WREXHAM (PAÍS DE GALES) - Rachel Parry e Wayne Jones, paramédicos do Serviço de Ambulâncias de Wrexham, pararam em um hospital no norte do País de Gales com um paciente logo após as 10h, no início de dezembro. Foi quando começou a espera.
Eram 16h30 quando a paciente de 47 anos, com forte dor nas costas e dormência nas duas pernas, foi entregue ao pronto-atendimento do Hospital Maelor. Fazia mais de 12 horas que ela havia ligado pela primeira vez para o 999, o número de emergência no Reino Unido.
Os atrasos ficaram tão graves —e tão comuns—, disseram os dois paramédicos, que sua primeira interação com os pacientes não é mais uma apresentação. “Agora começamos com um pedido de desculpas”, disse Parry. “Cada trabalho é tipo: eles abrem a porta da frente, e nós ‘Olá, sentimos muito pelo atraso’. Isso se tornou a norma.”
A visão de ambulâncias enfileiradas durante horas diante dos hospitais se tornou preocupantemente comum no País de Gales, que no mês passado registrou seus piores tempos de espera para chamadas de emergência com risco de vida. Mas o problema está longe de ser isolado. Os serviços de ambulância na Inglaterra, Escócia e Irlanda do Norte também estão enfrentando atrasos recordes.
É uma situação de quase crise que os especialistas dizem indicar uma quebra do pacto entre os britânicos e seu prestigioso Serviço Nacional de Saúde (NHS): que o governo fornecerá serviços de saúde responsáveis e eficientes, geralmente gratuitos, para todos os níveis de renda.
A questão ganhou grande relevo na quarta-feira (21), quando os funcionários do serviço de ambulâncias na Inglaterra e no País de Gales realizaram a primeira de duas greves por causa dos baixos salários e da deterioração das condições de trabalho. Eles deverão protestar novamente na próxima semana.
Será a mais recente paralisação em um período de intensa luta trabalhista no Reino Unido, com uma série de greves planejadas para todo o país durante as festas de fim de ano. Os enfermeiros fizeram a segunda greve de um dia na terça (20), e os trabalhadores ferroviários e de controle de fronteiras nos aeroportos começarão vários dias de greves ainda nesta semana.
Inúmeros incidentes angustiantes chamaram atenção para o problema das ambulâncias no Reino Unido, incluindo o de um idoso cuja família o cobriu com uma lona enquanto esperava sete horas depois de cair ao ar livre e um jogador de futebol de 17 anos que esperou quatro horas deitado num campo chuvoso após sofrer uma lesão no pescoço.
Um fotógrafo do New York Times e eu passamos um dia com o serviço em Wrexham este mês e testemunhamos paramédicos carregando pacientes delicadamente escada abaixo, navegando por ruas estreitas e tentando confortar as pessoas durante esperas terrivelmente longas no estacionamento do hospital. A frustração aumentava à medida que as horas passavam.
Um desafio citado por especialistas em saúde ficou evidente nesse dia: há uma falta aguda de leitos no departamento de acidentes e emergência, que estão superlotados devido à incapacidade de encontrar espaço para pacientes em outros lugares nos hospitais.
Isso ocorre porque os pacientes prontos para receber alta geralmente não têm para onde ir em consequência da redução dos serviços sociais –que foram prejudicados pela falta de financiamento do governo e pela grave escassez de pessoal. Isso deixa as ambulâncias em fila do lado de fora esperando que os leitos sejam abertos.
A equipe da linha de frente está chegando a um ponto de colapso. Enquanto Parry e Jones esperavam no hospital com seu segundo paciente, houve pelo menos 21 chamadas em sua área de ação para as quais eles e outros paramédicos também presos no hospital não puderam ser mobilizados. Durante o turno de 12 horas, eles atenderam apenas três pacientes.
“É frustrante”, disse Jones. “Essas pessoas são da comunidade e estão desesperadas.” Bons samaritanos às vezes intervêm e levam as pessoas em perigo aos hospitais. Enquanto Parry e Jones esperavam com seus pacientes, dois carros pararam no ponto de desembarque da ambulância, trazendo pessoas. Em ambos os casos —uma idosa que caiu e quebrou os pulsos e uma mulher que desmaiou num supermercado— o motorista ligou para o serviço de emergência apenas para saber que levaria horas até que uma ambulância chegasse.
“O público está trabalhando mais que eu hoje”, disse Parry, frustrado, depois de ajudar as duas chegadas ao hospital.
A análise dos dados mais recentes da Associação de Executivos-chefes de Ambulâncias descobriu que os tempos de resposta aumentaram em todo o país, e os atrasos na transferência de pacientes atingiram níveis sem precedentes em novembro.
Parry e Jones disseram que seu maior medo é chegar para apanhar um paciente depois de um longo atraso e descobrir que chegaram tarde demais.
“Eu sei que pessoas morreram”, disse Parry. “Conheço uma equipe que disse: ‘Acabamos de ver alguém que estava esperando havia quatro horas e tinha morrido no sofá’”.
Os serviços de ambulância em todo o país, quase todos pertencentes ao Serviço Nacional de Saúde e administrados pelo fundo de saúde local de cada área, descreveram um número crescente de mortes relacionadas a longas esperas. Um serviço de ambulância inglês observou que o número de suas equipes aumentou de apenas uma em 2020 para pelo menos 37 em 2022.
Um porta-voz do Departamento de Saúde e Assistência Social do governo, que supervisiona o Serviço Nacional de Saúde, disse em comunicado que reconhece a pressão que sofrem as equipes de emergência “e está tomando medidas urgentes para apoiar o serviço de ambulâncias e as equipes”.
“Ninguém deveria ter que esperar mais que o necessário para atendimento de emergência”, disse o comunicado, acrescentando que o governo está investindo mais 6,6 bilhões de libras (cerca de R$ 43 bilhões) no serviço nos próximos dois anos, “para garantir que ele tome medidas rapidamente para reduzir os tempos de espera”.
Frank Taylor esperou três horas com sua mulher, Ann Taylor, 79, por uma ambulância, dizendo que era difícil para ele vê-la com tanta dor.
Quando os paramédicos chegaram, ele ficou aliviado ao vê-los rapidamente ligá-la ao oxigênio antes de carregá-la gentilmente, enrolada num cobertor de tricô azul, escada abaixo até a ambulância.
Mas quando chegaram ao hospital foram mais duas horas de espera antes que Ann finalmente fosse internada. Por volta das 20h30, ela foi transferida do pronto-atendimento para a UTI, a escala final após um longo dia de incertezas.
No ano passado, ela foi colocada numa casa de repouso depois que sua saúde piorou —ela tem uma doença pulmonar em estágio terminal— e Frank a visita diariamente. Foi lá que a ambulância a buscou.
Na sala de estar de sua casa na manhã seguinte, Frank, 79, mostrou as dezenas de colheres que sua mulher colecionou ao longo de seu casamento de cinco décadas, expostas num armário que ele mesmo fez. “Há muito boas lembranças aqui”, disse ele sobre a casa onde criaram cinco filhos.
Enquanto elogiava o cuidado dos paramédicos, ele disse que o tempo de espera foi frustrante. Ele se preocupa com a dignidade de sua mulher durante essa última fase da vida, mas apoia a próxima greve de ambulâncias. Chamadas para atendimento de emergência tornaram-se um jogo de espera muito tenso.
“Não é mais como era anos atrás”, disse. “Eles vinham imediatamente.”