Joe Biden mostra como é complicada a realidade de ser o presidente mais velho dos EUA


Presidente americano intercala entre momentos de vitalidade e energia com situações em que mostra fragilidade, aumentando as preocupações dos eleitores com sua tentativa de reeleição

Por Peter Baker, Michael Shear, Katie Rogers e Zolan Kanno-Youngs
Atualização:

THE NEW YORK TIMES, WASHINGTON - Houve um momento, no inverno passado (Hemisfério Norte), em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi despertado às 3h, enquanto viajava para a Ásia, e ouviu que um míssil tinha atingido a Polônia, desencadeando o temor de que a Rússia poderia ter expandido a guerra na Ucrânia para um país-membro da Otan. Durante horas, no meio da madrugada, Biden consultou seus mais graduados conselheiros, telefonou para o presidente polonês e para o secretário-geral da Otan e reuniu líderes mundiais para lidar com a crise.

E houve um momento, poucas semanas atrás, em que Biden recebia crianças pelo Dia de Levar seu Filho ao Trabalho e se confundiu ao tentar listar seus netos. “Bem, deixe-me ver. Eu tenho um em Nova York, dois na Filadélfia — ou serão três? Não, três, porque eu tenho uma neta que está… eu não sei. Você está me confundindo.” Ele também se embaralhou quando lhe perguntaram qual era o último país que tinha visitado e o nome de seu filme favorito.

Esses dois Joe Bidens coexistem dentro do mesmo presidente octogenário: um deles é perspicaz e sábio em momentos críticos, produto de décadas de experiência, capaz de estar à altura da ocasião mesmo na calada da noite para confrontar um mundo perigoso; mas também existe um homem mais vagaroso e brando, que não ouve tão bem, um pouco mais vacilante ao caminhar e mais propenso a lapsos de memória ocasionais de maneiras que parecem familiares a qualquer um que passou dos 80 anos ou tem pais nessa faixa etária.

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O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarty  Foto: Jacquelyn Martin/ REUTERS

A síntese da complicada realidade do presidente mais velho dos EUA na história concretizou-se na quinta-feira, 1, quando o Congresso aprovou um acordo bipartidário que ele negociou para evitar um calote nacional. Até mesmo o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, republicano na Califórnia, declarou que Biden foi “muito profissional, muito inteligente, muito enérgico” durante suas negociações.

Mas pouco antes da votação ocorrer, Biden tropeçou em um saco de areia no palco de uma cerimônia de formatura da Academia da Força Aérea e caiu. O vídeo viralizou, seus apoiadores se acanharam e seus críticos regozijaram.

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Qualquer um, com qualquer idade, pode tropeçar, mas para um presidente de 80 anos isso sempre levanta questões desconfortáveis. Se ele fosse qualquer outra pessoa, os sinais da idade poderiam passar despercebidos.

Mas Biden é chefe do Executivo do país mais poderoso do planeta e acaba de iniciar uma campanha pedindo aos eleitores que o mantenham na Casa Branca até seus 86 anos, atraindo ainda mais atenção para um tema que, segundo mostram as pesquisas, inquieta a maioria dos americanos e é fonte de enorme ansiedade entre os líderes dos partidos.

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Dois lados

O retrato que emerge de meses de entrevistas com dezenas de autoridades e ex-autoridades e outras fontes que passam tempo com Biden se situa em um ponto entre a caricatura partidária de um velhinho confuso e facilmente manipulável, promovida pelos republicanos, e a imagem divulgada por sua equipe, de um presidente com óculos escuros de aviador que comanda a arena internacional e governa com vigor. Esse retrato é de um homem que ficou mais vagaroso com a idade de maneiras mais pronunciadas do que simplesmente os cabelos grisalhos comuns à maioria dos últimos presidentes durante seu período na função. Biden às vezes confunde palavras e parece mais velho do que antes em razão de seu caminhar rígido e sua voz cada vez mais rarefeita.

Mas pessoas que interagem com o presidente regularmente, incluindo alguns de seus adversários, afirmam que ele continua sagaz e imponente em reuniões privadas. Diplomatas contam histórias de viagens a lugares como Ucrânia, Japão, Egito, Camboja e Indonésia nas quais Biden com frequência resistia mais do que os colegas mais jovens. Legisladores democratas enumeram uma longa lista de realizações como prova de que ele ainda á capaz de trabalhar duro.

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O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, remove os óculos durante cerimonia de graduação da força aérea americana em Colorado Springs  Foto: Kevin Lamarque/ REUTERS

Seus desacertos verbais não são novidade, notam amigos; ele lutou a vida inteira contra gagueira e era, usando um termo cunhado pelo próprio, uma “máquina de gafes” muito antes de estar apto para benefícios previdenciários. Conselheiros dizem que seu julgamento é tão aguçado quanto sempre foi. Tantos usam a expressão “afiado como uma navalha” para descrevê-lo que ela virou um tipo de mantra.

Biden afirma que idade é uma preocupação legítima mas sustenta que sua longevidade é uma vantagem, não um passivo. “Você me chama de ancião?”, afirmou ele no jantar da Associação de Correspondentes da Casa Branca, em abril. “Eu lhe digo que sou sábio.”

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Preocupação

Pesquisas indicam que a idade de Biden é uma das principais preocupações dos americanos, incluindo democratas. Durante um debate recente organizado pelo New York Times, vários eleitores que apoiaram Biden em 2020 expressaram preocupação; um afirmou: “Eu comecei a perceber o olhar perdido dele algumas vezes, quando ele discursa na TV ou fala em eventos. Parece que ele perde a linha de pensamento”.

Privadamente, autoridades reconhecem que estão fazendo o que consideram adaptações razoáveis para não exigir demais fisicamente do presidente idoso. Sua equipe agenda a maioria de suas aparições entre 12h e 16h e tenta o máximo possível não perturbá-lo nos fins de semana.

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Um estudo da agenda de Biden com base em dados compilados pelo website Axios e expandido pelo Times constatou que ela possui uma cadência matutina similar à do ex-presidente que ele serviu como vice, Barack Obama. Nenhum deles marcou muitos eventos públicos antes das 10h, apenas 4% ocorreram antes desse horário no último ano de Obama na presidência, e 5% nos primeiros dois anos e meio de Biden. Obama compareceu quase ao dobro de eventos públicos após as 18h em comparação com Biden: 17% contra 9%.

Assessores de Biden limitam sua exposição a entrevistas à imprensa em momentos que ele poderia cometer algum erro prejudicial politicamente. Biden concedeu apenas um quarto do número de entrevistas concedidas por Donald Trump no mesmo período e um quinto em comparação a Obama — e nenhuma a repórteres de jornais grandes. Biden não concedeu entrevista ao departamento de notícias do Times, ao contrário de todos os presidentes americanos desde pelo menos Franklin D. Roosevelt, exceto por Dwight Eisenhower. E nos últimos 100 anos, apenas Ronald Reagan e Richard Nixon concederam tão poucas entrevistas coletivas.

Como muitos indivíduos com sua idade, Biden sempre repete as mesmas frases e reconta as mesmas histórias antigas, que com frequência não correspondem exatamente aos fatos. Às vezes ele é excêntrico; quando crianças o visitam, ele pode subitamente pegar um livro de William Butler Yeats em sua mesa e começar a recitar poesia irlandesa.

Ao mesmo tempo, Biden é esbelto e está em boa forma, se exercita cinco vezes por semana e não bebe. Em certas ocasiões ele demonstrou um vigor impressionante, como quando voou para a Polônia e depois embarcou em uma viagem de trem de nove horas para visitar secretamente Kiev, passou horas na capital ucraniana e em seguida embarcou em outra viagem de nove horas de um trem antes de tomar um voo para Varsóvia, Polônia. Um estudo da agenda de Biden realizado por seus assessores mostra que ele viajou um pouco mais em seu terceiro ano na presidência do que Obama no mesmo período de seu mandato.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda, e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, no Mosteiro de Cúpula Dourada de São Miguel em Kiev, capital da Ucrânia, em 20 de fevereiro de 2023. Biden exibiu resistência impressionante para chegar a Ucrânia, com um trajeto de avião até a Polônia e uma viagem de nove horas de trem até Kiev  Foto: Daniel Berehulak / NYT

“Ele divaga? Sim, ele divaga”, afirmou o governador de Nova Jersey, Phil Murphy, democrata que rejeita categoricamente a ideia de que Biden é velho demais para ser presidente. “Ele sempre divagou? Sim, ele sempre divagou. Em público e privadamente. Ele é sempre o mesmo cara. Literalmente — e não estou dizendo isso de maneira leviana — eu nunca conheci ninguém na minha vida que seja privadamente tão a mesma pessoa que é em público.”

A questão sobre a idade de Biden não ocorre isolada, evidentemente. Trump, seu competidor republicano mais provável, é apenas quatro anos mais jovem e tinha sido o presidente mais velho dos EUA até Biden suceder-lhe. Se Trump vencer no ano que vem, ele terá 82 anos no fim de seu mandato, será mais velho do que Biden no fim de seu atual período na presidência.

Quando ocupava a função, Trump causou preocupações a respeito de sua destreza mental e condição física. Ele não se exercitava, sua dieta tinha como base principalmente cheeseburgers e bifes e ele registrou na balança oficialmente 110,7 quilos, um peso considerado formalmente como obesidade em relação à sua altura.

Depois de reclamar que tinha reuniões demais de manhã, Trump passou a aparecer no Salão Oval entre 11h e 11h30 diariamente, ficando na residência enquanto assistia TV, dava telefonemas ou postava tuítes incendiários. Durante um evento na Academia Militar dos EUA em West Point, ele teve dificuldades em levantar um copo d’água e pareceu ter problemas em descer uma pequena rampa.

Biden ultimamente tem se voltado para o humor autodepreciativo para neutralizar a questão — seguindo uma dica de Reagan, que venceu a reeleição aos 73 anos após um gracejo num debate afirmando que não exploraria “a juventude e a inexperiência do meu oponente”.

No jantar com os correspondentes, Biden garantiu a todos que apoiava a Primeira Emenda “não apenas porque meu bom amigo Jimmy Madison a redigiu”. No evento do Dia de Levar seu Filho ao Trabalho, Biden relembrou da época “em que era jovem, 120 anos atrás”. E na Academia da Força Aérea, há poucos dias, Biden fez piada afirmando que “quando eu me formei no ensino médio, 300 anos atrás, eu me candidatei para a Academia Naval”. Depois de tropeçar no saco de areia, ele também conseguiu fazer brincadeira. “Tomei rasteira do saco”, disse ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES, WASHINGTON - Houve um momento, no inverno passado (Hemisfério Norte), em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi despertado às 3h, enquanto viajava para a Ásia, e ouviu que um míssil tinha atingido a Polônia, desencadeando o temor de que a Rússia poderia ter expandido a guerra na Ucrânia para um país-membro da Otan. Durante horas, no meio da madrugada, Biden consultou seus mais graduados conselheiros, telefonou para o presidente polonês e para o secretário-geral da Otan e reuniu líderes mundiais para lidar com a crise.

E houve um momento, poucas semanas atrás, em que Biden recebia crianças pelo Dia de Levar seu Filho ao Trabalho e se confundiu ao tentar listar seus netos. “Bem, deixe-me ver. Eu tenho um em Nova York, dois na Filadélfia — ou serão três? Não, três, porque eu tenho uma neta que está… eu não sei. Você está me confundindo.” Ele também se embaralhou quando lhe perguntaram qual era o último país que tinha visitado e o nome de seu filme favorito.

Esses dois Joe Bidens coexistem dentro do mesmo presidente octogenário: um deles é perspicaz e sábio em momentos críticos, produto de décadas de experiência, capaz de estar à altura da ocasião mesmo na calada da noite para confrontar um mundo perigoso; mas também existe um homem mais vagaroso e brando, que não ouve tão bem, um pouco mais vacilante ao caminhar e mais propenso a lapsos de memória ocasionais de maneiras que parecem familiares a qualquer um que passou dos 80 anos ou tem pais nessa faixa etária.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarty  Foto: Jacquelyn Martin/ REUTERS

A síntese da complicada realidade do presidente mais velho dos EUA na história concretizou-se na quinta-feira, 1, quando o Congresso aprovou um acordo bipartidário que ele negociou para evitar um calote nacional. Até mesmo o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, republicano na Califórnia, declarou que Biden foi “muito profissional, muito inteligente, muito enérgico” durante suas negociações.

Mas pouco antes da votação ocorrer, Biden tropeçou em um saco de areia no palco de uma cerimônia de formatura da Academia da Força Aérea e caiu. O vídeo viralizou, seus apoiadores se acanharam e seus críticos regozijaram.

Qualquer um, com qualquer idade, pode tropeçar, mas para um presidente de 80 anos isso sempre levanta questões desconfortáveis. Se ele fosse qualquer outra pessoa, os sinais da idade poderiam passar despercebidos.

Mas Biden é chefe do Executivo do país mais poderoso do planeta e acaba de iniciar uma campanha pedindo aos eleitores que o mantenham na Casa Branca até seus 86 anos, atraindo ainda mais atenção para um tema que, segundo mostram as pesquisas, inquieta a maioria dos americanos e é fonte de enorme ansiedade entre os líderes dos partidos.

Dois lados

O retrato que emerge de meses de entrevistas com dezenas de autoridades e ex-autoridades e outras fontes que passam tempo com Biden se situa em um ponto entre a caricatura partidária de um velhinho confuso e facilmente manipulável, promovida pelos republicanos, e a imagem divulgada por sua equipe, de um presidente com óculos escuros de aviador que comanda a arena internacional e governa com vigor. Esse retrato é de um homem que ficou mais vagaroso com a idade de maneiras mais pronunciadas do que simplesmente os cabelos grisalhos comuns à maioria dos últimos presidentes durante seu período na função. Biden às vezes confunde palavras e parece mais velho do que antes em razão de seu caminhar rígido e sua voz cada vez mais rarefeita.

Mas pessoas que interagem com o presidente regularmente, incluindo alguns de seus adversários, afirmam que ele continua sagaz e imponente em reuniões privadas. Diplomatas contam histórias de viagens a lugares como Ucrânia, Japão, Egito, Camboja e Indonésia nas quais Biden com frequência resistia mais do que os colegas mais jovens. Legisladores democratas enumeram uma longa lista de realizações como prova de que ele ainda á capaz de trabalhar duro.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, remove os óculos durante cerimonia de graduação da força aérea americana em Colorado Springs  Foto: Kevin Lamarque/ REUTERS

Seus desacertos verbais não são novidade, notam amigos; ele lutou a vida inteira contra gagueira e era, usando um termo cunhado pelo próprio, uma “máquina de gafes” muito antes de estar apto para benefícios previdenciários. Conselheiros dizem que seu julgamento é tão aguçado quanto sempre foi. Tantos usam a expressão “afiado como uma navalha” para descrevê-lo que ela virou um tipo de mantra.

Biden afirma que idade é uma preocupação legítima mas sustenta que sua longevidade é uma vantagem, não um passivo. “Você me chama de ancião?”, afirmou ele no jantar da Associação de Correspondentes da Casa Branca, em abril. “Eu lhe digo que sou sábio.”

Preocupação

Pesquisas indicam que a idade de Biden é uma das principais preocupações dos americanos, incluindo democratas. Durante um debate recente organizado pelo New York Times, vários eleitores que apoiaram Biden em 2020 expressaram preocupação; um afirmou: “Eu comecei a perceber o olhar perdido dele algumas vezes, quando ele discursa na TV ou fala em eventos. Parece que ele perde a linha de pensamento”.

Privadamente, autoridades reconhecem que estão fazendo o que consideram adaptações razoáveis para não exigir demais fisicamente do presidente idoso. Sua equipe agenda a maioria de suas aparições entre 12h e 16h e tenta o máximo possível não perturbá-lo nos fins de semana.

Um estudo da agenda de Biden com base em dados compilados pelo website Axios e expandido pelo Times constatou que ela possui uma cadência matutina similar à do ex-presidente que ele serviu como vice, Barack Obama. Nenhum deles marcou muitos eventos públicos antes das 10h, apenas 4% ocorreram antes desse horário no último ano de Obama na presidência, e 5% nos primeiros dois anos e meio de Biden. Obama compareceu quase ao dobro de eventos públicos após as 18h em comparação com Biden: 17% contra 9%.

Assessores de Biden limitam sua exposição a entrevistas à imprensa em momentos que ele poderia cometer algum erro prejudicial politicamente. Biden concedeu apenas um quarto do número de entrevistas concedidas por Donald Trump no mesmo período e um quinto em comparação a Obama — e nenhuma a repórteres de jornais grandes. Biden não concedeu entrevista ao departamento de notícias do Times, ao contrário de todos os presidentes americanos desde pelo menos Franklin D. Roosevelt, exceto por Dwight Eisenhower. E nos últimos 100 anos, apenas Ronald Reagan e Richard Nixon concederam tão poucas entrevistas coletivas.

Como muitos indivíduos com sua idade, Biden sempre repete as mesmas frases e reconta as mesmas histórias antigas, que com frequência não correspondem exatamente aos fatos. Às vezes ele é excêntrico; quando crianças o visitam, ele pode subitamente pegar um livro de William Butler Yeats em sua mesa e começar a recitar poesia irlandesa.

Ao mesmo tempo, Biden é esbelto e está em boa forma, se exercita cinco vezes por semana e não bebe. Em certas ocasiões ele demonstrou um vigor impressionante, como quando voou para a Polônia e depois embarcou em uma viagem de trem de nove horas para visitar secretamente Kiev, passou horas na capital ucraniana e em seguida embarcou em outra viagem de nove horas de um trem antes de tomar um voo para Varsóvia, Polônia. Um estudo da agenda de Biden realizado por seus assessores mostra que ele viajou um pouco mais em seu terceiro ano na presidência do que Obama no mesmo período de seu mandato.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda, e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, no Mosteiro de Cúpula Dourada de São Miguel em Kiev, capital da Ucrânia, em 20 de fevereiro de 2023. Biden exibiu resistência impressionante para chegar a Ucrânia, com um trajeto de avião até a Polônia e uma viagem de nove horas de trem até Kiev  Foto: Daniel Berehulak / NYT

“Ele divaga? Sim, ele divaga”, afirmou o governador de Nova Jersey, Phil Murphy, democrata que rejeita categoricamente a ideia de que Biden é velho demais para ser presidente. “Ele sempre divagou? Sim, ele sempre divagou. Em público e privadamente. Ele é sempre o mesmo cara. Literalmente — e não estou dizendo isso de maneira leviana — eu nunca conheci ninguém na minha vida que seja privadamente tão a mesma pessoa que é em público.”

A questão sobre a idade de Biden não ocorre isolada, evidentemente. Trump, seu competidor republicano mais provável, é apenas quatro anos mais jovem e tinha sido o presidente mais velho dos EUA até Biden suceder-lhe. Se Trump vencer no ano que vem, ele terá 82 anos no fim de seu mandato, será mais velho do que Biden no fim de seu atual período na presidência.

Quando ocupava a função, Trump causou preocupações a respeito de sua destreza mental e condição física. Ele não se exercitava, sua dieta tinha como base principalmente cheeseburgers e bifes e ele registrou na balança oficialmente 110,7 quilos, um peso considerado formalmente como obesidade em relação à sua altura.

Depois de reclamar que tinha reuniões demais de manhã, Trump passou a aparecer no Salão Oval entre 11h e 11h30 diariamente, ficando na residência enquanto assistia TV, dava telefonemas ou postava tuítes incendiários. Durante um evento na Academia Militar dos EUA em West Point, ele teve dificuldades em levantar um copo d’água e pareceu ter problemas em descer uma pequena rampa.

Biden ultimamente tem se voltado para o humor autodepreciativo para neutralizar a questão — seguindo uma dica de Reagan, que venceu a reeleição aos 73 anos após um gracejo num debate afirmando que não exploraria “a juventude e a inexperiência do meu oponente”.

No jantar com os correspondentes, Biden garantiu a todos que apoiava a Primeira Emenda “não apenas porque meu bom amigo Jimmy Madison a redigiu”. No evento do Dia de Levar seu Filho ao Trabalho, Biden relembrou da época “em que era jovem, 120 anos atrás”. E na Academia da Força Aérea, há poucos dias, Biden fez piada afirmando que “quando eu me formei no ensino médio, 300 anos atrás, eu me candidatei para a Academia Naval”. Depois de tropeçar no saco de areia, ele também conseguiu fazer brincadeira. “Tomei rasteira do saco”, disse ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES, WASHINGTON - Houve um momento, no inverno passado (Hemisfério Norte), em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi despertado às 3h, enquanto viajava para a Ásia, e ouviu que um míssil tinha atingido a Polônia, desencadeando o temor de que a Rússia poderia ter expandido a guerra na Ucrânia para um país-membro da Otan. Durante horas, no meio da madrugada, Biden consultou seus mais graduados conselheiros, telefonou para o presidente polonês e para o secretário-geral da Otan e reuniu líderes mundiais para lidar com a crise.

E houve um momento, poucas semanas atrás, em que Biden recebia crianças pelo Dia de Levar seu Filho ao Trabalho e se confundiu ao tentar listar seus netos. “Bem, deixe-me ver. Eu tenho um em Nova York, dois na Filadélfia — ou serão três? Não, três, porque eu tenho uma neta que está… eu não sei. Você está me confundindo.” Ele também se embaralhou quando lhe perguntaram qual era o último país que tinha visitado e o nome de seu filme favorito.

Esses dois Joe Bidens coexistem dentro do mesmo presidente octogenário: um deles é perspicaz e sábio em momentos críticos, produto de décadas de experiência, capaz de estar à altura da ocasião mesmo na calada da noite para confrontar um mundo perigoso; mas também existe um homem mais vagaroso e brando, que não ouve tão bem, um pouco mais vacilante ao caminhar e mais propenso a lapsos de memória ocasionais de maneiras que parecem familiares a qualquer um que passou dos 80 anos ou tem pais nessa faixa etária.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarty  Foto: Jacquelyn Martin/ REUTERS

A síntese da complicada realidade do presidente mais velho dos EUA na história concretizou-se na quinta-feira, 1, quando o Congresso aprovou um acordo bipartidário que ele negociou para evitar um calote nacional. Até mesmo o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, republicano na Califórnia, declarou que Biden foi “muito profissional, muito inteligente, muito enérgico” durante suas negociações.

Mas pouco antes da votação ocorrer, Biden tropeçou em um saco de areia no palco de uma cerimônia de formatura da Academia da Força Aérea e caiu. O vídeo viralizou, seus apoiadores se acanharam e seus críticos regozijaram.

Qualquer um, com qualquer idade, pode tropeçar, mas para um presidente de 80 anos isso sempre levanta questões desconfortáveis. Se ele fosse qualquer outra pessoa, os sinais da idade poderiam passar despercebidos.

Mas Biden é chefe do Executivo do país mais poderoso do planeta e acaba de iniciar uma campanha pedindo aos eleitores que o mantenham na Casa Branca até seus 86 anos, atraindo ainda mais atenção para um tema que, segundo mostram as pesquisas, inquieta a maioria dos americanos e é fonte de enorme ansiedade entre os líderes dos partidos.

Dois lados

O retrato que emerge de meses de entrevistas com dezenas de autoridades e ex-autoridades e outras fontes que passam tempo com Biden se situa em um ponto entre a caricatura partidária de um velhinho confuso e facilmente manipulável, promovida pelos republicanos, e a imagem divulgada por sua equipe, de um presidente com óculos escuros de aviador que comanda a arena internacional e governa com vigor. Esse retrato é de um homem que ficou mais vagaroso com a idade de maneiras mais pronunciadas do que simplesmente os cabelos grisalhos comuns à maioria dos últimos presidentes durante seu período na função. Biden às vezes confunde palavras e parece mais velho do que antes em razão de seu caminhar rígido e sua voz cada vez mais rarefeita.

Mas pessoas que interagem com o presidente regularmente, incluindo alguns de seus adversários, afirmam que ele continua sagaz e imponente em reuniões privadas. Diplomatas contam histórias de viagens a lugares como Ucrânia, Japão, Egito, Camboja e Indonésia nas quais Biden com frequência resistia mais do que os colegas mais jovens. Legisladores democratas enumeram uma longa lista de realizações como prova de que ele ainda á capaz de trabalhar duro.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, remove os óculos durante cerimonia de graduação da força aérea americana em Colorado Springs  Foto: Kevin Lamarque/ REUTERS

Seus desacertos verbais não são novidade, notam amigos; ele lutou a vida inteira contra gagueira e era, usando um termo cunhado pelo próprio, uma “máquina de gafes” muito antes de estar apto para benefícios previdenciários. Conselheiros dizem que seu julgamento é tão aguçado quanto sempre foi. Tantos usam a expressão “afiado como uma navalha” para descrevê-lo que ela virou um tipo de mantra.

Biden afirma que idade é uma preocupação legítima mas sustenta que sua longevidade é uma vantagem, não um passivo. “Você me chama de ancião?”, afirmou ele no jantar da Associação de Correspondentes da Casa Branca, em abril. “Eu lhe digo que sou sábio.”

Preocupação

Pesquisas indicam que a idade de Biden é uma das principais preocupações dos americanos, incluindo democratas. Durante um debate recente organizado pelo New York Times, vários eleitores que apoiaram Biden em 2020 expressaram preocupação; um afirmou: “Eu comecei a perceber o olhar perdido dele algumas vezes, quando ele discursa na TV ou fala em eventos. Parece que ele perde a linha de pensamento”.

Privadamente, autoridades reconhecem que estão fazendo o que consideram adaptações razoáveis para não exigir demais fisicamente do presidente idoso. Sua equipe agenda a maioria de suas aparições entre 12h e 16h e tenta o máximo possível não perturbá-lo nos fins de semana.

Um estudo da agenda de Biden com base em dados compilados pelo website Axios e expandido pelo Times constatou que ela possui uma cadência matutina similar à do ex-presidente que ele serviu como vice, Barack Obama. Nenhum deles marcou muitos eventos públicos antes das 10h, apenas 4% ocorreram antes desse horário no último ano de Obama na presidência, e 5% nos primeiros dois anos e meio de Biden. Obama compareceu quase ao dobro de eventos públicos após as 18h em comparação com Biden: 17% contra 9%.

Assessores de Biden limitam sua exposição a entrevistas à imprensa em momentos que ele poderia cometer algum erro prejudicial politicamente. Biden concedeu apenas um quarto do número de entrevistas concedidas por Donald Trump no mesmo período e um quinto em comparação a Obama — e nenhuma a repórteres de jornais grandes. Biden não concedeu entrevista ao departamento de notícias do Times, ao contrário de todos os presidentes americanos desde pelo menos Franklin D. Roosevelt, exceto por Dwight Eisenhower. E nos últimos 100 anos, apenas Ronald Reagan e Richard Nixon concederam tão poucas entrevistas coletivas.

Como muitos indivíduos com sua idade, Biden sempre repete as mesmas frases e reconta as mesmas histórias antigas, que com frequência não correspondem exatamente aos fatos. Às vezes ele é excêntrico; quando crianças o visitam, ele pode subitamente pegar um livro de William Butler Yeats em sua mesa e começar a recitar poesia irlandesa.

Ao mesmo tempo, Biden é esbelto e está em boa forma, se exercita cinco vezes por semana e não bebe. Em certas ocasiões ele demonstrou um vigor impressionante, como quando voou para a Polônia e depois embarcou em uma viagem de trem de nove horas para visitar secretamente Kiev, passou horas na capital ucraniana e em seguida embarcou em outra viagem de nove horas de um trem antes de tomar um voo para Varsóvia, Polônia. Um estudo da agenda de Biden realizado por seus assessores mostra que ele viajou um pouco mais em seu terceiro ano na presidência do que Obama no mesmo período de seu mandato.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda, e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, no Mosteiro de Cúpula Dourada de São Miguel em Kiev, capital da Ucrânia, em 20 de fevereiro de 2023. Biden exibiu resistência impressionante para chegar a Ucrânia, com um trajeto de avião até a Polônia e uma viagem de nove horas de trem até Kiev  Foto: Daniel Berehulak / NYT

“Ele divaga? Sim, ele divaga”, afirmou o governador de Nova Jersey, Phil Murphy, democrata que rejeita categoricamente a ideia de que Biden é velho demais para ser presidente. “Ele sempre divagou? Sim, ele sempre divagou. Em público e privadamente. Ele é sempre o mesmo cara. Literalmente — e não estou dizendo isso de maneira leviana — eu nunca conheci ninguém na minha vida que seja privadamente tão a mesma pessoa que é em público.”

A questão sobre a idade de Biden não ocorre isolada, evidentemente. Trump, seu competidor republicano mais provável, é apenas quatro anos mais jovem e tinha sido o presidente mais velho dos EUA até Biden suceder-lhe. Se Trump vencer no ano que vem, ele terá 82 anos no fim de seu mandato, será mais velho do que Biden no fim de seu atual período na presidência.

Quando ocupava a função, Trump causou preocupações a respeito de sua destreza mental e condição física. Ele não se exercitava, sua dieta tinha como base principalmente cheeseburgers e bifes e ele registrou na balança oficialmente 110,7 quilos, um peso considerado formalmente como obesidade em relação à sua altura.

Depois de reclamar que tinha reuniões demais de manhã, Trump passou a aparecer no Salão Oval entre 11h e 11h30 diariamente, ficando na residência enquanto assistia TV, dava telefonemas ou postava tuítes incendiários. Durante um evento na Academia Militar dos EUA em West Point, ele teve dificuldades em levantar um copo d’água e pareceu ter problemas em descer uma pequena rampa.

Biden ultimamente tem se voltado para o humor autodepreciativo para neutralizar a questão — seguindo uma dica de Reagan, que venceu a reeleição aos 73 anos após um gracejo num debate afirmando que não exploraria “a juventude e a inexperiência do meu oponente”.

No jantar com os correspondentes, Biden garantiu a todos que apoiava a Primeira Emenda “não apenas porque meu bom amigo Jimmy Madison a redigiu”. No evento do Dia de Levar seu Filho ao Trabalho, Biden relembrou da época “em que era jovem, 120 anos atrás”. E na Academia da Força Aérea, há poucos dias, Biden fez piada afirmando que “quando eu me formei no ensino médio, 300 anos atrás, eu me candidatei para a Academia Naval”. Depois de tropeçar no saco de areia, ele também conseguiu fazer brincadeira. “Tomei rasteira do saco”, disse ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES, WASHINGTON - Houve um momento, no inverno passado (Hemisfério Norte), em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi despertado às 3h, enquanto viajava para a Ásia, e ouviu que um míssil tinha atingido a Polônia, desencadeando o temor de que a Rússia poderia ter expandido a guerra na Ucrânia para um país-membro da Otan. Durante horas, no meio da madrugada, Biden consultou seus mais graduados conselheiros, telefonou para o presidente polonês e para o secretário-geral da Otan e reuniu líderes mundiais para lidar com a crise.

E houve um momento, poucas semanas atrás, em que Biden recebia crianças pelo Dia de Levar seu Filho ao Trabalho e se confundiu ao tentar listar seus netos. “Bem, deixe-me ver. Eu tenho um em Nova York, dois na Filadélfia — ou serão três? Não, três, porque eu tenho uma neta que está… eu não sei. Você está me confundindo.” Ele também se embaralhou quando lhe perguntaram qual era o último país que tinha visitado e o nome de seu filme favorito.

Esses dois Joe Bidens coexistem dentro do mesmo presidente octogenário: um deles é perspicaz e sábio em momentos críticos, produto de décadas de experiência, capaz de estar à altura da ocasião mesmo na calada da noite para confrontar um mundo perigoso; mas também existe um homem mais vagaroso e brando, que não ouve tão bem, um pouco mais vacilante ao caminhar e mais propenso a lapsos de memória ocasionais de maneiras que parecem familiares a qualquer um que passou dos 80 anos ou tem pais nessa faixa etária.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarty  Foto: Jacquelyn Martin/ REUTERS

A síntese da complicada realidade do presidente mais velho dos EUA na história concretizou-se na quinta-feira, 1, quando o Congresso aprovou um acordo bipartidário que ele negociou para evitar um calote nacional. Até mesmo o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, republicano na Califórnia, declarou que Biden foi “muito profissional, muito inteligente, muito enérgico” durante suas negociações.

Mas pouco antes da votação ocorrer, Biden tropeçou em um saco de areia no palco de uma cerimônia de formatura da Academia da Força Aérea e caiu. O vídeo viralizou, seus apoiadores se acanharam e seus críticos regozijaram.

Qualquer um, com qualquer idade, pode tropeçar, mas para um presidente de 80 anos isso sempre levanta questões desconfortáveis. Se ele fosse qualquer outra pessoa, os sinais da idade poderiam passar despercebidos.

Mas Biden é chefe do Executivo do país mais poderoso do planeta e acaba de iniciar uma campanha pedindo aos eleitores que o mantenham na Casa Branca até seus 86 anos, atraindo ainda mais atenção para um tema que, segundo mostram as pesquisas, inquieta a maioria dos americanos e é fonte de enorme ansiedade entre os líderes dos partidos.

Dois lados

O retrato que emerge de meses de entrevistas com dezenas de autoridades e ex-autoridades e outras fontes que passam tempo com Biden se situa em um ponto entre a caricatura partidária de um velhinho confuso e facilmente manipulável, promovida pelos republicanos, e a imagem divulgada por sua equipe, de um presidente com óculos escuros de aviador que comanda a arena internacional e governa com vigor. Esse retrato é de um homem que ficou mais vagaroso com a idade de maneiras mais pronunciadas do que simplesmente os cabelos grisalhos comuns à maioria dos últimos presidentes durante seu período na função. Biden às vezes confunde palavras e parece mais velho do que antes em razão de seu caminhar rígido e sua voz cada vez mais rarefeita.

Mas pessoas que interagem com o presidente regularmente, incluindo alguns de seus adversários, afirmam que ele continua sagaz e imponente em reuniões privadas. Diplomatas contam histórias de viagens a lugares como Ucrânia, Japão, Egito, Camboja e Indonésia nas quais Biden com frequência resistia mais do que os colegas mais jovens. Legisladores democratas enumeram uma longa lista de realizações como prova de que ele ainda á capaz de trabalhar duro.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, remove os óculos durante cerimonia de graduação da força aérea americana em Colorado Springs  Foto: Kevin Lamarque/ REUTERS

Seus desacertos verbais não são novidade, notam amigos; ele lutou a vida inteira contra gagueira e era, usando um termo cunhado pelo próprio, uma “máquina de gafes” muito antes de estar apto para benefícios previdenciários. Conselheiros dizem que seu julgamento é tão aguçado quanto sempre foi. Tantos usam a expressão “afiado como uma navalha” para descrevê-lo que ela virou um tipo de mantra.

Biden afirma que idade é uma preocupação legítima mas sustenta que sua longevidade é uma vantagem, não um passivo. “Você me chama de ancião?”, afirmou ele no jantar da Associação de Correspondentes da Casa Branca, em abril. “Eu lhe digo que sou sábio.”

Preocupação

Pesquisas indicam que a idade de Biden é uma das principais preocupações dos americanos, incluindo democratas. Durante um debate recente organizado pelo New York Times, vários eleitores que apoiaram Biden em 2020 expressaram preocupação; um afirmou: “Eu comecei a perceber o olhar perdido dele algumas vezes, quando ele discursa na TV ou fala em eventos. Parece que ele perde a linha de pensamento”.

Privadamente, autoridades reconhecem que estão fazendo o que consideram adaptações razoáveis para não exigir demais fisicamente do presidente idoso. Sua equipe agenda a maioria de suas aparições entre 12h e 16h e tenta o máximo possível não perturbá-lo nos fins de semana.

Um estudo da agenda de Biden com base em dados compilados pelo website Axios e expandido pelo Times constatou que ela possui uma cadência matutina similar à do ex-presidente que ele serviu como vice, Barack Obama. Nenhum deles marcou muitos eventos públicos antes das 10h, apenas 4% ocorreram antes desse horário no último ano de Obama na presidência, e 5% nos primeiros dois anos e meio de Biden. Obama compareceu quase ao dobro de eventos públicos após as 18h em comparação com Biden: 17% contra 9%.

Assessores de Biden limitam sua exposição a entrevistas à imprensa em momentos que ele poderia cometer algum erro prejudicial politicamente. Biden concedeu apenas um quarto do número de entrevistas concedidas por Donald Trump no mesmo período e um quinto em comparação a Obama — e nenhuma a repórteres de jornais grandes. Biden não concedeu entrevista ao departamento de notícias do Times, ao contrário de todos os presidentes americanos desde pelo menos Franklin D. Roosevelt, exceto por Dwight Eisenhower. E nos últimos 100 anos, apenas Ronald Reagan e Richard Nixon concederam tão poucas entrevistas coletivas.

Como muitos indivíduos com sua idade, Biden sempre repete as mesmas frases e reconta as mesmas histórias antigas, que com frequência não correspondem exatamente aos fatos. Às vezes ele é excêntrico; quando crianças o visitam, ele pode subitamente pegar um livro de William Butler Yeats em sua mesa e começar a recitar poesia irlandesa.

Ao mesmo tempo, Biden é esbelto e está em boa forma, se exercita cinco vezes por semana e não bebe. Em certas ocasiões ele demonstrou um vigor impressionante, como quando voou para a Polônia e depois embarcou em uma viagem de trem de nove horas para visitar secretamente Kiev, passou horas na capital ucraniana e em seguida embarcou em outra viagem de nove horas de um trem antes de tomar um voo para Varsóvia, Polônia. Um estudo da agenda de Biden realizado por seus assessores mostra que ele viajou um pouco mais em seu terceiro ano na presidência do que Obama no mesmo período de seu mandato.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda, e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, no Mosteiro de Cúpula Dourada de São Miguel em Kiev, capital da Ucrânia, em 20 de fevereiro de 2023. Biden exibiu resistência impressionante para chegar a Ucrânia, com um trajeto de avião até a Polônia e uma viagem de nove horas de trem até Kiev  Foto: Daniel Berehulak / NYT

“Ele divaga? Sim, ele divaga”, afirmou o governador de Nova Jersey, Phil Murphy, democrata que rejeita categoricamente a ideia de que Biden é velho demais para ser presidente. “Ele sempre divagou? Sim, ele sempre divagou. Em público e privadamente. Ele é sempre o mesmo cara. Literalmente — e não estou dizendo isso de maneira leviana — eu nunca conheci ninguém na minha vida que seja privadamente tão a mesma pessoa que é em público.”

A questão sobre a idade de Biden não ocorre isolada, evidentemente. Trump, seu competidor republicano mais provável, é apenas quatro anos mais jovem e tinha sido o presidente mais velho dos EUA até Biden suceder-lhe. Se Trump vencer no ano que vem, ele terá 82 anos no fim de seu mandato, será mais velho do que Biden no fim de seu atual período na presidência.

Quando ocupava a função, Trump causou preocupações a respeito de sua destreza mental e condição física. Ele não se exercitava, sua dieta tinha como base principalmente cheeseburgers e bifes e ele registrou na balança oficialmente 110,7 quilos, um peso considerado formalmente como obesidade em relação à sua altura.

Depois de reclamar que tinha reuniões demais de manhã, Trump passou a aparecer no Salão Oval entre 11h e 11h30 diariamente, ficando na residência enquanto assistia TV, dava telefonemas ou postava tuítes incendiários. Durante um evento na Academia Militar dos EUA em West Point, ele teve dificuldades em levantar um copo d’água e pareceu ter problemas em descer uma pequena rampa.

Biden ultimamente tem se voltado para o humor autodepreciativo para neutralizar a questão — seguindo uma dica de Reagan, que venceu a reeleição aos 73 anos após um gracejo num debate afirmando que não exploraria “a juventude e a inexperiência do meu oponente”.

No jantar com os correspondentes, Biden garantiu a todos que apoiava a Primeira Emenda “não apenas porque meu bom amigo Jimmy Madison a redigiu”. No evento do Dia de Levar seu Filho ao Trabalho, Biden relembrou da época “em que era jovem, 120 anos atrás”. E na Academia da Força Aérea, há poucos dias, Biden fez piada afirmando que “quando eu me formei no ensino médio, 300 anos atrás, eu me candidatei para a Academia Naval”. Depois de tropeçar no saco de areia, ele também conseguiu fazer brincadeira. “Tomei rasteira do saco”, disse ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES, WASHINGTON - Houve um momento, no inverno passado (Hemisfério Norte), em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi despertado às 3h, enquanto viajava para a Ásia, e ouviu que um míssil tinha atingido a Polônia, desencadeando o temor de que a Rússia poderia ter expandido a guerra na Ucrânia para um país-membro da Otan. Durante horas, no meio da madrugada, Biden consultou seus mais graduados conselheiros, telefonou para o presidente polonês e para o secretário-geral da Otan e reuniu líderes mundiais para lidar com a crise.

E houve um momento, poucas semanas atrás, em que Biden recebia crianças pelo Dia de Levar seu Filho ao Trabalho e se confundiu ao tentar listar seus netos. “Bem, deixe-me ver. Eu tenho um em Nova York, dois na Filadélfia — ou serão três? Não, três, porque eu tenho uma neta que está… eu não sei. Você está me confundindo.” Ele também se embaralhou quando lhe perguntaram qual era o último país que tinha visitado e o nome de seu filme favorito.

Esses dois Joe Bidens coexistem dentro do mesmo presidente octogenário: um deles é perspicaz e sábio em momentos críticos, produto de décadas de experiência, capaz de estar à altura da ocasião mesmo na calada da noite para confrontar um mundo perigoso; mas também existe um homem mais vagaroso e brando, que não ouve tão bem, um pouco mais vacilante ao caminhar e mais propenso a lapsos de memória ocasionais de maneiras que parecem familiares a qualquer um que passou dos 80 anos ou tem pais nessa faixa etária.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarty  Foto: Jacquelyn Martin/ REUTERS

A síntese da complicada realidade do presidente mais velho dos EUA na história concretizou-se na quinta-feira, 1, quando o Congresso aprovou um acordo bipartidário que ele negociou para evitar um calote nacional. Até mesmo o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, republicano na Califórnia, declarou que Biden foi “muito profissional, muito inteligente, muito enérgico” durante suas negociações.

Mas pouco antes da votação ocorrer, Biden tropeçou em um saco de areia no palco de uma cerimônia de formatura da Academia da Força Aérea e caiu. O vídeo viralizou, seus apoiadores se acanharam e seus críticos regozijaram.

Qualquer um, com qualquer idade, pode tropeçar, mas para um presidente de 80 anos isso sempre levanta questões desconfortáveis. Se ele fosse qualquer outra pessoa, os sinais da idade poderiam passar despercebidos.

Mas Biden é chefe do Executivo do país mais poderoso do planeta e acaba de iniciar uma campanha pedindo aos eleitores que o mantenham na Casa Branca até seus 86 anos, atraindo ainda mais atenção para um tema que, segundo mostram as pesquisas, inquieta a maioria dos americanos e é fonte de enorme ansiedade entre os líderes dos partidos.

Dois lados

O retrato que emerge de meses de entrevistas com dezenas de autoridades e ex-autoridades e outras fontes que passam tempo com Biden se situa em um ponto entre a caricatura partidária de um velhinho confuso e facilmente manipulável, promovida pelos republicanos, e a imagem divulgada por sua equipe, de um presidente com óculos escuros de aviador que comanda a arena internacional e governa com vigor. Esse retrato é de um homem que ficou mais vagaroso com a idade de maneiras mais pronunciadas do que simplesmente os cabelos grisalhos comuns à maioria dos últimos presidentes durante seu período na função. Biden às vezes confunde palavras e parece mais velho do que antes em razão de seu caminhar rígido e sua voz cada vez mais rarefeita.

Mas pessoas que interagem com o presidente regularmente, incluindo alguns de seus adversários, afirmam que ele continua sagaz e imponente em reuniões privadas. Diplomatas contam histórias de viagens a lugares como Ucrânia, Japão, Egito, Camboja e Indonésia nas quais Biden com frequência resistia mais do que os colegas mais jovens. Legisladores democratas enumeram uma longa lista de realizações como prova de que ele ainda á capaz de trabalhar duro.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, remove os óculos durante cerimonia de graduação da força aérea americana em Colorado Springs  Foto: Kevin Lamarque/ REUTERS

Seus desacertos verbais não são novidade, notam amigos; ele lutou a vida inteira contra gagueira e era, usando um termo cunhado pelo próprio, uma “máquina de gafes” muito antes de estar apto para benefícios previdenciários. Conselheiros dizem que seu julgamento é tão aguçado quanto sempre foi. Tantos usam a expressão “afiado como uma navalha” para descrevê-lo que ela virou um tipo de mantra.

Biden afirma que idade é uma preocupação legítima mas sustenta que sua longevidade é uma vantagem, não um passivo. “Você me chama de ancião?”, afirmou ele no jantar da Associação de Correspondentes da Casa Branca, em abril. “Eu lhe digo que sou sábio.”

Preocupação

Pesquisas indicam que a idade de Biden é uma das principais preocupações dos americanos, incluindo democratas. Durante um debate recente organizado pelo New York Times, vários eleitores que apoiaram Biden em 2020 expressaram preocupação; um afirmou: “Eu comecei a perceber o olhar perdido dele algumas vezes, quando ele discursa na TV ou fala em eventos. Parece que ele perde a linha de pensamento”.

Privadamente, autoridades reconhecem que estão fazendo o que consideram adaptações razoáveis para não exigir demais fisicamente do presidente idoso. Sua equipe agenda a maioria de suas aparições entre 12h e 16h e tenta o máximo possível não perturbá-lo nos fins de semana.

Um estudo da agenda de Biden com base em dados compilados pelo website Axios e expandido pelo Times constatou que ela possui uma cadência matutina similar à do ex-presidente que ele serviu como vice, Barack Obama. Nenhum deles marcou muitos eventos públicos antes das 10h, apenas 4% ocorreram antes desse horário no último ano de Obama na presidência, e 5% nos primeiros dois anos e meio de Biden. Obama compareceu quase ao dobro de eventos públicos após as 18h em comparação com Biden: 17% contra 9%.

Assessores de Biden limitam sua exposição a entrevistas à imprensa em momentos que ele poderia cometer algum erro prejudicial politicamente. Biden concedeu apenas um quarto do número de entrevistas concedidas por Donald Trump no mesmo período e um quinto em comparação a Obama — e nenhuma a repórteres de jornais grandes. Biden não concedeu entrevista ao departamento de notícias do Times, ao contrário de todos os presidentes americanos desde pelo menos Franklin D. Roosevelt, exceto por Dwight Eisenhower. E nos últimos 100 anos, apenas Ronald Reagan e Richard Nixon concederam tão poucas entrevistas coletivas.

Como muitos indivíduos com sua idade, Biden sempre repete as mesmas frases e reconta as mesmas histórias antigas, que com frequência não correspondem exatamente aos fatos. Às vezes ele é excêntrico; quando crianças o visitam, ele pode subitamente pegar um livro de William Butler Yeats em sua mesa e começar a recitar poesia irlandesa.

Ao mesmo tempo, Biden é esbelto e está em boa forma, se exercita cinco vezes por semana e não bebe. Em certas ocasiões ele demonstrou um vigor impressionante, como quando voou para a Polônia e depois embarcou em uma viagem de trem de nove horas para visitar secretamente Kiev, passou horas na capital ucraniana e em seguida embarcou em outra viagem de nove horas de um trem antes de tomar um voo para Varsóvia, Polônia. Um estudo da agenda de Biden realizado por seus assessores mostra que ele viajou um pouco mais em seu terceiro ano na presidência do que Obama no mesmo período de seu mandato.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda, e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, no Mosteiro de Cúpula Dourada de São Miguel em Kiev, capital da Ucrânia, em 20 de fevereiro de 2023. Biden exibiu resistência impressionante para chegar a Ucrânia, com um trajeto de avião até a Polônia e uma viagem de nove horas de trem até Kiev  Foto: Daniel Berehulak / NYT

“Ele divaga? Sim, ele divaga”, afirmou o governador de Nova Jersey, Phil Murphy, democrata que rejeita categoricamente a ideia de que Biden é velho demais para ser presidente. “Ele sempre divagou? Sim, ele sempre divagou. Em público e privadamente. Ele é sempre o mesmo cara. Literalmente — e não estou dizendo isso de maneira leviana — eu nunca conheci ninguém na minha vida que seja privadamente tão a mesma pessoa que é em público.”

A questão sobre a idade de Biden não ocorre isolada, evidentemente. Trump, seu competidor republicano mais provável, é apenas quatro anos mais jovem e tinha sido o presidente mais velho dos EUA até Biden suceder-lhe. Se Trump vencer no ano que vem, ele terá 82 anos no fim de seu mandato, será mais velho do que Biden no fim de seu atual período na presidência.

Quando ocupava a função, Trump causou preocupações a respeito de sua destreza mental e condição física. Ele não se exercitava, sua dieta tinha como base principalmente cheeseburgers e bifes e ele registrou na balança oficialmente 110,7 quilos, um peso considerado formalmente como obesidade em relação à sua altura.

Depois de reclamar que tinha reuniões demais de manhã, Trump passou a aparecer no Salão Oval entre 11h e 11h30 diariamente, ficando na residência enquanto assistia TV, dava telefonemas ou postava tuítes incendiários. Durante um evento na Academia Militar dos EUA em West Point, ele teve dificuldades em levantar um copo d’água e pareceu ter problemas em descer uma pequena rampa.

Biden ultimamente tem se voltado para o humor autodepreciativo para neutralizar a questão — seguindo uma dica de Reagan, que venceu a reeleição aos 73 anos após um gracejo num debate afirmando que não exploraria “a juventude e a inexperiência do meu oponente”.

No jantar com os correspondentes, Biden garantiu a todos que apoiava a Primeira Emenda “não apenas porque meu bom amigo Jimmy Madison a redigiu”. No evento do Dia de Levar seu Filho ao Trabalho, Biden relembrou da época “em que era jovem, 120 anos atrás”. E na Academia da Força Aérea, há poucos dias, Biden fez piada afirmando que “quando eu me formei no ensino médio, 300 anos atrás, eu me candidatei para a Academia Naval”. Depois de tropeçar no saco de areia, ele também conseguiu fazer brincadeira. “Tomei rasteira do saco”, disse ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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