A deputada republicana Liz Cheney anunciou nesta quarta-feira, 17, que está considerando sua própria candidatura à Casa Branca em um esforço total para impedir que Donald Trump ganhe outro mandato como presidente dos Estados Unidos.
Filha do ex-vice-presidente Dick Cheney, ela perdeu sua corrida primária republicana na noite de terça-feira no Estado do Wyoming e não poderá concorrer à reeleição no Congresso americano em novembro. A família Cheney nunca havia perdido uma eleição no Estado em 44 anos.
Sua decisão de sair como candidata à vaga do partido à Casa Branca testaria a viabilidade nacional de uma plataforma conservadora e anti-Trump que fracassou amplamente no Estado de Cheney, que deu ao ex-presidente sua maior margem de vitória em 2016 - mais de 70% dos votos.
A deputada perdeu as primárias do Partido Republicano por mais de 35 pontos porcentuais na terça-feira para Harriet Hageman, a adversária endossada por Trump. Cheney representava a única cadeira do Estado na Câmara, em Washington, desde 2017.
Ao reconhecer a derrota, Cheney prometeu fazer todo o possível para evitar que Trump volte à presidência. “Desde 6 de janeiro eu afirmo que farei o que for preciso para garantir que Donald Trump nunca mais chegue perto do Salão Oval, e estou falando sério”, disse ela a apoiadores em um discurso depois da derrota nas primárias.
Cheney também anunciou a formação de um comitê de ação política, a Grande Tarefa, que teria o objetivo de educar os americanos sobre ameaças à democracia. Esse comitê apresentou uma declaração de organização à Comissão Eleitoral Federal nesta quarta-feira.
O nome se refere ao Discurso de Gettysburg, de 1863, no qual o então presidente Abraham Lincoln disse que: “a grande tarefa que nos resta era garantir que esta nação, sob Deus, tenha um novo nascimento de liberdade, e que o governo do povo, pelo povo, para o povo, não perecerá da terra”.
A expressão é sempre citada por Cheney, incluindo no seu discurso que reconheceu a derrota na noite de terça-feira. Falando com Savannah Guthrie no Today Show da NBC nesta quarta-feira, Cheney inicialmente evitou a questão sobre se ela tinha uma campanha em mente para 2024.
Mas depois de ser pressionada, ela disse: “É algo em que estou pensando e tomarei uma decisão nos próximos meses”. “Acho que derrotá-lo vai exigir uma frente ampla e unida de republicanos, democratas e independentes”, disse ela sobre Trump.
Apoio democrata
Para Cheney, “milhões de republicanos e americanos em todo o país” rejeitaram as ações do ex-presidente, quando ele divulgou “mentiras” sobre a batida do FBI em sua mansão em Mar-a-Lago e demonizou os agentes federais, mesmo quando eles enfrentavam seus apoiadores.
Mas se a maioria dos democratas e independentes se opõem a Trump, os republicanos que o fazem são uma pequena minoria dos eleitores que escolherão o candidato do partido em 2024.
E enquanto alguns democratas em Wyoming mudaram sua filiação partidária para apoiar Cheney em suas primárias, quando a alternativa era uma republicana de extrema direita, dificilmente o farão nacionalmente para apoiar outro nome que não o de um candidato democrata.
Descendente da direita tradicional, pró-armas e anti-aborto, o histórico de Cheney, particularmente em política externa, é uma maldição para muitos democratas, e ela indicou na entrevista na quarta-feira que continuaria a pressionar por políticas que disse que o Partido Republicano “costumava defender”.
Ela citou como exemplo as crenças “em governo e impostos baixos e uma forte defesa nacional” e “que a família tem de ser o centro de nossa comunidade e de nossas vidas”.
Cheney tem ajudado a liderar a investigação da Câmara sobre as ações de Trump e seus aliados em torno do motim no Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, e disse que continuaria esse trabalho nos meses anteriores ao término de seu mandato, em janeiro. Ela também tem criticado os republicanos que se aliaram a Trump em rejeitar a legitimidade da vitória do presidente Joe Biden. A comissão da Câmara investiga se Trump “faltou ao dever” durante o ataque que tentava impedir a certificação de Biden.
Em retaliação, o ex-presidente desencadeou sua fúria sobre Cheney, acusando-a de ser “desleal” e chamando-a de “fracassada que dá lições”. O ex-presidente comemorou a derrota de Cheney, que chamou de “resultado maravilhoso para os Estados Unidos”. “Agora ela pode finalmente desaparecer nas profundezas do esquecimento político onde, tenho certeza, será muito mais feliz do que é agora”, afirmou em sua rede social, Truth Social.
Cheney alertou contra a adoção do “culto à personalidade” de Trump e disse que o país precisa de líderes que cumpram seu juramento “seja ou não politicamente conveniente”. “Kevin McCarthy não se encaixa nesse projeto”, disse ela, referindo-se ao líder republicano da Câmara.
McCarthy está prestes a se tornar presidente da Câmara se os republicanos ganharem o controle da Casa em novembro. Mas quando Guthrie perguntou se o país estaria melhor se os democratas continuassem no poder, Cheney evitou endossar isso diretamente.
“Acho que temos de ter certeza de que estamos lutando contra todos os negadores das eleições”, disse ela. “Os negadores das eleições, neste momento, são os republicanos. E eu acho que não deveria importar de que partido você é. Ninguém deveria votar nessas pessoas ou apoiá-las.”
Para os eleitores de Wyoming que a criticaram por se concentrar demais em Trump e muito pouco nas questões com as quais eles se importavam, ela disse que o ex-presidente representava uma ameaça existencial à democracia americana. “Como nação, não existe a possibilidade de debater e discutir qualquer outro assunto simplesmente virando a cabeça para esse tipo de ameaça fundamental à nossa república.”
Questionada se ela havia julgado mal a compreensão dos eleitores republicanos sobre a importância do dever para com a Constituição, Cheney respondeu: “Donald Trump traiu os eleitores republicanos. Ele mentiu para eles. Aqueles que o apoiam mentiram para eles”. Ela acrescentou: “Eles estão usando o patriotismo das pessoas contra eles”.
No final da entrevista, Guthrie perguntou a Cheney se ela se identificava com as palavras de Obi-Wan Kenobi em sua batalha final com Darth Vader: “Se você me derrubar, eu me tornarei mais poderoso do que você pode imaginar”, que a entrevistadora resumiu como sendo “mais forte na morte política esta manhã”.
“Bem, não vejo isso como morte esta manhã”, disse Cheney. “Meus filhos certamente iriam gostar dessa analogia. Eles ficam assistindo esse vídeo do YouTube pela casa.”/NYT