EUA têm alertado secretamente a Rússia sobre consequências no caso do uso de uma arma nuclear


Tentativa da Casa Branca de cultivar o que é conhecido como ‘ambiguidade estratégica’ ocorre enquanto Putin continua aumentando sua retórica sobre o possível uso de armas atômicas

Por Paul Sonne e John Hudson

THE WASHINGTON POST - Os Estados Unidos vêm há vários meses enviando comunicações privadas a Moscou alertando a liderança da Rússia sobre as graves consequências que se seguiriam ao uso de uma arma nuclear, segundo autoridades americanas citadas pelo jornal The Washington Post. As mensagens, segundo as fontes, ressaltam o que o presidente Joe Biden e seus assessores articularam publicamente.

O governo Biden decidiu manter os alertas sobre as consequências de um ataque nuclear deliberadamente vagos, para que o Kremlin se preocupe com a forma como Washington poderia responder, disseram as autoridades, falando sob condição de anonimato para descrever deliberações delicadas.

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A tentativa da Casa Branca de cultivar o que é conhecido no mundo da dissuasão nuclear como “ambiguidade estratégica” ocorre enquanto a Rússia continua aumentando sua retórica sobre o possível uso de armas nucleares em meio a uma mobilização doméstica destinada a estancar as perdas militares russas no leste da Ucrânia.

Os presidentes da Rússia, Vladimir Putin (E), e dos EUA, Joe Biden, durante cúpula EUA-Rússia em Genebra, Suíça, em 16 de junho de 2021  Foto: Saul Loeb/Pool via Reuters - 16/06/2021

O Departamento de Estado esteve envolvido nas comunicações privadas com Moscou, mas as autoridades não disseram quem entregou as mensagens ou o alcance de seu conteúdo. Não ficou claro se os EUA enviaram novas mensagens privadas depois que o presidente russo, Vladimir Putin, emitiu sua última ameaça nuclear velada durante um discurso anunciando uma mobilização parcial na quarta-feira. Um alto funcionário dos EUA disse, porém, que a comunicação vem acontecendo de forma consistente nos últimos meses.

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Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, escreveu na quinta-feira em um post no Telegram que o território no leste da Ucrânia seria “integrado à Rússia” após a conclusão dos “referendos” que começarão a ser votados nesta sexta-feira e prometeu fortalecer a segurança dessas áreas.

Para defender essa terra anexada, disse Medvedev, a Rússia pode usar não apenas suas forças recém-mobilizadas, mas também “qualquer arma russa, incluindo armas nucleares estratégicas e aquelas que usam novos princípios”, uma referência às armas hipersônicas. “A Rússia escolheu seu caminho”, acrescentou Medvedev. “Não há caminho de volta.”

O comentário veio um dia depois de Putin sugerir que a Rússia anexaria terras ocupadas no sul e leste da Ucrânia e incorporaria as regiões formalmente ao que Moscou considera seu território. Ele disse que não estava blefando quando prometeu usar todos os meios à disposição da Rússia para defender a integridade territorial do país – uma referência velada ao arsenal nuclear do país.

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Autoridades do governo Biden enfatizaram que esta não é a primeira vez que a liderança russa ameaçou usar armas nucleares desde o início da guerra, em 24 de fevereiro, e disseram que não há indicação de que a Rússia esteja movendo suas armas nucleares em preparação para um ataque iminente.

Ainda assim, as recentes declarações da liderança russa são mais específicas do que comentários anteriores e ocorrem em um momento em que a Rússia está cambaleando no campo de batalha por conta de uma contraofensiva ucraniana apoiada pelos EUA.

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Enquanto as declarações anteriores do Kremlin pareciam ter como objetivo alertar os EUA e seus aliados sobre ir longe demais na ajuda à Ucrânia, os comentários mais recentes de Putin sugeriram que a Rússia está considerando usar uma arma nuclear no campo de batalha para congelar ganhos e forçar Kiev e seus apoiadores à submissão, disse Daryl Kimball, diretor executivo da Associação de Controle de Armas, um grupo de defesa da não proliferação em Washington.

“O que todos precisam reconhecer é que este é um dos episódios mais graves, se não o mais grave, em que armas nucleares podem ser usadas em décadas”, disse Kimball. “As consequências até mesmo de uma chamada ‘guerra nuclear limitada’ seriam absolutamente catastróficas.”

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Durante anos, os especialistas nucleares dos EUA se preocuparam que a Rússia pudesse usar armas nucleares táticas menores, às vezes chamadas de “armas nucleares de campo de batalha”, para encerrar uma guerra convencional favoravelmente em seus termos – uma estratégia às vezes descrita como “escalar para diminuir”.

Na quinta-feira, Vadim Skibitski, vice-chefe da inteligência militar ucraniana, disse à ITV News do Reino Unido que é possível que a Rússia use armas nucleares contra a Ucrânia “para interromper nossa atividade ofensiva e destruir nosso estado”. “Esta é uma ameaça para outros países”, disse Skibitski. “A explosão de uma arma nuclear tática terá impacto não apenas na Ucrânia, mas na região do Mar Negro.”

Os ucranianos tentaram sinalizar que mesmo um ataque nuclear russo não os forçaria à capitulação – e de fato poderia ter o efeito oposto. “Ameaçar com armas nucleares… aos ucranianos?”, escreveu Mikhailo Podoliak, conselheiro do presidente ucraniano Volodmir Zelenski, no Twitter. “Putin ainda não entendeu com quem está lidando.”

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Em entrevista ao programa “60 Minutes” da CBS News que foi ao ar no domingo, Biden foi questionado sobre o que ele diria a Putin se o líder russo estiver considerando usar armas nucleares no conflito contra a Ucrânia. “Não. Não. Não”, disse Biden. “Você mudará a face da guerra como nada antes desde a 2ª Guerra.”

Crise

Biden se recusou a detalhar como os EUA responderiam, dizendo apenas que a reação seria “consequencial” e dependeria “da extensão do que eles (russos) fizerem”.

O governo Biden enfrentaria uma crise se a Rússia usasse uma pequena arma nuclear na Ucrânia, que os EUA não estão obrigados a defender por nenhum tratado. Qualquer resposta militar direta dos EUA contra a Rússia arriscaria a possibilidade de uma guerra mais ampla entre superpotências com armas nucleares – evitá-la tornou a prioridade ‘número 1′ do governo Biden em todas as suas políticas para a Ucrânia.

Matthew Kroenig, professor de governo da Universidade de Georgetown e diretor do Centro Scowcroft para Estratégia e Segurança do Conselho Atlântico, argumentou que a melhor opção para o governo, se confrontado com um ataque nuclear russo limitado na Ucrânia, pode ser apoiar a Ucrânia e realizar um ataque convencional limitado às forças ou bases russas que lançaram o ataque.

“Se foram as forças russas na Ucrânia que lançaram o ataque nuclear, os EUA poderiam atacar diretamente essas forças”, disse Kroenig. “Seria calibrado para enviar uma mensagem de que esta não é uma grande guerra, este é um ataque limitado. Se você é Putin, o que você faz em resposta? Eu não acho que você diga imediatamente vamos lançar todas as armas nucleares nos Estados Unidos.”

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Medida foi tomada no país pela última vez na 2ª Guerra, quatro regiões controladas por Moscou na Ucrânia anunciaram referendos para integração a Rússia

Mas mesmo um ataque convencional limitado dos militares dos EUA contra a Rússia seria visto como imprudente por muitos em Washington, que argumentariam contra o risco de uma guerra em grande escala com uma Rússia com armas nucleares.

James M. Acton, codiretor do programa de política nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, disse que não faz sentido neste momento descartar as respostas dos EUA porque há uma ampla gama de ações russas possíveis – de um teste nuclear subterrâneo que não faz mal a ninguém até uma explosão em grande escala que mata dezenas de milhares de civis - e não há sinais de que Putin esteja perto de cruzar o limiar.

“Se ele estivesse realmente pensando muito seriamente em usar armas nucleares muito em breve, ele quase certamente gostaria que soubéssemos disso”, disse Acton. “Ele prefere ameaçar o uso nuclear e nos obrigar a fazer concessões do que realmente ter de seguir o caminho do uso nuclear.”

Autoridades dos EUA intensificaram os esforços na Assembleia-Geral da ONU nesta semana para impedir a Rússia de considerar seriamente o que seria o primeiro uso de uma arma nuclear em um conflito desde os bombardeios atômicos do Japão pelos Estados Unidos em 1945.

O USS Ronald Reagan, um porta-aviões movido a energia nuclear da classe Nimitz da Marinha dos EUA, chega a um porto na cidade costeira de Busan, no sudeste da Coreia do Sul Foto: Jeon Heon-Kyun/EFE - 23/09/2022

O secretário de Estado Antony Blinken, falando em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU na quinta-feira, disse que as “ameaças nucleares imprudentes da Rússia devem parar imediatamente”.

“Esta semana, o presidente Putin disse que a Rússia não hesitaria em usar, e cito, ‘todos os sistemas de armas disponíveis’ em resposta a uma ameaça à sua integridade territorial – uma ameaça que é ainda mais ameaçadora dada a intenção dos russos de anexar grandes áreas da Ucrânia nos próximos dias”, disse Blinken. “Quando isso estiver completo, podemos esperar que o presidente Putin reivindique qualquer esforço ucraniano para libertar esta terra como um ataque ao chamado território russo”.

Blinken observou que a Rússia em janeiro se juntou a outros membros permanentes do Conselho de Segurança na assinatura de uma declaração conjunta dizendo que “a guerra nuclear nunca pode ser vencida e nunca deve ser travada”.

THE WASHINGTON POST - Os Estados Unidos vêm há vários meses enviando comunicações privadas a Moscou alertando a liderança da Rússia sobre as graves consequências que se seguiriam ao uso de uma arma nuclear, segundo autoridades americanas citadas pelo jornal The Washington Post. As mensagens, segundo as fontes, ressaltam o que o presidente Joe Biden e seus assessores articularam publicamente.

O governo Biden decidiu manter os alertas sobre as consequências de um ataque nuclear deliberadamente vagos, para que o Kremlin se preocupe com a forma como Washington poderia responder, disseram as autoridades, falando sob condição de anonimato para descrever deliberações delicadas.

A tentativa da Casa Branca de cultivar o que é conhecido no mundo da dissuasão nuclear como “ambiguidade estratégica” ocorre enquanto a Rússia continua aumentando sua retórica sobre o possível uso de armas nucleares em meio a uma mobilização doméstica destinada a estancar as perdas militares russas no leste da Ucrânia.

Os presidentes da Rússia, Vladimir Putin (E), e dos EUA, Joe Biden, durante cúpula EUA-Rússia em Genebra, Suíça, em 16 de junho de 2021  Foto: Saul Loeb/Pool via Reuters - 16/06/2021

O Departamento de Estado esteve envolvido nas comunicações privadas com Moscou, mas as autoridades não disseram quem entregou as mensagens ou o alcance de seu conteúdo. Não ficou claro se os EUA enviaram novas mensagens privadas depois que o presidente russo, Vladimir Putin, emitiu sua última ameaça nuclear velada durante um discurso anunciando uma mobilização parcial na quarta-feira. Um alto funcionário dos EUA disse, porém, que a comunicação vem acontecendo de forma consistente nos últimos meses.

Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, escreveu na quinta-feira em um post no Telegram que o território no leste da Ucrânia seria “integrado à Rússia” após a conclusão dos “referendos” que começarão a ser votados nesta sexta-feira e prometeu fortalecer a segurança dessas áreas.

Para defender essa terra anexada, disse Medvedev, a Rússia pode usar não apenas suas forças recém-mobilizadas, mas também “qualquer arma russa, incluindo armas nucleares estratégicas e aquelas que usam novos princípios”, uma referência às armas hipersônicas. “A Rússia escolheu seu caminho”, acrescentou Medvedev. “Não há caminho de volta.”

O comentário veio um dia depois de Putin sugerir que a Rússia anexaria terras ocupadas no sul e leste da Ucrânia e incorporaria as regiões formalmente ao que Moscou considera seu território. Ele disse que não estava blefando quando prometeu usar todos os meios à disposição da Rússia para defender a integridade territorial do país – uma referência velada ao arsenal nuclear do país.

Autoridades do governo Biden enfatizaram que esta não é a primeira vez que a liderança russa ameaçou usar armas nucleares desde o início da guerra, em 24 de fevereiro, e disseram que não há indicação de que a Rússia esteja movendo suas armas nucleares em preparação para um ataque iminente.

Ainda assim, as recentes declarações da liderança russa são mais específicas do que comentários anteriores e ocorrem em um momento em que a Rússia está cambaleando no campo de batalha por conta de uma contraofensiva ucraniana apoiada pelos EUA.

Enquanto as declarações anteriores do Kremlin pareciam ter como objetivo alertar os EUA e seus aliados sobre ir longe demais na ajuda à Ucrânia, os comentários mais recentes de Putin sugeriram que a Rússia está considerando usar uma arma nuclear no campo de batalha para congelar ganhos e forçar Kiev e seus apoiadores à submissão, disse Daryl Kimball, diretor executivo da Associação de Controle de Armas, um grupo de defesa da não proliferação em Washington.

“O que todos precisam reconhecer é que este é um dos episódios mais graves, se não o mais grave, em que armas nucleares podem ser usadas em décadas”, disse Kimball. “As consequências até mesmo de uma chamada ‘guerra nuclear limitada’ seriam absolutamente catastróficas.”

Durante anos, os especialistas nucleares dos EUA se preocuparam que a Rússia pudesse usar armas nucleares táticas menores, às vezes chamadas de “armas nucleares de campo de batalha”, para encerrar uma guerra convencional favoravelmente em seus termos – uma estratégia às vezes descrita como “escalar para diminuir”.

Na quinta-feira, Vadim Skibitski, vice-chefe da inteligência militar ucraniana, disse à ITV News do Reino Unido que é possível que a Rússia use armas nucleares contra a Ucrânia “para interromper nossa atividade ofensiva e destruir nosso estado”. “Esta é uma ameaça para outros países”, disse Skibitski. “A explosão de uma arma nuclear tática terá impacto não apenas na Ucrânia, mas na região do Mar Negro.”

Os ucranianos tentaram sinalizar que mesmo um ataque nuclear russo não os forçaria à capitulação – e de fato poderia ter o efeito oposto. “Ameaçar com armas nucleares… aos ucranianos?”, escreveu Mikhailo Podoliak, conselheiro do presidente ucraniano Volodmir Zelenski, no Twitter. “Putin ainda não entendeu com quem está lidando.”

Em entrevista ao programa “60 Minutes” da CBS News que foi ao ar no domingo, Biden foi questionado sobre o que ele diria a Putin se o líder russo estiver considerando usar armas nucleares no conflito contra a Ucrânia. “Não. Não. Não”, disse Biden. “Você mudará a face da guerra como nada antes desde a 2ª Guerra.”

Crise

Biden se recusou a detalhar como os EUA responderiam, dizendo apenas que a reação seria “consequencial” e dependeria “da extensão do que eles (russos) fizerem”.

O governo Biden enfrentaria uma crise se a Rússia usasse uma pequena arma nuclear na Ucrânia, que os EUA não estão obrigados a defender por nenhum tratado. Qualquer resposta militar direta dos EUA contra a Rússia arriscaria a possibilidade de uma guerra mais ampla entre superpotências com armas nucleares – evitá-la tornou a prioridade ‘número 1′ do governo Biden em todas as suas políticas para a Ucrânia.

Matthew Kroenig, professor de governo da Universidade de Georgetown e diretor do Centro Scowcroft para Estratégia e Segurança do Conselho Atlântico, argumentou que a melhor opção para o governo, se confrontado com um ataque nuclear russo limitado na Ucrânia, pode ser apoiar a Ucrânia e realizar um ataque convencional limitado às forças ou bases russas que lançaram o ataque.

“Se foram as forças russas na Ucrânia que lançaram o ataque nuclear, os EUA poderiam atacar diretamente essas forças”, disse Kroenig. “Seria calibrado para enviar uma mensagem de que esta não é uma grande guerra, este é um ataque limitado. Se você é Putin, o que você faz em resposta? Eu não acho que você diga imediatamente vamos lançar todas as armas nucleares nos Estados Unidos.”

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Medida foi tomada no país pela última vez na 2ª Guerra, quatro regiões controladas por Moscou na Ucrânia anunciaram referendos para integração a Rússia

Mas mesmo um ataque convencional limitado dos militares dos EUA contra a Rússia seria visto como imprudente por muitos em Washington, que argumentariam contra o risco de uma guerra em grande escala com uma Rússia com armas nucleares.

James M. Acton, codiretor do programa de política nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, disse que não faz sentido neste momento descartar as respostas dos EUA porque há uma ampla gama de ações russas possíveis – de um teste nuclear subterrâneo que não faz mal a ninguém até uma explosão em grande escala que mata dezenas de milhares de civis - e não há sinais de que Putin esteja perto de cruzar o limiar.

“Se ele estivesse realmente pensando muito seriamente em usar armas nucleares muito em breve, ele quase certamente gostaria que soubéssemos disso”, disse Acton. “Ele prefere ameaçar o uso nuclear e nos obrigar a fazer concessões do que realmente ter de seguir o caminho do uso nuclear.”

Autoridades dos EUA intensificaram os esforços na Assembleia-Geral da ONU nesta semana para impedir a Rússia de considerar seriamente o que seria o primeiro uso de uma arma nuclear em um conflito desde os bombardeios atômicos do Japão pelos Estados Unidos em 1945.

O USS Ronald Reagan, um porta-aviões movido a energia nuclear da classe Nimitz da Marinha dos EUA, chega a um porto na cidade costeira de Busan, no sudeste da Coreia do Sul Foto: Jeon Heon-Kyun/EFE - 23/09/2022

O secretário de Estado Antony Blinken, falando em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU na quinta-feira, disse que as “ameaças nucleares imprudentes da Rússia devem parar imediatamente”.

“Esta semana, o presidente Putin disse que a Rússia não hesitaria em usar, e cito, ‘todos os sistemas de armas disponíveis’ em resposta a uma ameaça à sua integridade territorial – uma ameaça que é ainda mais ameaçadora dada a intenção dos russos de anexar grandes áreas da Ucrânia nos próximos dias”, disse Blinken. “Quando isso estiver completo, podemos esperar que o presidente Putin reivindique qualquer esforço ucraniano para libertar esta terra como um ataque ao chamado território russo”.

Blinken observou que a Rússia em janeiro se juntou a outros membros permanentes do Conselho de Segurança na assinatura de uma declaração conjunta dizendo que “a guerra nuclear nunca pode ser vencida e nunca deve ser travada”.

THE WASHINGTON POST - Os Estados Unidos vêm há vários meses enviando comunicações privadas a Moscou alertando a liderança da Rússia sobre as graves consequências que se seguiriam ao uso de uma arma nuclear, segundo autoridades americanas citadas pelo jornal The Washington Post. As mensagens, segundo as fontes, ressaltam o que o presidente Joe Biden e seus assessores articularam publicamente.

O governo Biden decidiu manter os alertas sobre as consequências de um ataque nuclear deliberadamente vagos, para que o Kremlin se preocupe com a forma como Washington poderia responder, disseram as autoridades, falando sob condição de anonimato para descrever deliberações delicadas.

A tentativa da Casa Branca de cultivar o que é conhecido no mundo da dissuasão nuclear como “ambiguidade estratégica” ocorre enquanto a Rússia continua aumentando sua retórica sobre o possível uso de armas nucleares em meio a uma mobilização doméstica destinada a estancar as perdas militares russas no leste da Ucrânia.

Os presidentes da Rússia, Vladimir Putin (E), e dos EUA, Joe Biden, durante cúpula EUA-Rússia em Genebra, Suíça, em 16 de junho de 2021  Foto: Saul Loeb/Pool via Reuters - 16/06/2021

O Departamento de Estado esteve envolvido nas comunicações privadas com Moscou, mas as autoridades não disseram quem entregou as mensagens ou o alcance de seu conteúdo. Não ficou claro se os EUA enviaram novas mensagens privadas depois que o presidente russo, Vladimir Putin, emitiu sua última ameaça nuclear velada durante um discurso anunciando uma mobilização parcial na quarta-feira. Um alto funcionário dos EUA disse, porém, que a comunicação vem acontecendo de forma consistente nos últimos meses.

Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, escreveu na quinta-feira em um post no Telegram que o território no leste da Ucrânia seria “integrado à Rússia” após a conclusão dos “referendos” que começarão a ser votados nesta sexta-feira e prometeu fortalecer a segurança dessas áreas.

Para defender essa terra anexada, disse Medvedev, a Rússia pode usar não apenas suas forças recém-mobilizadas, mas também “qualquer arma russa, incluindo armas nucleares estratégicas e aquelas que usam novos princípios”, uma referência às armas hipersônicas. “A Rússia escolheu seu caminho”, acrescentou Medvedev. “Não há caminho de volta.”

O comentário veio um dia depois de Putin sugerir que a Rússia anexaria terras ocupadas no sul e leste da Ucrânia e incorporaria as regiões formalmente ao que Moscou considera seu território. Ele disse que não estava blefando quando prometeu usar todos os meios à disposição da Rússia para defender a integridade territorial do país – uma referência velada ao arsenal nuclear do país.

Autoridades do governo Biden enfatizaram que esta não é a primeira vez que a liderança russa ameaçou usar armas nucleares desde o início da guerra, em 24 de fevereiro, e disseram que não há indicação de que a Rússia esteja movendo suas armas nucleares em preparação para um ataque iminente.

Ainda assim, as recentes declarações da liderança russa são mais específicas do que comentários anteriores e ocorrem em um momento em que a Rússia está cambaleando no campo de batalha por conta de uma contraofensiva ucraniana apoiada pelos EUA.

Enquanto as declarações anteriores do Kremlin pareciam ter como objetivo alertar os EUA e seus aliados sobre ir longe demais na ajuda à Ucrânia, os comentários mais recentes de Putin sugeriram que a Rússia está considerando usar uma arma nuclear no campo de batalha para congelar ganhos e forçar Kiev e seus apoiadores à submissão, disse Daryl Kimball, diretor executivo da Associação de Controle de Armas, um grupo de defesa da não proliferação em Washington.

“O que todos precisam reconhecer é que este é um dos episódios mais graves, se não o mais grave, em que armas nucleares podem ser usadas em décadas”, disse Kimball. “As consequências até mesmo de uma chamada ‘guerra nuclear limitada’ seriam absolutamente catastróficas.”

Durante anos, os especialistas nucleares dos EUA se preocuparam que a Rússia pudesse usar armas nucleares táticas menores, às vezes chamadas de “armas nucleares de campo de batalha”, para encerrar uma guerra convencional favoravelmente em seus termos – uma estratégia às vezes descrita como “escalar para diminuir”.

Na quinta-feira, Vadim Skibitski, vice-chefe da inteligência militar ucraniana, disse à ITV News do Reino Unido que é possível que a Rússia use armas nucleares contra a Ucrânia “para interromper nossa atividade ofensiva e destruir nosso estado”. “Esta é uma ameaça para outros países”, disse Skibitski. “A explosão de uma arma nuclear tática terá impacto não apenas na Ucrânia, mas na região do Mar Negro.”

Os ucranianos tentaram sinalizar que mesmo um ataque nuclear russo não os forçaria à capitulação – e de fato poderia ter o efeito oposto. “Ameaçar com armas nucleares… aos ucranianos?”, escreveu Mikhailo Podoliak, conselheiro do presidente ucraniano Volodmir Zelenski, no Twitter. “Putin ainda não entendeu com quem está lidando.”

Em entrevista ao programa “60 Minutes” da CBS News que foi ao ar no domingo, Biden foi questionado sobre o que ele diria a Putin se o líder russo estiver considerando usar armas nucleares no conflito contra a Ucrânia. “Não. Não. Não”, disse Biden. “Você mudará a face da guerra como nada antes desde a 2ª Guerra.”

Crise

Biden se recusou a detalhar como os EUA responderiam, dizendo apenas que a reação seria “consequencial” e dependeria “da extensão do que eles (russos) fizerem”.

O governo Biden enfrentaria uma crise se a Rússia usasse uma pequena arma nuclear na Ucrânia, que os EUA não estão obrigados a defender por nenhum tratado. Qualquer resposta militar direta dos EUA contra a Rússia arriscaria a possibilidade de uma guerra mais ampla entre superpotências com armas nucleares – evitá-la tornou a prioridade ‘número 1′ do governo Biden em todas as suas políticas para a Ucrânia.

Matthew Kroenig, professor de governo da Universidade de Georgetown e diretor do Centro Scowcroft para Estratégia e Segurança do Conselho Atlântico, argumentou que a melhor opção para o governo, se confrontado com um ataque nuclear russo limitado na Ucrânia, pode ser apoiar a Ucrânia e realizar um ataque convencional limitado às forças ou bases russas que lançaram o ataque.

“Se foram as forças russas na Ucrânia que lançaram o ataque nuclear, os EUA poderiam atacar diretamente essas forças”, disse Kroenig. “Seria calibrado para enviar uma mensagem de que esta não é uma grande guerra, este é um ataque limitado. Se você é Putin, o que você faz em resposta? Eu não acho que você diga imediatamente vamos lançar todas as armas nucleares nos Estados Unidos.”

Seu navegador não suporta esse video.

Medida foi tomada no país pela última vez na 2ª Guerra, quatro regiões controladas por Moscou na Ucrânia anunciaram referendos para integração a Rússia

Mas mesmo um ataque convencional limitado dos militares dos EUA contra a Rússia seria visto como imprudente por muitos em Washington, que argumentariam contra o risco de uma guerra em grande escala com uma Rússia com armas nucleares.

James M. Acton, codiretor do programa de política nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, disse que não faz sentido neste momento descartar as respostas dos EUA porque há uma ampla gama de ações russas possíveis – de um teste nuclear subterrâneo que não faz mal a ninguém até uma explosão em grande escala que mata dezenas de milhares de civis - e não há sinais de que Putin esteja perto de cruzar o limiar.

“Se ele estivesse realmente pensando muito seriamente em usar armas nucleares muito em breve, ele quase certamente gostaria que soubéssemos disso”, disse Acton. “Ele prefere ameaçar o uso nuclear e nos obrigar a fazer concessões do que realmente ter de seguir o caminho do uso nuclear.”

Autoridades dos EUA intensificaram os esforços na Assembleia-Geral da ONU nesta semana para impedir a Rússia de considerar seriamente o que seria o primeiro uso de uma arma nuclear em um conflito desde os bombardeios atômicos do Japão pelos Estados Unidos em 1945.

O USS Ronald Reagan, um porta-aviões movido a energia nuclear da classe Nimitz da Marinha dos EUA, chega a um porto na cidade costeira de Busan, no sudeste da Coreia do Sul Foto: Jeon Heon-Kyun/EFE - 23/09/2022

O secretário de Estado Antony Blinken, falando em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU na quinta-feira, disse que as “ameaças nucleares imprudentes da Rússia devem parar imediatamente”.

“Esta semana, o presidente Putin disse que a Rússia não hesitaria em usar, e cito, ‘todos os sistemas de armas disponíveis’ em resposta a uma ameaça à sua integridade territorial – uma ameaça que é ainda mais ameaçadora dada a intenção dos russos de anexar grandes áreas da Ucrânia nos próximos dias”, disse Blinken. “Quando isso estiver completo, podemos esperar que o presidente Putin reivindique qualquer esforço ucraniano para libertar esta terra como um ataque ao chamado território russo”.

Blinken observou que a Rússia em janeiro se juntou a outros membros permanentes do Conselho de Segurança na assinatura de uma declaração conjunta dizendo que “a guerra nuclear nunca pode ser vencida e nunca deve ser travada”.

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