Extrema direita cresce e deve se tornar 3ª força política de Portugal


Partido Chega, de André Ventura, deve passar de 1 para 10 deputados e tornar-se peça importante na formação de governo

Por Thaís Ferraz

Anos após a meteórica ascensão de radicais de direita em outras partes da Europa, o partido Chega, do jurista e ex-comentarista de futebol André Ventura, pode levar a extrema direita portuguesa à relevância pela primeira vez desde a Revolução dos Cravos, em 1974.  Nas eleições de hoje, convocadas após a dissolução do Parlamento, o Chega deve passar de 1 para 10 deputados, segundo pesquisas. O resultado faria do partido a terceira força política e uma peça importante para a governabilidade, em caso de uma coalizão de direita.

O Chega foi criado em 2019, após uma ruptura no Partido Social-Democrata (PSD), que apesar do nome é de centro-direita. O Chega passou em branco nas primeiras eleições – apenas Ventura foi eleito. Mas o cenário mudou em 2021, quando obteve 4,16% dos votos nas autárquicas – legislativas municipais –, um resultado acima de partidos tradicionais.

André Ventura (centro) durante comício em Lisboa; desde o início, partido tentou se distanciar dos companheiros ideológicos europeus Foto: Rodrigo Antunes/EFE/EPA
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Em 2021, Ventura ficou em terceiro lugar na corrida presidencial, com 11,9% dos votos, atrás dos 12,9% de Ana Gomes, a segunda colocada. Durante a campanha, ele recebeu apoio da direitista francesa Marine Le Pen. Até 2015, porém, a extrema direita teve dificuldades para decolar em Portugal. 

“Com o fim do governo de Pedro Passos Coelho (2011-2015), que geriu a crise econômica e o resgate financeiro, abriu-se um período de crise na direita portuguesa”, explica Riccardo Marchi, do Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Lisboa. “Essa crise atingiu os dois principais partidos de centro-direita. Rui Rio (líder do PSD) rumou para o centro e Francisco Rodrigues dos Santos (do Centro Democrático Social, o CDS), foi para a direita, sendo contestado pela própria base.”

“Faltava um empreendedor político disposto a capitalizar essa frustração”, explica Marchi. “Havia a velha direita, mas ela não é atrativa para os portugueses que não querem saber dos salazaristas. Neste momento, explica, o populismo de protesto de André Ventura veio a calhar, posicionando-o como o único – e tardio – líder possível.

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Desde o início, Ventura tentou se distanciar de seus companheiros ideológicos europeus. “Na extrema direita europeia, há uma lógica de estatização brutal, de querer nacionalizar tudo, desde agências de seguros a prestadoras de serviços. Nós somos o contrário”, disse Ventura, em entrevista ao TSF Rádio-Notícias de Portugal, em 2017. 

Existem, de fato, algumas diferenças entre o Chega e a extrema direita europeia, afirma Marchi. “O Chega é um partido populista de protesto, mas não se apresentou assim. Ele se apresenta como um partido de governo”, explica. “Ele se coloca à disposição para dialogar com todos os partidos.”

Outra diferença é que o Chega é pró-europeu. “Para se moldar ao euroceticismo de outros partidos da direita, ele adota um discurso de ‘não queremos sair da Europa, mas ela precisa ser modificada’”, explica Marchi. “O Chega diz que a Europa não pode ser um projeto federal governado pelo eixo Paris-Berlim, mas um bloco que garanta a soberania dos Estados e onde todos os membros tenham a mesma importância no Parlamento Europeu.”

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A pauta anti-imigração, comum à extrema direita, também passa por algumas adaptações nas mãos do Chega. “Em Portugal, não temos o nível de imigração de países como França e Itália. Temos uma grande comunidade africana, principalmente na área metropolitana de Lisboa, mas que não pode ser criticadas do ponto de vista cultural”, explica Marchi. “Por isso, o Chega não entra nesse discurso. Ele não quer arriscar ser identificado como o ‘Portugal branco’.”

Os eleitores do Chega se diferenciam dos eleitores de outros partidos da extrema direita europeia, afirma Katielle Silva, pesquisadora do Instituto de Ciências Sociais e Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa. “Nos outros países, o perfil do votante de extrema direita é muito mais envelhecido e muito menos instruído”, afirma. 

Ela define dois grupos principais que constituem a base do eleitorado do partido. O primeiro se caracteriza por um sentimento de desproteção. “São pessoas de áreas industrializadas, afetadas por uma economia muito mais globalizada e neoliberal, pelo desmonte de redes de indústrias, pequenos empresários que tiveram seus negócios desmantelados com o aumento das importações”, explica. “É um grupo cuja demanda não foi representada por partidos e cujo processo de avanço do capitalismo levou a dificuldades econômicas.” 

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O segundo, por sua vez, é composto por uma elite mais reacionária. “Esse apoio da elite pode ser constatado nas votações em conselhos de maior riqueza, como Cascaes e a zona de Estoril, na região metropolitana”, explica. “Trata-se de uma elite que já era de direita, votava em partidos como o PSD e o CDS e passou a se reconhecer no Chega, sobretudo porque já não se reconhecia na direita que votava.”

Embora André Ventura não goste muito de ser associado a figuras como Jair Bolsonaro e Donald Trump, é inegável que seu programa siga a cartilha da “nova direita” e existam mais semelhanças do que diferenças entre o Chega e seus irmãos radicais de outros países. 

“Embora ele se mostre como uma nova opção de direita, que não é tão extrema, sua comunicação, com base em redes sociais e difusão de fake news, nos mostram que o partido é sim de extrema direita”, afirma Silvia Roque, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. “O Chega acentua o que a direita tradicional pensa e não diz, e tem muitas pautas em comum com outros partidos direitistas radicais, com uma agenda centrada na xenofobia, no antifeminismo e contra a ideologia de gênero.”

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André Ventura ganhou fama nacional com uma declaração sobre a comunidade cigana de Portugal. Em 2017, em entrevista ao jornal I, ele declarou que os ciganos viviam de subsídios do Estado português. 

Desde então, a questão se tornou central em sua trajetória. Ventura foi multado mais de uma vez por declarações racistas contra os ciganos. Em uma delas, em 2020, ele disse que “quase 90% da comunidade cigana vive de ‘outras coisas’ que não do seu próprio trabalho.” Ventura também defende bandeiras como a volta da prisão perpétua e a castração química de pedófilos. 

Embora polarizadoras, essas propostas não parecem encontrar ressonância na sociedade portuguesa, afirma Roque. “Esses temas não são relevantes. Nenhuma dessas bandeiras está no ranking das preocupações dos portugueses, que são a corrupção, o desemprego, as questões econômicas e de justiça”, explica. 

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“Ainda assim, funciona. São temas tabu em Portugal. Ao tocar neles, Ventura passa a impressão de ser um político que não tem medo de enfrentar o sistema, indo ao encontro de uma parte do eleitorado que é contra a elite política e o politicamente correto.”

Aos poucos, o Chega vem se aproximando de seus pares europeus. Em 2020, ele se juntou ao grupo Identidade e Democracia, que une três partidos de extrema direita, o Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen, a Liga, de Matteo Salvini, e a Alternativa para a Alemanha (AfD), de Tino Chrupalla. “O partido não vem da mesma família da AfD ou de Le Pen. Mas, quando começou a surfar a onda e viu que ela crescia, precisou se aproximar de algumas famílias políticas europeias”, explica Marchi.

Anos após a meteórica ascensão de radicais de direita em outras partes da Europa, o partido Chega, do jurista e ex-comentarista de futebol André Ventura, pode levar a extrema direita portuguesa à relevância pela primeira vez desde a Revolução dos Cravos, em 1974.  Nas eleições de hoje, convocadas após a dissolução do Parlamento, o Chega deve passar de 1 para 10 deputados, segundo pesquisas. O resultado faria do partido a terceira força política e uma peça importante para a governabilidade, em caso de uma coalizão de direita.

O Chega foi criado em 2019, após uma ruptura no Partido Social-Democrata (PSD), que apesar do nome é de centro-direita. O Chega passou em branco nas primeiras eleições – apenas Ventura foi eleito. Mas o cenário mudou em 2021, quando obteve 4,16% dos votos nas autárquicas – legislativas municipais –, um resultado acima de partidos tradicionais.

André Ventura (centro) durante comício em Lisboa; desde o início, partido tentou se distanciar dos companheiros ideológicos europeus Foto: Rodrigo Antunes/EFE/EPA

Em 2021, Ventura ficou em terceiro lugar na corrida presidencial, com 11,9% dos votos, atrás dos 12,9% de Ana Gomes, a segunda colocada. Durante a campanha, ele recebeu apoio da direitista francesa Marine Le Pen. Até 2015, porém, a extrema direita teve dificuldades para decolar em Portugal. 

“Com o fim do governo de Pedro Passos Coelho (2011-2015), que geriu a crise econômica e o resgate financeiro, abriu-se um período de crise na direita portuguesa”, explica Riccardo Marchi, do Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Lisboa. “Essa crise atingiu os dois principais partidos de centro-direita. Rui Rio (líder do PSD) rumou para o centro e Francisco Rodrigues dos Santos (do Centro Democrático Social, o CDS), foi para a direita, sendo contestado pela própria base.”

“Faltava um empreendedor político disposto a capitalizar essa frustração”, explica Marchi. “Havia a velha direita, mas ela não é atrativa para os portugueses que não querem saber dos salazaristas. Neste momento, explica, o populismo de protesto de André Ventura veio a calhar, posicionando-o como o único – e tardio – líder possível.

Desde o início, Ventura tentou se distanciar de seus companheiros ideológicos europeus. “Na extrema direita europeia, há uma lógica de estatização brutal, de querer nacionalizar tudo, desde agências de seguros a prestadoras de serviços. Nós somos o contrário”, disse Ventura, em entrevista ao TSF Rádio-Notícias de Portugal, em 2017. 

Existem, de fato, algumas diferenças entre o Chega e a extrema direita europeia, afirma Marchi. “O Chega é um partido populista de protesto, mas não se apresentou assim. Ele se apresenta como um partido de governo”, explica. “Ele se coloca à disposição para dialogar com todos os partidos.”

Outra diferença é que o Chega é pró-europeu. “Para se moldar ao euroceticismo de outros partidos da direita, ele adota um discurso de ‘não queremos sair da Europa, mas ela precisa ser modificada’”, explica Marchi. “O Chega diz que a Europa não pode ser um projeto federal governado pelo eixo Paris-Berlim, mas um bloco que garanta a soberania dos Estados e onde todos os membros tenham a mesma importância no Parlamento Europeu.”

A pauta anti-imigração, comum à extrema direita, também passa por algumas adaptações nas mãos do Chega. “Em Portugal, não temos o nível de imigração de países como França e Itália. Temos uma grande comunidade africana, principalmente na área metropolitana de Lisboa, mas que não pode ser criticadas do ponto de vista cultural”, explica Marchi. “Por isso, o Chega não entra nesse discurso. Ele não quer arriscar ser identificado como o ‘Portugal branco’.”

Os eleitores do Chega se diferenciam dos eleitores de outros partidos da extrema direita europeia, afirma Katielle Silva, pesquisadora do Instituto de Ciências Sociais e Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa. “Nos outros países, o perfil do votante de extrema direita é muito mais envelhecido e muito menos instruído”, afirma. 

Ela define dois grupos principais que constituem a base do eleitorado do partido. O primeiro se caracteriza por um sentimento de desproteção. “São pessoas de áreas industrializadas, afetadas por uma economia muito mais globalizada e neoliberal, pelo desmonte de redes de indústrias, pequenos empresários que tiveram seus negócios desmantelados com o aumento das importações”, explica. “É um grupo cuja demanda não foi representada por partidos e cujo processo de avanço do capitalismo levou a dificuldades econômicas.” 

O segundo, por sua vez, é composto por uma elite mais reacionária. “Esse apoio da elite pode ser constatado nas votações em conselhos de maior riqueza, como Cascaes e a zona de Estoril, na região metropolitana”, explica. “Trata-se de uma elite que já era de direita, votava em partidos como o PSD e o CDS e passou a se reconhecer no Chega, sobretudo porque já não se reconhecia na direita que votava.”

Embora André Ventura não goste muito de ser associado a figuras como Jair Bolsonaro e Donald Trump, é inegável que seu programa siga a cartilha da “nova direita” e existam mais semelhanças do que diferenças entre o Chega e seus irmãos radicais de outros países. 

“Embora ele se mostre como uma nova opção de direita, que não é tão extrema, sua comunicação, com base em redes sociais e difusão de fake news, nos mostram que o partido é sim de extrema direita”, afirma Silvia Roque, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. “O Chega acentua o que a direita tradicional pensa e não diz, e tem muitas pautas em comum com outros partidos direitistas radicais, com uma agenda centrada na xenofobia, no antifeminismo e contra a ideologia de gênero.”

André Ventura ganhou fama nacional com uma declaração sobre a comunidade cigana de Portugal. Em 2017, em entrevista ao jornal I, ele declarou que os ciganos viviam de subsídios do Estado português. 

Desde então, a questão se tornou central em sua trajetória. Ventura foi multado mais de uma vez por declarações racistas contra os ciganos. Em uma delas, em 2020, ele disse que “quase 90% da comunidade cigana vive de ‘outras coisas’ que não do seu próprio trabalho.” Ventura também defende bandeiras como a volta da prisão perpétua e a castração química de pedófilos. 

Embora polarizadoras, essas propostas não parecem encontrar ressonância na sociedade portuguesa, afirma Roque. “Esses temas não são relevantes. Nenhuma dessas bandeiras está no ranking das preocupações dos portugueses, que são a corrupção, o desemprego, as questões econômicas e de justiça”, explica. 

“Ainda assim, funciona. São temas tabu em Portugal. Ao tocar neles, Ventura passa a impressão de ser um político que não tem medo de enfrentar o sistema, indo ao encontro de uma parte do eleitorado que é contra a elite política e o politicamente correto.”

Aos poucos, o Chega vem se aproximando de seus pares europeus. Em 2020, ele se juntou ao grupo Identidade e Democracia, que une três partidos de extrema direita, o Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen, a Liga, de Matteo Salvini, e a Alternativa para a Alemanha (AfD), de Tino Chrupalla. “O partido não vem da mesma família da AfD ou de Le Pen. Mas, quando começou a surfar a onda e viu que ela crescia, precisou se aproximar de algumas famílias políticas europeias”, explica Marchi.

Anos após a meteórica ascensão de radicais de direita em outras partes da Europa, o partido Chega, do jurista e ex-comentarista de futebol André Ventura, pode levar a extrema direita portuguesa à relevância pela primeira vez desde a Revolução dos Cravos, em 1974.  Nas eleições de hoje, convocadas após a dissolução do Parlamento, o Chega deve passar de 1 para 10 deputados, segundo pesquisas. O resultado faria do partido a terceira força política e uma peça importante para a governabilidade, em caso de uma coalizão de direita.

O Chega foi criado em 2019, após uma ruptura no Partido Social-Democrata (PSD), que apesar do nome é de centro-direita. O Chega passou em branco nas primeiras eleições – apenas Ventura foi eleito. Mas o cenário mudou em 2021, quando obteve 4,16% dos votos nas autárquicas – legislativas municipais –, um resultado acima de partidos tradicionais.

André Ventura (centro) durante comício em Lisboa; desde o início, partido tentou se distanciar dos companheiros ideológicos europeus Foto: Rodrigo Antunes/EFE/EPA

Em 2021, Ventura ficou em terceiro lugar na corrida presidencial, com 11,9% dos votos, atrás dos 12,9% de Ana Gomes, a segunda colocada. Durante a campanha, ele recebeu apoio da direitista francesa Marine Le Pen. Até 2015, porém, a extrema direita teve dificuldades para decolar em Portugal. 

“Com o fim do governo de Pedro Passos Coelho (2011-2015), que geriu a crise econômica e o resgate financeiro, abriu-se um período de crise na direita portuguesa”, explica Riccardo Marchi, do Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Lisboa. “Essa crise atingiu os dois principais partidos de centro-direita. Rui Rio (líder do PSD) rumou para o centro e Francisco Rodrigues dos Santos (do Centro Democrático Social, o CDS), foi para a direita, sendo contestado pela própria base.”

“Faltava um empreendedor político disposto a capitalizar essa frustração”, explica Marchi. “Havia a velha direita, mas ela não é atrativa para os portugueses que não querem saber dos salazaristas. Neste momento, explica, o populismo de protesto de André Ventura veio a calhar, posicionando-o como o único – e tardio – líder possível.

Desde o início, Ventura tentou se distanciar de seus companheiros ideológicos europeus. “Na extrema direita europeia, há uma lógica de estatização brutal, de querer nacionalizar tudo, desde agências de seguros a prestadoras de serviços. Nós somos o contrário”, disse Ventura, em entrevista ao TSF Rádio-Notícias de Portugal, em 2017. 

Existem, de fato, algumas diferenças entre o Chega e a extrema direita europeia, afirma Marchi. “O Chega é um partido populista de protesto, mas não se apresentou assim. Ele se apresenta como um partido de governo”, explica. “Ele se coloca à disposição para dialogar com todos os partidos.”

Outra diferença é que o Chega é pró-europeu. “Para se moldar ao euroceticismo de outros partidos da direita, ele adota um discurso de ‘não queremos sair da Europa, mas ela precisa ser modificada’”, explica Marchi. “O Chega diz que a Europa não pode ser um projeto federal governado pelo eixo Paris-Berlim, mas um bloco que garanta a soberania dos Estados e onde todos os membros tenham a mesma importância no Parlamento Europeu.”

A pauta anti-imigração, comum à extrema direita, também passa por algumas adaptações nas mãos do Chega. “Em Portugal, não temos o nível de imigração de países como França e Itália. Temos uma grande comunidade africana, principalmente na área metropolitana de Lisboa, mas que não pode ser criticadas do ponto de vista cultural”, explica Marchi. “Por isso, o Chega não entra nesse discurso. Ele não quer arriscar ser identificado como o ‘Portugal branco’.”

Os eleitores do Chega se diferenciam dos eleitores de outros partidos da extrema direita europeia, afirma Katielle Silva, pesquisadora do Instituto de Ciências Sociais e Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa. “Nos outros países, o perfil do votante de extrema direita é muito mais envelhecido e muito menos instruído”, afirma. 

Ela define dois grupos principais que constituem a base do eleitorado do partido. O primeiro se caracteriza por um sentimento de desproteção. “São pessoas de áreas industrializadas, afetadas por uma economia muito mais globalizada e neoliberal, pelo desmonte de redes de indústrias, pequenos empresários que tiveram seus negócios desmantelados com o aumento das importações”, explica. “É um grupo cuja demanda não foi representada por partidos e cujo processo de avanço do capitalismo levou a dificuldades econômicas.” 

O segundo, por sua vez, é composto por uma elite mais reacionária. “Esse apoio da elite pode ser constatado nas votações em conselhos de maior riqueza, como Cascaes e a zona de Estoril, na região metropolitana”, explica. “Trata-se de uma elite que já era de direita, votava em partidos como o PSD e o CDS e passou a se reconhecer no Chega, sobretudo porque já não se reconhecia na direita que votava.”

Embora André Ventura não goste muito de ser associado a figuras como Jair Bolsonaro e Donald Trump, é inegável que seu programa siga a cartilha da “nova direita” e existam mais semelhanças do que diferenças entre o Chega e seus irmãos radicais de outros países. 

“Embora ele se mostre como uma nova opção de direita, que não é tão extrema, sua comunicação, com base em redes sociais e difusão de fake news, nos mostram que o partido é sim de extrema direita”, afirma Silvia Roque, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. “O Chega acentua o que a direita tradicional pensa e não diz, e tem muitas pautas em comum com outros partidos direitistas radicais, com uma agenda centrada na xenofobia, no antifeminismo e contra a ideologia de gênero.”

André Ventura ganhou fama nacional com uma declaração sobre a comunidade cigana de Portugal. Em 2017, em entrevista ao jornal I, ele declarou que os ciganos viviam de subsídios do Estado português. 

Desde então, a questão se tornou central em sua trajetória. Ventura foi multado mais de uma vez por declarações racistas contra os ciganos. Em uma delas, em 2020, ele disse que “quase 90% da comunidade cigana vive de ‘outras coisas’ que não do seu próprio trabalho.” Ventura também defende bandeiras como a volta da prisão perpétua e a castração química de pedófilos. 

Embora polarizadoras, essas propostas não parecem encontrar ressonância na sociedade portuguesa, afirma Roque. “Esses temas não são relevantes. Nenhuma dessas bandeiras está no ranking das preocupações dos portugueses, que são a corrupção, o desemprego, as questões econômicas e de justiça”, explica. 

“Ainda assim, funciona. São temas tabu em Portugal. Ao tocar neles, Ventura passa a impressão de ser um político que não tem medo de enfrentar o sistema, indo ao encontro de uma parte do eleitorado que é contra a elite política e o politicamente correto.”

Aos poucos, o Chega vem se aproximando de seus pares europeus. Em 2020, ele se juntou ao grupo Identidade e Democracia, que une três partidos de extrema direita, o Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen, a Liga, de Matteo Salvini, e a Alternativa para a Alemanha (AfD), de Tino Chrupalla. “O partido não vem da mesma família da AfD ou de Le Pen. Mas, quando começou a surfar a onda e viu que ela crescia, precisou se aproximar de algumas famílias políticas europeias”, explica Marchi.

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