THE NEW YORK TIMES - Dorothy Hoffner, nascida em 1918, sobreviveu à gripe espanhola e à pandemia de covid-19, bem como ao seu primeiro salto de paraquedas, aos 100 anos. Isso pode explicar o que se passava na cabeça dela antes de seu segundo salto, enquanto se preparava para uma descida de aproximadamente 3 mil metros.
“O que teremos para jantar?”, ela lembra de ter pensado na porta do avião. Dorothy, de 104 anos, decidiu, em algum momento no início deste ano, recuperar a sensação de deslizar no ar, flutuante, com seus cabelos ondulados açoitados pelos ventos. Então, no domingo, 1º, ela foi buscada em sua casa, no centro de convivência para idosos em Brookdale Lake View, em Chicago, e levada para a sede da Skydive Chicago.
Lá, ela deixou a bengala para trás antes de embarcar no avião. Ela se sentiu nervosa? “Não”, disse ela em entrevista na segunda-feira, 2. Ela estava ciente de que provavelmente quebraria o recorde mundial do Guinness Book de pessoa mais velha do mundo a saltar de paraquedas? “Não tinha ideia.”
Amarrada no instrutor, Dorothy pulou do avião e mergulhou nas paisagens de riachos ondulados e de trechos quadrados de terra, e fez história ao pousar em Ottawa, descrevendo a descida como “maravilhosa” para uma pequena multidão que havia reunidos para parabenizá-la.
O salto de paraquedas rapidamente despertou a atenção nacional, com jornalistas telefonando para ela o dia todo no domingo e na segunda-feira. Na noite de segunda, porém, ela disse que estava realmente perplexa de que as pessoas estavam interessadas. “Eles só se preocupam com a minha idade”, disse ela. Todos pareciam tão impressionados, acrescentou ela, quando na verdade tudo o que ela fez foi recorrer a um especialista e deixá-lo fazer todo o trabalho, segundo ela mesma.
Dorothy não foi a primeira pessoa a pular de paraquedas em uma idade avançada. Em 2014, o ex-presidente George H.W. Bush comemorou seu 90º aniversário saltando de paraquedas de um helicóptero sobre a cidade de Kennebunkport, em Maine. O recorde anterior era de 103 anos.
Mesmo assim, todos querem saber: por que ela decidiu fazer isso? Certamente haveria alguma explicação existencial, alguma amostra de sabedoria “carpe diem” para transmitir ou uma missão a cumprir. Mas Dorothy não parecia ansiosa para dar alguma lição de vida e não emite exatamente vibrações ousadas durante as conversas.
Ela tem medo de cobras. Ela ama assistir a reprises de M*A*S*H. Questionada se ela sempre foi uma caçadora de emoções enquanto crescia, ela respondeu “na verdade, não”.
Ela nasceu no dia 17 de dezembro de 1980, em Chicago, logo após o fim da Primeira Guerra, enquanto uma pandemia de gripe assolava o mundo. Ela cresceu pobre, não podia bancar faculdade e trabalhou para a Illinois Bell, uma companhia telefônica que posteriormente se tornou parte da AT&T. Ela disse que nunca se casou, nem teve filhos, o que deu a ela mais liberdade.
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E com essa liberdade, ela conta, vieram muitas aventuras: viagens ao México, onde ela e um amigo pegavam ônibus para cidades empoeiradas ou praias aleatórias; viagens de fim de semana pelo país, dirigindo seu Dodge Coronet azul; e passeios de barco no rio Danúbio, na Alemanha.
”Ela é a companhia perfeita para um jantar porque ela tem histórias interessantes”, disse Joe Conant, de 62 anos, um enfermeiro que conheceu Dorothy no lar de idosos. Ele havia cuidado de uma amiga de Dorothy e ficou impressionado com seu entusiasmo e sua curiosidade. No dia que eles se conheceram, Dorothy ouviu Conant perguntar a outra pessoa o que seria servido no jantar.
“No último domingo de cada mês não há jantar aqui no Brookdale; fazemos um brunch de domingo”, ele se lembra de Dorothy ter respondido naquele dia. “E vocês dois vão sentar comigo na minha mesa”. Uma amizade surgiu. Ele a visitava uma vez por semana e logo a idosa estava se referindo ao Conant como seu neto. Ele também saltou de paraquedas com a ela no domingo.
Viver uma vida secular frequentemente significa passar pela morte daqueles que você mais ama, relata Dorothy. Mesmo assim, novos amigos sempre chegam, e ela encontrou Conant. Em 2019, ele mencionou durante um jantar que iria saltar de paraquedas. “Isso parece interessante”, ela respondeu a ele. “Acho que eu quero fazer isso.”
Conant disse que foi “totalmente pego de surpresa, mas ela estava falando sério”. Eles saltaram de paraquedas no final daquele ano, e a Sra. Hoffner “definitivamente amou”, disse ele.
Derek Baxter, o instrutor do Skydive Chicago que saltou com a Sra. Hoffner, disse na segunda-feira que queria ter certeza de que ela conseguiria levantar as pernas durante o pouso. “Ela faz isso melhor do que muita gente”, disse Baxter. Na descida, a idosa estava “gritando o quanto queria”, disse ele.
O vídeo do salto mostra a Sra. Hoffner olhando ao redor com os olhos bem abertos sob os óculos de proteção e seu suéter azul bebê esvoaçando enquanto ela desce de paraquedas, aparentemente relaxada. (Mais tarde, ela lamentou ter esquecido de orar antes do mergulho.)
Quando ela pousou e começaram a surgir perguntas sobre como foi o salto, Dorothy disse ter respondido algo como “Eu simplesmente me senti confortável lá em cima”. Ela estava mais preocupada com uma questão diferente: o local do jantar. Na tarde de domingo, ela teve a resposta: a cervejaria Tangled Roots, em Ottawa. Era hora do segundo melhor deleite do dia: uma salada especial de frango.