios em espanhol na semana passada na Flórida, enquanto Obama começou em março do ano da eleição", disse. De olho nesse eleitorado, tanto Trump quanto Hillary fizeram campanha na Flórida semana passada. Na quarta-feira, a candidata aproveitou um discurso em Orlando para defender mais oportunidade de trabalho para deficientes físicos.
Já Trump aproveitou um evento em Miami para tentar agradar a comunidade de migrantes cubanos, dizendo que poderia reverter a retomada das relações diplomáticas com Cuba, como relatou o site Politico, destacando que o candidato Republicano já havia declarado que apoiava o acordo.
A abordagem dele pode agradar as famílias cubanas que migraram após a chegada de Fidel Castro ao poder, que hoje estão mais velhas e frequentam o tradicional restaurante Versailles, em Little Havana, o bairro cubano de Miami. Só que uma mudança de gerações está transformando esse eleitorado, segundo Andrés Oppenheimer, colunista do Miami Herald, que prefere dividir as gerações entre "exilados" e "imigrantes".
Apesar de, tradicionalmente, o eleitorado hispânico da Flórida, conservador, pender para o Partido Republicano, Alan Abramowitz, da Universidade Emory, considera a mudança geracional, somada à chegada de migrantes latinos, uma das principais mudanças no cenário eleitoral no país nos últimos 20 anos. "No fim, o voto hispânico será maior e, principalmente, mais democrata nos Estados que têm a disputa em aberto", disse, citando Flórida, Nevada, Colorado e Arizona.
O REPÓRTER DO 'ESTADO' VIAJA COMO BOLSISTA DO WORLD PRESS INSTITUTE