Guerra da Ucrânia aumenta tensão entre a Rússia e ex-repúblicas soviéticas que tentam fugir de Putin


Por razões distintas, Geórgia, Moldávia e Armênia estão buscando laços mais próximos com a União Europeia

Por Andrew Higgins
Atualização:

TBLISI - Na Geórgia, manifestantes levantando bandeiras da União Europeia protestaram contra o que consideram líderes pró-Rússia. O governo da Moldávia faz pressão para entrar no bloco, enfurecendo cidadãos com esperança de relações mais próximas com Moscou. A Armênia também acenou para a Europa, enfurecida em razão do Kremlin, um aliado de longa data, estar cortejando seu inimigo Azerbaijão.

Alimentadas em parte pela guerra na Ucrânia, tensões têm aumentado em algumas ex-repúblicas soviéticas, contrapondo cidadãos favoráveis a relações mais próximas com a Rússia a indivíduos mais orientados na direção da Europa.

Muitas dessas tensões antecedem a guerra, arraigadas em duradouras lutas domésticas por poder, dinheiro e outras questões, mas têm sido amplificadas pela geopolítica à medida que a Rússia e o Ocidente pressionam os países a escolher de que lado se posicionam.

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Veículo militar russo na área de Nagorno Karabak, disputada entre Armênia e Azerbaijão Foto: Nanna Heitmann/NYT
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A influência da guerra

Por toda a ex-União Soviética, “o contexto atual é completamente moldado pela maneira que a guerra na Ucrânia radicalizou a competição entre a Rússia e o Ocidente”, afirmou Gerard Toal autor de “Exterior Próximo”, um estudo sobre as relações da Rússia com Estados anteriormente soviéticos.

Temendo perder sua influência, Moscou emitiu alertas contundentes a países como Geórgia e Moldávia: lembrem-se do que aconteceu na Ucrânia. Sem ameaçar invadir nenhum dos países, o Kremlin apontou para o tumulto e o derramamento de sangue que se seguiram à Ucrânia pender para o Ocidente após a revolta popular de 2014 que depôs o então presidente pró-Rússia.

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Moscou também espera que seus recentes sucessos nos campos de batalha no leste da Ucrânia possam ajudar a reverter os muitos reveses ao seu prestígio e influência que sofreu numa série de ex-repúblicas soviéticas anteriormente nesta guerra.

“Campanhas russas de informação têm alimentado essa ideia de que um alinhamento mais próximo com o Ocidente ameaça provocar uma guerra que somente a Rússia é capaz de vencer”, afirmou o ex-ministro de Relações Exteriores da Moldávia Nicu Popescu. “Tudo depende da Ucrânia.”

Com o desfecho da guerra parecendo cada vez mais incerto, “o desconforto do Ocidente agrada à Rússia”, afirmou o especialista em ex-União Soviética Thomas de Waal, do instituto de pesquisa Carnegie Europe.

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Trincheira na Ucrânia: soldados disparam peças de artilharia contra os russos Foto: Tyler Hicks/NYT

Armênia e Moldávia

Moscou tem muito território para recuperar e algumas de suas perdas podem ser irreversíveis. Distraída pela guerra e determinada a expandir suas relações com o Azerbaijão, a Rússia rifou no ano passado uma de suas aliadas mais próximas, a Armênia, ordenando que tropas de paz russas não interferissem quando soldados azerbaijanos tomaram Nagorno-Karabakh, um enclave montanhoso em disputa. Posteriormente, a Armênia afirmou que considera se candidatar a aderir à União Europeia e abandonar um pacto de segurança liderado pela Rússia.

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A Moldávia intensificou seus esforços para aderir à União Europeia, que em 2022 concedeu ao país status de candidato. Na semana passada, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, visitou a Moldávia para demonstrar o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia e seus vizinhos que poderiam estar potencialmente em risco.

Impasse na Geórgia

Mas mesmo na Geórgia — que foi invadida pela Rússia em 2008, perdeu 20% seu território para separatistas apoiados por Moscou e alberga profundos sentimentos anti-Rússia — uma minoria substancial ainda prefere melhorar as relações, pelo menos econômicas, com os russos.

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“Não que eles gostem da Rússia, eles têm medo da Rússia”, afirmou o diretor dos Centros de Recursos de Pesquisa do Cáucaso, Koba Turmanidze, um instituto de pesquisa em Tbilíssi, a capital da Geórgia.

Segundo De Waal, do Carnegie Europe, mesmo que não queira se envolver no conflito na Ucrânia, a Geórgia “percebe que o vento está soprando mais a favor da Rússia na guerra. E está pendendo para Moscou ao mesmo tempo que tenta permanecer não alinhada”.

O governo georgiano — apesar de oficialmente estar se esforçando para juntar-se à União Europeia, um objetivo amplamente apoiado pela população — tem usado o medo da retaliação russa para justificar sua recusa em aderir às sanções europeias contra Moscou.

Protestos contra governo pró-Rússia na Ucrânia em 2014 estão na raiz do atual conflito Foto: Sergey Ponomarev/NYT

O partido governista, Sonho Georgiano, afirmou Turmanidze, jamais afirmaria que está do lado da Rússia contra a Ucrânia, porque “seria um suicídio político”, dada a hostilidade do público em relação a Moscou. Mas o partido tem dados passos, notavelmente com uma controvertida lei sobre influência estrangeira que desencadeou semanas de protestos de rua, “em estilo russo”, acrescentou ele.

Manter a influência sobre ex-repúblicas soviéticas tem sido um objetivo de Moscou desde o início dos anos 90, mas esse esforço recebeu uma nova ênfase em um “conceito de política externa” revisado, assinado pelo presidente Vladimir Putin no ano passado.

O documento comprometeu a Rússia a evitar “revoluções coloridas”, termo que Moscou usa para se referir a levantes populares, “e outras tentativas de interferir nos assuntos internos dos aliados e parceiros da Rússia” e “evitar e se contrapor a ações inamistosas de Estados estrangeiros”.

Definindo os recentes protestos na Geórgia como uma reedição do que, na visão de Moscou, foi um golpe orquestrado pela CIA em 2014 na Ucrânia, o ministério russo de Relações Exteriores declarou que as manifestações da semana passada em Tbilíssi foram “exatamente iguais ao que aconteceu na Ucrânia”.

E “vejam como a situação tem se desdobrado na Moldávia”, acrescentou a porta-voz do ministério, Maria Zakharova, referindo-se às tensões no país anteriormente a um referendo que deliberará sobre sua adesão à União Europeia. As opiniões estão divididas na Moldávia entre quem é favorável a uma maior integração com a Europa e quem prefere a Rússia.

“Parece o mesmo cenário preparado pelos mestres ocidentais para a Ucrânia”, afirmou Zakharova.

Rússia x Ucrânia

Os protestos de rua de 2014 em Kiev, que derrubaram o então presidente eleito da Ucrânia, Viktor Ianukovich, foram ocasionados pelo ultraje público em reação a ele ter rejeitado um acordo comercial e político com a União Europeia que anteriormente havia prometido assinar.

“A narrativa genérica da Rússia é que existe uma conspiração geopolítica perpetrada pelo Ocidente para subverter a soberania de Estados independentes”, afirmou Toal.

O Ocidente também tem sua própria história definida a partir da Ucrânia, que Blinken recitou semana passada na Moldávia. “Os moldavos estão bem cientes de que os acontecimentos na Ucrânia não são importantes apenas para os ucranianos, mas importam também para os moldavos”, afirmou Blinken em uma conferência de imprensa conjunta com a presidente da Moldávia, Maia Sandu. Se não for confrontada, afirmou ele, a Rússia “não vai parar na Ucrânia”.

Algumas semanas antes, autoridades aduaneiras do aeroporto internacional da Moldávia encontraram mais de US$ 1 milhão em dinheiro em bagagens de políticos alinhados à Rússia que retornavam de Moscou.

Popescu, que se demitiu do cargo de chanceler da Moldávia em janeiro e hoje atua como pesquisador do Conselho Europeu de Relações Exteriores, afirmou que esse dinheiro serviria para financiar atividades políticas durante as campanhas para o referendo de outubro e as eleições presidenciais simultaneamente.

“Você pode fazer política, mas não pode trazer malas de dinheiro da Rússia”, afirmou Popescu.

O ex-ministro afirmou que o risco de uma intervenção direta de Moscou na Moldávia, um temor sério no início da invasão russa em escala total à Ucrânia, diminuiu. Mas os recentes avanços militares dos russos “são uma preocupação”, acrescentou Popescu. “Eles ainda estão bem longe de nós, mas tudo depende do desfecho da guerra.”

A guerra se tornou o princípio organizacional em torno do qual até mesmo disputas estritamente domésticas passaram a revolver, transformando querelas internas em confrontos geopolíticos com grandes interesses em jogo.

O recente tumulto na Geórgia sobre a lei de influência estrangeira foi, de muitas maneiras, “uma luta pelo poder local entre diferentes redes políticas”, afirmou Toal, mas a guerra transformou-a numa “batalha moldada pela geopolítica”.

Mas o que os manifestantes percebem como evidência do afastamento do governo georgiano em relação ao Ocidente e sua maior proximidade com a Rússia é, na visão de alguns analistas, um sinal de preocupações mais específicas anteriormente à eleição de outubro — como fazer um banco suíço descongelar bilhões de dólares do oligarca mais poderoso da Geórgia, Bidzina Ivanishvili, fundador do partido Sonho Georgiano.

Ivanishvili envolveu-se em uma longa disputa com o banco Credit Suisse sobre seu dinheiro. Depois de obter decisões favoráveis em vários processos judiciais e recuperar parte dos recursos, a guerra na Ucrânia adicionou um novo obstáculo sobre o congelamento de US$ 2,7 bilhões, em 2022, em razão de preocupações a respeito de sua possível origem na Rússia.

O partido de Ivanishvili acredita que Washington forçou o congelamento do dinheiro para tentar fazer a Geórgia se alinhar com o Ocidente contra a Rússia. Seja qual for a verdade, a investida financeira deixou-o mais determinado a confrontar os inimigos que ele percebe domesticamente a qualquer custo, afirmou De Waal. “Ele está paranóico e acha que isso é parte de uma conspiração mundial contra ele”, disse. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

TBLISI - Na Geórgia, manifestantes levantando bandeiras da União Europeia protestaram contra o que consideram líderes pró-Rússia. O governo da Moldávia faz pressão para entrar no bloco, enfurecendo cidadãos com esperança de relações mais próximas com Moscou. A Armênia também acenou para a Europa, enfurecida em razão do Kremlin, um aliado de longa data, estar cortejando seu inimigo Azerbaijão.

Alimentadas em parte pela guerra na Ucrânia, tensões têm aumentado em algumas ex-repúblicas soviéticas, contrapondo cidadãos favoráveis a relações mais próximas com a Rússia a indivíduos mais orientados na direção da Europa.

Muitas dessas tensões antecedem a guerra, arraigadas em duradouras lutas domésticas por poder, dinheiro e outras questões, mas têm sido amplificadas pela geopolítica à medida que a Rússia e o Ocidente pressionam os países a escolher de que lado se posicionam.

Veículo militar russo na área de Nagorno Karabak, disputada entre Armênia e Azerbaijão Foto: Nanna Heitmann/NYT

A influência da guerra

Por toda a ex-União Soviética, “o contexto atual é completamente moldado pela maneira que a guerra na Ucrânia radicalizou a competição entre a Rússia e o Ocidente”, afirmou Gerard Toal autor de “Exterior Próximo”, um estudo sobre as relações da Rússia com Estados anteriormente soviéticos.

Temendo perder sua influência, Moscou emitiu alertas contundentes a países como Geórgia e Moldávia: lembrem-se do que aconteceu na Ucrânia. Sem ameaçar invadir nenhum dos países, o Kremlin apontou para o tumulto e o derramamento de sangue que se seguiram à Ucrânia pender para o Ocidente após a revolta popular de 2014 que depôs o então presidente pró-Rússia.

Moscou também espera que seus recentes sucessos nos campos de batalha no leste da Ucrânia possam ajudar a reverter os muitos reveses ao seu prestígio e influência que sofreu numa série de ex-repúblicas soviéticas anteriormente nesta guerra.

“Campanhas russas de informação têm alimentado essa ideia de que um alinhamento mais próximo com o Ocidente ameaça provocar uma guerra que somente a Rússia é capaz de vencer”, afirmou o ex-ministro de Relações Exteriores da Moldávia Nicu Popescu. “Tudo depende da Ucrânia.”

Com o desfecho da guerra parecendo cada vez mais incerto, “o desconforto do Ocidente agrada à Rússia”, afirmou o especialista em ex-União Soviética Thomas de Waal, do instituto de pesquisa Carnegie Europe.

Trincheira na Ucrânia: soldados disparam peças de artilharia contra os russos Foto: Tyler Hicks/NYT

Armênia e Moldávia

Moscou tem muito território para recuperar e algumas de suas perdas podem ser irreversíveis. Distraída pela guerra e determinada a expandir suas relações com o Azerbaijão, a Rússia rifou no ano passado uma de suas aliadas mais próximas, a Armênia, ordenando que tropas de paz russas não interferissem quando soldados azerbaijanos tomaram Nagorno-Karabakh, um enclave montanhoso em disputa. Posteriormente, a Armênia afirmou que considera se candidatar a aderir à União Europeia e abandonar um pacto de segurança liderado pela Rússia.

A Moldávia intensificou seus esforços para aderir à União Europeia, que em 2022 concedeu ao país status de candidato. Na semana passada, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, visitou a Moldávia para demonstrar o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia e seus vizinhos que poderiam estar potencialmente em risco.

Impasse na Geórgia

Mas mesmo na Geórgia — que foi invadida pela Rússia em 2008, perdeu 20% seu território para separatistas apoiados por Moscou e alberga profundos sentimentos anti-Rússia — uma minoria substancial ainda prefere melhorar as relações, pelo menos econômicas, com os russos.

“Não que eles gostem da Rússia, eles têm medo da Rússia”, afirmou o diretor dos Centros de Recursos de Pesquisa do Cáucaso, Koba Turmanidze, um instituto de pesquisa em Tbilíssi, a capital da Geórgia.

Segundo De Waal, do Carnegie Europe, mesmo que não queira se envolver no conflito na Ucrânia, a Geórgia “percebe que o vento está soprando mais a favor da Rússia na guerra. E está pendendo para Moscou ao mesmo tempo que tenta permanecer não alinhada”.

O governo georgiano — apesar de oficialmente estar se esforçando para juntar-se à União Europeia, um objetivo amplamente apoiado pela população — tem usado o medo da retaliação russa para justificar sua recusa em aderir às sanções europeias contra Moscou.

Protestos contra governo pró-Rússia na Ucrânia em 2014 estão na raiz do atual conflito Foto: Sergey Ponomarev/NYT

O partido governista, Sonho Georgiano, afirmou Turmanidze, jamais afirmaria que está do lado da Rússia contra a Ucrânia, porque “seria um suicídio político”, dada a hostilidade do público em relação a Moscou. Mas o partido tem dados passos, notavelmente com uma controvertida lei sobre influência estrangeira que desencadeou semanas de protestos de rua, “em estilo russo”, acrescentou ele.

Manter a influência sobre ex-repúblicas soviéticas tem sido um objetivo de Moscou desde o início dos anos 90, mas esse esforço recebeu uma nova ênfase em um “conceito de política externa” revisado, assinado pelo presidente Vladimir Putin no ano passado.

O documento comprometeu a Rússia a evitar “revoluções coloridas”, termo que Moscou usa para se referir a levantes populares, “e outras tentativas de interferir nos assuntos internos dos aliados e parceiros da Rússia” e “evitar e se contrapor a ações inamistosas de Estados estrangeiros”.

Definindo os recentes protestos na Geórgia como uma reedição do que, na visão de Moscou, foi um golpe orquestrado pela CIA em 2014 na Ucrânia, o ministério russo de Relações Exteriores declarou que as manifestações da semana passada em Tbilíssi foram “exatamente iguais ao que aconteceu na Ucrânia”.

E “vejam como a situação tem se desdobrado na Moldávia”, acrescentou a porta-voz do ministério, Maria Zakharova, referindo-se às tensões no país anteriormente a um referendo que deliberará sobre sua adesão à União Europeia. As opiniões estão divididas na Moldávia entre quem é favorável a uma maior integração com a Europa e quem prefere a Rússia.

“Parece o mesmo cenário preparado pelos mestres ocidentais para a Ucrânia”, afirmou Zakharova.

Rússia x Ucrânia

Os protestos de rua de 2014 em Kiev, que derrubaram o então presidente eleito da Ucrânia, Viktor Ianukovich, foram ocasionados pelo ultraje público em reação a ele ter rejeitado um acordo comercial e político com a União Europeia que anteriormente havia prometido assinar.

“A narrativa genérica da Rússia é que existe uma conspiração geopolítica perpetrada pelo Ocidente para subverter a soberania de Estados independentes”, afirmou Toal.

O Ocidente também tem sua própria história definida a partir da Ucrânia, que Blinken recitou semana passada na Moldávia. “Os moldavos estão bem cientes de que os acontecimentos na Ucrânia não são importantes apenas para os ucranianos, mas importam também para os moldavos”, afirmou Blinken em uma conferência de imprensa conjunta com a presidente da Moldávia, Maia Sandu. Se não for confrontada, afirmou ele, a Rússia “não vai parar na Ucrânia”.

Algumas semanas antes, autoridades aduaneiras do aeroporto internacional da Moldávia encontraram mais de US$ 1 milhão em dinheiro em bagagens de políticos alinhados à Rússia que retornavam de Moscou.

Popescu, que se demitiu do cargo de chanceler da Moldávia em janeiro e hoje atua como pesquisador do Conselho Europeu de Relações Exteriores, afirmou que esse dinheiro serviria para financiar atividades políticas durante as campanhas para o referendo de outubro e as eleições presidenciais simultaneamente.

“Você pode fazer política, mas não pode trazer malas de dinheiro da Rússia”, afirmou Popescu.

O ex-ministro afirmou que o risco de uma intervenção direta de Moscou na Moldávia, um temor sério no início da invasão russa em escala total à Ucrânia, diminuiu. Mas os recentes avanços militares dos russos “são uma preocupação”, acrescentou Popescu. “Eles ainda estão bem longe de nós, mas tudo depende do desfecho da guerra.”

A guerra se tornou o princípio organizacional em torno do qual até mesmo disputas estritamente domésticas passaram a revolver, transformando querelas internas em confrontos geopolíticos com grandes interesses em jogo.

O recente tumulto na Geórgia sobre a lei de influência estrangeira foi, de muitas maneiras, “uma luta pelo poder local entre diferentes redes políticas”, afirmou Toal, mas a guerra transformou-a numa “batalha moldada pela geopolítica”.

Mas o que os manifestantes percebem como evidência do afastamento do governo georgiano em relação ao Ocidente e sua maior proximidade com a Rússia é, na visão de alguns analistas, um sinal de preocupações mais específicas anteriormente à eleição de outubro — como fazer um banco suíço descongelar bilhões de dólares do oligarca mais poderoso da Geórgia, Bidzina Ivanishvili, fundador do partido Sonho Georgiano.

Ivanishvili envolveu-se em uma longa disputa com o banco Credit Suisse sobre seu dinheiro. Depois de obter decisões favoráveis em vários processos judiciais e recuperar parte dos recursos, a guerra na Ucrânia adicionou um novo obstáculo sobre o congelamento de US$ 2,7 bilhões, em 2022, em razão de preocupações a respeito de sua possível origem na Rússia.

O partido de Ivanishvili acredita que Washington forçou o congelamento do dinheiro para tentar fazer a Geórgia se alinhar com o Ocidente contra a Rússia. Seja qual for a verdade, a investida financeira deixou-o mais determinado a confrontar os inimigos que ele percebe domesticamente a qualquer custo, afirmou De Waal. “Ele está paranóico e acha que isso é parte de uma conspiração mundial contra ele”, disse. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

TBLISI - Na Geórgia, manifestantes levantando bandeiras da União Europeia protestaram contra o que consideram líderes pró-Rússia. O governo da Moldávia faz pressão para entrar no bloco, enfurecendo cidadãos com esperança de relações mais próximas com Moscou. A Armênia também acenou para a Europa, enfurecida em razão do Kremlin, um aliado de longa data, estar cortejando seu inimigo Azerbaijão.

Alimentadas em parte pela guerra na Ucrânia, tensões têm aumentado em algumas ex-repúblicas soviéticas, contrapondo cidadãos favoráveis a relações mais próximas com a Rússia a indivíduos mais orientados na direção da Europa.

Muitas dessas tensões antecedem a guerra, arraigadas em duradouras lutas domésticas por poder, dinheiro e outras questões, mas têm sido amplificadas pela geopolítica à medida que a Rússia e o Ocidente pressionam os países a escolher de que lado se posicionam.

Veículo militar russo na área de Nagorno Karabak, disputada entre Armênia e Azerbaijão Foto: Nanna Heitmann/NYT

A influência da guerra

Por toda a ex-União Soviética, “o contexto atual é completamente moldado pela maneira que a guerra na Ucrânia radicalizou a competição entre a Rússia e o Ocidente”, afirmou Gerard Toal autor de “Exterior Próximo”, um estudo sobre as relações da Rússia com Estados anteriormente soviéticos.

Temendo perder sua influência, Moscou emitiu alertas contundentes a países como Geórgia e Moldávia: lembrem-se do que aconteceu na Ucrânia. Sem ameaçar invadir nenhum dos países, o Kremlin apontou para o tumulto e o derramamento de sangue que se seguiram à Ucrânia pender para o Ocidente após a revolta popular de 2014 que depôs o então presidente pró-Rússia.

Moscou também espera que seus recentes sucessos nos campos de batalha no leste da Ucrânia possam ajudar a reverter os muitos reveses ao seu prestígio e influência que sofreu numa série de ex-repúblicas soviéticas anteriormente nesta guerra.

“Campanhas russas de informação têm alimentado essa ideia de que um alinhamento mais próximo com o Ocidente ameaça provocar uma guerra que somente a Rússia é capaz de vencer”, afirmou o ex-ministro de Relações Exteriores da Moldávia Nicu Popescu. “Tudo depende da Ucrânia.”

Com o desfecho da guerra parecendo cada vez mais incerto, “o desconforto do Ocidente agrada à Rússia”, afirmou o especialista em ex-União Soviética Thomas de Waal, do instituto de pesquisa Carnegie Europe.

Trincheira na Ucrânia: soldados disparam peças de artilharia contra os russos Foto: Tyler Hicks/NYT

Armênia e Moldávia

Moscou tem muito território para recuperar e algumas de suas perdas podem ser irreversíveis. Distraída pela guerra e determinada a expandir suas relações com o Azerbaijão, a Rússia rifou no ano passado uma de suas aliadas mais próximas, a Armênia, ordenando que tropas de paz russas não interferissem quando soldados azerbaijanos tomaram Nagorno-Karabakh, um enclave montanhoso em disputa. Posteriormente, a Armênia afirmou que considera se candidatar a aderir à União Europeia e abandonar um pacto de segurança liderado pela Rússia.

A Moldávia intensificou seus esforços para aderir à União Europeia, que em 2022 concedeu ao país status de candidato. Na semana passada, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, visitou a Moldávia para demonstrar o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia e seus vizinhos que poderiam estar potencialmente em risco.

Impasse na Geórgia

Mas mesmo na Geórgia — que foi invadida pela Rússia em 2008, perdeu 20% seu território para separatistas apoiados por Moscou e alberga profundos sentimentos anti-Rússia — uma minoria substancial ainda prefere melhorar as relações, pelo menos econômicas, com os russos.

“Não que eles gostem da Rússia, eles têm medo da Rússia”, afirmou o diretor dos Centros de Recursos de Pesquisa do Cáucaso, Koba Turmanidze, um instituto de pesquisa em Tbilíssi, a capital da Geórgia.

Segundo De Waal, do Carnegie Europe, mesmo que não queira se envolver no conflito na Ucrânia, a Geórgia “percebe que o vento está soprando mais a favor da Rússia na guerra. E está pendendo para Moscou ao mesmo tempo que tenta permanecer não alinhada”.

O governo georgiano — apesar de oficialmente estar se esforçando para juntar-se à União Europeia, um objetivo amplamente apoiado pela população — tem usado o medo da retaliação russa para justificar sua recusa em aderir às sanções europeias contra Moscou.

Protestos contra governo pró-Rússia na Ucrânia em 2014 estão na raiz do atual conflito Foto: Sergey Ponomarev/NYT

O partido governista, Sonho Georgiano, afirmou Turmanidze, jamais afirmaria que está do lado da Rússia contra a Ucrânia, porque “seria um suicídio político”, dada a hostilidade do público em relação a Moscou. Mas o partido tem dados passos, notavelmente com uma controvertida lei sobre influência estrangeira que desencadeou semanas de protestos de rua, “em estilo russo”, acrescentou ele.

Manter a influência sobre ex-repúblicas soviéticas tem sido um objetivo de Moscou desde o início dos anos 90, mas esse esforço recebeu uma nova ênfase em um “conceito de política externa” revisado, assinado pelo presidente Vladimir Putin no ano passado.

O documento comprometeu a Rússia a evitar “revoluções coloridas”, termo que Moscou usa para se referir a levantes populares, “e outras tentativas de interferir nos assuntos internos dos aliados e parceiros da Rússia” e “evitar e se contrapor a ações inamistosas de Estados estrangeiros”.

Definindo os recentes protestos na Geórgia como uma reedição do que, na visão de Moscou, foi um golpe orquestrado pela CIA em 2014 na Ucrânia, o ministério russo de Relações Exteriores declarou que as manifestações da semana passada em Tbilíssi foram “exatamente iguais ao que aconteceu na Ucrânia”.

E “vejam como a situação tem se desdobrado na Moldávia”, acrescentou a porta-voz do ministério, Maria Zakharova, referindo-se às tensões no país anteriormente a um referendo que deliberará sobre sua adesão à União Europeia. As opiniões estão divididas na Moldávia entre quem é favorável a uma maior integração com a Europa e quem prefere a Rússia.

“Parece o mesmo cenário preparado pelos mestres ocidentais para a Ucrânia”, afirmou Zakharova.

Rússia x Ucrânia

Os protestos de rua de 2014 em Kiev, que derrubaram o então presidente eleito da Ucrânia, Viktor Ianukovich, foram ocasionados pelo ultraje público em reação a ele ter rejeitado um acordo comercial e político com a União Europeia que anteriormente havia prometido assinar.

“A narrativa genérica da Rússia é que existe uma conspiração geopolítica perpetrada pelo Ocidente para subverter a soberania de Estados independentes”, afirmou Toal.

O Ocidente também tem sua própria história definida a partir da Ucrânia, que Blinken recitou semana passada na Moldávia. “Os moldavos estão bem cientes de que os acontecimentos na Ucrânia não são importantes apenas para os ucranianos, mas importam também para os moldavos”, afirmou Blinken em uma conferência de imprensa conjunta com a presidente da Moldávia, Maia Sandu. Se não for confrontada, afirmou ele, a Rússia “não vai parar na Ucrânia”.

Algumas semanas antes, autoridades aduaneiras do aeroporto internacional da Moldávia encontraram mais de US$ 1 milhão em dinheiro em bagagens de políticos alinhados à Rússia que retornavam de Moscou.

Popescu, que se demitiu do cargo de chanceler da Moldávia em janeiro e hoje atua como pesquisador do Conselho Europeu de Relações Exteriores, afirmou que esse dinheiro serviria para financiar atividades políticas durante as campanhas para o referendo de outubro e as eleições presidenciais simultaneamente.

“Você pode fazer política, mas não pode trazer malas de dinheiro da Rússia”, afirmou Popescu.

O ex-ministro afirmou que o risco de uma intervenção direta de Moscou na Moldávia, um temor sério no início da invasão russa em escala total à Ucrânia, diminuiu. Mas os recentes avanços militares dos russos “são uma preocupação”, acrescentou Popescu. “Eles ainda estão bem longe de nós, mas tudo depende do desfecho da guerra.”

A guerra se tornou o princípio organizacional em torno do qual até mesmo disputas estritamente domésticas passaram a revolver, transformando querelas internas em confrontos geopolíticos com grandes interesses em jogo.

O recente tumulto na Geórgia sobre a lei de influência estrangeira foi, de muitas maneiras, “uma luta pelo poder local entre diferentes redes políticas”, afirmou Toal, mas a guerra transformou-a numa “batalha moldada pela geopolítica”.

Mas o que os manifestantes percebem como evidência do afastamento do governo georgiano em relação ao Ocidente e sua maior proximidade com a Rússia é, na visão de alguns analistas, um sinal de preocupações mais específicas anteriormente à eleição de outubro — como fazer um banco suíço descongelar bilhões de dólares do oligarca mais poderoso da Geórgia, Bidzina Ivanishvili, fundador do partido Sonho Georgiano.

Ivanishvili envolveu-se em uma longa disputa com o banco Credit Suisse sobre seu dinheiro. Depois de obter decisões favoráveis em vários processos judiciais e recuperar parte dos recursos, a guerra na Ucrânia adicionou um novo obstáculo sobre o congelamento de US$ 2,7 bilhões, em 2022, em razão de preocupações a respeito de sua possível origem na Rússia.

O partido de Ivanishvili acredita que Washington forçou o congelamento do dinheiro para tentar fazer a Geórgia se alinhar com o Ocidente contra a Rússia. Seja qual for a verdade, a investida financeira deixou-o mais determinado a confrontar os inimigos que ele percebe domesticamente a qualquer custo, afirmou De Waal. “Ele está paranóico e acha que isso é parte de uma conspiração mundial contra ele”, disse. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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