O primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida, vai visitar os Estados Unidos esta semana para aumentar a aliança militar entre os dois países no Indo-Pacífico e combater a presença e influência da China na região. Kishida, que já é o aliado mais importante de Joe Biden no Indo-Pacífico, deve apresentar junto com o presidente americano um realinhamento de tropas militares dos EUA baseadas em Okinawa e um plano de equipá-los com mísseis antinavio que podem ser disparados contra os chineses no caso de um conflito em Taiwan.
A ida do premiê japonês a Washington ocorre no momento em que ele enfrenta dificuldades no poder, com índices de aprovação abaixo de 40% em algumas pesquisas, e Biden busca impulsionar um aliado. Acontece, também, após o Japão anunciar o aumentar de gastos com defesa e uma nova estratégia de segurança nacional que prioriza armas com capacidade de ataque de longo alcance – permitindo que a China continental esteja na mira. “A reunião entre o presidente Biden e o primeiro-ministro Kishida destacará o momento crucial em que estamos para a aliança EUA-Japão”, disseram autoridades da Casa Branca em um comunicado ao Washington Post.
Essa aliança foi destacada por posições do Japão este ano. O país, que lidera o G-7 este ano, tomou medidas significativas para responsabilizar a Rússia pela guerra na Ucrânia – tornando-se o primeiro país da Ásia a se juntar às democracias ocidentais em sanções contra Moscou. E Kishida, sob o risco de irritar a China, falou publicamente sobre um potencial conflito em torno de Taiwan.
À medida em que se sentiu ameaçado por uma guerra no Indo-Pacífico, o Japão deixou de lado décadas de restrições militares autoimpostas. “Trata-se essencialmente de o Japão se alinhar com os Estados Unidos, em muitos aspectos como um aliado da Otan”, disse um alto funcionário do governo americano sob anonimato.
O anúncio desta semana, que trata do reaproveitamento de tropas navais em Okinawa para que estas se dispersem rapidamente até 2025 para lutar em ilhas isoldas, será um dos avanços mais significativos na presença militar dos EUA no Indo-Pacífico, avaliam as autoridades. “O Japão está melhorando substancialmente sua capacidade, mas também fornecendo mais capacidade para os Estados Unidos”, disse uma autoridade do governo americano.
No passado, o Japão teria recorrido a “uma espécie de diplomacia de talão de cheques e, basicamente, pedido aos Estados Unidos que cuidassem” da segurança na região, acrescentou a autoridade. “O que eles estão fazendo agora é algo bem diferente e bastante significativo. Essencialmente, dizem: ‘Conte conosco’”.
Mais sobre as tensões no Indo-Pacífico
O anúncio desta semana foi planejado para acontecer em sintonia com o lançamento do orçamento de defesa e das estratégias de segurança nacional do Japão. A reunião entre Kishida e Biden, no entanto, vai além e deve tratar sobre a atuação conjunta dos dois países no ano passado e o futuro da aliança.
Nos Estados Unidos, parte dos políticos, como o deputado republicano Mike Gallagher, presidente da nova Comissão sobre a China, apoiam a parceria, mas querem ver mais ação. Segundo Gallagher, nem o atual governo nem o anterior parecem ter tomado ações com “senso de urgência” para lidar com a China.
Funcionários do governo Biden discordam e dizem que as mudanças que o Japão prometeu fazer são significativas. O país planeja aumentar os gastos de defesa para 2% do PIB ao longo de 5 anos, o que tornaria o orçamento de defesa japonês o terceiro maior do mundo. Além disso, avaliam os funcionários, a decisão de construir mísseis de longo alcance e comprar mísseis Tomahawks dos EUA significa um grande avanço na capacidade de defesa e um sinal para a China de que os movimentos agressivos na região não ficarão sem resposta.
O endosso do Japão à reestruturação do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA ocorre no momento em que a China continua um amplo acúmulo militar, incluindo a expansão de sua Marinha – já a maior do mundo – e seu programa nuclear, que fazem parte do objetivo de Pequim de se tornar o exército mais proeminente do mundo até 2049.
‘Urgência de ameaça’
O Japão e a China também estão envolvidos em uma longa disputa territorial sobre as Ilhas Senkaku, no Mar da China Oriental, a nordeste de Taiwan, onde uma escalada poderia levar os Estados Unidos – que se comprometeram a defender o Japão sob um tratado de segurança – em um conflito com a China.
Altos oficiais militares dos EUA em Washington e no Pacífico discutem há anos uma reestruturação das forças armadas dos EUA – e do Corpo de Fuzileiros Navais, em particular – para combater as crescentes preocupações sobre o crescimento das forças armadas chinesas e ações imprevisíveis.
A forte concentração das forças armadas dos EUA em Okinawa e uma série de incidentes criminais ao longo dos anos têm sido um ponto sensível com os japoneses, e os okinawanos em particular. “O fato de que eles estão endossando mostra o quanto o relacionamento mudou e que o apoio à aliança se estende a Okinawa também”, disse Christopher Johnstone, presidente do Japão no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais e ex-diretor da Casa Branca para o Leste Asiático. “Isso fala da evolução política em Okinawa e da urgência da ameaça.”
Embora o número total de pessoal designado para unidades de fuzileiros navais em Okinawa se mantenha estável, em cerca de 18 mil, “não é apenas sobre soldados, é sobre as capacidades”, avaliou um funcionário do governo. “Eles vão se mover mais rápido. Com mais poder de fogo.”
Ele acrescentou que nos próximos anos o objetivo é fornecer ao regimento naval mísseis antinavio que sejam lançados da terra, permitindo que os militares possam atingir adversários de vários “domínios” simultaneamente (ar-ar, ar-terra, terra-mar, mar-terra e assim por diante).
O Pentágono também quer aumentar a capacidade de mover fuzileiros navais para ilhas remotas a sudoeste de Okinawa, onde treinarão e talvez posicionarão equipamentos para poderem se instalarem rapidamente caso a China ataque Taiwan, disseram as autoridades.