Imigrantes venezuelanos temem novo fluxo na fronteira em Roraima


Reabertura pode atrair mais refugiados e agravar acesso já difícil a serviços de saúde em todo o Estado

Por Túlio Kruse

BOA VISTA - A venezuelana Cecília Margarita Soarez, de 61 anos, escora as mãos nos joelhos e coloca os pés descalços sobre os pedregulhos, à sombra de uma árvore em Boa Vista. O calor é de 34 °C e a umidade sufoca, mas o chão queima menos do que o contato com seus chinelos de borracha. Ela caminhou duas horas para encontrar sua filha no posto de triagem da Operação Acolhida, administrado pelo Exército brasileiro, que horas depois seria visitado pelo secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, na sexta-feira.

Venezuelana Cecília Margarita Soarez transporta material reciclável em Boa Vista (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 

Cecília está entre os pelo menos 30 mil venezuelanos que deixaram seu país e ainda vivem na capital de Roraima. Desde o fechamento da fronteira, há seis meses, o governo federal enviou por volta de 6 mil venezuelanos para outras partes do País a fim de retirar a pressão sobre o sistema de saúde e a assistência social no Estado. 

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A perspectiva de reabertura, ainda sem data definida para ocorrer, tem preocupado o governo estadual e a prefeitura de Boa Vista. Como o ritmo da interiorização dos estrangeiros diminuiu durante a pandemia, o temor é que um novo fluxo de imigrantes possa voltar a sobrecarregar os serviços estaduais. 

Para ter renda, Cecília transporta materiais recicláveis em um carrinho de bebê até pontos de coleta. Sua miséria é comum a seus conterrâneos na cidade – estima-se que 2 mil estejam desabrigados, vivendo na rua ou em moradias clandestinas. Ela chegou no início de 2019, no auge da crise entre o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e o opositor Juan Guaidó. Além de fugir da desvalorização vertiginosa da moeda venezuelana, ela diz que as promessas de ajuda humanitária, inclusive pelo governo americano, a atraíram para Boa Vista.

“Cheguei aqui e tive tropeços, vivi na rua, comi da lata do lixo. O que deixavam por aí, abandonado, eu limpava e comia com a minha família”, conta Cecília. Ela tem poucas dúvidas de que está melhor agora do que há dois anos. “Cheguei muito fraca, porque não comia, não consumíamos nada com gordura, só verdura e sardinha. Isso pode te encher, mas não te alimenta. Aqui temos manteiga, maionese, alface e tomate, carne.”

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Recuperada de uma úlcera, hoje ela quer que os filhos migrem para o interior brasileiro, para conseguir trabalho e dinheiro que a ajudem a sobreviver na capital de Roraima. Ela tem dois filhos de 25 e 29 anos, mas a pouca experiência de trabalho que eles têm no campo não tem ajudado a encontrar novos empregos no Brasil.

Ao menos 4 mil venezuelanos aguardam a reabertura para entrar no País, segundo estimativa de agências da ONU que atendem a região. Até março, o fluxo de entrada em Pacaraima, na fronteira, era de mil imigrantes ao dia. Como o envio de refugiados para outras partes ocorre em ritmo mais lento, os venezuelanos ficam retidos em Roraima e dividem os serviços sobrecarregados da região com a população local. Apenas nos 13 abrigos do Estado, são cerca de 5 mil.

Pedreiro Jaime Ortegas sonha viver em São Paulo (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 
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Além disso, a inflação no preço dos alimentos durante os últimos meses tem piorado a condição de vida. O pedreiro Jaime Ortegas, de 59 anos, tenta se mudar para São Paulo há cerca de um mês. Com o pouco trabalho que consegue e o aumento no custo de vida, tem sido cada vez mais difícil sobreviver em Roraima.

“Quando eu cheguei, as coisas eram mais baratas, a comida ao menos, e agora os preços subiram bastante”, afirma. Há muitos venezuelanos aqui e o trabalho diminuiu, os brasileiros querem pagar pouco em Boa Vista.”

Ele, a mulher e os dois netos dependem principalmente da sua renda como prestador de serviço em obras. Eles chegaram há cerca de dois anos – Jaime, sua mulher Sonia, e sua filha de 28 anos, que descobriu um câncer logo após cruzar a fronteira. Ela morreu há cerca de um ano. 

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Sua filha de 14 anos e o filho de 4 estão sob os cuidados dos avós, que ainda não sabem quando terão permissão para viajar a São Paulo. “Eu tinha caminhão, tinha carro, hoje não tenho nada. Eu perdi tudo”, diz Jaime. “Mas há de se seguir em frente com a vida, adiante e lutando.”

O governo brasileiro tem evitado dar uma previsão para a reabertura da fronteira. Autoridades locais acreditam que isso deva ocorrer até o fim do ano. A divisa em Pacaraima, principal ponto de entrada de venezuelanos no Brasil, foi fechada em março de forma provisória. A previsão inicial era de que o bloqueio durasse apenas duas semanas, mas a passagem nunca mais reabriu.

Na sexta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que a capacidade de atendimento dos serviços públicos é a maior preocupação para evitar a reabertura por enquanto. Ele negou que a prorrogação do fechamento tenha motivação política – uma vez que o Brasil retomou a imigração de outros países, como do Paraguai, por exemplo. 

BOA VISTA - A venezuelana Cecília Margarita Soarez, de 61 anos, escora as mãos nos joelhos e coloca os pés descalços sobre os pedregulhos, à sombra de uma árvore em Boa Vista. O calor é de 34 °C e a umidade sufoca, mas o chão queima menos do que o contato com seus chinelos de borracha. Ela caminhou duas horas para encontrar sua filha no posto de triagem da Operação Acolhida, administrado pelo Exército brasileiro, que horas depois seria visitado pelo secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, na sexta-feira.

Venezuelana Cecília Margarita Soarez transporta material reciclável em Boa Vista (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 

Cecília está entre os pelo menos 30 mil venezuelanos que deixaram seu país e ainda vivem na capital de Roraima. Desde o fechamento da fronteira, há seis meses, o governo federal enviou por volta de 6 mil venezuelanos para outras partes do País a fim de retirar a pressão sobre o sistema de saúde e a assistência social no Estado. 

A perspectiva de reabertura, ainda sem data definida para ocorrer, tem preocupado o governo estadual e a prefeitura de Boa Vista. Como o ritmo da interiorização dos estrangeiros diminuiu durante a pandemia, o temor é que um novo fluxo de imigrantes possa voltar a sobrecarregar os serviços estaduais. 

Para ter renda, Cecília transporta materiais recicláveis em um carrinho de bebê até pontos de coleta. Sua miséria é comum a seus conterrâneos na cidade – estima-se que 2 mil estejam desabrigados, vivendo na rua ou em moradias clandestinas. Ela chegou no início de 2019, no auge da crise entre o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e o opositor Juan Guaidó. Além de fugir da desvalorização vertiginosa da moeda venezuelana, ela diz que as promessas de ajuda humanitária, inclusive pelo governo americano, a atraíram para Boa Vista.

“Cheguei aqui e tive tropeços, vivi na rua, comi da lata do lixo. O que deixavam por aí, abandonado, eu limpava e comia com a minha família”, conta Cecília. Ela tem poucas dúvidas de que está melhor agora do que há dois anos. “Cheguei muito fraca, porque não comia, não consumíamos nada com gordura, só verdura e sardinha. Isso pode te encher, mas não te alimenta. Aqui temos manteiga, maionese, alface e tomate, carne.”

Recuperada de uma úlcera, hoje ela quer que os filhos migrem para o interior brasileiro, para conseguir trabalho e dinheiro que a ajudem a sobreviver na capital de Roraima. Ela tem dois filhos de 25 e 29 anos, mas a pouca experiência de trabalho que eles têm no campo não tem ajudado a encontrar novos empregos no Brasil.

Ao menos 4 mil venezuelanos aguardam a reabertura para entrar no País, segundo estimativa de agências da ONU que atendem a região. Até março, o fluxo de entrada em Pacaraima, na fronteira, era de mil imigrantes ao dia. Como o envio de refugiados para outras partes ocorre em ritmo mais lento, os venezuelanos ficam retidos em Roraima e dividem os serviços sobrecarregados da região com a população local. Apenas nos 13 abrigos do Estado, são cerca de 5 mil.

Pedreiro Jaime Ortegas sonha viver em São Paulo (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 

Além disso, a inflação no preço dos alimentos durante os últimos meses tem piorado a condição de vida. O pedreiro Jaime Ortegas, de 59 anos, tenta se mudar para São Paulo há cerca de um mês. Com o pouco trabalho que consegue e o aumento no custo de vida, tem sido cada vez mais difícil sobreviver em Roraima.

“Quando eu cheguei, as coisas eram mais baratas, a comida ao menos, e agora os preços subiram bastante”, afirma. Há muitos venezuelanos aqui e o trabalho diminuiu, os brasileiros querem pagar pouco em Boa Vista.”

Ele, a mulher e os dois netos dependem principalmente da sua renda como prestador de serviço em obras. Eles chegaram há cerca de dois anos – Jaime, sua mulher Sonia, e sua filha de 28 anos, que descobriu um câncer logo após cruzar a fronteira. Ela morreu há cerca de um ano. 

Sua filha de 14 anos e o filho de 4 estão sob os cuidados dos avós, que ainda não sabem quando terão permissão para viajar a São Paulo. “Eu tinha caminhão, tinha carro, hoje não tenho nada. Eu perdi tudo”, diz Jaime. “Mas há de se seguir em frente com a vida, adiante e lutando.”

O governo brasileiro tem evitado dar uma previsão para a reabertura da fronteira. Autoridades locais acreditam que isso deva ocorrer até o fim do ano. A divisa em Pacaraima, principal ponto de entrada de venezuelanos no Brasil, foi fechada em março de forma provisória. A previsão inicial era de que o bloqueio durasse apenas duas semanas, mas a passagem nunca mais reabriu.

Na sexta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que a capacidade de atendimento dos serviços públicos é a maior preocupação para evitar a reabertura por enquanto. Ele negou que a prorrogação do fechamento tenha motivação política – uma vez que o Brasil retomou a imigração de outros países, como do Paraguai, por exemplo. 

BOA VISTA - A venezuelana Cecília Margarita Soarez, de 61 anos, escora as mãos nos joelhos e coloca os pés descalços sobre os pedregulhos, à sombra de uma árvore em Boa Vista. O calor é de 34 °C e a umidade sufoca, mas o chão queima menos do que o contato com seus chinelos de borracha. Ela caminhou duas horas para encontrar sua filha no posto de triagem da Operação Acolhida, administrado pelo Exército brasileiro, que horas depois seria visitado pelo secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, na sexta-feira.

Venezuelana Cecília Margarita Soarez transporta material reciclável em Boa Vista (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 

Cecília está entre os pelo menos 30 mil venezuelanos que deixaram seu país e ainda vivem na capital de Roraima. Desde o fechamento da fronteira, há seis meses, o governo federal enviou por volta de 6 mil venezuelanos para outras partes do País a fim de retirar a pressão sobre o sistema de saúde e a assistência social no Estado. 

A perspectiva de reabertura, ainda sem data definida para ocorrer, tem preocupado o governo estadual e a prefeitura de Boa Vista. Como o ritmo da interiorização dos estrangeiros diminuiu durante a pandemia, o temor é que um novo fluxo de imigrantes possa voltar a sobrecarregar os serviços estaduais. 

Para ter renda, Cecília transporta materiais recicláveis em um carrinho de bebê até pontos de coleta. Sua miséria é comum a seus conterrâneos na cidade – estima-se que 2 mil estejam desabrigados, vivendo na rua ou em moradias clandestinas. Ela chegou no início de 2019, no auge da crise entre o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e o opositor Juan Guaidó. Além de fugir da desvalorização vertiginosa da moeda venezuelana, ela diz que as promessas de ajuda humanitária, inclusive pelo governo americano, a atraíram para Boa Vista.

“Cheguei aqui e tive tropeços, vivi na rua, comi da lata do lixo. O que deixavam por aí, abandonado, eu limpava e comia com a minha família”, conta Cecília. Ela tem poucas dúvidas de que está melhor agora do que há dois anos. “Cheguei muito fraca, porque não comia, não consumíamos nada com gordura, só verdura e sardinha. Isso pode te encher, mas não te alimenta. Aqui temos manteiga, maionese, alface e tomate, carne.”

Recuperada de uma úlcera, hoje ela quer que os filhos migrem para o interior brasileiro, para conseguir trabalho e dinheiro que a ajudem a sobreviver na capital de Roraima. Ela tem dois filhos de 25 e 29 anos, mas a pouca experiência de trabalho que eles têm no campo não tem ajudado a encontrar novos empregos no Brasil.

Ao menos 4 mil venezuelanos aguardam a reabertura para entrar no País, segundo estimativa de agências da ONU que atendem a região. Até março, o fluxo de entrada em Pacaraima, na fronteira, era de mil imigrantes ao dia. Como o envio de refugiados para outras partes ocorre em ritmo mais lento, os venezuelanos ficam retidos em Roraima e dividem os serviços sobrecarregados da região com a população local. Apenas nos 13 abrigos do Estado, são cerca de 5 mil.

Pedreiro Jaime Ortegas sonha viver em São Paulo (TULIO KRUSE / ESTADÃO) 

Além disso, a inflação no preço dos alimentos durante os últimos meses tem piorado a condição de vida. O pedreiro Jaime Ortegas, de 59 anos, tenta se mudar para São Paulo há cerca de um mês. Com o pouco trabalho que consegue e o aumento no custo de vida, tem sido cada vez mais difícil sobreviver em Roraima.

“Quando eu cheguei, as coisas eram mais baratas, a comida ao menos, e agora os preços subiram bastante”, afirma. Há muitos venezuelanos aqui e o trabalho diminuiu, os brasileiros querem pagar pouco em Boa Vista.”

Ele, a mulher e os dois netos dependem principalmente da sua renda como prestador de serviço em obras. Eles chegaram há cerca de dois anos – Jaime, sua mulher Sonia, e sua filha de 28 anos, que descobriu um câncer logo após cruzar a fronteira. Ela morreu há cerca de um ano. 

Sua filha de 14 anos e o filho de 4 estão sob os cuidados dos avós, que ainda não sabem quando terão permissão para viajar a São Paulo. “Eu tinha caminhão, tinha carro, hoje não tenho nada. Eu perdi tudo”, diz Jaime. “Mas há de se seguir em frente com a vida, adiante e lutando.”

O governo brasileiro tem evitado dar uma previsão para a reabertura da fronteira. Autoridades locais acreditam que isso deva ocorrer até o fim do ano. A divisa em Pacaraima, principal ponto de entrada de venezuelanos no Brasil, foi fechada em março de forma provisória. A previsão inicial era de que o bloqueio durasse apenas duas semanas, mas a passagem nunca mais reabriu.

Na sexta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que a capacidade de atendimento dos serviços públicos é a maior preocupação para evitar a reabertura por enquanto. Ele negou que a prorrogação do fechamento tenha motivação política – uma vez que o Brasil retomou a imigração de outros países, como do Paraguai, por exemplo. 

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