Hamas é indiferente à vida de crianças palestinas. Nós não devemos ser; leia a análise


Ritmo das morte de civis durante a guerra entre Israel e Hamas foi muito maior que na maioria de outros conflitos recentes

Por Nicholas Kristof

THE NEW YORK TIMES — Considerem o seguinte: o lugar mais perigoso para ser criança hoje no planeta é Gaza.

Esta é a avaliação da diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, que, em vez de uma radical exasperada, é ex-embaixadora e advogada experiente, que trabalhou para os presidentes Joe Biden e Barack Obama.

Já parece que morreram pelo menos duas vezes mais crianças em Gaza desde o início da guerra, em 7 de outubro, do que o número total de crianças mortas em todos os conflitos do mundo em 2022, de acordo com registros das Nações Unidas.

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Uma mulher carrega o corpo de seu filho, morto em um ataque aéreo a uma casa no campo de refugiados de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, em 08 de novembro de 2023. Foto: HAITHAM IMAD / EFE

“Quase 1 em cada 150 crianças palestinas de Gaza foi morta em apenas dois meses”, notou o médico Zaher Sahloul, presidente do MedGlobal, um grupo de ajuda que trabalha no enclave. “Equivale a meio milhão de crianças americanas.”

Sahloul alertou que muitas outras crianças podem “morrer de infecções, doenças transmissíveis pela água ou desidratação”, enquanto outras sofrerão com deficiências físicas por toda a vida.

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Nós podemos e devemos abominar o Hamas, uma força repressiva, misógina e homofóbica que usa civis palestinos como escudo humano. E conseguimos entender como o Estado de Israel, traumatizado pelos selvagens assassinatos e estupros do Hamas, está determinado a contra-atacar. Mas só porque o Hamas é indiferente em relação às vidas das crianças palestinas não significa que Israel e os Estados Unidos também possam agir irresponsavelmente.

O governo Biden continua a defender Israel periodicamente não apenas quando o país é atacado, o que é correto, mas até quando suas forças geram números enormes de mortes de civis em Gaza. Contrariando alegações do governo Biden de que Israel está entendendo a mensagem de demonstrar comedimento, as Nações Unidas informam que esta semana “testemunhou um dos bombardeios mais pesados em Gaza até aqui” e que, “se isso for sequer possível, um cenário ainda mais infernal está prestes a irromper”.

“Nenhum lugar é seguro em Gaza”, afirmou Martin Griffiths, a alta autoridade da ONU para assuntos humanitários. “Esse desrespeito gritante por direitos humanos básicos tem de parar.”

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O alto comissário da ONU para direitos humanos, Volker Türk, sugeriu que crimes de guerra foram cometidos tanto pelo Hamas quanto por Israel, ainda que muitos americanos indignem-se com certas mortes e prefiram esquecer-se de outras. Nós dizemos ao mundo que estamos ajudando a Ucrânia em razão da nossa convicção na “ordem internacional com base em regras” e então fornecemos armamentos que acabam matando crianças em grande escala em Gaza.

Uma mulher sentada com crianças do lado de fora, enquanto palestinos deslocados, que fugiram de suas casas devido ao ataque israelense, se abrigam em um campo em Rafah, em meio ao conflito contínuo entre Israel e o grupo islâmico palestino Hamas, no sul da Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023.  Foto: Ibraheem Abu Mustafa / REUTERS

Muita gente vê a coisa através de um prisma segundo o qual vidas de um dos lados têm valor incalculável enquanto as mortes do outro são apenas lamentáveis.

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As autoridades de saúde de Gaza afirmam que 16.248 pessoas foram mortas no enclave até aqui, cerca de 70% mulheres e crianças. É impossível verificar esse número, mas entidades que monitoram direitos humanos afirmam que o registro é crível e se provou confiável no passado. Uma autoridade graduada do governo Biden disse ao Congresso que o número relatado pode ser menor que o total (presumivelmente em razão de corpos ainda não recuperados sob escombros).

Se esse registro estiver correto, significa que uma mulher ou criança foi morta em média a cada sete minutos desde que a guerra começou — entre elas, bebês em incubadoras.

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A selvageria dos ataques de 7 de outubro motivou o bombardeio, evidentemente, e o Hamas continua a manter reféns. Toda pressão diplomática possível deve ser aplicada para que o Hamas liberte os reféns e, enquanto os mantém cativos, permita que agentes humanitários os visitem. A tendência de alguns progressistas americanos de rasgar pôsteres com imagens dos reféns é repugnante, assim como a onda de antissemitismo que temos visto nos EUA e na Europa.

Há uma distinção: o Hamas matou e sequestrou crianças deliberadamente em 7 de outubro; e Israel não está matando crianças palestinas deliberadamente, está simplesmente bombardeando bairros inteiros sem a mínima consideração por vidas de civis. Há uma diferença moral aí, mas eu não gostaria de tentar explicá-la aos pais e mães enlutados em Gaza.

Mesmo reconhecendo o direito de Israel se defender, de que forma esmagar grandes áreas com bombas de 900 quilos melhora a segurança do país? Os EUA aconselharam Israel repetidamente a usar bombas menores e realizar ataques mais cirúrgicos, em parte para evitar transformar vitórias táticas em uma derrota estratégica.

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Palestinos feridos chegam ao Hospital Nasser em Khan Younis, no sul de Gaza, na terça-feira, 5 de dezembro de 2023.  Foto: Yousef Masoud / NYT
Restos de um prédio bombardeado pelo exército israelense em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, em 3 de dezembro de 2023.  Foto: SAID KHATIB / AFP

Até onde podemos perceber, os resultados desta operação até aqui são os seguintes:

  • Israel parece ter degradado modestamente a capacidade militar do Hamas. Um porta-voz militar israelense estimou que milhares de combatentes do Hamas foram mortos, o que poderia corresponder a 10% ou menos da força do grupo.
  • O Hamas ganhou popularidade e credibilidade na Cisjordânia (quando visitei o território recentemente, vi bandeiras do grupo por toda parte).
  • Reféns israelenses foram colocados em risco e, segundo relatos, mortos.
  • As expressões iniciais de apoio a Israel foram substituídas por uma maré de simpatia aos palestinos.
  • O Hamas foi bem-sucedido em um de seus objetivos: colocar a causa palestina de volta à pauta global.
  • A repulsa em relação à perda de vidas palestinas colocou em risco a estabilidade de vizinhos como Jordânia e adiou qualquer esperança de acordo entre Israel e Arábia Saudita.
  • A probabilidade de uma insurreição na Cisjordânia aumentou, juntamente com a de uma guerra maior com o Líbano.

Isso tornou Israel um lugar mais seguro? A ponto de justificar as mortes de uma mulher ou criança a cada sete minutos?

Eu cobri muitos conflitos, e uma das coisas chocantes a respeito do bombardeio de Gaza é sua intensidade. Aproximadamente metade dos edifícios do norte de Gaza apresentam danos estruturais, de acordo com análises de imagens de satélite.

Uma foto tirada do sul de Israel, perto da fronteira com a Faixa de Gaza, em 2 de dezembro de 2023, mostra uma explosão e fumaça sobre o território palestino durante um ataque israelense. Foto: JACK GUEZ / AFP

O ritmo das morte de civis foi muito maior que na maioria de outros conflitos recentes; a única matança comparável que conheço talvez seja o genocídio em Ruanda, de 1994. Muito mais mulheres e crianças parecem ter sido mortas em Gaza do que no primeiro ano inteiro da guerra no Iraque, por exemplo.

“Um sofrimento normalmente adquirido ao longo de vários anos foi condensado em seis semanas”, afirmou a pediatra Annie Sparrow, que tem longa experiência de prática médica em zonas de guerra e trabalha como professora associada da Escola Icahn de Medicina. “Para os bebês que nascem em meio a esta guerra, muitos deles órfãos logo ao nascer, é como se eles herdassem uma aflição congênita — uma predestinação ao sofrimento, a uma vida limitada por acontecimentos que eles não têm capacidade de influenciar”.

Ao pulverizar bairros inteiros e matar civis em grandes números em vez de usar bombas menores e adotar uma estratégia muito mais cirúrgica, conforme pediram autoridades americanas, Israel provocou demandas crescentes por um cessar-fogo estendido que, poderia-se argumentar, equivaleria a uma vitória do Hamas. Em suma, eu considero infligir baixas massivas um erro tanto estratégico quanto moral; enquanto partes de Gaza foram arrasadas com o objetivo de destruir o Hamas, isso poderá ser justamente a salvação do grupo.

Bombas e mísseis americanos matando crianças é algo que deveria nos inquietar especialmente. Estou feliz pelo fato das autoridades do governo Biden terem encontrado sua voz para tentar diminuir a matança, mas gostaria que elas não tivessem demorado tanto.

Se o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu está se afundando em um atoleiro, o presidente Biden não faz nenhum favor a Israel ao conter suas palavras em público. Biden deveria se posicionar mais forçosamente em nome das crianças cujas mortes, eu temo admitir, os americanos são cúmplices.

Vejam, é difícil conversar a respeito do Oriente Médio, porque as pessoas se dividem rapidamente em dois lados. Mas o lado que deveríamos defender é o das crianças que morreram despropositadamente em Israel e Gaza, sem que a segurança de ninguém melhore. As vidas das crianças israelenses, americanas e palestinas têm o mesmo valor, e nós devemos agir de acordo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES — Considerem o seguinte: o lugar mais perigoso para ser criança hoje no planeta é Gaza.

Esta é a avaliação da diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, que, em vez de uma radical exasperada, é ex-embaixadora e advogada experiente, que trabalhou para os presidentes Joe Biden e Barack Obama.

Já parece que morreram pelo menos duas vezes mais crianças em Gaza desde o início da guerra, em 7 de outubro, do que o número total de crianças mortas em todos os conflitos do mundo em 2022, de acordo com registros das Nações Unidas.

Uma mulher carrega o corpo de seu filho, morto em um ataque aéreo a uma casa no campo de refugiados de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, em 08 de novembro de 2023. Foto: HAITHAM IMAD / EFE

“Quase 1 em cada 150 crianças palestinas de Gaza foi morta em apenas dois meses”, notou o médico Zaher Sahloul, presidente do MedGlobal, um grupo de ajuda que trabalha no enclave. “Equivale a meio milhão de crianças americanas.”

Sahloul alertou que muitas outras crianças podem “morrer de infecções, doenças transmissíveis pela água ou desidratação”, enquanto outras sofrerão com deficiências físicas por toda a vida.

Nós podemos e devemos abominar o Hamas, uma força repressiva, misógina e homofóbica que usa civis palestinos como escudo humano. E conseguimos entender como o Estado de Israel, traumatizado pelos selvagens assassinatos e estupros do Hamas, está determinado a contra-atacar. Mas só porque o Hamas é indiferente em relação às vidas das crianças palestinas não significa que Israel e os Estados Unidos também possam agir irresponsavelmente.

O governo Biden continua a defender Israel periodicamente não apenas quando o país é atacado, o que é correto, mas até quando suas forças geram números enormes de mortes de civis em Gaza. Contrariando alegações do governo Biden de que Israel está entendendo a mensagem de demonstrar comedimento, as Nações Unidas informam que esta semana “testemunhou um dos bombardeios mais pesados em Gaza até aqui” e que, “se isso for sequer possível, um cenário ainda mais infernal está prestes a irromper”.

“Nenhum lugar é seguro em Gaza”, afirmou Martin Griffiths, a alta autoridade da ONU para assuntos humanitários. “Esse desrespeito gritante por direitos humanos básicos tem de parar.”

O alto comissário da ONU para direitos humanos, Volker Türk, sugeriu que crimes de guerra foram cometidos tanto pelo Hamas quanto por Israel, ainda que muitos americanos indignem-se com certas mortes e prefiram esquecer-se de outras. Nós dizemos ao mundo que estamos ajudando a Ucrânia em razão da nossa convicção na “ordem internacional com base em regras” e então fornecemos armamentos que acabam matando crianças em grande escala em Gaza.

Uma mulher sentada com crianças do lado de fora, enquanto palestinos deslocados, que fugiram de suas casas devido ao ataque israelense, se abrigam em um campo em Rafah, em meio ao conflito contínuo entre Israel e o grupo islâmico palestino Hamas, no sul da Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023.  Foto: Ibraheem Abu Mustafa / REUTERS

Muita gente vê a coisa através de um prisma segundo o qual vidas de um dos lados têm valor incalculável enquanto as mortes do outro são apenas lamentáveis.

As autoridades de saúde de Gaza afirmam que 16.248 pessoas foram mortas no enclave até aqui, cerca de 70% mulheres e crianças. É impossível verificar esse número, mas entidades que monitoram direitos humanos afirmam que o registro é crível e se provou confiável no passado. Uma autoridade graduada do governo Biden disse ao Congresso que o número relatado pode ser menor que o total (presumivelmente em razão de corpos ainda não recuperados sob escombros).

Se esse registro estiver correto, significa que uma mulher ou criança foi morta em média a cada sete minutos desde que a guerra começou — entre elas, bebês em incubadoras.

A selvageria dos ataques de 7 de outubro motivou o bombardeio, evidentemente, e o Hamas continua a manter reféns. Toda pressão diplomática possível deve ser aplicada para que o Hamas liberte os reféns e, enquanto os mantém cativos, permita que agentes humanitários os visitem. A tendência de alguns progressistas americanos de rasgar pôsteres com imagens dos reféns é repugnante, assim como a onda de antissemitismo que temos visto nos EUA e na Europa.

Há uma distinção: o Hamas matou e sequestrou crianças deliberadamente em 7 de outubro; e Israel não está matando crianças palestinas deliberadamente, está simplesmente bombardeando bairros inteiros sem a mínima consideração por vidas de civis. Há uma diferença moral aí, mas eu não gostaria de tentar explicá-la aos pais e mães enlutados em Gaza.

Mesmo reconhecendo o direito de Israel se defender, de que forma esmagar grandes áreas com bombas de 900 quilos melhora a segurança do país? Os EUA aconselharam Israel repetidamente a usar bombas menores e realizar ataques mais cirúrgicos, em parte para evitar transformar vitórias táticas em uma derrota estratégica.

Palestinos feridos chegam ao Hospital Nasser em Khan Younis, no sul de Gaza, na terça-feira, 5 de dezembro de 2023.  Foto: Yousef Masoud / NYT
Restos de um prédio bombardeado pelo exército israelense em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, em 3 de dezembro de 2023.  Foto: SAID KHATIB / AFP

Até onde podemos perceber, os resultados desta operação até aqui são os seguintes:

  • Israel parece ter degradado modestamente a capacidade militar do Hamas. Um porta-voz militar israelense estimou que milhares de combatentes do Hamas foram mortos, o que poderia corresponder a 10% ou menos da força do grupo.
  • O Hamas ganhou popularidade e credibilidade na Cisjordânia (quando visitei o território recentemente, vi bandeiras do grupo por toda parte).
  • Reféns israelenses foram colocados em risco e, segundo relatos, mortos.
  • As expressões iniciais de apoio a Israel foram substituídas por uma maré de simpatia aos palestinos.
  • O Hamas foi bem-sucedido em um de seus objetivos: colocar a causa palestina de volta à pauta global.
  • A repulsa em relação à perda de vidas palestinas colocou em risco a estabilidade de vizinhos como Jordânia e adiou qualquer esperança de acordo entre Israel e Arábia Saudita.
  • A probabilidade de uma insurreição na Cisjordânia aumentou, juntamente com a de uma guerra maior com o Líbano.

Isso tornou Israel um lugar mais seguro? A ponto de justificar as mortes de uma mulher ou criança a cada sete minutos?

Eu cobri muitos conflitos, e uma das coisas chocantes a respeito do bombardeio de Gaza é sua intensidade. Aproximadamente metade dos edifícios do norte de Gaza apresentam danos estruturais, de acordo com análises de imagens de satélite.

Uma foto tirada do sul de Israel, perto da fronteira com a Faixa de Gaza, em 2 de dezembro de 2023, mostra uma explosão e fumaça sobre o território palestino durante um ataque israelense. Foto: JACK GUEZ / AFP

O ritmo das morte de civis foi muito maior que na maioria de outros conflitos recentes; a única matança comparável que conheço talvez seja o genocídio em Ruanda, de 1994. Muito mais mulheres e crianças parecem ter sido mortas em Gaza do que no primeiro ano inteiro da guerra no Iraque, por exemplo.

“Um sofrimento normalmente adquirido ao longo de vários anos foi condensado em seis semanas”, afirmou a pediatra Annie Sparrow, que tem longa experiência de prática médica em zonas de guerra e trabalha como professora associada da Escola Icahn de Medicina. “Para os bebês que nascem em meio a esta guerra, muitos deles órfãos logo ao nascer, é como se eles herdassem uma aflição congênita — uma predestinação ao sofrimento, a uma vida limitada por acontecimentos que eles não têm capacidade de influenciar”.

Ao pulverizar bairros inteiros e matar civis em grandes números em vez de usar bombas menores e adotar uma estratégia muito mais cirúrgica, conforme pediram autoridades americanas, Israel provocou demandas crescentes por um cessar-fogo estendido que, poderia-se argumentar, equivaleria a uma vitória do Hamas. Em suma, eu considero infligir baixas massivas um erro tanto estratégico quanto moral; enquanto partes de Gaza foram arrasadas com o objetivo de destruir o Hamas, isso poderá ser justamente a salvação do grupo.

Bombas e mísseis americanos matando crianças é algo que deveria nos inquietar especialmente. Estou feliz pelo fato das autoridades do governo Biden terem encontrado sua voz para tentar diminuir a matança, mas gostaria que elas não tivessem demorado tanto.

Se o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu está se afundando em um atoleiro, o presidente Biden não faz nenhum favor a Israel ao conter suas palavras em público. Biden deveria se posicionar mais forçosamente em nome das crianças cujas mortes, eu temo admitir, os americanos são cúmplices.

Vejam, é difícil conversar a respeito do Oriente Médio, porque as pessoas se dividem rapidamente em dois lados. Mas o lado que deveríamos defender é o das crianças que morreram despropositadamente em Israel e Gaza, sem que a segurança de ninguém melhore. As vidas das crianças israelenses, americanas e palestinas têm o mesmo valor, e nós devemos agir de acordo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES — Considerem o seguinte: o lugar mais perigoso para ser criança hoje no planeta é Gaza.

Esta é a avaliação da diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, que, em vez de uma radical exasperada, é ex-embaixadora e advogada experiente, que trabalhou para os presidentes Joe Biden e Barack Obama.

Já parece que morreram pelo menos duas vezes mais crianças em Gaza desde o início da guerra, em 7 de outubro, do que o número total de crianças mortas em todos os conflitos do mundo em 2022, de acordo com registros das Nações Unidas.

Uma mulher carrega o corpo de seu filho, morto em um ataque aéreo a uma casa no campo de refugiados de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, em 08 de novembro de 2023. Foto: HAITHAM IMAD / EFE

“Quase 1 em cada 150 crianças palestinas de Gaza foi morta em apenas dois meses”, notou o médico Zaher Sahloul, presidente do MedGlobal, um grupo de ajuda que trabalha no enclave. “Equivale a meio milhão de crianças americanas.”

Sahloul alertou que muitas outras crianças podem “morrer de infecções, doenças transmissíveis pela água ou desidratação”, enquanto outras sofrerão com deficiências físicas por toda a vida.

Nós podemos e devemos abominar o Hamas, uma força repressiva, misógina e homofóbica que usa civis palestinos como escudo humano. E conseguimos entender como o Estado de Israel, traumatizado pelos selvagens assassinatos e estupros do Hamas, está determinado a contra-atacar. Mas só porque o Hamas é indiferente em relação às vidas das crianças palestinas não significa que Israel e os Estados Unidos também possam agir irresponsavelmente.

O governo Biden continua a defender Israel periodicamente não apenas quando o país é atacado, o que é correto, mas até quando suas forças geram números enormes de mortes de civis em Gaza. Contrariando alegações do governo Biden de que Israel está entendendo a mensagem de demonstrar comedimento, as Nações Unidas informam que esta semana “testemunhou um dos bombardeios mais pesados em Gaza até aqui” e que, “se isso for sequer possível, um cenário ainda mais infernal está prestes a irromper”.

“Nenhum lugar é seguro em Gaza”, afirmou Martin Griffiths, a alta autoridade da ONU para assuntos humanitários. “Esse desrespeito gritante por direitos humanos básicos tem de parar.”

O alto comissário da ONU para direitos humanos, Volker Türk, sugeriu que crimes de guerra foram cometidos tanto pelo Hamas quanto por Israel, ainda que muitos americanos indignem-se com certas mortes e prefiram esquecer-se de outras. Nós dizemos ao mundo que estamos ajudando a Ucrânia em razão da nossa convicção na “ordem internacional com base em regras” e então fornecemos armamentos que acabam matando crianças em grande escala em Gaza.

Uma mulher sentada com crianças do lado de fora, enquanto palestinos deslocados, que fugiram de suas casas devido ao ataque israelense, se abrigam em um campo em Rafah, em meio ao conflito contínuo entre Israel e o grupo islâmico palestino Hamas, no sul da Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023.  Foto: Ibraheem Abu Mustafa / REUTERS

Muita gente vê a coisa através de um prisma segundo o qual vidas de um dos lados têm valor incalculável enquanto as mortes do outro são apenas lamentáveis.

As autoridades de saúde de Gaza afirmam que 16.248 pessoas foram mortas no enclave até aqui, cerca de 70% mulheres e crianças. É impossível verificar esse número, mas entidades que monitoram direitos humanos afirmam que o registro é crível e se provou confiável no passado. Uma autoridade graduada do governo Biden disse ao Congresso que o número relatado pode ser menor que o total (presumivelmente em razão de corpos ainda não recuperados sob escombros).

Se esse registro estiver correto, significa que uma mulher ou criança foi morta em média a cada sete minutos desde que a guerra começou — entre elas, bebês em incubadoras.

A selvageria dos ataques de 7 de outubro motivou o bombardeio, evidentemente, e o Hamas continua a manter reféns. Toda pressão diplomática possível deve ser aplicada para que o Hamas liberte os reféns e, enquanto os mantém cativos, permita que agentes humanitários os visitem. A tendência de alguns progressistas americanos de rasgar pôsteres com imagens dos reféns é repugnante, assim como a onda de antissemitismo que temos visto nos EUA e na Europa.

Há uma distinção: o Hamas matou e sequestrou crianças deliberadamente em 7 de outubro; e Israel não está matando crianças palestinas deliberadamente, está simplesmente bombardeando bairros inteiros sem a mínima consideração por vidas de civis. Há uma diferença moral aí, mas eu não gostaria de tentar explicá-la aos pais e mães enlutados em Gaza.

Mesmo reconhecendo o direito de Israel se defender, de que forma esmagar grandes áreas com bombas de 900 quilos melhora a segurança do país? Os EUA aconselharam Israel repetidamente a usar bombas menores e realizar ataques mais cirúrgicos, em parte para evitar transformar vitórias táticas em uma derrota estratégica.

Palestinos feridos chegam ao Hospital Nasser em Khan Younis, no sul de Gaza, na terça-feira, 5 de dezembro de 2023.  Foto: Yousef Masoud / NYT
Restos de um prédio bombardeado pelo exército israelense em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, em 3 de dezembro de 2023.  Foto: SAID KHATIB / AFP

Até onde podemos perceber, os resultados desta operação até aqui são os seguintes:

  • Israel parece ter degradado modestamente a capacidade militar do Hamas. Um porta-voz militar israelense estimou que milhares de combatentes do Hamas foram mortos, o que poderia corresponder a 10% ou menos da força do grupo.
  • O Hamas ganhou popularidade e credibilidade na Cisjordânia (quando visitei o território recentemente, vi bandeiras do grupo por toda parte).
  • Reféns israelenses foram colocados em risco e, segundo relatos, mortos.
  • As expressões iniciais de apoio a Israel foram substituídas por uma maré de simpatia aos palestinos.
  • O Hamas foi bem-sucedido em um de seus objetivos: colocar a causa palestina de volta à pauta global.
  • A repulsa em relação à perda de vidas palestinas colocou em risco a estabilidade de vizinhos como Jordânia e adiou qualquer esperança de acordo entre Israel e Arábia Saudita.
  • A probabilidade de uma insurreição na Cisjordânia aumentou, juntamente com a de uma guerra maior com o Líbano.

Isso tornou Israel um lugar mais seguro? A ponto de justificar as mortes de uma mulher ou criança a cada sete minutos?

Eu cobri muitos conflitos, e uma das coisas chocantes a respeito do bombardeio de Gaza é sua intensidade. Aproximadamente metade dos edifícios do norte de Gaza apresentam danos estruturais, de acordo com análises de imagens de satélite.

Uma foto tirada do sul de Israel, perto da fronteira com a Faixa de Gaza, em 2 de dezembro de 2023, mostra uma explosão e fumaça sobre o território palestino durante um ataque israelense. Foto: JACK GUEZ / AFP

O ritmo das morte de civis foi muito maior que na maioria de outros conflitos recentes; a única matança comparável que conheço talvez seja o genocídio em Ruanda, de 1994. Muito mais mulheres e crianças parecem ter sido mortas em Gaza do que no primeiro ano inteiro da guerra no Iraque, por exemplo.

“Um sofrimento normalmente adquirido ao longo de vários anos foi condensado em seis semanas”, afirmou a pediatra Annie Sparrow, que tem longa experiência de prática médica em zonas de guerra e trabalha como professora associada da Escola Icahn de Medicina. “Para os bebês que nascem em meio a esta guerra, muitos deles órfãos logo ao nascer, é como se eles herdassem uma aflição congênita — uma predestinação ao sofrimento, a uma vida limitada por acontecimentos que eles não têm capacidade de influenciar”.

Ao pulverizar bairros inteiros e matar civis em grandes números em vez de usar bombas menores e adotar uma estratégia muito mais cirúrgica, conforme pediram autoridades americanas, Israel provocou demandas crescentes por um cessar-fogo estendido que, poderia-se argumentar, equivaleria a uma vitória do Hamas. Em suma, eu considero infligir baixas massivas um erro tanto estratégico quanto moral; enquanto partes de Gaza foram arrasadas com o objetivo de destruir o Hamas, isso poderá ser justamente a salvação do grupo.

Bombas e mísseis americanos matando crianças é algo que deveria nos inquietar especialmente. Estou feliz pelo fato das autoridades do governo Biden terem encontrado sua voz para tentar diminuir a matança, mas gostaria que elas não tivessem demorado tanto.

Se o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu está se afundando em um atoleiro, o presidente Biden não faz nenhum favor a Israel ao conter suas palavras em público. Biden deveria se posicionar mais forçosamente em nome das crianças cujas mortes, eu temo admitir, os americanos são cúmplices.

Vejam, é difícil conversar a respeito do Oriente Médio, porque as pessoas se dividem rapidamente em dois lados. Mas o lado que deveríamos defender é o das crianças que morreram despropositadamente em Israel e Gaza, sem que a segurança de ninguém melhore. As vidas das crianças israelenses, americanas e palestinas têm o mesmo valor, e nós devemos agir de acordo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES — Considerem o seguinte: o lugar mais perigoso para ser criança hoje no planeta é Gaza.

Esta é a avaliação da diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, que, em vez de uma radical exasperada, é ex-embaixadora e advogada experiente, que trabalhou para os presidentes Joe Biden e Barack Obama.

Já parece que morreram pelo menos duas vezes mais crianças em Gaza desde o início da guerra, em 7 de outubro, do que o número total de crianças mortas em todos os conflitos do mundo em 2022, de acordo com registros das Nações Unidas.

Uma mulher carrega o corpo de seu filho, morto em um ataque aéreo a uma casa no campo de refugiados de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, em 08 de novembro de 2023. Foto: HAITHAM IMAD / EFE

“Quase 1 em cada 150 crianças palestinas de Gaza foi morta em apenas dois meses”, notou o médico Zaher Sahloul, presidente do MedGlobal, um grupo de ajuda que trabalha no enclave. “Equivale a meio milhão de crianças americanas.”

Sahloul alertou que muitas outras crianças podem “morrer de infecções, doenças transmissíveis pela água ou desidratação”, enquanto outras sofrerão com deficiências físicas por toda a vida.

Nós podemos e devemos abominar o Hamas, uma força repressiva, misógina e homofóbica que usa civis palestinos como escudo humano. E conseguimos entender como o Estado de Israel, traumatizado pelos selvagens assassinatos e estupros do Hamas, está determinado a contra-atacar. Mas só porque o Hamas é indiferente em relação às vidas das crianças palestinas não significa que Israel e os Estados Unidos também possam agir irresponsavelmente.

O governo Biden continua a defender Israel periodicamente não apenas quando o país é atacado, o que é correto, mas até quando suas forças geram números enormes de mortes de civis em Gaza. Contrariando alegações do governo Biden de que Israel está entendendo a mensagem de demonstrar comedimento, as Nações Unidas informam que esta semana “testemunhou um dos bombardeios mais pesados em Gaza até aqui” e que, “se isso for sequer possível, um cenário ainda mais infernal está prestes a irromper”.

“Nenhum lugar é seguro em Gaza”, afirmou Martin Griffiths, a alta autoridade da ONU para assuntos humanitários. “Esse desrespeito gritante por direitos humanos básicos tem de parar.”

O alto comissário da ONU para direitos humanos, Volker Türk, sugeriu que crimes de guerra foram cometidos tanto pelo Hamas quanto por Israel, ainda que muitos americanos indignem-se com certas mortes e prefiram esquecer-se de outras. Nós dizemos ao mundo que estamos ajudando a Ucrânia em razão da nossa convicção na “ordem internacional com base em regras” e então fornecemos armamentos que acabam matando crianças em grande escala em Gaza.

Uma mulher sentada com crianças do lado de fora, enquanto palestinos deslocados, que fugiram de suas casas devido ao ataque israelense, se abrigam em um campo em Rafah, em meio ao conflito contínuo entre Israel e o grupo islâmico palestino Hamas, no sul da Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023.  Foto: Ibraheem Abu Mustafa / REUTERS

Muita gente vê a coisa através de um prisma segundo o qual vidas de um dos lados têm valor incalculável enquanto as mortes do outro são apenas lamentáveis.

As autoridades de saúde de Gaza afirmam que 16.248 pessoas foram mortas no enclave até aqui, cerca de 70% mulheres e crianças. É impossível verificar esse número, mas entidades que monitoram direitos humanos afirmam que o registro é crível e se provou confiável no passado. Uma autoridade graduada do governo Biden disse ao Congresso que o número relatado pode ser menor que o total (presumivelmente em razão de corpos ainda não recuperados sob escombros).

Se esse registro estiver correto, significa que uma mulher ou criança foi morta em média a cada sete minutos desde que a guerra começou — entre elas, bebês em incubadoras.

A selvageria dos ataques de 7 de outubro motivou o bombardeio, evidentemente, e o Hamas continua a manter reféns. Toda pressão diplomática possível deve ser aplicada para que o Hamas liberte os reféns e, enquanto os mantém cativos, permita que agentes humanitários os visitem. A tendência de alguns progressistas americanos de rasgar pôsteres com imagens dos reféns é repugnante, assim como a onda de antissemitismo que temos visto nos EUA e na Europa.

Há uma distinção: o Hamas matou e sequestrou crianças deliberadamente em 7 de outubro; e Israel não está matando crianças palestinas deliberadamente, está simplesmente bombardeando bairros inteiros sem a mínima consideração por vidas de civis. Há uma diferença moral aí, mas eu não gostaria de tentar explicá-la aos pais e mães enlutados em Gaza.

Mesmo reconhecendo o direito de Israel se defender, de que forma esmagar grandes áreas com bombas de 900 quilos melhora a segurança do país? Os EUA aconselharam Israel repetidamente a usar bombas menores e realizar ataques mais cirúrgicos, em parte para evitar transformar vitórias táticas em uma derrota estratégica.

Palestinos feridos chegam ao Hospital Nasser em Khan Younis, no sul de Gaza, na terça-feira, 5 de dezembro de 2023.  Foto: Yousef Masoud / NYT
Restos de um prédio bombardeado pelo exército israelense em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, em 3 de dezembro de 2023.  Foto: SAID KHATIB / AFP

Até onde podemos perceber, os resultados desta operação até aqui são os seguintes:

  • Israel parece ter degradado modestamente a capacidade militar do Hamas. Um porta-voz militar israelense estimou que milhares de combatentes do Hamas foram mortos, o que poderia corresponder a 10% ou menos da força do grupo.
  • O Hamas ganhou popularidade e credibilidade na Cisjordânia (quando visitei o território recentemente, vi bandeiras do grupo por toda parte).
  • Reféns israelenses foram colocados em risco e, segundo relatos, mortos.
  • As expressões iniciais de apoio a Israel foram substituídas por uma maré de simpatia aos palestinos.
  • O Hamas foi bem-sucedido em um de seus objetivos: colocar a causa palestina de volta à pauta global.
  • A repulsa em relação à perda de vidas palestinas colocou em risco a estabilidade de vizinhos como Jordânia e adiou qualquer esperança de acordo entre Israel e Arábia Saudita.
  • A probabilidade de uma insurreição na Cisjordânia aumentou, juntamente com a de uma guerra maior com o Líbano.

Isso tornou Israel um lugar mais seguro? A ponto de justificar as mortes de uma mulher ou criança a cada sete minutos?

Eu cobri muitos conflitos, e uma das coisas chocantes a respeito do bombardeio de Gaza é sua intensidade. Aproximadamente metade dos edifícios do norte de Gaza apresentam danos estruturais, de acordo com análises de imagens de satélite.

Uma foto tirada do sul de Israel, perto da fronteira com a Faixa de Gaza, em 2 de dezembro de 2023, mostra uma explosão e fumaça sobre o território palestino durante um ataque israelense. Foto: JACK GUEZ / AFP

O ritmo das morte de civis foi muito maior que na maioria de outros conflitos recentes; a única matança comparável que conheço talvez seja o genocídio em Ruanda, de 1994. Muito mais mulheres e crianças parecem ter sido mortas em Gaza do que no primeiro ano inteiro da guerra no Iraque, por exemplo.

“Um sofrimento normalmente adquirido ao longo de vários anos foi condensado em seis semanas”, afirmou a pediatra Annie Sparrow, que tem longa experiência de prática médica em zonas de guerra e trabalha como professora associada da Escola Icahn de Medicina. “Para os bebês que nascem em meio a esta guerra, muitos deles órfãos logo ao nascer, é como se eles herdassem uma aflição congênita — uma predestinação ao sofrimento, a uma vida limitada por acontecimentos que eles não têm capacidade de influenciar”.

Ao pulverizar bairros inteiros e matar civis em grandes números em vez de usar bombas menores e adotar uma estratégia muito mais cirúrgica, conforme pediram autoridades americanas, Israel provocou demandas crescentes por um cessar-fogo estendido que, poderia-se argumentar, equivaleria a uma vitória do Hamas. Em suma, eu considero infligir baixas massivas um erro tanto estratégico quanto moral; enquanto partes de Gaza foram arrasadas com o objetivo de destruir o Hamas, isso poderá ser justamente a salvação do grupo.

Bombas e mísseis americanos matando crianças é algo que deveria nos inquietar especialmente. Estou feliz pelo fato das autoridades do governo Biden terem encontrado sua voz para tentar diminuir a matança, mas gostaria que elas não tivessem demorado tanto.

Se o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu está se afundando em um atoleiro, o presidente Biden não faz nenhum favor a Israel ao conter suas palavras em público. Biden deveria se posicionar mais forçosamente em nome das crianças cujas mortes, eu temo admitir, os americanos são cúmplices.

Vejam, é difícil conversar a respeito do Oriente Médio, porque as pessoas se dividem rapidamente em dois lados. Mas o lado que deveríamos defender é o das crianças que morreram despropositadamente em Israel e Gaza, sem que a segurança de ninguém melhore. As vidas das crianças israelenses, americanas e palestinas têm o mesmo valor, e nós devemos agir de acordo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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