Filho roubado na ditadura Pinochet, no Chile, abraça a mãe pela primeira vez em 42 anos; veja vídeo


Depois de mais de quatro décadas sem conhecer o paradeiro da mãe biológica, o ex-fuzileiro naval conseguiu abraçá-la após uma jornada de meses para reunir-se com parentes e descobrir detalhes de sua adoção ilegal

Por Nathan Ellgren

WASHINGTON (AP)- “Hola, mamá.”

O que parecia um cumprimento corriqueiro de um filho a sua mãe era, neste caso, completamente o oposto. Quarenta e dois anos antes, uma equipe médica tinha tirado o filho de María Angélica González de seus braços logo após o nascimento, dizendo-lhe que o bebê havia morrido. E naquele momento ela se encontrava cara a cara com o filho dentro de sua residência em Valdivia, no Chile. “Eu te amo muito”, disse à mãe Jimmy Thyden, em espanhol, enquanto ambos se abraçavam às lágrimas.

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“Eu fiquei sem ar. A intensidade daquele momento me deixou tirou o fôlego”, afirmou Jimmy à Associated Press, por meio de videochamada, depois do encontro. “Como você abraça alguém de uma maneira que compense 42 anos de falta de abraços?”

A jornada de Jimmy para encontrar sua família biológica, que ele não conhecia, começou em abril, depois que ele leu reportagens sobre pessoas nascidas no Chile que cresceram em lares adotivos e tinham encontrado parentes com ajuda da ONG chilena Nos Buscamos.

A entidade descobriu que Jimmy nasceu prematuro em um hospital de Santiago, a capital do Chile, e foi colocado numa incubadora. María Angélica recebeu alta do hospital, mas quando voltou para buscar o filho a equipe médica lhe disse que o bebê tinha morrido e que seu corpo havia sido descartado, de acordo com o registro do caso, que Jimmy resumiu à AP.

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Jimmy Thyden, à direita, abraça seu irmão Pablo Leiva Gonzalez enquanto Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, à esquerda, observa em Valdivia, Chile Foto: Constanza Del Rio / AP

“Os documentos da minha adoção me dizem que eu não tenho nenhum parente vivo. E eu descobri nos últimos meses que tenho uma mamá, quatro irmãos e uma irmã”, afirmou Jimmy em entrevista, de Ashburn, Virgínia, onde ele trabalha como advogado criminalista defendendo “pessoas parecidas comigo” e não têm como pagar por representação legal. Ele define seu caso como “adoção ilegal”.

A ONG Nos Buscamos estima que dezenas de milhares de bebês foram roubados de famílias chilenas nos anos 70 e 80 com base em um relatório da Polícia de Investigações do Chile que analisou passaportes de crianças chilenas que deixaram o país e nunca voltaram.

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“A história real é que essas crianças foram roubadas de famílias pobres, de mulheres pobres que não sabiam a verdade. Elas não sabiam como se defender”, afirmou Constanza del Río, fundadora e diretora da entidade.

Jimmy Thyden, à esquerda, dá a mão a Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, quando eles se encontram em Valdivia, Chile, na quinta-feira, 17 de agosto de 2023, pela primeira vez Foto: Constanza Del Rio / AP

Tráfico

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O tráfico de crianças coincidiu com muitas outras violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 17 anos imposta pelo general Augusto Pinochet, que em 11 de setembro de 1973 liderou um golpe de Estado que derrubou o então presidente marxista, Salvador Allende. Durante a ditadura, pelo menos 3.095 pessoas foram mortas, de acordo com registros oficiais, e outras dezenas de milhares foram torturadas ou presas por motivações políticas.

Ao longo dos últimos nove anos, a ONG Nos Buscamos orquestrou mais de 450 encontros entre pessoas adotadas ilegalmente e suas famílias biológicas, afirmou Del Río said.

Outras entidades sem fins lucrativos fazem um trabalho similar, incluindo as ONGs Filhos e Mães do Silêncio, no Chile, e Conectando Raízes, nos Estados Unidos.

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A ONG Nos Buscamos tem trabalhado há dois anos com a plataforma de genealogia MyHeritage, que fornece gratuitamente kits de teste de DNA de coleta domiciliar para chilenos que cresceram em famílias adotivas e possíveis vítimas de tráfico infantil no Chile.

O teste de DNA de Jimmy confirmou que ele é 100% chileno e constatou correspondência genética entre ele e um primo de primeiro grau que também usa a plataforma MyHeritage.

Jimmy Thyden durante a infância nos Estados Unidos. Com 42 anos, Thyden conseguiu viajar ao Chile para conhecer a sua mãe biológica  Foto: Jimmy Thyden/ AP
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Jimmy mandou ao primo a documentação de sua adoção, que incluía o endereço de sua mãe biológica e um nome muito comum no Chile: María Angélica González. E o primo de Jimmy, por sua vez, tinha uma parente chamada María Angélica González no lado materno e o ajudou a fazer a conexão. Mas María Angélica não atendeu seus telefonemas até que ele lhe mandasse uma foto de sua mulher e suas filhas.

“Daí ela desabou”, afirmou Jimmy, que lhe mandou mais fotos da família que o adotou, de seu período no Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, de seu casamento, e de vários outros momentos memoráveis de sua vida.

“Eu tentei contar como foram, do início até aquele momento, os 42 anos da vida que foi tirada dela, tirada de nós dois”, afirmou Jimmy. Ele viajou para o Chile com sua mulher, Johannah, e as duas filhas do casal, Ebba Joy, de 8 anos, e Betty Grace, de 5, para conhecer sua família recém-descoberta.

Jimmy foi recebido com 42 balões coloridos na casa de sua mãe, cada um significando um ano do tempo que ele passou longe de sua família chilena. “Há um empoderamento em estourar esses balões, um empoderamento em estar com sua família e fazer o inventário de tudo que se perdeu”, afirmou ele.

Jimmy lembra da resposta de sua mãe ao ouvir sua voz: “Meu filho, você não tem ideia dos oceanos de lágrimas que eu chorei, de quantas noites eu passei em claro rezando a Deus para me permitir viver o suficiente para saber o que aconteceu com você”.

Jimmy Thyden posa para uma foto com a sua mãe biológica, Maria Angelica Gonzalez em Valdivia, Chile  Foto: Constanza Del Rio / AP

María Angélica preferiu não conceder entrevista para a elaboração desta reportagem.

Jimmy, com sua mulher e filhas, visitou o zoológico de Santiago, onde sua família americana o levou após a adoção. Desta vez, a guia da excursão era sua irmã biológica.

De volta à residência de María Angélica, Jimmy percebeu que compartilha com a mãe o amor pela culinária. “Minhas mãos estão amassando a mesma massa que as mãos da minha mamá” , afirmou ele, enquanto ambos preparavam empanadas para fritar. Jimmy prometeu continuar usando a receita da família para estar conectado com seus parentes e sua cultura.

Jimmy afirmou que seus pais adotivos apoiaram sua jornada para encontrar-se com os parentes perdidos, mas que eles foram “vítimas involuntárias” de uma grande rede ilegal de adoção e têm dificuldade em aceitar a realidade da situação. “Meus pais queriam uma família, mas não desse jeito”, afirmou ele. “Não pela usurpação do próximo, pelo roubo.”

Por meio de um porta-voz, os pais de Jimmy recusaram-se a comentar.

Ainda que tenha sido bem-sucedido em encontrar sua família biológica, Jimmy reconhece que as coisas podem não ir tão bem para outras pessoas adotadas. “A história poderia ter sido muito pior”, afirmou ele. “Tem gente que descobre detalhes realmente escabrosos a respeito de suas origens.”

Quando esteve no Chile, Jimmy e Del Río reuniram-se com um investigador, de um grupo de sete, que trabalha para solucionar casos de adoção ilegal como o dele.

“Nós não queremos dinheiro, nós queremos apenas o reconhecimento humano de que essa coisa horrível aconteceu no Chile e o compromisso que isso não seguirá ocorrendo no futuro”, afirmou Del Río. “Nós estamos tentando fazer a diferença não apenas com Jimmy e sua família; nós queremos fazer isso, operar essa mudança, em todo o país.”

Jimmy também se encontrou com o embaixador chileno nos EUA, Juan Gabriel Valdés, para buscar reconhecimento do governo a respeito da magnitude do esquema ilegal de adoção.

Ele lhe disse que não há nenhum mecanismo, financeiro nem de outro tipo, para ajudar chilenos que cresceram em lares adotivos a visitar seu país natal. Ele lhe disse que vendeu uma caminhonete para conseguir pagar as passagens de avião e outras despesas de viagem de sua família.

“As pessoas precisam poder decidir qual será seu nome, que cidadania terão — devem ter acesso a ambas”, afirmou Jimmy. “Elas devem ter todos os direitos e privilégios dos cidadãos chilenos porque isso foi algo que lhes aconteceu independentemente de sua escolha.”

A Embaixada Chilena em Washington não retornou a um pedido de comentário. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

WASHINGTON (AP)- “Hola, mamá.”

O que parecia um cumprimento corriqueiro de um filho a sua mãe era, neste caso, completamente o oposto. Quarenta e dois anos antes, uma equipe médica tinha tirado o filho de María Angélica González de seus braços logo após o nascimento, dizendo-lhe que o bebê havia morrido. E naquele momento ela se encontrava cara a cara com o filho dentro de sua residência em Valdivia, no Chile. “Eu te amo muito”, disse à mãe Jimmy Thyden, em espanhol, enquanto ambos se abraçavam às lágrimas.

“Eu fiquei sem ar. A intensidade daquele momento me deixou tirou o fôlego”, afirmou Jimmy à Associated Press, por meio de videochamada, depois do encontro. “Como você abraça alguém de uma maneira que compense 42 anos de falta de abraços?”

A jornada de Jimmy para encontrar sua família biológica, que ele não conhecia, começou em abril, depois que ele leu reportagens sobre pessoas nascidas no Chile que cresceram em lares adotivos e tinham encontrado parentes com ajuda da ONG chilena Nos Buscamos.

A entidade descobriu que Jimmy nasceu prematuro em um hospital de Santiago, a capital do Chile, e foi colocado numa incubadora. María Angélica recebeu alta do hospital, mas quando voltou para buscar o filho a equipe médica lhe disse que o bebê tinha morrido e que seu corpo havia sido descartado, de acordo com o registro do caso, que Jimmy resumiu à AP.

Jimmy Thyden, à direita, abraça seu irmão Pablo Leiva Gonzalez enquanto Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, à esquerda, observa em Valdivia, Chile Foto: Constanza Del Rio / AP

“Os documentos da minha adoção me dizem que eu não tenho nenhum parente vivo. E eu descobri nos últimos meses que tenho uma mamá, quatro irmãos e uma irmã”, afirmou Jimmy em entrevista, de Ashburn, Virgínia, onde ele trabalha como advogado criminalista defendendo “pessoas parecidas comigo” e não têm como pagar por representação legal. Ele define seu caso como “adoção ilegal”.

A ONG Nos Buscamos estima que dezenas de milhares de bebês foram roubados de famílias chilenas nos anos 70 e 80 com base em um relatório da Polícia de Investigações do Chile que analisou passaportes de crianças chilenas que deixaram o país e nunca voltaram.

“A história real é que essas crianças foram roubadas de famílias pobres, de mulheres pobres que não sabiam a verdade. Elas não sabiam como se defender”, afirmou Constanza del Río, fundadora e diretora da entidade.

Jimmy Thyden, à esquerda, dá a mão a Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, quando eles se encontram em Valdivia, Chile, na quinta-feira, 17 de agosto de 2023, pela primeira vez Foto: Constanza Del Rio / AP

Tráfico

O tráfico de crianças coincidiu com muitas outras violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 17 anos imposta pelo general Augusto Pinochet, que em 11 de setembro de 1973 liderou um golpe de Estado que derrubou o então presidente marxista, Salvador Allende. Durante a ditadura, pelo menos 3.095 pessoas foram mortas, de acordo com registros oficiais, e outras dezenas de milhares foram torturadas ou presas por motivações políticas.

Ao longo dos últimos nove anos, a ONG Nos Buscamos orquestrou mais de 450 encontros entre pessoas adotadas ilegalmente e suas famílias biológicas, afirmou Del Río said.

Outras entidades sem fins lucrativos fazem um trabalho similar, incluindo as ONGs Filhos e Mães do Silêncio, no Chile, e Conectando Raízes, nos Estados Unidos.

A ONG Nos Buscamos tem trabalhado há dois anos com a plataforma de genealogia MyHeritage, que fornece gratuitamente kits de teste de DNA de coleta domiciliar para chilenos que cresceram em famílias adotivas e possíveis vítimas de tráfico infantil no Chile.

O teste de DNA de Jimmy confirmou que ele é 100% chileno e constatou correspondência genética entre ele e um primo de primeiro grau que também usa a plataforma MyHeritage.

Jimmy Thyden durante a infância nos Estados Unidos. Com 42 anos, Thyden conseguiu viajar ao Chile para conhecer a sua mãe biológica  Foto: Jimmy Thyden/ AP

Jimmy mandou ao primo a documentação de sua adoção, que incluía o endereço de sua mãe biológica e um nome muito comum no Chile: María Angélica González. E o primo de Jimmy, por sua vez, tinha uma parente chamada María Angélica González no lado materno e o ajudou a fazer a conexão. Mas María Angélica não atendeu seus telefonemas até que ele lhe mandasse uma foto de sua mulher e suas filhas.

“Daí ela desabou”, afirmou Jimmy, que lhe mandou mais fotos da família que o adotou, de seu período no Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, de seu casamento, e de vários outros momentos memoráveis de sua vida.

“Eu tentei contar como foram, do início até aquele momento, os 42 anos da vida que foi tirada dela, tirada de nós dois”, afirmou Jimmy. Ele viajou para o Chile com sua mulher, Johannah, e as duas filhas do casal, Ebba Joy, de 8 anos, e Betty Grace, de 5, para conhecer sua família recém-descoberta.

Jimmy foi recebido com 42 balões coloridos na casa de sua mãe, cada um significando um ano do tempo que ele passou longe de sua família chilena. “Há um empoderamento em estourar esses balões, um empoderamento em estar com sua família e fazer o inventário de tudo que se perdeu”, afirmou ele.

Jimmy lembra da resposta de sua mãe ao ouvir sua voz: “Meu filho, você não tem ideia dos oceanos de lágrimas que eu chorei, de quantas noites eu passei em claro rezando a Deus para me permitir viver o suficiente para saber o que aconteceu com você”.

Jimmy Thyden posa para uma foto com a sua mãe biológica, Maria Angelica Gonzalez em Valdivia, Chile  Foto: Constanza Del Rio / AP

María Angélica preferiu não conceder entrevista para a elaboração desta reportagem.

Jimmy, com sua mulher e filhas, visitou o zoológico de Santiago, onde sua família americana o levou após a adoção. Desta vez, a guia da excursão era sua irmã biológica.

De volta à residência de María Angélica, Jimmy percebeu que compartilha com a mãe o amor pela culinária. “Minhas mãos estão amassando a mesma massa que as mãos da minha mamá” , afirmou ele, enquanto ambos preparavam empanadas para fritar. Jimmy prometeu continuar usando a receita da família para estar conectado com seus parentes e sua cultura.

Jimmy afirmou que seus pais adotivos apoiaram sua jornada para encontrar-se com os parentes perdidos, mas que eles foram “vítimas involuntárias” de uma grande rede ilegal de adoção e têm dificuldade em aceitar a realidade da situação. “Meus pais queriam uma família, mas não desse jeito”, afirmou ele. “Não pela usurpação do próximo, pelo roubo.”

Por meio de um porta-voz, os pais de Jimmy recusaram-se a comentar.

Ainda que tenha sido bem-sucedido em encontrar sua família biológica, Jimmy reconhece que as coisas podem não ir tão bem para outras pessoas adotadas. “A história poderia ter sido muito pior”, afirmou ele. “Tem gente que descobre detalhes realmente escabrosos a respeito de suas origens.”

Quando esteve no Chile, Jimmy e Del Río reuniram-se com um investigador, de um grupo de sete, que trabalha para solucionar casos de adoção ilegal como o dele.

“Nós não queremos dinheiro, nós queremos apenas o reconhecimento humano de que essa coisa horrível aconteceu no Chile e o compromisso que isso não seguirá ocorrendo no futuro”, afirmou Del Río. “Nós estamos tentando fazer a diferença não apenas com Jimmy e sua família; nós queremos fazer isso, operar essa mudança, em todo o país.”

Jimmy também se encontrou com o embaixador chileno nos EUA, Juan Gabriel Valdés, para buscar reconhecimento do governo a respeito da magnitude do esquema ilegal de adoção.

Ele lhe disse que não há nenhum mecanismo, financeiro nem de outro tipo, para ajudar chilenos que cresceram em lares adotivos a visitar seu país natal. Ele lhe disse que vendeu uma caminhonete para conseguir pagar as passagens de avião e outras despesas de viagem de sua família.

“As pessoas precisam poder decidir qual será seu nome, que cidadania terão — devem ter acesso a ambas”, afirmou Jimmy. “Elas devem ter todos os direitos e privilégios dos cidadãos chilenos porque isso foi algo que lhes aconteceu independentemente de sua escolha.”

A Embaixada Chilena em Washington não retornou a um pedido de comentário. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

WASHINGTON (AP)- “Hola, mamá.”

O que parecia um cumprimento corriqueiro de um filho a sua mãe era, neste caso, completamente o oposto. Quarenta e dois anos antes, uma equipe médica tinha tirado o filho de María Angélica González de seus braços logo após o nascimento, dizendo-lhe que o bebê havia morrido. E naquele momento ela se encontrava cara a cara com o filho dentro de sua residência em Valdivia, no Chile. “Eu te amo muito”, disse à mãe Jimmy Thyden, em espanhol, enquanto ambos se abraçavam às lágrimas.

“Eu fiquei sem ar. A intensidade daquele momento me deixou tirou o fôlego”, afirmou Jimmy à Associated Press, por meio de videochamada, depois do encontro. “Como você abraça alguém de uma maneira que compense 42 anos de falta de abraços?”

A jornada de Jimmy para encontrar sua família biológica, que ele não conhecia, começou em abril, depois que ele leu reportagens sobre pessoas nascidas no Chile que cresceram em lares adotivos e tinham encontrado parentes com ajuda da ONG chilena Nos Buscamos.

A entidade descobriu que Jimmy nasceu prematuro em um hospital de Santiago, a capital do Chile, e foi colocado numa incubadora. María Angélica recebeu alta do hospital, mas quando voltou para buscar o filho a equipe médica lhe disse que o bebê tinha morrido e que seu corpo havia sido descartado, de acordo com o registro do caso, que Jimmy resumiu à AP.

Jimmy Thyden, à direita, abraça seu irmão Pablo Leiva Gonzalez enquanto Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, à esquerda, observa em Valdivia, Chile Foto: Constanza Del Rio / AP

“Os documentos da minha adoção me dizem que eu não tenho nenhum parente vivo. E eu descobri nos últimos meses que tenho uma mamá, quatro irmãos e uma irmã”, afirmou Jimmy em entrevista, de Ashburn, Virgínia, onde ele trabalha como advogado criminalista defendendo “pessoas parecidas comigo” e não têm como pagar por representação legal. Ele define seu caso como “adoção ilegal”.

A ONG Nos Buscamos estima que dezenas de milhares de bebês foram roubados de famílias chilenas nos anos 70 e 80 com base em um relatório da Polícia de Investigações do Chile que analisou passaportes de crianças chilenas que deixaram o país e nunca voltaram.

“A história real é que essas crianças foram roubadas de famílias pobres, de mulheres pobres que não sabiam a verdade. Elas não sabiam como se defender”, afirmou Constanza del Río, fundadora e diretora da entidade.

Jimmy Thyden, à esquerda, dá a mão a Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, quando eles se encontram em Valdivia, Chile, na quinta-feira, 17 de agosto de 2023, pela primeira vez Foto: Constanza Del Rio / AP

Tráfico

O tráfico de crianças coincidiu com muitas outras violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 17 anos imposta pelo general Augusto Pinochet, que em 11 de setembro de 1973 liderou um golpe de Estado que derrubou o então presidente marxista, Salvador Allende. Durante a ditadura, pelo menos 3.095 pessoas foram mortas, de acordo com registros oficiais, e outras dezenas de milhares foram torturadas ou presas por motivações políticas.

Ao longo dos últimos nove anos, a ONG Nos Buscamos orquestrou mais de 450 encontros entre pessoas adotadas ilegalmente e suas famílias biológicas, afirmou Del Río said.

Outras entidades sem fins lucrativos fazem um trabalho similar, incluindo as ONGs Filhos e Mães do Silêncio, no Chile, e Conectando Raízes, nos Estados Unidos.

A ONG Nos Buscamos tem trabalhado há dois anos com a plataforma de genealogia MyHeritage, que fornece gratuitamente kits de teste de DNA de coleta domiciliar para chilenos que cresceram em famílias adotivas e possíveis vítimas de tráfico infantil no Chile.

O teste de DNA de Jimmy confirmou que ele é 100% chileno e constatou correspondência genética entre ele e um primo de primeiro grau que também usa a plataforma MyHeritage.

Jimmy Thyden durante a infância nos Estados Unidos. Com 42 anos, Thyden conseguiu viajar ao Chile para conhecer a sua mãe biológica  Foto: Jimmy Thyden/ AP

Jimmy mandou ao primo a documentação de sua adoção, que incluía o endereço de sua mãe biológica e um nome muito comum no Chile: María Angélica González. E o primo de Jimmy, por sua vez, tinha uma parente chamada María Angélica González no lado materno e o ajudou a fazer a conexão. Mas María Angélica não atendeu seus telefonemas até que ele lhe mandasse uma foto de sua mulher e suas filhas.

“Daí ela desabou”, afirmou Jimmy, que lhe mandou mais fotos da família que o adotou, de seu período no Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, de seu casamento, e de vários outros momentos memoráveis de sua vida.

“Eu tentei contar como foram, do início até aquele momento, os 42 anos da vida que foi tirada dela, tirada de nós dois”, afirmou Jimmy. Ele viajou para o Chile com sua mulher, Johannah, e as duas filhas do casal, Ebba Joy, de 8 anos, e Betty Grace, de 5, para conhecer sua família recém-descoberta.

Jimmy foi recebido com 42 balões coloridos na casa de sua mãe, cada um significando um ano do tempo que ele passou longe de sua família chilena. “Há um empoderamento em estourar esses balões, um empoderamento em estar com sua família e fazer o inventário de tudo que se perdeu”, afirmou ele.

Jimmy lembra da resposta de sua mãe ao ouvir sua voz: “Meu filho, você não tem ideia dos oceanos de lágrimas que eu chorei, de quantas noites eu passei em claro rezando a Deus para me permitir viver o suficiente para saber o que aconteceu com você”.

Jimmy Thyden posa para uma foto com a sua mãe biológica, Maria Angelica Gonzalez em Valdivia, Chile  Foto: Constanza Del Rio / AP

María Angélica preferiu não conceder entrevista para a elaboração desta reportagem.

Jimmy, com sua mulher e filhas, visitou o zoológico de Santiago, onde sua família americana o levou após a adoção. Desta vez, a guia da excursão era sua irmã biológica.

De volta à residência de María Angélica, Jimmy percebeu que compartilha com a mãe o amor pela culinária. “Minhas mãos estão amassando a mesma massa que as mãos da minha mamá” , afirmou ele, enquanto ambos preparavam empanadas para fritar. Jimmy prometeu continuar usando a receita da família para estar conectado com seus parentes e sua cultura.

Jimmy afirmou que seus pais adotivos apoiaram sua jornada para encontrar-se com os parentes perdidos, mas que eles foram “vítimas involuntárias” de uma grande rede ilegal de adoção e têm dificuldade em aceitar a realidade da situação. “Meus pais queriam uma família, mas não desse jeito”, afirmou ele. “Não pela usurpação do próximo, pelo roubo.”

Por meio de um porta-voz, os pais de Jimmy recusaram-se a comentar.

Ainda que tenha sido bem-sucedido em encontrar sua família biológica, Jimmy reconhece que as coisas podem não ir tão bem para outras pessoas adotadas. “A história poderia ter sido muito pior”, afirmou ele. “Tem gente que descobre detalhes realmente escabrosos a respeito de suas origens.”

Quando esteve no Chile, Jimmy e Del Río reuniram-se com um investigador, de um grupo de sete, que trabalha para solucionar casos de adoção ilegal como o dele.

“Nós não queremos dinheiro, nós queremos apenas o reconhecimento humano de que essa coisa horrível aconteceu no Chile e o compromisso que isso não seguirá ocorrendo no futuro”, afirmou Del Río. “Nós estamos tentando fazer a diferença não apenas com Jimmy e sua família; nós queremos fazer isso, operar essa mudança, em todo o país.”

Jimmy também se encontrou com o embaixador chileno nos EUA, Juan Gabriel Valdés, para buscar reconhecimento do governo a respeito da magnitude do esquema ilegal de adoção.

Ele lhe disse que não há nenhum mecanismo, financeiro nem de outro tipo, para ajudar chilenos que cresceram em lares adotivos a visitar seu país natal. Ele lhe disse que vendeu uma caminhonete para conseguir pagar as passagens de avião e outras despesas de viagem de sua família.

“As pessoas precisam poder decidir qual será seu nome, que cidadania terão — devem ter acesso a ambas”, afirmou Jimmy. “Elas devem ter todos os direitos e privilégios dos cidadãos chilenos porque isso foi algo que lhes aconteceu independentemente de sua escolha.”

A Embaixada Chilena em Washington não retornou a um pedido de comentário. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

WASHINGTON (AP)- “Hola, mamá.”

O que parecia um cumprimento corriqueiro de um filho a sua mãe era, neste caso, completamente o oposto. Quarenta e dois anos antes, uma equipe médica tinha tirado o filho de María Angélica González de seus braços logo após o nascimento, dizendo-lhe que o bebê havia morrido. E naquele momento ela se encontrava cara a cara com o filho dentro de sua residência em Valdivia, no Chile. “Eu te amo muito”, disse à mãe Jimmy Thyden, em espanhol, enquanto ambos se abraçavam às lágrimas.

“Eu fiquei sem ar. A intensidade daquele momento me deixou tirou o fôlego”, afirmou Jimmy à Associated Press, por meio de videochamada, depois do encontro. “Como você abraça alguém de uma maneira que compense 42 anos de falta de abraços?”

A jornada de Jimmy para encontrar sua família biológica, que ele não conhecia, começou em abril, depois que ele leu reportagens sobre pessoas nascidas no Chile que cresceram em lares adotivos e tinham encontrado parentes com ajuda da ONG chilena Nos Buscamos.

A entidade descobriu que Jimmy nasceu prematuro em um hospital de Santiago, a capital do Chile, e foi colocado numa incubadora. María Angélica recebeu alta do hospital, mas quando voltou para buscar o filho a equipe médica lhe disse que o bebê tinha morrido e que seu corpo havia sido descartado, de acordo com o registro do caso, que Jimmy resumiu à AP.

Jimmy Thyden, à direita, abraça seu irmão Pablo Leiva Gonzalez enquanto Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, à esquerda, observa em Valdivia, Chile Foto: Constanza Del Rio / AP

“Os documentos da minha adoção me dizem que eu não tenho nenhum parente vivo. E eu descobri nos últimos meses que tenho uma mamá, quatro irmãos e uma irmã”, afirmou Jimmy em entrevista, de Ashburn, Virgínia, onde ele trabalha como advogado criminalista defendendo “pessoas parecidas comigo” e não têm como pagar por representação legal. Ele define seu caso como “adoção ilegal”.

A ONG Nos Buscamos estima que dezenas de milhares de bebês foram roubados de famílias chilenas nos anos 70 e 80 com base em um relatório da Polícia de Investigações do Chile que analisou passaportes de crianças chilenas que deixaram o país e nunca voltaram.

“A história real é que essas crianças foram roubadas de famílias pobres, de mulheres pobres que não sabiam a verdade. Elas não sabiam como se defender”, afirmou Constanza del Río, fundadora e diretora da entidade.

Jimmy Thyden, à esquerda, dá a mão a Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, quando eles se encontram em Valdivia, Chile, na quinta-feira, 17 de agosto de 2023, pela primeira vez Foto: Constanza Del Rio / AP

Tráfico

O tráfico de crianças coincidiu com muitas outras violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 17 anos imposta pelo general Augusto Pinochet, que em 11 de setembro de 1973 liderou um golpe de Estado que derrubou o então presidente marxista, Salvador Allende. Durante a ditadura, pelo menos 3.095 pessoas foram mortas, de acordo com registros oficiais, e outras dezenas de milhares foram torturadas ou presas por motivações políticas.

Ao longo dos últimos nove anos, a ONG Nos Buscamos orquestrou mais de 450 encontros entre pessoas adotadas ilegalmente e suas famílias biológicas, afirmou Del Río said.

Outras entidades sem fins lucrativos fazem um trabalho similar, incluindo as ONGs Filhos e Mães do Silêncio, no Chile, e Conectando Raízes, nos Estados Unidos.

A ONG Nos Buscamos tem trabalhado há dois anos com a plataforma de genealogia MyHeritage, que fornece gratuitamente kits de teste de DNA de coleta domiciliar para chilenos que cresceram em famílias adotivas e possíveis vítimas de tráfico infantil no Chile.

O teste de DNA de Jimmy confirmou que ele é 100% chileno e constatou correspondência genética entre ele e um primo de primeiro grau que também usa a plataforma MyHeritage.

Jimmy Thyden durante a infância nos Estados Unidos. Com 42 anos, Thyden conseguiu viajar ao Chile para conhecer a sua mãe biológica  Foto: Jimmy Thyden/ AP

Jimmy mandou ao primo a documentação de sua adoção, que incluía o endereço de sua mãe biológica e um nome muito comum no Chile: María Angélica González. E o primo de Jimmy, por sua vez, tinha uma parente chamada María Angélica González no lado materno e o ajudou a fazer a conexão. Mas María Angélica não atendeu seus telefonemas até que ele lhe mandasse uma foto de sua mulher e suas filhas.

“Daí ela desabou”, afirmou Jimmy, que lhe mandou mais fotos da família que o adotou, de seu período no Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, de seu casamento, e de vários outros momentos memoráveis de sua vida.

“Eu tentei contar como foram, do início até aquele momento, os 42 anos da vida que foi tirada dela, tirada de nós dois”, afirmou Jimmy. Ele viajou para o Chile com sua mulher, Johannah, e as duas filhas do casal, Ebba Joy, de 8 anos, e Betty Grace, de 5, para conhecer sua família recém-descoberta.

Jimmy foi recebido com 42 balões coloridos na casa de sua mãe, cada um significando um ano do tempo que ele passou longe de sua família chilena. “Há um empoderamento em estourar esses balões, um empoderamento em estar com sua família e fazer o inventário de tudo que se perdeu”, afirmou ele.

Jimmy lembra da resposta de sua mãe ao ouvir sua voz: “Meu filho, você não tem ideia dos oceanos de lágrimas que eu chorei, de quantas noites eu passei em claro rezando a Deus para me permitir viver o suficiente para saber o que aconteceu com você”.

Jimmy Thyden posa para uma foto com a sua mãe biológica, Maria Angelica Gonzalez em Valdivia, Chile  Foto: Constanza Del Rio / AP

María Angélica preferiu não conceder entrevista para a elaboração desta reportagem.

Jimmy, com sua mulher e filhas, visitou o zoológico de Santiago, onde sua família americana o levou após a adoção. Desta vez, a guia da excursão era sua irmã biológica.

De volta à residência de María Angélica, Jimmy percebeu que compartilha com a mãe o amor pela culinária. “Minhas mãos estão amassando a mesma massa que as mãos da minha mamá” , afirmou ele, enquanto ambos preparavam empanadas para fritar. Jimmy prometeu continuar usando a receita da família para estar conectado com seus parentes e sua cultura.

Jimmy afirmou que seus pais adotivos apoiaram sua jornada para encontrar-se com os parentes perdidos, mas que eles foram “vítimas involuntárias” de uma grande rede ilegal de adoção e têm dificuldade em aceitar a realidade da situação. “Meus pais queriam uma família, mas não desse jeito”, afirmou ele. “Não pela usurpação do próximo, pelo roubo.”

Por meio de um porta-voz, os pais de Jimmy recusaram-se a comentar.

Ainda que tenha sido bem-sucedido em encontrar sua família biológica, Jimmy reconhece que as coisas podem não ir tão bem para outras pessoas adotadas. “A história poderia ter sido muito pior”, afirmou ele. “Tem gente que descobre detalhes realmente escabrosos a respeito de suas origens.”

Quando esteve no Chile, Jimmy e Del Río reuniram-se com um investigador, de um grupo de sete, que trabalha para solucionar casos de adoção ilegal como o dele.

“Nós não queremos dinheiro, nós queremos apenas o reconhecimento humano de que essa coisa horrível aconteceu no Chile e o compromisso que isso não seguirá ocorrendo no futuro”, afirmou Del Río. “Nós estamos tentando fazer a diferença não apenas com Jimmy e sua família; nós queremos fazer isso, operar essa mudança, em todo o país.”

Jimmy também se encontrou com o embaixador chileno nos EUA, Juan Gabriel Valdés, para buscar reconhecimento do governo a respeito da magnitude do esquema ilegal de adoção.

Ele lhe disse que não há nenhum mecanismo, financeiro nem de outro tipo, para ajudar chilenos que cresceram em lares adotivos a visitar seu país natal. Ele lhe disse que vendeu uma caminhonete para conseguir pagar as passagens de avião e outras despesas de viagem de sua família.

“As pessoas precisam poder decidir qual será seu nome, que cidadania terão — devem ter acesso a ambas”, afirmou Jimmy. “Elas devem ter todos os direitos e privilégios dos cidadãos chilenos porque isso foi algo que lhes aconteceu independentemente de sua escolha.”

A Embaixada Chilena em Washington não retornou a um pedido de comentário. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

WASHINGTON (AP)- “Hola, mamá.”

O que parecia um cumprimento corriqueiro de um filho a sua mãe era, neste caso, completamente o oposto. Quarenta e dois anos antes, uma equipe médica tinha tirado o filho de María Angélica González de seus braços logo após o nascimento, dizendo-lhe que o bebê havia morrido. E naquele momento ela se encontrava cara a cara com o filho dentro de sua residência em Valdivia, no Chile. “Eu te amo muito”, disse à mãe Jimmy Thyden, em espanhol, enquanto ambos se abraçavam às lágrimas.

“Eu fiquei sem ar. A intensidade daquele momento me deixou tirou o fôlego”, afirmou Jimmy à Associated Press, por meio de videochamada, depois do encontro. “Como você abraça alguém de uma maneira que compense 42 anos de falta de abraços?”

A jornada de Jimmy para encontrar sua família biológica, que ele não conhecia, começou em abril, depois que ele leu reportagens sobre pessoas nascidas no Chile que cresceram em lares adotivos e tinham encontrado parentes com ajuda da ONG chilena Nos Buscamos.

A entidade descobriu que Jimmy nasceu prematuro em um hospital de Santiago, a capital do Chile, e foi colocado numa incubadora. María Angélica recebeu alta do hospital, mas quando voltou para buscar o filho a equipe médica lhe disse que o bebê tinha morrido e que seu corpo havia sido descartado, de acordo com o registro do caso, que Jimmy resumiu à AP.

Jimmy Thyden, à direita, abraça seu irmão Pablo Leiva Gonzalez enquanto Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, à esquerda, observa em Valdivia, Chile Foto: Constanza Del Rio / AP

“Os documentos da minha adoção me dizem que eu não tenho nenhum parente vivo. E eu descobri nos últimos meses que tenho uma mamá, quatro irmãos e uma irmã”, afirmou Jimmy em entrevista, de Ashburn, Virgínia, onde ele trabalha como advogado criminalista defendendo “pessoas parecidas comigo” e não têm como pagar por representação legal. Ele define seu caso como “adoção ilegal”.

A ONG Nos Buscamos estima que dezenas de milhares de bebês foram roubados de famílias chilenas nos anos 70 e 80 com base em um relatório da Polícia de Investigações do Chile que analisou passaportes de crianças chilenas que deixaram o país e nunca voltaram.

“A história real é que essas crianças foram roubadas de famílias pobres, de mulheres pobres que não sabiam a verdade. Elas não sabiam como se defender”, afirmou Constanza del Río, fundadora e diretora da entidade.

Jimmy Thyden, à esquerda, dá a mão a Maria Angelica Gonzalez, sua mãe biológica chilena, quando eles se encontram em Valdivia, Chile, na quinta-feira, 17 de agosto de 2023, pela primeira vez Foto: Constanza Del Rio / AP

Tráfico

O tráfico de crianças coincidiu com muitas outras violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 17 anos imposta pelo general Augusto Pinochet, que em 11 de setembro de 1973 liderou um golpe de Estado que derrubou o então presidente marxista, Salvador Allende. Durante a ditadura, pelo menos 3.095 pessoas foram mortas, de acordo com registros oficiais, e outras dezenas de milhares foram torturadas ou presas por motivações políticas.

Ao longo dos últimos nove anos, a ONG Nos Buscamos orquestrou mais de 450 encontros entre pessoas adotadas ilegalmente e suas famílias biológicas, afirmou Del Río said.

Outras entidades sem fins lucrativos fazem um trabalho similar, incluindo as ONGs Filhos e Mães do Silêncio, no Chile, e Conectando Raízes, nos Estados Unidos.

A ONG Nos Buscamos tem trabalhado há dois anos com a plataforma de genealogia MyHeritage, que fornece gratuitamente kits de teste de DNA de coleta domiciliar para chilenos que cresceram em famílias adotivas e possíveis vítimas de tráfico infantil no Chile.

O teste de DNA de Jimmy confirmou que ele é 100% chileno e constatou correspondência genética entre ele e um primo de primeiro grau que também usa a plataforma MyHeritage.

Jimmy Thyden durante a infância nos Estados Unidos. Com 42 anos, Thyden conseguiu viajar ao Chile para conhecer a sua mãe biológica  Foto: Jimmy Thyden/ AP

Jimmy mandou ao primo a documentação de sua adoção, que incluía o endereço de sua mãe biológica e um nome muito comum no Chile: María Angélica González. E o primo de Jimmy, por sua vez, tinha uma parente chamada María Angélica González no lado materno e o ajudou a fazer a conexão. Mas María Angélica não atendeu seus telefonemas até que ele lhe mandasse uma foto de sua mulher e suas filhas.

“Daí ela desabou”, afirmou Jimmy, que lhe mandou mais fotos da família que o adotou, de seu período no Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, de seu casamento, e de vários outros momentos memoráveis de sua vida.

“Eu tentei contar como foram, do início até aquele momento, os 42 anos da vida que foi tirada dela, tirada de nós dois”, afirmou Jimmy. Ele viajou para o Chile com sua mulher, Johannah, e as duas filhas do casal, Ebba Joy, de 8 anos, e Betty Grace, de 5, para conhecer sua família recém-descoberta.

Jimmy foi recebido com 42 balões coloridos na casa de sua mãe, cada um significando um ano do tempo que ele passou longe de sua família chilena. “Há um empoderamento em estourar esses balões, um empoderamento em estar com sua família e fazer o inventário de tudo que se perdeu”, afirmou ele.

Jimmy lembra da resposta de sua mãe ao ouvir sua voz: “Meu filho, você não tem ideia dos oceanos de lágrimas que eu chorei, de quantas noites eu passei em claro rezando a Deus para me permitir viver o suficiente para saber o que aconteceu com você”.

Jimmy Thyden posa para uma foto com a sua mãe biológica, Maria Angelica Gonzalez em Valdivia, Chile  Foto: Constanza Del Rio / AP

María Angélica preferiu não conceder entrevista para a elaboração desta reportagem.

Jimmy, com sua mulher e filhas, visitou o zoológico de Santiago, onde sua família americana o levou após a adoção. Desta vez, a guia da excursão era sua irmã biológica.

De volta à residência de María Angélica, Jimmy percebeu que compartilha com a mãe o amor pela culinária. “Minhas mãos estão amassando a mesma massa que as mãos da minha mamá” , afirmou ele, enquanto ambos preparavam empanadas para fritar. Jimmy prometeu continuar usando a receita da família para estar conectado com seus parentes e sua cultura.

Jimmy afirmou que seus pais adotivos apoiaram sua jornada para encontrar-se com os parentes perdidos, mas que eles foram “vítimas involuntárias” de uma grande rede ilegal de adoção e têm dificuldade em aceitar a realidade da situação. “Meus pais queriam uma família, mas não desse jeito”, afirmou ele. “Não pela usurpação do próximo, pelo roubo.”

Por meio de um porta-voz, os pais de Jimmy recusaram-se a comentar.

Ainda que tenha sido bem-sucedido em encontrar sua família biológica, Jimmy reconhece que as coisas podem não ir tão bem para outras pessoas adotadas. “A história poderia ter sido muito pior”, afirmou ele. “Tem gente que descobre detalhes realmente escabrosos a respeito de suas origens.”

Quando esteve no Chile, Jimmy e Del Río reuniram-se com um investigador, de um grupo de sete, que trabalha para solucionar casos de adoção ilegal como o dele.

“Nós não queremos dinheiro, nós queremos apenas o reconhecimento humano de que essa coisa horrível aconteceu no Chile e o compromisso que isso não seguirá ocorrendo no futuro”, afirmou Del Río. “Nós estamos tentando fazer a diferença não apenas com Jimmy e sua família; nós queremos fazer isso, operar essa mudança, em todo o país.”

Jimmy também se encontrou com o embaixador chileno nos EUA, Juan Gabriel Valdés, para buscar reconhecimento do governo a respeito da magnitude do esquema ilegal de adoção.

Ele lhe disse que não há nenhum mecanismo, financeiro nem de outro tipo, para ajudar chilenos que cresceram em lares adotivos a visitar seu país natal. Ele lhe disse que vendeu uma caminhonete para conseguir pagar as passagens de avião e outras despesas de viagem de sua família.

“As pessoas precisam poder decidir qual será seu nome, que cidadania terão — devem ter acesso a ambas”, afirmou Jimmy. “Elas devem ter todos os direitos e privilégios dos cidadãos chilenos porque isso foi algo que lhes aconteceu independentemente de sua escolha.”

A Embaixada Chilena em Washington não retornou a um pedido de comentário. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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