Inflação corrói popularidade e capital político de líderes sul-americanos


Eleitos nos últimos anos, líderes de Argentina, Chile, Peru e Equador têm tido dificuldades nos últimos meses com a alta do preço dos combustíveis e dos alimentos

Por Luiz Raatz e Carolina Marins

A eleição de Gustavo Petro na Colômbia deu sequência a uma série de vitórias eleitorais da esquerda na América do Sul nos últimos anos e colocou o ex-guerrilheiro no mapa político da região junto de outros líderes como o argentino Alberto Fernández, o peruano Pedro Castillo, o boliviano Luis Arce e o chileno Gabriel Boric. Eleitos nos últimos três anos, no entanto, esses presidentes têm tido dificuldades nos últimos meses com a alta do preço dos combustíveis e dos alimentos, que faz a maior parte do eleitorado desaprovar seu trabalho e dificulta a implementação de sua agenda legislativa.

A baixa popularidade afeta ainda líderes recentemente eleitos com uma plataforma de direita, como é o caso de Guillermo Lasso, às voltas com violentos protestos de indígenas no Equador que o enfraqueceram politicamente nas últimas semanas,e ouros há mais tempo no cargo, como o paraguaio Mario Abdo Benítez.

O caso mais recente de fim da lua de mel entre o presidente e seu eleitorado é o do chileno Gabriel Boric. Com pouco mais de 100 dias no cargo, o líder mais jovem do continente viu sua aprovação despencar de 50% para 34%, segundo monitoramento semanal do instituto Cadem. O número é o mais baixo desde a posse de Boric, em março. A inflação de 11,5%, muito alta para a estável economia chilena, é apontada por analistas como o principal fator para o fim da lua de mel com o novo presidente.

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Gabriel Boric durante a posse: popularidade do líder chileno caiu com apenas 100 dias de governo € (AP Photo/) Foto: Esteban Felix, File, AP

“No Chile não se esperava uma inflação tão alta, mas se sabia que a recuperação do emprego pós-pandemia seria muito difícil. Mas esses dois fatores tiveram um efeito adverso sobre a popularidade do governo porque as pessoas estão com dificuldades de sobreviver”, explicou ao Estado o economista chileno Luis Eduardo Escobar, diretor do Centro de Estudios del Desarrollo de Santiago. “Uma inflação de 10%, sobretudo concentrada nos alimentos e nos combustíveis, afeta demais as pessoas, ainda que seja menor do que os índices medidos no começo dos anos 90.”

Para reverter esse cenário, explica o economista, Boric conta com a valorização do cobre, a principal commodity chilena, no mercado internacional. Isso possibilitaria ao presidente intervir para baixar os preços de alguns itens e aprovar programas sociais para quem está mais afetado pela crise. “O principal agora é saber se Boric conseguirá aprovar no Congresso seu projeto de reforma tributária, que deve aumentar a arrecadação de impostos no Chile.

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Além do front econômico, outros problemas enfrentados por Boric incluem o aumento da violência urbana no Chile e do aumento da imigração, principalmente de bolivianos no norte do país. A questão mapuche também se tornou um foco de impasse entre o novo governo e a nação indígena, que há anos reivindica mais autonomia no Chile.

Segundo a ONG Paz Cidadã, o número de homicídios no Chile aumentou 70% nos últimos seis anos. O combate à violência urbana e a imigração ilegal eram os principais pontos da campanha do antecessor de Boric, o conservador Sebastián Piñera. O rival do presidente no segundo turno, o populista de direita José Antonio Kast também prometia mão firme contra a criminalidade, mas acabou derrotado pelo esquerdista, que obteve 55% dos votos.

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No Peru, um presidente fraco

No Peru, onde o presidente Pedro Castillo, há 11 meses no cargo, vive em guerra com o Congresso e o próprio partido, a alta dos preços complica um governo que já nasceu frágil em virtude da estreita diferença de votos no segundo turno para a rival Keiko Fujimori. Até mesmo a proclamação de Castillo como vencedor levou semanas em julho do ano passado.

Assim como no Chile, os peruanos estavam desacostumados a um cenário inflacionário, já que os preços estavam razoavelmente controlados no país desde meados dos anos 90. Nos últimos 12 meses, a inflação subiu 8,78% no país, um índice alto para os padrões peruanos. Já Castillo, prestes a completar um ano no cargo, tem a aprovação em torno de 23%, segundo o instituto Datum, e sua desaprovação já se iguala à de Alejandro Toledo, o presidente mais mal avaliado da história recente do Peru

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“O Peru vinha de um ciclo de crescimento, que apesar de não ter sido equitativo, garantiu um certo controle macroeconômico. Com a pandemia, retrocedemos 10 anos, e agora a inflação agravou esse quadro. Este mês tivemos a pior inflação em 25 anos”, disse ao Estado a cientista política Milagros Campos Ramos, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP). “O governo não está tomando medidas contra a crise e temos um presidente que não é só fraco como responde a tudo isso de improviso e com declarações contraditórias. Sua aprovação vem caindo por isso, em todos os níveis etários e socioeconômicos.”

Pedro Castillo tem tido uma relação difícil com o Congresso  Foto: Paolo Aguilar/EFE

Inflação, o velho problema argentino

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Na Argentina, onde a inflação é um problema crônico há 20 anos, o impacto da recente alta dos combustíveis e dos alimentos no governo do presidente Alberto Fernández, no cargo desde 2019, tem impactado diretamente em sua popularidade a governabilidade da coalizão peronista. A aprovação de Fernández, que no começo da pandemia chegou a 67% em virtude das duras medidas para conter o contágio da covid-19.

O cansaço do lockdown, o avanço da pandemia, e a difícil recuperação econômica nos últimos meses, no entanto, custaram caro a Fernández, que desde o ano passado se viu em disputas com a vice e madrinha política, Cristina Kirchner. Hoje, sua aprovação gira em torno de 23%, segundo projeção da consultoria Management & Fit. Seis em cada dez argentinos o reprova.

Além disso, a inflação é a maior preocupação na cabeça dos argentinos. Para 37,1% da população, a alta dos preços é o pior problema do país. A alta do petróleo no mercado internacional criou nas últimas semanas um temor de escassez de diesel nos postos argentinos. Nos últimos 12 meses, os preços subiram 29,30%, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas (Indec).

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“O nível de aprovação de Fernández está muito distante do seu ápice e isso se deve a duas razões principais. Uma tem a ver com a inflação. 70% dos argentinos dizem que a situação econômica vai cada vez pior e 80% acreditam que o governo não vai conseguir resolver o problema”, afirmou ao Estado Mariel Fornoni, da consultoria Management and Fit. “A coalizão de governo, formada por Fernández, Cristina e Sergio Massa, está rompida. Os principais detratores de Fernández eram seus aliados.”

Presidente argentino, Alberto Fernández, conversa com o premiê britânico, Boris Johson, durante a reunião do G-7 na Alemanha  Foto: Maria Eugenia Cerruti/Argentine Presidency/Handout via REUTERS

Uma solução populista na Bolívia

Quem anda na contramão dessa onda de impopularidade é a Bolívia. Ali, o presidente Luis Arce, afilhado político de Evo Morales eleito no ano passado, tem conseguido manter a inflação sob controle e com isso, sua popularidade, que hoje chega perto de 50%. A receita do populista de esquerda combina um câmbio fixo mantido graças às receitas obtidas com a exportação de gás e a distribuição de subsídios para manter a estabilidade do preço dos alimentos e dos combustíveis.

Analistas ressaltam, no entanto, que essa fórmula é uma panela de pressão, já que a dívida pública boliviana vem crescendo nos últimos anos.

“Para manter congelados os preços do dólar e dos combustíveis, o governo recorre há muitos anos a pesados subsídios”, disse o economista boliviano Roberto Laserna. “Mas isso tem um limite. O déficit fiscal é muito grande e esse processo não é sustentável por muito tempo.”

O presidente Boliviano Luis Arce (esquerda) e seu antecessor, Evo Morales, celebram o ano novo aymara em La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP

A eleição de Gustavo Petro na Colômbia deu sequência a uma série de vitórias eleitorais da esquerda na América do Sul nos últimos anos e colocou o ex-guerrilheiro no mapa político da região junto de outros líderes como o argentino Alberto Fernández, o peruano Pedro Castillo, o boliviano Luis Arce e o chileno Gabriel Boric. Eleitos nos últimos três anos, no entanto, esses presidentes têm tido dificuldades nos últimos meses com a alta do preço dos combustíveis e dos alimentos, que faz a maior parte do eleitorado desaprovar seu trabalho e dificulta a implementação de sua agenda legislativa.

A baixa popularidade afeta ainda líderes recentemente eleitos com uma plataforma de direita, como é o caso de Guillermo Lasso, às voltas com violentos protestos de indígenas no Equador que o enfraqueceram politicamente nas últimas semanas,e ouros há mais tempo no cargo, como o paraguaio Mario Abdo Benítez.

O caso mais recente de fim da lua de mel entre o presidente e seu eleitorado é o do chileno Gabriel Boric. Com pouco mais de 100 dias no cargo, o líder mais jovem do continente viu sua aprovação despencar de 50% para 34%, segundo monitoramento semanal do instituto Cadem. O número é o mais baixo desde a posse de Boric, em março. A inflação de 11,5%, muito alta para a estável economia chilena, é apontada por analistas como o principal fator para o fim da lua de mel com o novo presidente.

Gabriel Boric durante a posse: popularidade do líder chileno caiu com apenas 100 dias de governo € (AP Photo/) Foto: Esteban Felix, File, AP

“No Chile não se esperava uma inflação tão alta, mas se sabia que a recuperação do emprego pós-pandemia seria muito difícil. Mas esses dois fatores tiveram um efeito adverso sobre a popularidade do governo porque as pessoas estão com dificuldades de sobreviver”, explicou ao Estado o economista chileno Luis Eduardo Escobar, diretor do Centro de Estudios del Desarrollo de Santiago. “Uma inflação de 10%, sobretudo concentrada nos alimentos e nos combustíveis, afeta demais as pessoas, ainda que seja menor do que os índices medidos no começo dos anos 90.”

Para reverter esse cenário, explica o economista, Boric conta com a valorização do cobre, a principal commodity chilena, no mercado internacional. Isso possibilitaria ao presidente intervir para baixar os preços de alguns itens e aprovar programas sociais para quem está mais afetado pela crise. “O principal agora é saber se Boric conseguirá aprovar no Congresso seu projeto de reforma tributária, que deve aumentar a arrecadação de impostos no Chile.

Além do front econômico, outros problemas enfrentados por Boric incluem o aumento da violência urbana no Chile e do aumento da imigração, principalmente de bolivianos no norte do país. A questão mapuche também se tornou um foco de impasse entre o novo governo e a nação indígena, que há anos reivindica mais autonomia no Chile.

Segundo a ONG Paz Cidadã, o número de homicídios no Chile aumentou 70% nos últimos seis anos. O combate à violência urbana e a imigração ilegal eram os principais pontos da campanha do antecessor de Boric, o conservador Sebastián Piñera. O rival do presidente no segundo turno, o populista de direita José Antonio Kast também prometia mão firme contra a criminalidade, mas acabou derrotado pelo esquerdista, que obteve 55% dos votos.

No Peru, um presidente fraco

No Peru, onde o presidente Pedro Castillo, há 11 meses no cargo, vive em guerra com o Congresso e o próprio partido, a alta dos preços complica um governo que já nasceu frágil em virtude da estreita diferença de votos no segundo turno para a rival Keiko Fujimori. Até mesmo a proclamação de Castillo como vencedor levou semanas em julho do ano passado.

Assim como no Chile, os peruanos estavam desacostumados a um cenário inflacionário, já que os preços estavam razoavelmente controlados no país desde meados dos anos 90. Nos últimos 12 meses, a inflação subiu 8,78% no país, um índice alto para os padrões peruanos. Já Castillo, prestes a completar um ano no cargo, tem a aprovação em torno de 23%, segundo o instituto Datum, e sua desaprovação já se iguala à de Alejandro Toledo, o presidente mais mal avaliado da história recente do Peru

“O Peru vinha de um ciclo de crescimento, que apesar de não ter sido equitativo, garantiu um certo controle macroeconômico. Com a pandemia, retrocedemos 10 anos, e agora a inflação agravou esse quadro. Este mês tivemos a pior inflação em 25 anos”, disse ao Estado a cientista política Milagros Campos Ramos, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP). “O governo não está tomando medidas contra a crise e temos um presidente que não é só fraco como responde a tudo isso de improviso e com declarações contraditórias. Sua aprovação vem caindo por isso, em todos os níveis etários e socioeconômicos.”

Pedro Castillo tem tido uma relação difícil com o Congresso  Foto: Paolo Aguilar/EFE

Inflação, o velho problema argentino

Na Argentina, onde a inflação é um problema crônico há 20 anos, o impacto da recente alta dos combustíveis e dos alimentos no governo do presidente Alberto Fernández, no cargo desde 2019, tem impactado diretamente em sua popularidade a governabilidade da coalizão peronista. A aprovação de Fernández, que no começo da pandemia chegou a 67% em virtude das duras medidas para conter o contágio da covid-19.

O cansaço do lockdown, o avanço da pandemia, e a difícil recuperação econômica nos últimos meses, no entanto, custaram caro a Fernández, que desde o ano passado se viu em disputas com a vice e madrinha política, Cristina Kirchner. Hoje, sua aprovação gira em torno de 23%, segundo projeção da consultoria Management & Fit. Seis em cada dez argentinos o reprova.

Além disso, a inflação é a maior preocupação na cabeça dos argentinos. Para 37,1% da população, a alta dos preços é o pior problema do país. A alta do petróleo no mercado internacional criou nas últimas semanas um temor de escassez de diesel nos postos argentinos. Nos últimos 12 meses, os preços subiram 29,30%, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas (Indec).

“O nível de aprovação de Fernández está muito distante do seu ápice e isso se deve a duas razões principais. Uma tem a ver com a inflação. 70% dos argentinos dizem que a situação econômica vai cada vez pior e 80% acreditam que o governo não vai conseguir resolver o problema”, afirmou ao Estado Mariel Fornoni, da consultoria Management and Fit. “A coalizão de governo, formada por Fernández, Cristina e Sergio Massa, está rompida. Os principais detratores de Fernández eram seus aliados.”

Presidente argentino, Alberto Fernández, conversa com o premiê britânico, Boris Johson, durante a reunião do G-7 na Alemanha  Foto: Maria Eugenia Cerruti/Argentine Presidency/Handout via REUTERS

Uma solução populista na Bolívia

Quem anda na contramão dessa onda de impopularidade é a Bolívia. Ali, o presidente Luis Arce, afilhado político de Evo Morales eleito no ano passado, tem conseguido manter a inflação sob controle e com isso, sua popularidade, que hoje chega perto de 50%. A receita do populista de esquerda combina um câmbio fixo mantido graças às receitas obtidas com a exportação de gás e a distribuição de subsídios para manter a estabilidade do preço dos alimentos e dos combustíveis.

Analistas ressaltam, no entanto, que essa fórmula é uma panela de pressão, já que a dívida pública boliviana vem crescendo nos últimos anos.

“Para manter congelados os preços do dólar e dos combustíveis, o governo recorre há muitos anos a pesados subsídios”, disse o economista boliviano Roberto Laserna. “Mas isso tem um limite. O déficit fiscal é muito grande e esse processo não é sustentável por muito tempo.”

O presidente Boliviano Luis Arce (esquerda) e seu antecessor, Evo Morales, celebram o ano novo aymara em La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP

A eleição de Gustavo Petro na Colômbia deu sequência a uma série de vitórias eleitorais da esquerda na América do Sul nos últimos anos e colocou o ex-guerrilheiro no mapa político da região junto de outros líderes como o argentino Alberto Fernández, o peruano Pedro Castillo, o boliviano Luis Arce e o chileno Gabriel Boric. Eleitos nos últimos três anos, no entanto, esses presidentes têm tido dificuldades nos últimos meses com a alta do preço dos combustíveis e dos alimentos, que faz a maior parte do eleitorado desaprovar seu trabalho e dificulta a implementação de sua agenda legislativa.

A baixa popularidade afeta ainda líderes recentemente eleitos com uma plataforma de direita, como é o caso de Guillermo Lasso, às voltas com violentos protestos de indígenas no Equador que o enfraqueceram politicamente nas últimas semanas,e ouros há mais tempo no cargo, como o paraguaio Mario Abdo Benítez.

O caso mais recente de fim da lua de mel entre o presidente e seu eleitorado é o do chileno Gabriel Boric. Com pouco mais de 100 dias no cargo, o líder mais jovem do continente viu sua aprovação despencar de 50% para 34%, segundo monitoramento semanal do instituto Cadem. O número é o mais baixo desde a posse de Boric, em março. A inflação de 11,5%, muito alta para a estável economia chilena, é apontada por analistas como o principal fator para o fim da lua de mel com o novo presidente.

Gabriel Boric durante a posse: popularidade do líder chileno caiu com apenas 100 dias de governo € (AP Photo/) Foto: Esteban Felix, File, AP

“No Chile não se esperava uma inflação tão alta, mas se sabia que a recuperação do emprego pós-pandemia seria muito difícil. Mas esses dois fatores tiveram um efeito adverso sobre a popularidade do governo porque as pessoas estão com dificuldades de sobreviver”, explicou ao Estado o economista chileno Luis Eduardo Escobar, diretor do Centro de Estudios del Desarrollo de Santiago. “Uma inflação de 10%, sobretudo concentrada nos alimentos e nos combustíveis, afeta demais as pessoas, ainda que seja menor do que os índices medidos no começo dos anos 90.”

Para reverter esse cenário, explica o economista, Boric conta com a valorização do cobre, a principal commodity chilena, no mercado internacional. Isso possibilitaria ao presidente intervir para baixar os preços de alguns itens e aprovar programas sociais para quem está mais afetado pela crise. “O principal agora é saber se Boric conseguirá aprovar no Congresso seu projeto de reforma tributária, que deve aumentar a arrecadação de impostos no Chile.

Além do front econômico, outros problemas enfrentados por Boric incluem o aumento da violência urbana no Chile e do aumento da imigração, principalmente de bolivianos no norte do país. A questão mapuche também se tornou um foco de impasse entre o novo governo e a nação indígena, que há anos reivindica mais autonomia no Chile.

Segundo a ONG Paz Cidadã, o número de homicídios no Chile aumentou 70% nos últimos seis anos. O combate à violência urbana e a imigração ilegal eram os principais pontos da campanha do antecessor de Boric, o conservador Sebastián Piñera. O rival do presidente no segundo turno, o populista de direita José Antonio Kast também prometia mão firme contra a criminalidade, mas acabou derrotado pelo esquerdista, que obteve 55% dos votos.

No Peru, um presidente fraco

No Peru, onde o presidente Pedro Castillo, há 11 meses no cargo, vive em guerra com o Congresso e o próprio partido, a alta dos preços complica um governo que já nasceu frágil em virtude da estreita diferença de votos no segundo turno para a rival Keiko Fujimori. Até mesmo a proclamação de Castillo como vencedor levou semanas em julho do ano passado.

Assim como no Chile, os peruanos estavam desacostumados a um cenário inflacionário, já que os preços estavam razoavelmente controlados no país desde meados dos anos 90. Nos últimos 12 meses, a inflação subiu 8,78% no país, um índice alto para os padrões peruanos. Já Castillo, prestes a completar um ano no cargo, tem a aprovação em torno de 23%, segundo o instituto Datum, e sua desaprovação já se iguala à de Alejandro Toledo, o presidente mais mal avaliado da história recente do Peru

“O Peru vinha de um ciclo de crescimento, que apesar de não ter sido equitativo, garantiu um certo controle macroeconômico. Com a pandemia, retrocedemos 10 anos, e agora a inflação agravou esse quadro. Este mês tivemos a pior inflação em 25 anos”, disse ao Estado a cientista política Milagros Campos Ramos, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP). “O governo não está tomando medidas contra a crise e temos um presidente que não é só fraco como responde a tudo isso de improviso e com declarações contraditórias. Sua aprovação vem caindo por isso, em todos os níveis etários e socioeconômicos.”

Pedro Castillo tem tido uma relação difícil com o Congresso  Foto: Paolo Aguilar/EFE

Inflação, o velho problema argentino

Na Argentina, onde a inflação é um problema crônico há 20 anos, o impacto da recente alta dos combustíveis e dos alimentos no governo do presidente Alberto Fernández, no cargo desde 2019, tem impactado diretamente em sua popularidade a governabilidade da coalizão peronista. A aprovação de Fernández, que no começo da pandemia chegou a 67% em virtude das duras medidas para conter o contágio da covid-19.

O cansaço do lockdown, o avanço da pandemia, e a difícil recuperação econômica nos últimos meses, no entanto, custaram caro a Fernández, que desde o ano passado se viu em disputas com a vice e madrinha política, Cristina Kirchner. Hoje, sua aprovação gira em torno de 23%, segundo projeção da consultoria Management & Fit. Seis em cada dez argentinos o reprova.

Além disso, a inflação é a maior preocupação na cabeça dos argentinos. Para 37,1% da população, a alta dos preços é o pior problema do país. A alta do petróleo no mercado internacional criou nas últimas semanas um temor de escassez de diesel nos postos argentinos. Nos últimos 12 meses, os preços subiram 29,30%, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas (Indec).

“O nível de aprovação de Fernández está muito distante do seu ápice e isso se deve a duas razões principais. Uma tem a ver com a inflação. 70% dos argentinos dizem que a situação econômica vai cada vez pior e 80% acreditam que o governo não vai conseguir resolver o problema”, afirmou ao Estado Mariel Fornoni, da consultoria Management and Fit. “A coalizão de governo, formada por Fernández, Cristina e Sergio Massa, está rompida. Os principais detratores de Fernández eram seus aliados.”

Presidente argentino, Alberto Fernández, conversa com o premiê britânico, Boris Johson, durante a reunião do G-7 na Alemanha  Foto: Maria Eugenia Cerruti/Argentine Presidency/Handout via REUTERS

Uma solução populista na Bolívia

Quem anda na contramão dessa onda de impopularidade é a Bolívia. Ali, o presidente Luis Arce, afilhado político de Evo Morales eleito no ano passado, tem conseguido manter a inflação sob controle e com isso, sua popularidade, que hoje chega perto de 50%. A receita do populista de esquerda combina um câmbio fixo mantido graças às receitas obtidas com a exportação de gás e a distribuição de subsídios para manter a estabilidade do preço dos alimentos e dos combustíveis.

Analistas ressaltam, no entanto, que essa fórmula é uma panela de pressão, já que a dívida pública boliviana vem crescendo nos últimos anos.

“Para manter congelados os preços do dólar e dos combustíveis, o governo recorre há muitos anos a pesados subsídios”, disse o economista boliviano Roberto Laserna. “Mas isso tem um limite. O déficit fiscal é muito grande e esse processo não é sustentável por muito tempo.”

O presidente Boliviano Luis Arce (esquerda) e seu antecessor, Evo Morales, celebram o ano novo aymara em La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP

A eleição de Gustavo Petro na Colômbia deu sequência a uma série de vitórias eleitorais da esquerda na América do Sul nos últimos anos e colocou o ex-guerrilheiro no mapa político da região junto de outros líderes como o argentino Alberto Fernández, o peruano Pedro Castillo, o boliviano Luis Arce e o chileno Gabriel Boric. Eleitos nos últimos três anos, no entanto, esses presidentes têm tido dificuldades nos últimos meses com a alta do preço dos combustíveis e dos alimentos, que faz a maior parte do eleitorado desaprovar seu trabalho e dificulta a implementação de sua agenda legislativa.

A baixa popularidade afeta ainda líderes recentemente eleitos com uma plataforma de direita, como é o caso de Guillermo Lasso, às voltas com violentos protestos de indígenas no Equador que o enfraqueceram politicamente nas últimas semanas,e ouros há mais tempo no cargo, como o paraguaio Mario Abdo Benítez.

O caso mais recente de fim da lua de mel entre o presidente e seu eleitorado é o do chileno Gabriel Boric. Com pouco mais de 100 dias no cargo, o líder mais jovem do continente viu sua aprovação despencar de 50% para 34%, segundo monitoramento semanal do instituto Cadem. O número é o mais baixo desde a posse de Boric, em março. A inflação de 11,5%, muito alta para a estável economia chilena, é apontada por analistas como o principal fator para o fim da lua de mel com o novo presidente.

Gabriel Boric durante a posse: popularidade do líder chileno caiu com apenas 100 dias de governo € (AP Photo/) Foto: Esteban Felix, File, AP

“No Chile não se esperava uma inflação tão alta, mas se sabia que a recuperação do emprego pós-pandemia seria muito difícil. Mas esses dois fatores tiveram um efeito adverso sobre a popularidade do governo porque as pessoas estão com dificuldades de sobreviver”, explicou ao Estado o economista chileno Luis Eduardo Escobar, diretor do Centro de Estudios del Desarrollo de Santiago. “Uma inflação de 10%, sobretudo concentrada nos alimentos e nos combustíveis, afeta demais as pessoas, ainda que seja menor do que os índices medidos no começo dos anos 90.”

Para reverter esse cenário, explica o economista, Boric conta com a valorização do cobre, a principal commodity chilena, no mercado internacional. Isso possibilitaria ao presidente intervir para baixar os preços de alguns itens e aprovar programas sociais para quem está mais afetado pela crise. “O principal agora é saber se Boric conseguirá aprovar no Congresso seu projeto de reforma tributária, que deve aumentar a arrecadação de impostos no Chile.

Além do front econômico, outros problemas enfrentados por Boric incluem o aumento da violência urbana no Chile e do aumento da imigração, principalmente de bolivianos no norte do país. A questão mapuche também se tornou um foco de impasse entre o novo governo e a nação indígena, que há anos reivindica mais autonomia no Chile.

Segundo a ONG Paz Cidadã, o número de homicídios no Chile aumentou 70% nos últimos seis anos. O combate à violência urbana e a imigração ilegal eram os principais pontos da campanha do antecessor de Boric, o conservador Sebastián Piñera. O rival do presidente no segundo turno, o populista de direita José Antonio Kast também prometia mão firme contra a criminalidade, mas acabou derrotado pelo esquerdista, que obteve 55% dos votos.

No Peru, um presidente fraco

No Peru, onde o presidente Pedro Castillo, há 11 meses no cargo, vive em guerra com o Congresso e o próprio partido, a alta dos preços complica um governo que já nasceu frágil em virtude da estreita diferença de votos no segundo turno para a rival Keiko Fujimori. Até mesmo a proclamação de Castillo como vencedor levou semanas em julho do ano passado.

Assim como no Chile, os peruanos estavam desacostumados a um cenário inflacionário, já que os preços estavam razoavelmente controlados no país desde meados dos anos 90. Nos últimos 12 meses, a inflação subiu 8,78% no país, um índice alto para os padrões peruanos. Já Castillo, prestes a completar um ano no cargo, tem a aprovação em torno de 23%, segundo o instituto Datum, e sua desaprovação já se iguala à de Alejandro Toledo, o presidente mais mal avaliado da história recente do Peru

“O Peru vinha de um ciclo de crescimento, que apesar de não ter sido equitativo, garantiu um certo controle macroeconômico. Com a pandemia, retrocedemos 10 anos, e agora a inflação agravou esse quadro. Este mês tivemos a pior inflação em 25 anos”, disse ao Estado a cientista política Milagros Campos Ramos, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP). “O governo não está tomando medidas contra a crise e temos um presidente que não é só fraco como responde a tudo isso de improviso e com declarações contraditórias. Sua aprovação vem caindo por isso, em todos os níveis etários e socioeconômicos.”

Pedro Castillo tem tido uma relação difícil com o Congresso  Foto: Paolo Aguilar/EFE

Inflação, o velho problema argentino

Na Argentina, onde a inflação é um problema crônico há 20 anos, o impacto da recente alta dos combustíveis e dos alimentos no governo do presidente Alberto Fernández, no cargo desde 2019, tem impactado diretamente em sua popularidade a governabilidade da coalizão peronista. A aprovação de Fernández, que no começo da pandemia chegou a 67% em virtude das duras medidas para conter o contágio da covid-19.

O cansaço do lockdown, o avanço da pandemia, e a difícil recuperação econômica nos últimos meses, no entanto, custaram caro a Fernández, que desde o ano passado se viu em disputas com a vice e madrinha política, Cristina Kirchner. Hoje, sua aprovação gira em torno de 23%, segundo projeção da consultoria Management & Fit. Seis em cada dez argentinos o reprova.

Além disso, a inflação é a maior preocupação na cabeça dos argentinos. Para 37,1% da população, a alta dos preços é o pior problema do país. A alta do petróleo no mercado internacional criou nas últimas semanas um temor de escassez de diesel nos postos argentinos. Nos últimos 12 meses, os preços subiram 29,30%, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas (Indec).

“O nível de aprovação de Fernández está muito distante do seu ápice e isso se deve a duas razões principais. Uma tem a ver com a inflação. 70% dos argentinos dizem que a situação econômica vai cada vez pior e 80% acreditam que o governo não vai conseguir resolver o problema”, afirmou ao Estado Mariel Fornoni, da consultoria Management and Fit. “A coalizão de governo, formada por Fernández, Cristina e Sergio Massa, está rompida. Os principais detratores de Fernández eram seus aliados.”

Presidente argentino, Alberto Fernández, conversa com o premiê britânico, Boris Johson, durante a reunião do G-7 na Alemanha  Foto: Maria Eugenia Cerruti/Argentine Presidency/Handout via REUTERS

Uma solução populista na Bolívia

Quem anda na contramão dessa onda de impopularidade é a Bolívia. Ali, o presidente Luis Arce, afilhado político de Evo Morales eleito no ano passado, tem conseguido manter a inflação sob controle e com isso, sua popularidade, que hoje chega perto de 50%. A receita do populista de esquerda combina um câmbio fixo mantido graças às receitas obtidas com a exportação de gás e a distribuição de subsídios para manter a estabilidade do preço dos alimentos e dos combustíveis.

Analistas ressaltam, no entanto, que essa fórmula é uma panela de pressão, já que a dívida pública boliviana vem crescendo nos últimos anos.

“Para manter congelados os preços do dólar e dos combustíveis, o governo recorre há muitos anos a pesados subsídios”, disse o economista boliviano Roberto Laserna. “Mas isso tem um limite. O déficit fiscal é muito grande e esse processo não é sustentável por muito tempo.”

O presidente Boliviano Luis Arce (esquerda) e seu antecessor, Evo Morales, celebram o ano novo aymara em La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP

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