Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio, morre aos 93 anos na Argentina


Suas cinzas serão jogadas na Praça de Maio, onde se reunia todas as quintas-feiras com outras mães e avós que buscavam seus filhos e netos desaparecidos durante a ditadura argentina

Por Redação
Atualização:

BUENOS AIRES - Hebe de Bonafini, a dona de casa que buscou seus filhos e uma nora desaparecidos durante a ditadura militar argentina e se tornou uma das mais emblemáticas ativistas pelos direitos humanos, morreu neste domingo, 20, na Argentina aos 93 anos. A morte foi confirmada pela família e suas cinzas serão jogadas na Praça de Maio, onde se reunia todas as quintas-feiras com outras mães e avós que buscavam seus filhos e netos sequestrados pela ditadura.

Mãe de dois desaparecidos, Bonafini se tornou uma defensora histórica e ativista dos direitos humanos, foi um dos principais rostos da Asociación Madres de Plaza de Mayo (Associação Mães da Praça de Maio) organização argentina conhecida no mundo todo pela busca dos desaparecidos, incluindo de crianças doadas a outras famílias durante a ditadura argentina.

A morte foi confirmada por sua filha Alejandra Bonafini, que agradeceu as manifestações de carinho recebidas enquanto ela estava internada nos últimos dias no Hospital Italiano da cidade de La Plata, província de Buenos Aires.

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Hebe de Bonafini, fundadora do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio marcha durante a Marcha de Resistência de 24 horas, na Plaza de Mayo, em 29 de novembro de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

“São momentos muito difíceis e de profunda tristeza e compreendemos o amor do povo por Hebe, mas neste momento temos a necessidade de chorar na intimidade”, afirmou Alejandra Bonafini. A conta oficial da associação Mães da Praça de Maio informou que as cinzas de Bonafini “como pedido da própria Hebe, descansarão na Praça de Maio”.

“Nossa presidente, Hebe de Bonafini, mudou de casa, como sempre dizia de suas companheiras que a precederam no jogo. Continuará para sempre na Praça de Maio”, continuou o perfil oficial.

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A ativista sofria de complicações derivadas de doenças crônicas que nas últimas semanas se agravaram consideravelmente, explicou o ministro da Saúde de Buenos Aires, Nicolás Kreplak. Ela havia sido internada em 10 de outubro para realizar exames complementares e recebeu alta três dias depois. Mas nos últimos dias ela voltou a ser internada devido a complicações de saúde, situação que a família manteve sob sigilo.

A última aparição pública de Bonafini foi em 10 de novembro, na tradicional marcha realizada todas as quintas-feiras pelas Mães da Praça de Maio em frente à Casa Rosada. “Os médicos me deixaram vir porque sabem que isso também faz parte da minha saúde. Eu preciso da Praça para me curar, preciso de vocês para melhorar”, afirmou na ocasião.

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A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, muito próxima da ativista, foi uma das primeiras a lamentar sua morte. “Queridíssima Hebe, Mãe da Praça de Maio, símbolo mundial da luta pelos Direitos Humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no dia da Soberania Nacional... não deve ser coincidência. Simplesmente obrigado e até sempre”, escreveu Cristina Kirchner no Twitter.

O governo argentino decretou três dias de luto nacional e disse em comunicado que “se despede com profunda dor e respeito” daquela que é considerada uma incansável lutadora pelos direitos humanos. “O governo e o povo argentino encontram nela um símbolo internacional da busca pela memória, verdade e justiça para os trinta mil desaparecidos”, continuou. Como fundadora das Mães da Praça de Maio, “lançou luz na noite escura da ditadura militar”.

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De dona de casa à busca pelos filhos

Hebe María Pastor de Bonafini foi uma das fundadoras da Associação Mães da Praça de Maio em 1977, dois anos após o golpe militar que colocou em prática o mais feroz aparato repressivo contra os dissidentes da ditadura.

Como presidente da organização de 1979 até sua morte, Bonafini primeiro lutou para descobrir o paradeiro de dois de seus filhos e uma nora desaparecidos e pelo julgamento e punição dos militares, antes de se envolver em outras causas políticas e sociais.

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Nasceu em 1928 na cidade de Ensenada, na província de Buenos Aires. Aos 18 anos casou-se com Humberto Alfredo Bonafini, vizinho do bairro, com quem teve três filhos: Jorge, Raúl e Alejandra.

Dona de casa, com ensino fundamental mal concluído, todos a conheciam como Kika Pastor até que membros das forças armadas sequestraram seu filho mais velho em fevereiro de 1977 e a partir desse momento “meu filho sumiu, virei Hebe de Bonafini, é isso que sou agora, uma mãe”, disse ela em uma de suas últimas entrevistas.

Seus filhos eram militantes de organizações de esquerda, um deles inclusive na luta armada, segundo a mãe, que admitiu conhecer sua atividade política. No final de 1977, Raúl desapareceu. Como outras mães, Bonafini abandonou a rotina do lar e foi procurar os filhos.

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Líder do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, à direita, lidera um protesto em frente a uma igreja Foto: Eduardo Di Baia/AP

Ao visitar hospitais, tribunais, delegacias, quartéis e necrotérios, começou a se deparar com outras mulheres com a mesma cara de dor. Diante da falta de respostas, elas concordaram em se reunir no sábado, 30 de abril de 1977, na Praça de Maio, em frente à sede do governo, e marchar pela aparição de seus filhos, com a esperança de chamar a atenção de Jorge Rafael Videla, então líder da junta militar que governou o país de 1976 a 1983.

Como na época vigorava o estado de sítio, que proibia reuniões de mais de três pessoas por serem potencialmente subversivas, um policial as mandou “circular”, então elas começaram a contornar a Pirâmide de Maio, no centro da praça. Elas se reuniram no mesmo local na quinta-feira seguinte e desde então a marcha se repete todas as quintas-feiras até hoje.

O grupo original de mães participou de uma grande peregrinação à Virgem de Luján em outubro de 1977 e, para se reconhecerem, concordaram em colocar na cabeça as fraldas de pano branco de seus filhos, que com o tempo se tornariam o distintivo da organização.

Durante a ditadura, se estima que mais de 30 mil pessoas desapareceram, a grande maioria sem ter seu paradeiro revelado. Os números oficiais, no entanto, cortam esse número pela metade. Bonafini, como outros membros da organização, nunca quis procurar os restos mortais de seus filhos, até porque dizia que “não estavam mortos e sim desaparecidos”. Também não participou de comissões de investigação que serviram para condenar os repressores após a volta da democracia em 1983, nem cobrou indenizações do Estado.

Para intimidar as mulheres, os militares sequestraram e assassinaram Azucena Villaflor, a primeira presidente da organização e outras duas mães. Mas suas companheiras não pararam de procurar seus filhos e fortaleceram ainda mais seus laços. Hebe de Bonafini assumiu a presidência desde então.

Hebe de Bonafini fala durante coletiva de imprensa do lado de fora da sede do Mães da Praça de Maio em 15 de abril de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Controvérsias

Hebe de Bonafini, no entanto, estabeleceu um perfil polêmico ao se tornar uma militante aguerrida do ‘kirchnerismo’ e ferrenha defensora do casal Néstor Kirchner e Cristina. Sua morte provocou várias reações nas redes sociais, com múltiplas mensagens de afeto e rejeição por questões políticas, já que ela ficou muito marcada por declarações controversas e elogios a personalidades como Ernesto “Che” Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.

Após os ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, Bonafini lançou uma de suas declarações mais polêmicas: “Quando o ataque aconteceu e eu estava em Cuba visitando minha filha, senti alegria. Não vou ser hipócrita, não doeu nada.”

O ex-presidente boliviano Evo Morales é recebido pela por Hebe de Bonafini em 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Bonafini questionou duramente os sucessivos governos democráticos até que em 2003 foi recebida pela primeira vez na casa do governo pelo presidente eleito Néstor Kirchner, que mais tarde promoveria a revogação das leis de anistia e indulto que protegiam os acusados de crimes de lesa humanidade. A ativista se tornou então defensora de Kirchner e suas políticas.

Em meio a uma briga com o Grupo Clarín, o conglomerado de mídia mais poderoso do país, Bonafini organizou um julgamento público e popular simulado na Praça de Maio contra jornalistas críticos ao governo e em frente aos tribunais ameaçaram “tomar” o prédio se o Supremo Tribunal de Justiça não endossasse uma lei sobre mídia audiovisual promovida pelo kirchnerismo.

Essa proximidade com o poder político lhe rendeu duros questionamento e uma briga com outras organizações de direitos humanos. Em 2011, Bonafini foi acusada de irregularidades na gestão de fundos públicos destinados a um programa de construção de habitação social da Fundação Mães da Praça de Maio. A figura da ativista ficou manchada pelo escândalo que ainda não foi resolvido na Justiça.

O roqueiro britânico Sting é saudado por Hebe de Bonafini antes de um show no estádio Velez Sarsfield em Buenos Aires, em 16 de janeiro de 2001 Foto: Reuters

No exterior, por outro lado, as opiniões são mais favoráveis. Ela recebeu inúmeros prêmios e distinções e chegou a compartilhar palco com o cantor britânico Sting ao som de “They dance alone” em várias ocasiões.

Essa música, composta pelo ex-líder do Police em 1987, foi uma homenagem às mulheres chilenas que haviam perdido seus maridos e parentes durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e foi estendida, durante suas apresentações na Argentina, às mães da Praça de Maio./AFP, AP e EFE

BUENOS AIRES - Hebe de Bonafini, a dona de casa que buscou seus filhos e uma nora desaparecidos durante a ditadura militar argentina e se tornou uma das mais emblemáticas ativistas pelos direitos humanos, morreu neste domingo, 20, na Argentina aos 93 anos. A morte foi confirmada pela família e suas cinzas serão jogadas na Praça de Maio, onde se reunia todas as quintas-feiras com outras mães e avós que buscavam seus filhos e netos sequestrados pela ditadura.

Mãe de dois desaparecidos, Bonafini se tornou uma defensora histórica e ativista dos direitos humanos, foi um dos principais rostos da Asociación Madres de Plaza de Mayo (Associação Mães da Praça de Maio) organização argentina conhecida no mundo todo pela busca dos desaparecidos, incluindo de crianças doadas a outras famílias durante a ditadura argentina.

A morte foi confirmada por sua filha Alejandra Bonafini, que agradeceu as manifestações de carinho recebidas enquanto ela estava internada nos últimos dias no Hospital Italiano da cidade de La Plata, província de Buenos Aires.

Hebe de Bonafini, fundadora do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio marcha durante a Marcha de Resistência de 24 horas, na Plaza de Mayo, em 29 de novembro de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

“São momentos muito difíceis e de profunda tristeza e compreendemos o amor do povo por Hebe, mas neste momento temos a necessidade de chorar na intimidade”, afirmou Alejandra Bonafini. A conta oficial da associação Mães da Praça de Maio informou que as cinzas de Bonafini “como pedido da própria Hebe, descansarão na Praça de Maio”.

“Nossa presidente, Hebe de Bonafini, mudou de casa, como sempre dizia de suas companheiras que a precederam no jogo. Continuará para sempre na Praça de Maio”, continuou o perfil oficial.

A ativista sofria de complicações derivadas de doenças crônicas que nas últimas semanas se agravaram consideravelmente, explicou o ministro da Saúde de Buenos Aires, Nicolás Kreplak. Ela havia sido internada em 10 de outubro para realizar exames complementares e recebeu alta três dias depois. Mas nos últimos dias ela voltou a ser internada devido a complicações de saúde, situação que a família manteve sob sigilo.

A última aparição pública de Bonafini foi em 10 de novembro, na tradicional marcha realizada todas as quintas-feiras pelas Mães da Praça de Maio em frente à Casa Rosada. “Os médicos me deixaram vir porque sabem que isso também faz parte da minha saúde. Eu preciso da Praça para me curar, preciso de vocês para melhorar”, afirmou na ocasião.

A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, muito próxima da ativista, foi uma das primeiras a lamentar sua morte. “Queridíssima Hebe, Mãe da Praça de Maio, símbolo mundial da luta pelos Direitos Humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no dia da Soberania Nacional... não deve ser coincidência. Simplesmente obrigado e até sempre”, escreveu Cristina Kirchner no Twitter.

O governo argentino decretou três dias de luto nacional e disse em comunicado que “se despede com profunda dor e respeito” daquela que é considerada uma incansável lutadora pelos direitos humanos. “O governo e o povo argentino encontram nela um símbolo internacional da busca pela memória, verdade e justiça para os trinta mil desaparecidos”, continuou. Como fundadora das Mães da Praça de Maio, “lançou luz na noite escura da ditadura militar”.

De dona de casa à busca pelos filhos

Hebe María Pastor de Bonafini foi uma das fundadoras da Associação Mães da Praça de Maio em 1977, dois anos após o golpe militar que colocou em prática o mais feroz aparato repressivo contra os dissidentes da ditadura.

Como presidente da organização de 1979 até sua morte, Bonafini primeiro lutou para descobrir o paradeiro de dois de seus filhos e uma nora desaparecidos e pelo julgamento e punição dos militares, antes de se envolver em outras causas políticas e sociais.

Nasceu em 1928 na cidade de Ensenada, na província de Buenos Aires. Aos 18 anos casou-se com Humberto Alfredo Bonafini, vizinho do bairro, com quem teve três filhos: Jorge, Raúl e Alejandra.

Dona de casa, com ensino fundamental mal concluído, todos a conheciam como Kika Pastor até que membros das forças armadas sequestraram seu filho mais velho em fevereiro de 1977 e a partir desse momento “meu filho sumiu, virei Hebe de Bonafini, é isso que sou agora, uma mãe”, disse ela em uma de suas últimas entrevistas.

Seus filhos eram militantes de organizações de esquerda, um deles inclusive na luta armada, segundo a mãe, que admitiu conhecer sua atividade política. No final de 1977, Raúl desapareceu. Como outras mães, Bonafini abandonou a rotina do lar e foi procurar os filhos.

Líder do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, à direita, lidera um protesto em frente a uma igreja Foto: Eduardo Di Baia/AP

Ao visitar hospitais, tribunais, delegacias, quartéis e necrotérios, começou a se deparar com outras mulheres com a mesma cara de dor. Diante da falta de respostas, elas concordaram em se reunir no sábado, 30 de abril de 1977, na Praça de Maio, em frente à sede do governo, e marchar pela aparição de seus filhos, com a esperança de chamar a atenção de Jorge Rafael Videla, então líder da junta militar que governou o país de 1976 a 1983.

Como na época vigorava o estado de sítio, que proibia reuniões de mais de três pessoas por serem potencialmente subversivas, um policial as mandou “circular”, então elas começaram a contornar a Pirâmide de Maio, no centro da praça. Elas se reuniram no mesmo local na quinta-feira seguinte e desde então a marcha se repete todas as quintas-feiras até hoje.

O grupo original de mães participou de uma grande peregrinação à Virgem de Luján em outubro de 1977 e, para se reconhecerem, concordaram em colocar na cabeça as fraldas de pano branco de seus filhos, que com o tempo se tornariam o distintivo da organização.

Durante a ditadura, se estima que mais de 30 mil pessoas desapareceram, a grande maioria sem ter seu paradeiro revelado. Os números oficiais, no entanto, cortam esse número pela metade. Bonafini, como outros membros da organização, nunca quis procurar os restos mortais de seus filhos, até porque dizia que “não estavam mortos e sim desaparecidos”. Também não participou de comissões de investigação que serviram para condenar os repressores após a volta da democracia em 1983, nem cobrou indenizações do Estado.

Para intimidar as mulheres, os militares sequestraram e assassinaram Azucena Villaflor, a primeira presidente da organização e outras duas mães. Mas suas companheiras não pararam de procurar seus filhos e fortaleceram ainda mais seus laços. Hebe de Bonafini assumiu a presidência desde então.

Hebe de Bonafini fala durante coletiva de imprensa do lado de fora da sede do Mães da Praça de Maio em 15 de abril de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Controvérsias

Hebe de Bonafini, no entanto, estabeleceu um perfil polêmico ao se tornar uma militante aguerrida do ‘kirchnerismo’ e ferrenha defensora do casal Néstor Kirchner e Cristina. Sua morte provocou várias reações nas redes sociais, com múltiplas mensagens de afeto e rejeição por questões políticas, já que ela ficou muito marcada por declarações controversas e elogios a personalidades como Ernesto “Che” Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.

Após os ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, Bonafini lançou uma de suas declarações mais polêmicas: “Quando o ataque aconteceu e eu estava em Cuba visitando minha filha, senti alegria. Não vou ser hipócrita, não doeu nada.”

O ex-presidente boliviano Evo Morales é recebido pela por Hebe de Bonafini em 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Bonafini questionou duramente os sucessivos governos democráticos até que em 2003 foi recebida pela primeira vez na casa do governo pelo presidente eleito Néstor Kirchner, que mais tarde promoveria a revogação das leis de anistia e indulto que protegiam os acusados de crimes de lesa humanidade. A ativista se tornou então defensora de Kirchner e suas políticas.

Em meio a uma briga com o Grupo Clarín, o conglomerado de mídia mais poderoso do país, Bonafini organizou um julgamento público e popular simulado na Praça de Maio contra jornalistas críticos ao governo e em frente aos tribunais ameaçaram “tomar” o prédio se o Supremo Tribunal de Justiça não endossasse uma lei sobre mídia audiovisual promovida pelo kirchnerismo.

Essa proximidade com o poder político lhe rendeu duros questionamento e uma briga com outras organizações de direitos humanos. Em 2011, Bonafini foi acusada de irregularidades na gestão de fundos públicos destinados a um programa de construção de habitação social da Fundação Mães da Praça de Maio. A figura da ativista ficou manchada pelo escândalo que ainda não foi resolvido na Justiça.

O roqueiro britânico Sting é saudado por Hebe de Bonafini antes de um show no estádio Velez Sarsfield em Buenos Aires, em 16 de janeiro de 2001 Foto: Reuters

No exterior, por outro lado, as opiniões são mais favoráveis. Ela recebeu inúmeros prêmios e distinções e chegou a compartilhar palco com o cantor britânico Sting ao som de “They dance alone” em várias ocasiões.

Essa música, composta pelo ex-líder do Police em 1987, foi uma homenagem às mulheres chilenas que haviam perdido seus maridos e parentes durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e foi estendida, durante suas apresentações na Argentina, às mães da Praça de Maio./AFP, AP e EFE

BUENOS AIRES - Hebe de Bonafini, a dona de casa que buscou seus filhos e uma nora desaparecidos durante a ditadura militar argentina e se tornou uma das mais emblemáticas ativistas pelos direitos humanos, morreu neste domingo, 20, na Argentina aos 93 anos. A morte foi confirmada pela família e suas cinzas serão jogadas na Praça de Maio, onde se reunia todas as quintas-feiras com outras mães e avós que buscavam seus filhos e netos sequestrados pela ditadura.

Mãe de dois desaparecidos, Bonafini se tornou uma defensora histórica e ativista dos direitos humanos, foi um dos principais rostos da Asociación Madres de Plaza de Mayo (Associação Mães da Praça de Maio) organização argentina conhecida no mundo todo pela busca dos desaparecidos, incluindo de crianças doadas a outras famílias durante a ditadura argentina.

A morte foi confirmada por sua filha Alejandra Bonafini, que agradeceu as manifestações de carinho recebidas enquanto ela estava internada nos últimos dias no Hospital Italiano da cidade de La Plata, província de Buenos Aires.

Hebe de Bonafini, fundadora do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio marcha durante a Marcha de Resistência de 24 horas, na Plaza de Mayo, em 29 de novembro de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

“São momentos muito difíceis e de profunda tristeza e compreendemos o amor do povo por Hebe, mas neste momento temos a necessidade de chorar na intimidade”, afirmou Alejandra Bonafini. A conta oficial da associação Mães da Praça de Maio informou que as cinzas de Bonafini “como pedido da própria Hebe, descansarão na Praça de Maio”.

“Nossa presidente, Hebe de Bonafini, mudou de casa, como sempre dizia de suas companheiras que a precederam no jogo. Continuará para sempre na Praça de Maio”, continuou o perfil oficial.

A ativista sofria de complicações derivadas de doenças crônicas que nas últimas semanas se agravaram consideravelmente, explicou o ministro da Saúde de Buenos Aires, Nicolás Kreplak. Ela havia sido internada em 10 de outubro para realizar exames complementares e recebeu alta três dias depois. Mas nos últimos dias ela voltou a ser internada devido a complicações de saúde, situação que a família manteve sob sigilo.

A última aparição pública de Bonafini foi em 10 de novembro, na tradicional marcha realizada todas as quintas-feiras pelas Mães da Praça de Maio em frente à Casa Rosada. “Os médicos me deixaram vir porque sabem que isso também faz parte da minha saúde. Eu preciso da Praça para me curar, preciso de vocês para melhorar”, afirmou na ocasião.

A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, muito próxima da ativista, foi uma das primeiras a lamentar sua morte. “Queridíssima Hebe, Mãe da Praça de Maio, símbolo mundial da luta pelos Direitos Humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no dia da Soberania Nacional... não deve ser coincidência. Simplesmente obrigado e até sempre”, escreveu Cristina Kirchner no Twitter.

O governo argentino decretou três dias de luto nacional e disse em comunicado que “se despede com profunda dor e respeito” daquela que é considerada uma incansável lutadora pelos direitos humanos. “O governo e o povo argentino encontram nela um símbolo internacional da busca pela memória, verdade e justiça para os trinta mil desaparecidos”, continuou. Como fundadora das Mães da Praça de Maio, “lançou luz na noite escura da ditadura militar”.

De dona de casa à busca pelos filhos

Hebe María Pastor de Bonafini foi uma das fundadoras da Associação Mães da Praça de Maio em 1977, dois anos após o golpe militar que colocou em prática o mais feroz aparato repressivo contra os dissidentes da ditadura.

Como presidente da organização de 1979 até sua morte, Bonafini primeiro lutou para descobrir o paradeiro de dois de seus filhos e uma nora desaparecidos e pelo julgamento e punição dos militares, antes de se envolver em outras causas políticas e sociais.

Nasceu em 1928 na cidade de Ensenada, na província de Buenos Aires. Aos 18 anos casou-se com Humberto Alfredo Bonafini, vizinho do bairro, com quem teve três filhos: Jorge, Raúl e Alejandra.

Dona de casa, com ensino fundamental mal concluído, todos a conheciam como Kika Pastor até que membros das forças armadas sequestraram seu filho mais velho em fevereiro de 1977 e a partir desse momento “meu filho sumiu, virei Hebe de Bonafini, é isso que sou agora, uma mãe”, disse ela em uma de suas últimas entrevistas.

Seus filhos eram militantes de organizações de esquerda, um deles inclusive na luta armada, segundo a mãe, que admitiu conhecer sua atividade política. No final de 1977, Raúl desapareceu. Como outras mães, Bonafini abandonou a rotina do lar e foi procurar os filhos.

Líder do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, à direita, lidera um protesto em frente a uma igreja Foto: Eduardo Di Baia/AP

Ao visitar hospitais, tribunais, delegacias, quartéis e necrotérios, começou a se deparar com outras mulheres com a mesma cara de dor. Diante da falta de respostas, elas concordaram em se reunir no sábado, 30 de abril de 1977, na Praça de Maio, em frente à sede do governo, e marchar pela aparição de seus filhos, com a esperança de chamar a atenção de Jorge Rafael Videla, então líder da junta militar que governou o país de 1976 a 1983.

Como na época vigorava o estado de sítio, que proibia reuniões de mais de três pessoas por serem potencialmente subversivas, um policial as mandou “circular”, então elas começaram a contornar a Pirâmide de Maio, no centro da praça. Elas se reuniram no mesmo local na quinta-feira seguinte e desde então a marcha se repete todas as quintas-feiras até hoje.

O grupo original de mães participou de uma grande peregrinação à Virgem de Luján em outubro de 1977 e, para se reconhecerem, concordaram em colocar na cabeça as fraldas de pano branco de seus filhos, que com o tempo se tornariam o distintivo da organização.

Durante a ditadura, se estima que mais de 30 mil pessoas desapareceram, a grande maioria sem ter seu paradeiro revelado. Os números oficiais, no entanto, cortam esse número pela metade. Bonafini, como outros membros da organização, nunca quis procurar os restos mortais de seus filhos, até porque dizia que “não estavam mortos e sim desaparecidos”. Também não participou de comissões de investigação que serviram para condenar os repressores após a volta da democracia em 1983, nem cobrou indenizações do Estado.

Para intimidar as mulheres, os militares sequestraram e assassinaram Azucena Villaflor, a primeira presidente da organização e outras duas mães. Mas suas companheiras não pararam de procurar seus filhos e fortaleceram ainda mais seus laços. Hebe de Bonafini assumiu a presidência desde então.

Hebe de Bonafini fala durante coletiva de imprensa do lado de fora da sede do Mães da Praça de Maio em 15 de abril de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Controvérsias

Hebe de Bonafini, no entanto, estabeleceu um perfil polêmico ao se tornar uma militante aguerrida do ‘kirchnerismo’ e ferrenha defensora do casal Néstor Kirchner e Cristina. Sua morte provocou várias reações nas redes sociais, com múltiplas mensagens de afeto e rejeição por questões políticas, já que ela ficou muito marcada por declarações controversas e elogios a personalidades como Ernesto “Che” Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.

Após os ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, Bonafini lançou uma de suas declarações mais polêmicas: “Quando o ataque aconteceu e eu estava em Cuba visitando minha filha, senti alegria. Não vou ser hipócrita, não doeu nada.”

O ex-presidente boliviano Evo Morales é recebido pela por Hebe de Bonafini em 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Bonafini questionou duramente os sucessivos governos democráticos até que em 2003 foi recebida pela primeira vez na casa do governo pelo presidente eleito Néstor Kirchner, que mais tarde promoveria a revogação das leis de anistia e indulto que protegiam os acusados de crimes de lesa humanidade. A ativista se tornou então defensora de Kirchner e suas políticas.

Em meio a uma briga com o Grupo Clarín, o conglomerado de mídia mais poderoso do país, Bonafini organizou um julgamento público e popular simulado na Praça de Maio contra jornalistas críticos ao governo e em frente aos tribunais ameaçaram “tomar” o prédio se o Supremo Tribunal de Justiça não endossasse uma lei sobre mídia audiovisual promovida pelo kirchnerismo.

Essa proximidade com o poder político lhe rendeu duros questionamento e uma briga com outras organizações de direitos humanos. Em 2011, Bonafini foi acusada de irregularidades na gestão de fundos públicos destinados a um programa de construção de habitação social da Fundação Mães da Praça de Maio. A figura da ativista ficou manchada pelo escândalo que ainda não foi resolvido na Justiça.

O roqueiro britânico Sting é saudado por Hebe de Bonafini antes de um show no estádio Velez Sarsfield em Buenos Aires, em 16 de janeiro de 2001 Foto: Reuters

No exterior, por outro lado, as opiniões são mais favoráveis. Ela recebeu inúmeros prêmios e distinções e chegou a compartilhar palco com o cantor britânico Sting ao som de “They dance alone” em várias ocasiões.

Essa música, composta pelo ex-líder do Police em 1987, foi uma homenagem às mulheres chilenas que haviam perdido seus maridos e parentes durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e foi estendida, durante suas apresentações na Argentina, às mães da Praça de Maio./AFP, AP e EFE

BUENOS AIRES - Hebe de Bonafini, a dona de casa que buscou seus filhos e uma nora desaparecidos durante a ditadura militar argentina e se tornou uma das mais emblemáticas ativistas pelos direitos humanos, morreu neste domingo, 20, na Argentina aos 93 anos. A morte foi confirmada pela família e suas cinzas serão jogadas na Praça de Maio, onde se reunia todas as quintas-feiras com outras mães e avós que buscavam seus filhos e netos sequestrados pela ditadura.

Mãe de dois desaparecidos, Bonafini se tornou uma defensora histórica e ativista dos direitos humanos, foi um dos principais rostos da Asociación Madres de Plaza de Mayo (Associação Mães da Praça de Maio) organização argentina conhecida no mundo todo pela busca dos desaparecidos, incluindo de crianças doadas a outras famílias durante a ditadura argentina.

A morte foi confirmada por sua filha Alejandra Bonafini, que agradeceu as manifestações de carinho recebidas enquanto ela estava internada nos últimos dias no Hospital Italiano da cidade de La Plata, província de Buenos Aires.

Hebe de Bonafini, fundadora do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio marcha durante a Marcha de Resistência de 24 horas, na Plaza de Mayo, em 29 de novembro de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

“São momentos muito difíceis e de profunda tristeza e compreendemos o amor do povo por Hebe, mas neste momento temos a necessidade de chorar na intimidade”, afirmou Alejandra Bonafini. A conta oficial da associação Mães da Praça de Maio informou que as cinzas de Bonafini “como pedido da própria Hebe, descansarão na Praça de Maio”.

“Nossa presidente, Hebe de Bonafini, mudou de casa, como sempre dizia de suas companheiras que a precederam no jogo. Continuará para sempre na Praça de Maio”, continuou o perfil oficial.

A ativista sofria de complicações derivadas de doenças crônicas que nas últimas semanas se agravaram consideravelmente, explicou o ministro da Saúde de Buenos Aires, Nicolás Kreplak. Ela havia sido internada em 10 de outubro para realizar exames complementares e recebeu alta três dias depois. Mas nos últimos dias ela voltou a ser internada devido a complicações de saúde, situação que a família manteve sob sigilo.

A última aparição pública de Bonafini foi em 10 de novembro, na tradicional marcha realizada todas as quintas-feiras pelas Mães da Praça de Maio em frente à Casa Rosada. “Os médicos me deixaram vir porque sabem que isso também faz parte da minha saúde. Eu preciso da Praça para me curar, preciso de vocês para melhorar”, afirmou na ocasião.

A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, muito próxima da ativista, foi uma das primeiras a lamentar sua morte. “Queridíssima Hebe, Mãe da Praça de Maio, símbolo mundial da luta pelos Direitos Humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no dia da Soberania Nacional... não deve ser coincidência. Simplesmente obrigado e até sempre”, escreveu Cristina Kirchner no Twitter.

O governo argentino decretou três dias de luto nacional e disse em comunicado que “se despede com profunda dor e respeito” daquela que é considerada uma incansável lutadora pelos direitos humanos. “O governo e o povo argentino encontram nela um símbolo internacional da busca pela memória, verdade e justiça para os trinta mil desaparecidos”, continuou. Como fundadora das Mães da Praça de Maio, “lançou luz na noite escura da ditadura militar”.

De dona de casa à busca pelos filhos

Hebe María Pastor de Bonafini foi uma das fundadoras da Associação Mães da Praça de Maio em 1977, dois anos após o golpe militar que colocou em prática o mais feroz aparato repressivo contra os dissidentes da ditadura.

Como presidente da organização de 1979 até sua morte, Bonafini primeiro lutou para descobrir o paradeiro de dois de seus filhos e uma nora desaparecidos e pelo julgamento e punição dos militares, antes de se envolver em outras causas políticas e sociais.

Nasceu em 1928 na cidade de Ensenada, na província de Buenos Aires. Aos 18 anos casou-se com Humberto Alfredo Bonafini, vizinho do bairro, com quem teve três filhos: Jorge, Raúl e Alejandra.

Dona de casa, com ensino fundamental mal concluído, todos a conheciam como Kika Pastor até que membros das forças armadas sequestraram seu filho mais velho em fevereiro de 1977 e a partir desse momento “meu filho sumiu, virei Hebe de Bonafini, é isso que sou agora, uma mãe”, disse ela em uma de suas últimas entrevistas.

Seus filhos eram militantes de organizações de esquerda, um deles inclusive na luta armada, segundo a mãe, que admitiu conhecer sua atividade política. No final de 1977, Raúl desapareceu. Como outras mães, Bonafini abandonou a rotina do lar e foi procurar os filhos.

Líder do grupo de direitos humanos Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, à direita, lidera um protesto em frente a uma igreja Foto: Eduardo Di Baia/AP

Ao visitar hospitais, tribunais, delegacias, quartéis e necrotérios, começou a se deparar com outras mulheres com a mesma cara de dor. Diante da falta de respostas, elas concordaram em se reunir no sábado, 30 de abril de 1977, na Praça de Maio, em frente à sede do governo, e marchar pela aparição de seus filhos, com a esperança de chamar a atenção de Jorge Rafael Videla, então líder da junta militar que governou o país de 1976 a 1983.

Como na época vigorava o estado de sítio, que proibia reuniões de mais de três pessoas por serem potencialmente subversivas, um policial as mandou “circular”, então elas começaram a contornar a Pirâmide de Maio, no centro da praça. Elas se reuniram no mesmo local na quinta-feira seguinte e desde então a marcha se repete todas as quintas-feiras até hoje.

O grupo original de mães participou de uma grande peregrinação à Virgem de Luján em outubro de 1977 e, para se reconhecerem, concordaram em colocar na cabeça as fraldas de pano branco de seus filhos, que com o tempo se tornariam o distintivo da organização.

Durante a ditadura, se estima que mais de 30 mil pessoas desapareceram, a grande maioria sem ter seu paradeiro revelado. Os números oficiais, no entanto, cortam esse número pela metade. Bonafini, como outros membros da organização, nunca quis procurar os restos mortais de seus filhos, até porque dizia que “não estavam mortos e sim desaparecidos”. Também não participou de comissões de investigação que serviram para condenar os repressores após a volta da democracia em 1983, nem cobrou indenizações do Estado.

Para intimidar as mulheres, os militares sequestraram e assassinaram Azucena Villaflor, a primeira presidente da organização e outras duas mães. Mas suas companheiras não pararam de procurar seus filhos e fortaleceram ainda mais seus laços. Hebe de Bonafini assumiu a presidência desde então.

Hebe de Bonafini fala durante coletiva de imprensa do lado de fora da sede do Mães da Praça de Maio em 15 de abril de 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Controvérsias

Hebe de Bonafini, no entanto, estabeleceu um perfil polêmico ao se tornar uma militante aguerrida do ‘kirchnerismo’ e ferrenha defensora do casal Néstor Kirchner e Cristina. Sua morte provocou várias reações nas redes sociais, com múltiplas mensagens de afeto e rejeição por questões políticas, já que ela ficou muito marcada por declarações controversas e elogios a personalidades como Ernesto “Che” Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.

Após os ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, Bonafini lançou uma de suas declarações mais polêmicas: “Quando o ataque aconteceu e eu estava em Cuba visitando minha filha, senti alegria. Não vou ser hipócrita, não doeu nada.”

O ex-presidente boliviano Evo Morales é recebido pela por Hebe de Bonafini em 2019 Foto: Agustin Marcarian/Reuters

Bonafini questionou duramente os sucessivos governos democráticos até que em 2003 foi recebida pela primeira vez na casa do governo pelo presidente eleito Néstor Kirchner, que mais tarde promoveria a revogação das leis de anistia e indulto que protegiam os acusados de crimes de lesa humanidade. A ativista se tornou então defensora de Kirchner e suas políticas.

Em meio a uma briga com o Grupo Clarín, o conglomerado de mídia mais poderoso do país, Bonafini organizou um julgamento público e popular simulado na Praça de Maio contra jornalistas críticos ao governo e em frente aos tribunais ameaçaram “tomar” o prédio se o Supremo Tribunal de Justiça não endossasse uma lei sobre mídia audiovisual promovida pelo kirchnerismo.

Essa proximidade com o poder político lhe rendeu duros questionamento e uma briga com outras organizações de direitos humanos. Em 2011, Bonafini foi acusada de irregularidades na gestão de fundos públicos destinados a um programa de construção de habitação social da Fundação Mães da Praça de Maio. A figura da ativista ficou manchada pelo escândalo que ainda não foi resolvido na Justiça.

O roqueiro britânico Sting é saudado por Hebe de Bonafini antes de um show no estádio Velez Sarsfield em Buenos Aires, em 16 de janeiro de 2001 Foto: Reuters

No exterior, por outro lado, as opiniões são mais favoráveis. Ela recebeu inúmeros prêmios e distinções e chegou a compartilhar palco com o cantor britânico Sting ao som de “They dance alone” em várias ocasiões.

Essa música, composta pelo ex-líder do Police em 1987, foi uma homenagem às mulheres chilenas que haviam perdido seus maridos e parentes durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e foi estendida, durante suas apresentações na Argentina, às mães da Praça de Maio./AFP, AP e EFE

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