Giorgia Meloni tenta consolidar protagonismo na direita europeia ao sediar o G-7 na Itália


Ao se tornar primeira-ministra, ela provocou arrepios no establishment, em razão de suas credenciais de extrema direita, mas agora o establishment passou a considerá-la uma parceira pragmática

Por Emma Bubola

Cinco anos atrás, quando seu partido conquistou 6% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu, Giorgia Meloni tentou celebrar com uma garrafa de vinho espumante, mas sua rolha se despedaçou constrangedoramente entre alguns apoiadores.

Nesta semana, Meloni, hoje primeira-ministra da Itália, emergiu como uma grande vencedora nas eleições e, juntamente com dúzias de membros de seu partido, Irmãos de Itália, celebrou o resultado em um hotel 5 estrelas em Roma, onde garçons traziam espumantes em bacias de gelo. Seu partido de extrema direita conquistou cerca de 29% dos votos. A vitória foi ainda mais significativa porque Meloni foi a única líder de um grande país da Europa Ocidental a emergir fortalecida da eleição.

Para Meloni, o impulso não poderia ter vindo em momento melhor. Todos os olhares voltam-se para a Itália nesta semana, conforme Meloni prepara-se para receber a cúpula do Grupo dos 7 países com grandes economias por três dias a partir desta quinta-feira, 13. Mais uma oportunidade para Meloni se definir como líder legítima no clube dos líderes mais influentes do mundo.

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“Esta nação vai ao G-7 e à Europa com o governo mais forte de todos”, disse ela a apoiadores na manhã da segunda-feira, após os resultados serem revelados. “Não conseguiram nos impedir.”

A primeira-ministra da Itália e líder do partido de extrema direita Irmãos da Itália, Giorgia Meloni, participa de uma coletiva de imprensa em Roma após as eleições do Parlamento Europeu  Foto: Filippo Monteforte/AFP

Virada para a direita

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As eleições europeias marcaram uma virada para a direita não apenas no Parlamento Europeu, mas em toda a política europeia. Meloni fez de si mesma protagonista desse movimento, trabalhando para liderar a entrada da extrema direita no mainstream.

Ao se tornar primeira-ministra, em 2022, ela provocou arrepios no establishment europeu, em razão de suas credenciais de extrema direita e eurocéticas, assim como suas raízes pós-fascistas. O establishment passou a considerá-la uma parceira pragmática em assuntos internacionais críticos.

A estratégia de Meloni serve como modelo para outros líderes em busca de caminhos para entrar no mainstream.

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Na França, Marine Le Pen abrandou suas posições em relação a temas importantes e lustrou sua imagem. Seu partido, Reagrupamento Nacional, obteve um resultado tão forte nas eleições europeias, com mais de 30% dos votos, que o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições parlamentares.

“O governo de Giorgia Meloni contaminou positivamente a Europa”, afirmou o legislador do Irmãos de Itália Giovanni Donzelli, na noite do domingo. “Um muro ruiu em toda a Europa: perceberam que a direita pode governar bem.”

A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, vota nas eleições para o Parlamento Europeu em Roma, Itália  Foto: Mauro Scrobogna/AP
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Alianças

Nos meses recentes, Meloni tem sido cortejada tanto pelo centro europeu como potencial aliada quanto por partidos ainda mais à direita que o dela, conforme tentam criar uma frente nacionalista unida.

Ainda que o centro tenha se mantido no novo Parlamento Europeu, Meloni ainda poderá emergir como figura determinante em votações individuais, incluindo, mais imediatamente, para a reeleição da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que precisa da aprovação da legislatura para assegurar um segundo mandato.

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Meloni, afirmaram especialistas, pode decidir apoiar Von der Leyen para exercer mais influência em Bruxelas.

“Meloni será uma grande jogadora na Europa”, afirmou o diretor para Europa da consultoria Eurasia Group, Mujtaba Rahman. “Se pender para o centro e for construtiva, Meloni receberá muitas recompensas.”

Na arena internacional mais ampla, Meloni também fez se si mesma uma jogadora crítica em temas como o apoio à Ucrânia, o que a distinguiu em relação a outros setores da extrema direita que tendem a ser mais pró-Rússia.

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A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, participa de uma coletiva de imprensa ao lado da primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni  Foto: Cecilia Fabiano/AP

Isso a colocou em boa posição no grupo de líderes ocidentais que se reunirá nesta semana na região de Apúlia, no sul da Itália, especialmente após a eleição.

“Todas as luzes estão nela”, afirmou o cientista político Roberto D’Alimonte, da universidade LUISS Guido Carli, em Roma. “Sua imagem está ainda mais reforçada.”

Deverão estar presentes na cúpula do G-7 o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden; o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau; Rishi Sunak, do Reino Unido; o presidente da França, Emmanuel Macron; o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz; e o primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida. Von der Leyen e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, também planejam comparecer.

Meloni também convidou o papa Francisco; o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski; o recém-reeleito primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi; e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, entre outros, incluindo vários líderes africanos. Ela prometeu colocar parte do foco da cúpula sobre seu plano de desenvolvimento e cooperação com a África.

A reunião ocorrerá em Borgo Egnazia, um resort de luxo com piscinas reluzentes cercadas de arbustos de alecrim e oliveiras. Suas casas de pedra e villas são abastecidas com cestas de amêndoas e limões e suas estreitas vielas são delineadas por bicicletas enferrujadas e carroças de madeira carregadas de sinais dos tempos.

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, conversa com a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, em Bruxelas, Bélgica  Foto: Geert Vanden Wijngaert/AP

O detalhe, porém, é que o lugar foi construído no início dos anos 2000, em uma terra devastada por Mussolini para a construção de uma base aérea. O resort é uma réplica de uma ancestral cidade e casa rural apuliana, em um projeto que alguns moradores da região compararam a um “vilarejo Potemkin no Mediterrâneo”.

Os líderes mundiais sucederão hóspedes como Madonna, os Beckhams e Justin Timberlake e Jessica Biel, que se casaram no resort.

“Meloni quis causar uma ótima impressão. E estou certo de que conseguirá”, afirmou o comerciante Romeo Di Bari, de 41 anos, dono de uma loja em Alberobello, que está na agenda de visitas dos parceiros dos líderes e onde, numa tarde recente, namorados ajoelhavam-se sobre os paralelepípedos para fotografar suas namoradas girando entre as singulares e pontudas cabanas trulli da região.

Perto de lá, na cidade de Bari, os moradores elogiaram Meloni por trazer um novo prestígio à sua região e ao seu país.

“Nossa nação está na dianteira”, afirmou o topógrafo aposentado Giovanni Pirlo, de 68 anos. “Nossa nação sempre foi escanteada; agora, com Meloni, algo está mudando.”

Equilíbrio

Meloni realizou um delicado ato de equilíbrio ao aderir ao establishment europeu em temas internacionais ao mesmo tempo agradando sua base doméstica com posições linha-dura sobre aborto ou direitos LGBT+, que lhe custam pouco na Europa (e em dinheiro).

Meloni também jogou com seus papéis enquanto mulher do povo e estadista internacional. Insistiu que os italianos se referissem a ela pelo primeiro nome, pedindo-lhes para escrever “Giorgia” nas cédulas, e garante que defende os interesses da Itália em Bruxelas ajudando a aprovar políticas conservadoras sobre imigração e meio ambiente.

Em seu país, Meloni preside uma coalizão estável, apoiada por dois partidos mais fracos que precisam dela desesperadamente para permanecer no poder. O partido Força Itália, cujo fundador Silvio Berlusconi morreu no ano passado, obteve cerca de 10% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu após uma campanha fantasmagórica, que imprimiu o nome e a foto de Berlusconi nos cartazes. A Liga, partido de Matteo Salvini, que dialoga com o flanco à direita do eleitorado de Meloni, baixou sua votação para 9% este ano, de 34% em 2019.

O Castelo Suábio de Brindisi sediará o jantar de boas-vindas da Cúpula do G7, no dia 12 de junho de 2024 no porto de Brindisi, Itália Foto: Piero Cruciatti/AFP

Segundo especialistas, o maior desafio que restou à líder nacionalista da Itália talvez tenha sido seu próprio país.

A produtividade da Itália defasou em comparação ao índice da União Europeia, e os salários estão em grande medida estagnados. Ainda que o desemprego tenha diminuído na Itália, entre os jovens no sul do país o desemprego continua generalizado, e dezenas de milhares de jovens italianos deixam o país anualmente.

Na cidade de Savelletri, na esquina do resort que receberá o G-7, moradores locais matavam o tempo em um café próximo a dois helipontos construídos recentemente, enquanto caminhões militares circulavam.

O pescador Stefano Martellotta, de 51 anos, afirmou que não se preocupa muito com o que chamou de “show” do G-7. Ele se preocupa com seus dois filhos, de 22 e 27 anos, que tiveram de se mudar para os Países Baixos para trabalhar em cozinhas de restaurantes, porque na Itália “ninguém lhes paga um salário digno”, afirmou ele.

“Isso é dramático para a gente, nossos jovens indo embora”, afirmou Annamaria Santorsola, de 75 anos, mãe e avó, acrescentando que sua região precisa “de empregos, não do G-7″. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Cinco anos atrás, quando seu partido conquistou 6% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu, Giorgia Meloni tentou celebrar com uma garrafa de vinho espumante, mas sua rolha se despedaçou constrangedoramente entre alguns apoiadores.

Nesta semana, Meloni, hoje primeira-ministra da Itália, emergiu como uma grande vencedora nas eleições e, juntamente com dúzias de membros de seu partido, Irmãos de Itália, celebrou o resultado em um hotel 5 estrelas em Roma, onde garçons traziam espumantes em bacias de gelo. Seu partido de extrema direita conquistou cerca de 29% dos votos. A vitória foi ainda mais significativa porque Meloni foi a única líder de um grande país da Europa Ocidental a emergir fortalecida da eleição.

Para Meloni, o impulso não poderia ter vindo em momento melhor. Todos os olhares voltam-se para a Itália nesta semana, conforme Meloni prepara-se para receber a cúpula do Grupo dos 7 países com grandes economias por três dias a partir desta quinta-feira, 13. Mais uma oportunidade para Meloni se definir como líder legítima no clube dos líderes mais influentes do mundo.

“Esta nação vai ao G-7 e à Europa com o governo mais forte de todos”, disse ela a apoiadores na manhã da segunda-feira, após os resultados serem revelados. “Não conseguiram nos impedir.”

A primeira-ministra da Itália e líder do partido de extrema direita Irmãos da Itália, Giorgia Meloni, participa de uma coletiva de imprensa em Roma após as eleições do Parlamento Europeu  Foto: Filippo Monteforte/AFP

Virada para a direita

As eleições europeias marcaram uma virada para a direita não apenas no Parlamento Europeu, mas em toda a política europeia. Meloni fez de si mesma protagonista desse movimento, trabalhando para liderar a entrada da extrema direita no mainstream.

Ao se tornar primeira-ministra, em 2022, ela provocou arrepios no establishment europeu, em razão de suas credenciais de extrema direita e eurocéticas, assim como suas raízes pós-fascistas. O establishment passou a considerá-la uma parceira pragmática em assuntos internacionais críticos.

A estratégia de Meloni serve como modelo para outros líderes em busca de caminhos para entrar no mainstream.

Na França, Marine Le Pen abrandou suas posições em relação a temas importantes e lustrou sua imagem. Seu partido, Reagrupamento Nacional, obteve um resultado tão forte nas eleições europeias, com mais de 30% dos votos, que o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições parlamentares.

“O governo de Giorgia Meloni contaminou positivamente a Europa”, afirmou o legislador do Irmãos de Itália Giovanni Donzelli, na noite do domingo. “Um muro ruiu em toda a Europa: perceberam que a direita pode governar bem.”

A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, vota nas eleições para o Parlamento Europeu em Roma, Itália  Foto: Mauro Scrobogna/AP

Alianças

Nos meses recentes, Meloni tem sido cortejada tanto pelo centro europeu como potencial aliada quanto por partidos ainda mais à direita que o dela, conforme tentam criar uma frente nacionalista unida.

Ainda que o centro tenha se mantido no novo Parlamento Europeu, Meloni ainda poderá emergir como figura determinante em votações individuais, incluindo, mais imediatamente, para a reeleição da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que precisa da aprovação da legislatura para assegurar um segundo mandato.

Meloni, afirmaram especialistas, pode decidir apoiar Von der Leyen para exercer mais influência em Bruxelas.

“Meloni será uma grande jogadora na Europa”, afirmou o diretor para Europa da consultoria Eurasia Group, Mujtaba Rahman. “Se pender para o centro e for construtiva, Meloni receberá muitas recompensas.”

Na arena internacional mais ampla, Meloni também fez se si mesma uma jogadora crítica em temas como o apoio à Ucrânia, o que a distinguiu em relação a outros setores da extrema direita que tendem a ser mais pró-Rússia.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, participa de uma coletiva de imprensa ao lado da primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni  Foto: Cecilia Fabiano/AP

Isso a colocou em boa posição no grupo de líderes ocidentais que se reunirá nesta semana na região de Apúlia, no sul da Itália, especialmente após a eleição.

“Todas as luzes estão nela”, afirmou o cientista político Roberto D’Alimonte, da universidade LUISS Guido Carli, em Roma. “Sua imagem está ainda mais reforçada.”

Deverão estar presentes na cúpula do G-7 o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden; o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau; Rishi Sunak, do Reino Unido; o presidente da França, Emmanuel Macron; o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz; e o primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida. Von der Leyen e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, também planejam comparecer.

Meloni também convidou o papa Francisco; o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski; o recém-reeleito primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi; e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, entre outros, incluindo vários líderes africanos. Ela prometeu colocar parte do foco da cúpula sobre seu plano de desenvolvimento e cooperação com a África.

A reunião ocorrerá em Borgo Egnazia, um resort de luxo com piscinas reluzentes cercadas de arbustos de alecrim e oliveiras. Suas casas de pedra e villas são abastecidas com cestas de amêndoas e limões e suas estreitas vielas são delineadas por bicicletas enferrujadas e carroças de madeira carregadas de sinais dos tempos.

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, conversa com a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, em Bruxelas, Bélgica  Foto: Geert Vanden Wijngaert/AP

O detalhe, porém, é que o lugar foi construído no início dos anos 2000, em uma terra devastada por Mussolini para a construção de uma base aérea. O resort é uma réplica de uma ancestral cidade e casa rural apuliana, em um projeto que alguns moradores da região compararam a um “vilarejo Potemkin no Mediterrâneo”.

Os líderes mundiais sucederão hóspedes como Madonna, os Beckhams e Justin Timberlake e Jessica Biel, que se casaram no resort.

“Meloni quis causar uma ótima impressão. E estou certo de que conseguirá”, afirmou o comerciante Romeo Di Bari, de 41 anos, dono de uma loja em Alberobello, que está na agenda de visitas dos parceiros dos líderes e onde, numa tarde recente, namorados ajoelhavam-se sobre os paralelepípedos para fotografar suas namoradas girando entre as singulares e pontudas cabanas trulli da região.

Perto de lá, na cidade de Bari, os moradores elogiaram Meloni por trazer um novo prestígio à sua região e ao seu país.

“Nossa nação está na dianteira”, afirmou o topógrafo aposentado Giovanni Pirlo, de 68 anos. “Nossa nação sempre foi escanteada; agora, com Meloni, algo está mudando.”

Equilíbrio

Meloni realizou um delicado ato de equilíbrio ao aderir ao establishment europeu em temas internacionais ao mesmo tempo agradando sua base doméstica com posições linha-dura sobre aborto ou direitos LGBT+, que lhe custam pouco na Europa (e em dinheiro).

Meloni também jogou com seus papéis enquanto mulher do povo e estadista internacional. Insistiu que os italianos se referissem a ela pelo primeiro nome, pedindo-lhes para escrever “Giorgia” nas cédulas, e garante que defende os interesses da Itália em Bruxelas ajudando a aprovar políticas conservadoras sobre imigração e meio ambiente.

Em seu país, Meloni preside uma coalizão estável, apoiada por dois partidos mais fracos que precisam dela desesperadamente para permanecer no poder. O partido Força Itália, cujo fundador Silvio Berlusconi morreu no ano passado, obteve cerca de 10% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu após uma campanha fantasmagórica, que imprimiu o nome e a foto de Berlusconi nos cartazes. A Liga, partido de Matteo Salvini, que dialoga com o flanco à direita do eleitorado de Meloni, baixou sua votação para 9% este ano, de 34% em 2019.

O Castelo Suábio de Brindisi sediará o jantar de boas-vindas da Cúpula do G7, no dia 12 de junho de 2024 no porto de Brindisi, Itália Foto: Piero Cruciatti/AFP

Segundo especialistas, o maior desafio que restou à líder nacionalista da Itália talvez tenha sido seu próprio país.

A produtividade da Itália defasou em comparação ao índice da União Europeia, e os salários estão em grande medida estagnados. Ainda que o desemprego tenha diminuído na Itália, entre os jovens no sul do país o desemprego continua generalizado, e dezenas de milhares de jovens italianos deixam o país anualmente.

Na cidade de Savelletri, na esquina do resort que receberá o G-7, moradores locais matavam o tempo em um café próximo a dois helipontos construídos recentemente, enquanto caminhões militares circulavam.

O pescador Stefano Martellotta, de 51 anos, afirmou que não se preocupa muito com o que chamou de “show” do G-7. Ele se preocupa com seus dois filhos, de 22 e 27 anos, que tiveram de se mudar para os Países Baixos para trabalhar em cozinhas de restaurantes, porque na Itália “ninguém lhes paga um salário digno”, afirmou ele.

“Isso é dramático para a gente, nossos jovens indo embora”, afirmou Annamaria Santorsola, de 75 anos, mãe e avó, acrescentando que sua região precisa “de empregos, não do G-7″. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Cinco anos atrás, quando seu partido conquistou 6% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu, Giorgia Meloni tentou celebrar com uma garrafa de vinho espumante, mas sua rolha se despedaçou constrangedoramente entre alguns apoiadores.

Nesta semana, Meloni, hoje primeira-ministra da Itália, emergiu como uma grande vencedora nas eleições e, juntamente com dúzias de membros de seu partido, Irmãos de Itália, celebrou o resultado em um hotel 5 estrelas em Roma, onde garçons traziam espumantes em bacias de gelo. Seu partido de extrema direita conquistou cerca de 29% dos votos. A vitória foi ainda mais significativa porque Meloni foi a única líder de um grande país da Europa Ocidental a emergir fortalecida da eleição.

Para Meloni, o impulso não poderia ter vindo em momento melhor. Todos os olhares voltam-se para a Itália nesta semana, conforme Meloni prepara-se para receber a cúpula do Grupo dos 7 países com grandes economias por três dias a partir desta quinta-feira, 13. Mais uma oportunidade para Meloni se definir como líder legítima no clube dos líderes mais influentes do mundo.

“Esta nação vai ao G-7 e à Europa com o governo mais forte de todos”, disse ela a apoiadores na manhã da segunda-feira, após os resultados serem revelados. “Não conseguiram nos impedir.”

A primeira-ministra da Itália e líder do partido de extrema direita Irmãos da Itália, Giorgia Meloni, participa de uma coletiva de imprensa em Roma após as eleições do Parlamento Europeu  Foto: Filippo Monteforte/AFP

Virada para a direita

As eleições europeias marcaram uma virada para a direita não apenas no Parlamento Europeu, mas em toda a política europeia. Meloni fez de si mesma protagonista desse movimento, trabalhando para liderar a entrada da extrema direita no mainstream.

Ao se tornar primeira-ministra, em 2022, ela provocou arrepios no establishment europeu, em razão de suas credenciais de extrema direita e eurocéticas, assim como suas raízes pós-fascistas. O establishment passou a considerá-la uma parceira pragmática em assuntos internacionais críticos.

A estratégia de Meloni serve como modelo para outros líderes em busca de caminhos para entrar no mainstream.

Na França, Marine Le Pen abrandou suas posições em relação a temas importantes e lustrou sua imagem. Seu partido, Reagrupamento Nacional, obteve um resultado tão forte nas eleições europeias, com mais de 30% dos votos, que o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições parlamentares.

“O governo de Giorgia Meloni contaminou positivamente a Europa”, afirmou o legislador do Irmãos de Itália Giovanni Donzelli, na noite do domingo. “Um muro ruiu em toda a Europa: perceberam que a direita pode governar bem.”

A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, vota nas eleições para o Parlamento Europeu em Roma, Itália  Foto: Mauro Scrobogna/AP

Alianças

Nos meses recentes, Meloni tem sido cortejada tanto pelo centro europeu como potencial aliada quanto por partidos ainda mais à direita que o dela, conforme tentam criar uma frente nacionalista unida.

Ainda que o centro tenha se mantido no novo Parlamento Europeu, Meloni ainda poderá emergir como figura determinante em votações individuais, incluindo, mais imediatamente, para a reeleição da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que precisa da aprovação da legislatura para assegurar um segundo mandato.

Meloni, afirmaram especialistas, pode decidir apoiar Von der Leyen para exercer mais influência em Bruxelas.

“Meloni será uma grande jogadora na Europa”, afirmou o diretor para Europa da consultoria Eurasia Group, Mujtaba Rahman. “Se pender para o centro e for construtiva, Meloni receberá muitas recompensas.”

Na arena internacional mais ampla, Meloni também fez se si mesma uma jogadora crítica em temas como o apoio à Ucrânia, o que a distinguiu em relação a outros setores da extrema direita que tendem a ser mais pró-Rússia.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, participa de uma coletiva de imprensa ao lado da primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni  Foto: Cecilia Fabiano/AP

Isso a colocou em boa posição no grupo de líderes ocidentais que se reunirá nesta semana na região de Apúlia, no sul da Itália, especialmente após a eleição.

“Todas as luzes estão nela”, afirmou o cientista político Roberto D’Alimonte, da universidade LUISS Guido Carli, em Roma. “Sua imagem está ainda mais reforçada.”

Deverão estar presentes na cúpula do G-7 o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden; o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau; Rishi Sunak, do Reino Unido; o presidente da França, Emmanuel Macron; o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz; e o primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida. Von der Leyen e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, também planejam comparecer.

Meloni também convidou o papa Francisco; o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski; o recém-reeleito primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi; e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, entre outros, incluindo vários líderes africanos. Ela prometeu colocar parte do foco da cúpula sobre seu plano de desenvolvimento e cooperação com a África.

A reunião ocorrerá em Borgo Egnazia, um resort de luxo com piscinas reluzentes cercadas de arbustos de alecrim e oliveiras. Suas casas de pedra e villas são abastecidas com cestas de amêndoas e limões e suas estreitas vielas são delineadas por bicicletas enferrujadas e carroças de madeira carregadas de sinais dos tempos.

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, conversa com a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, em Bruxelas, Bélgica  Foto: Geert Vanden Wijngaert/AP

O detalhe, porém, é que o lugar foi construído no início dos anos 2000, em uma terra devastada por Mussolini para a construção de uma base aérea. O resort é uma réplica de uma ancestral cidade e casa rural apuliana, em um projeto que alguns moradores da região compararam a um “vilarejo Potemkin no Mediterrâneo”.

Os líderes mundiais sucederão hóspedes como Madonna, os Beckhams e Justin Timberlake e Jessica Biel, que se casaram no resort.

“Meloni quis causar uma ótima impressão. E estou certo de que conseguirá”, afirmou o comerciante Romeo Di Bari, de 41 anos, dono de uma loja em Alberobello, que está na agenda de visitas dos parceiros dos líderes e onde, numa tarde recente, namorados ajoelhavam-se sobre os paralelepípedos para fotografar suas namoradas girando entre as singulares e pontudas cabanas trulli da região.

Perto de lá, na cidade de Bari, os moradores elogiaram Meloni por trazer um novo prestígio à sua região e ao seu país.

“Nossa nação está na dianteira”, afirmou o topógrafo aposentado Giovanni Pirlo, de 68 anos. “Nossa nação sempre foi escanteada; agora, com Meloni, algo está mudando.”

Equilíbrio

Meloni realizou um delicado ato de equilíbrio ao aderir ao establishment europeu em temas internacionais ao mesmo tempo agradando sua base doméstica com posições linha-dura sobre aborto ou direitos LGBT+, que lhe custam pouco na Europa (e em dinheiro).

Meloni também jogou com seus papéis enquanto mulher do povo e estadista internacional. Insistiu que os italianos se referissem a ela pelo primeiro nome, pedindo-lhes para escrever “Giorgia” nas cédulas, e garante que defende os interesses da Itália em Bruxelas ajudando a aprovar políticas conservadoras sobre imigração e meio ambiente.

Em seu país, Meloni preside uma coalizão estável, apoiada por dois partidos mais fracos que precisam dela desesperadamente para permanecer no poder. O partido Força Itália, cujo fundador Silvio Berlusconi morreu no ano passado, obteve cerca de 10% dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu após uma campanha fantasmagórica, que imprimiu o nome e a foto de Berlusconi nos cartazes. A Liga, partido de Matteo Salvini, que dialoga com o flanco à direita do eleitorado de Meloni, baixou sua votação para 9% este ano, de 34% em 2019.

O Castelo Suábio de Brindisi sediará o jantar de boas-vindas da Cúpula do G7, no dia 12 de junho de 2024 no porto de Brindisi, Itália Foto: Piero Cruciatti/AFP

Segundo especialistas, o maior desafio que restou à líder nacionalista da Itália talvez tenha sido seu próprio país.

A produtividade da Itália defasou em comparação ao índice da União Europeia, e os salários estão em grande medida estagnados. Ainda que o desemprego tenha diminuído na Itália, entre os jovens no sul do país o desemprego continua generalizado, e dezenas de milhares de jovens italianos deixam o país anualmente.

Na cidade de Savelletri, na esquina do resort que receberá o G-7, moradores locais matavam o tempo em um café próximo a dois helipontos construídos recentemente, enquanto caminhões militares circulavam.

O pescador Stefano Martellotta, de 51 anos, afirmou que não se preocupa muito com o que chamou de “show” do G-7. Ele se preocupa com seus dois filhos, de 22 e 27 anos, que tiveram de se mudar para os Países Baixos para trabalhar em cozinhas de restaurantes, porque na Itália “ninguém lhes paga um salário digno”, afirmou ele.

“Isso é dramático para a gente, nossos jovens indo embora”, afirmou Annamaria Santorsola, de 75 anos, mãe e avó, acrescentando que sua região precisa “de empregos, não do G-7″. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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