Kamala se contrapõe a Trump e diz que eleição é oportunidade de superar ‘amargura e cinismo’


Vice-presidente aceitou a nomeação para concorrer a Casa Branca na última noite de Convenção Nacional do Partido Democrata

Por Isabel Gomes, Jéssica Petrovna e Luiz Raatz
Atualização:

Com discurso contundente, Kamala Harris aceitou a nomeação para disputar a presidência no último dia de Convenção Nacional do Partido Democrata. Diante de uma multidão energizada, ela descreveu a eleição como uma oportunidade de superar o passado de “amargura e cinismo”, representado na figura de Donald Trump.

“Ele quer nos levar de volta ao passado, mas não vamos retroceder”, disse Kamala Harris ao apontar o adversário como uma ameaça aos Estados Unidos, apelando aos eleitores para considerar o que ele fará se voltar ao poder. “Imaginem Donald Trump sem freio nenhum. E como ele usaria o poder imenso da presidência dos EUA. Não para melhorar a sua vida, ou para aumentar nossa segurança, mas para servir o único cliente que ele sempre teve: ele mesmo.”

Foi uma autorreferência. Durante o discurso, Kamala relembrou suas origens numa família de imigrantes da classe média e contou que decidiu estudar direito por causa da amiga de escola Wanda, que era sexualmente abusada pelo padrasto.

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Kamala Harris aceitou a nomeação para ser a candidata democrata na disputa presidencial contra o rebublicano Donald Trump. Foto: Andrew Caballero-reynolds/AFP

“Enquanto procuradora, eu nomeava as ações não em nome da vítima, mas em nome do povo. Por uma razão simples. No nosso sistema de Justiça, o dano a um de nós é um dano a todos nós”, disse. “Todos os dias no tribunal eu me colocava orgulhosamente diante do juiz e dizia quatro palavras: Kamala Harris pelo povo. Eu tive um único cliente em toda minha carreira: o povo”.

Kamala Harris pelo povo foi, inclusive, o seu lema de campanha em 2020, quando disputou a nomeação democrata. Sem conseguir deslanchar, acabou virando vice-presidente de Joe Biden, antes de se tornar a segunda mulher — depois de Hillary Clinton — e a primeira mulher não branca a disputar a presidência por um grande partido dos Estados Unidos.

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“Em nome do povo e todos os americanos independentemente de fé, credo ou etnia, e em nome das pessoas que trabalham duro e cuidam um dos outros, de todos cuja história só poderia ser escrita no melhor do país do mundo, eu aceito a nomeação para disputar a presidência dos Estados Unidos”, declarou.

Em seu discurso, fez acenos claros à classe trabalhadora, eleitorado que deve ser decisivo nas eleições, apresentado a chapa democrata como a única que seria capaz de entender e atender aos anseios do americano comum.

“Vamos fazer a economia crescer e reduzir os preços. E vamos facilitar o acesso a crédito”, prometeu. “Agora comparem isso com Donald Trump. Ele não luta pela classe média. Ele luta por ele mesmo e para os amigos bilionários dele. E ele vai cortar impostos desse pessoal”, acusou.

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Discurso de Kamala Harris encerrou quatro dias de Convenção Nacional Democrata, realizada em Chicago. Foto: Brynn Anderson/AP

Kamala passou por temas caros à base democrata, como acesso ao aborto, acusando Donald Trump de tirar a liberdade das mulheres com a nomeação dos juízes conservadores que reverteram Roe versus Wade. “Ele vai criar um programar para banir o aborto nacionalmente. Ele vai forçar os Estados a informar os abortos, espontâneos ou não. Em resumo: ele está maluco”, declarou, embora Trump tenha descartado a proibição nacional e afirme que pretende manter a decisão com os Estados.

A democrata seguiu dizendo que outras liberdades também estão em risco, como a de viver em segurança. Esse foi outro destaque da última noite de Convenção Nacional do Partido Democrata, que levou vítimas da violência armada ao palco do United Center.

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Em meio às críticas a Donald Trump, ela aproveitou para atacar uma das principais bandeiras do concorrente: a imigração. Kamala acusou o republicano de matar o projeto bipartidário para reforçar a segurança na fronteira, argumento antecipado nos discursos ao longo da Convenção. “Eu me recuso a fazer política com a segurança da nossa fronteira como ele fez”, disse.

Sobe a política externa, Kamala destacou as negociações do governo americano pelo cessar-fogo na Faixa de Gaza e afirmou que sempre defenderá “o direito de Israel de ser defender e ter acesso ao que precisa para se defender”, disse. “Ao mesmo tempo o que acontece em Gaza é desesperador”, reconheceu. “A escala de sofrimento é de partir o coração. Por isso, queremos encerrar a guerra para que o palestinos tenham direito a liberdade, segurança e autodeterminação.”

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Destaque para os direitos civis

Kamala, que pode ser a primeira mulher se tornar presidente dos Estados Unidos, afirmou em seu discurso que cresceu “nos valores dos direitos civis”, ao relembrar o ativismo dos pais, Shyamala Gopalan e Donald Harris, no movimento.

A luta pelos direitos civis foi um tema central na última noite da Convenção Democrata, com o discurso de Al Sharpton, que abordou o racismo de forma mais incisiva ao longo dos quatro dias de evento, sendo um dos momentos mais marcantes desta quinta-feira. “Nós sofremos, morremos e sangramos, fomos para a cadeia para ter o direito de votar. Nós não vamos voltar”, enfatizou.

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Sharpton destacou a natureza histórica da nomeação de Kamala, observando que, 52 anos atrás, ele era o jovem diretor da campanha de Shirley Chisholm (primeira mulher negra a ser eleita ao Congresso americano) para as primárias do Partido Democrata em 1972.

(Da esquerda para direita) Kevin Richardson, Yusef Salaam, Korey Wise e Raymond Santana, representando o “Central Park Five”, no palco com Al Sharpton. Foto: CHIP SOMODEVILLA/Getty Images via AFP

Ele também criticou Donald por gastar uma “pequena fortuna” ao comprar um anúncio em uma página inteira de jornal pedindo a pena de morte para adolescentes no caso “Central Park Five”, que condenou injustamente cinco jovens por um estupro no Central Park, em Nova York, em 1989. Quatro dos cinco, que foram inocentados depois de pegar entre seis e 13 anos de prisão, subiram ao palco da convenção após o discurso de Sharpton, provocando uma forte reação do público.

O ativista Korey Wise também lembrou do papel que Trump teve na época do julgamento. “Meus amigos e eu fomos presos por um crime que não cometemos. Nossos anos foram tirados de nós. Todos os dias quando entramos no tribunal as pessoas gritavam conosco por causa de Donald Trump. Ele pagou por um anúncio nos jornais de NY pedindo que fôssemos executados”, disse ele ao que a plateia respondeu com vaias. “Éramos crianças inocentes”.

Yusef Salaam, que hoje atua no Conselho da Cidade de Nova York, reforçou: “Ele queria que fôssemos mortos. Hoje, estamos inocentados porque o real estuprador confessou e isso foi provado. Aquele cara diz que ainda defende o veredito inicial, ele nega as evidências científicas no lugar de admitir que estava errado. Ele nunca mudou e nunca vai mudar”, declarou aplaudido pela multidão. “A América vai dizer adeus aquele homem odioso”. Até hoje, Trump se recusa a se desculpar pelo anúncio pago na época.

‘Nem para mover meu sofá’

Num momento mais descontraído da Convenção, a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, que foi rival de Kamala ao tentar a indicação presidencial democrata em 2020, provocou uma onda de gritos e risadas entre os democratas ao dizer que não confiaria em Trump e J.D. Vance “para mover meu sofá”.

A declaração da democrata foi uma referência a um boato infundado de que Vance, o vice de Trump, teria feito sexo com um sofá. “Confiar em Donald Trump e J.D. Vance para cuidar da sua família? Droga, eu não confiaria neles para mover meu sofá”, disse.

Referindo-se a Trump como “o criminoso”, a senadora ainda comparou a atuação de Kamala com a de Trump após a crise financeira de 2008.

”Kamala estava protegendo famílias”, disse. “E Donald estava enganando estudantes na Trump University e tentando ganhar dinheiro com pessoas que estavam perdendo suas casas”. “Essa é a diferença entre um criminoso e um promotor”, afirmou a senadora.

A noite democrata também deu espaço para um republicano subir ao palco. O ex-deputado Adam Kinzinger, um conhecido crítico de Trump, mandou um recado direto aos colegas de partido no palco da Convenção Democrata.

“Fui republicano por 12 anos no Congresso e ainda mantenho esse rótulo. Nunca pensei que estaria aqui, mas vocês também nunca pensaram que me veriam aqui, não é mesmo?”, disse rindo. “Aprendi algo sobre o Partido Democrata e quero contar o segredo aos meus colegas republicanos: os democratas são tão patriotas quanto nós”.

“Aos meus colegas republicanos: se vocês ainda juram lealdade a esses princípios, suspeito que vocês também pertencem a este lugar”, declarou Kinzinger, que acusou Trump de ser um “homem fraco que finge ser forte” e de “sufocar a alma do Partido Republicano”.

A participação de Kinzinger faz parte de uma estratégia da campanha democrata de tentar conquistar o apoio de republicanos que não se identificam com o extremismo de Trump. Em seu discurso, Kamala fez um apelo a este público.

“Sei que há pessoas de várias visões políticas assistindo esta noite, e quero que saibam que prometo ser um presidente para todos os americanos”, disse Kamala. “Prometo ser um presidente para todos os americanos para manter os princípios constitucionais sagrados da América, princípios fundamentais, desde o estado de direito e eleições justas até a transferência pacífica de poder.”

Com discurso contundente, Kamala Harris aceitou a nomeação para disputar a presidência no último dia de Convenção Nacional do Partido Democrata. Diante de uma multidão energizada, ela descreveu a eleição como uma oportunidade de superar o passado de “amargura e cinismo”, representado na figura de Donald Trump.

“Ele quer nos levar de volta ao passado, mas não vamos retroceder”, disse Kamala Harris ao apontar o adversário como uma ameaça aos Estados Unidos, apelando aos eleitores para considerar o que ele fará se voltar ao poder. “Imaginem Donald Trump sem freio nenhum. E como ele usaria o poder imenso da presidência dos EUA. Não para melhorar a sua vida, ou para aumentar nossa segurança, mas para servir o único cliente que ele sempre teve: ele mesmo.”

Foi uma autorreferência. Durante o discurso, Kamala relembrou suas origens numa família de imigrantes da classe média e contou que decidiu estudar direito por causa da amiga de escola Wanda, que era sexualmente abusada pelo padrasto.

Kamala Harris aceitou a nomeação para ser a candidata democrata na disputa presidencial contra o rebublicano Donald Trump. Foto: Andrew Caballero-reynolds/AFP

“Enquanto procuradora, eu nomeava as ações não em nome da vítima, mas em nome do povo. Por uma razão simples. No nosso sistema de Justiça, o dano a um de nós é um dano a todos nós”, disse. “Todos os dias no tribunal eu me colocava orgulhosamente diante do juiz e dizia quatro palavras: Kamala Harris pelo povo. Eu tive um único cliente em toda minha carreira: o povo”.

Kamala Harris pelo povo foi, inclusive, o seu lema de campanha em 2020, quando disputou a nomeação democrata. Sem conseguir deslanchar, acabou virando vice-presidente de Joe Biden, antes de se tornar a segunda mulher — depois de Hillary Clinton — e a primeira mulher não branca a disputar a presidência por um grande partido dos Estados Unidos.

“Em nome do povo e todos os americanos independentemente de fé, credo ou etnia, e em nome das pessoas que trabalham duro e cuidam um dos outros, de todos cuja história só poderia ser escrita no melhor do país do mundo, eu aceito a nomeação para disputar a presidência dos Estados Unidos”, declarou.

Em seu discurso, fez acenos claros à classe trabalhadora, eleitorado que deve ser decisivo nas eleições, apresentado a chapa democrata como a única que seria capaz de entender e atender aos anseios do americano comum.

“Vamos fazer a economia crescer e reduzir os preços. E vamos facilitar o acesso a crédito”, prometeu. “Agora comparem isso com Donald Trump. Ele não luta pela classe média. Ele luta por ele mesmo e para os amigos bilionários dele. E ele vai cortar impostos desse pessoal”, acusou.

Discurso de Kamala Harris encerrou quatro dias de Convenção Nacional Democrata, realizada em Chicago. Foto: Brynn Anderson/AP

Kamala passou por temas caros à base democrata, como acesso ao aborto, acusando Donald Trump de tirar a liberdade das mulheres com a nomeação dos juízes conservadores que reverteram Roe versus Wade. “Ele vai criar um programar para banir o aborto nacionalmente. Ele vai forçar os Estados a informar os abortos, espontâneos ou não. Em resumo: ele está maluco”, declarou, embora Trump tenha descartado a proibição nacional e afirme que pretende manter a decisão com os Estados.

A democrata seguiu dizendo que outras liberdades também estão em risco, como a de viver em segurança. Esse foi outro destaque da última noite de Convenção Nacional do Partido Democrata, que levou vítimas da violência armada ao palco do United Center.

Em meio às críticas a Donald Trump, ela aproveitou para atacar uma das principais bandeiras do concorrente: a imigração. Kamala acusou o republicano de matar o projeto bipartidário para reforçar a segurança na fronteira, argumento antecipado nos discursos ao longo da Convenção. “Eu me recuso a fazer política com a segurança da nossa fronteira como ele fez”, disse.

Sobe a política externa, Kamala destacou as negociações do governo americano pelo cessar-fogo na Faixa de Gaza e afirmou que sempre defenderá “o direito de Israel de ser defender e ter acesso ao que precisa para se defender”, disse. “Ao mesmo tempo o que acontece em Gaza é desesperador”, reconheceu. “A escala de sofrimento é de partir o coração. Por isso, queremos encerrar a guerra para que o palestinos tenham direito a liberdade, segurança e autodeterminação.”

Destaque para os direitos civis

Kamala, que pode ser a primeira mulher se tornar presidente dos Estados Unidos, afirmou em seu discurso que cresceu “nos valores dos direitos civis”, ao relembrar o ativismo dos pais, Shyamala Gopalan e Donald Harris, no movimento.

A luta pelos direitos civis foi um tema central na última noite da Convenção Democrata, com o discurso de Al Sharpton, que abordou o racismo de forma mais incisiva ao longo dos quatro dias de evento, sendo um dos momentos mais marcantes desta quinta-feira. “Nós sofremos, morremos e sangramos, fomos para a cadeia para ter o direito de votar. Nós não vamos voltar”, enfatizou.

Sharpton destacou a natureza histórica da nomeação de Kamala, observando que, 52 anos atrás, ele era o jovem diretor da campanha de Shirley Chisholm (primeira mulher negra a ser eleita ao Congresso americano) para as primárias do Partido Democrata em 1972.

(Da esquerda para direita) Kevin Richardson, Yusef Salaam, Korey Wise e Raymond Santana, representando o “Central Park Five”, no palco com Al Sharpton. Foto: CHIP SOMODEVILLA/Getty Images via AFP

Ele também criticou Donald por gastar uma “pequena fortuna” ao comprar um anúncio em uma página inteira de jornal pedindo a pena de morte para adolescentes no caso “Central Park Five”, que condenou injustamente cinco jovens por um estupro no Central Park, em Nova York, em 1989. Quatro dos cinco, que foram inocentados depois de pegar entre seis e 13 anos de prisão, subiram ao palco da convenção após o discurso de Sharpton, provocando uma forte reação do público.

O ativista Korey Wise também lembrou do papel que Trump teve na época do julgamento. “Meus amigos e eu fomos presos por um crime que não cometemos. Nossos anos foram tirados de nós. Todos os dias quando entramos no tribunal as pessoas gritavam conosco por causa de Donald Trump. Ele pagou por um anúncio nos jornais de NY pedindo que fôssemos executados”, disse ele ao que a plateia respondeu com vaias. “Éramos crianças inocentes”.

Yusef Salaam, que hoje atua no Conselho da Cidade de Nova York, reforçou: “Ele queria que fôssemos mortos. Hoje, estamos inocentados porque o real estuprador confessou e isso foi provado. Aquele cara diz que ainda defende o veredito inicial, ele nega as evidências científicas no lugar de admitir que estava errado. Ele nunca mudou e nunca vai mudar”, declarou aplaudido pela multidão. “A América vai dizer adeus aquele homem odioso”. Até hoje, Trump se recusa a se desculpar pelo anúncio pago na época.

‘Nem para mover meu sofá’

Num momento mais descontraído da Convenção, a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, que foi rival de Kamala ao tentar a indicação presidencial democrata em 2020, provocou uma onda de gritos e risadas entre os democratas ao dizer que não confiaria em Trump e J.D. Vance “para mover meu sofá”.

A declaração da democrata foi uma referência a um boato infundado de que Vance, o vice de Trump, teria feito sexo com um sofá. “Confiar em Donald Trump e J.D. Vance para cuidar da sua família? Droga, eu não confiaria neles para mover meu sofá”, disse.

Referindo-se a Trump como “o criminoso”, a senadora ainda comparou a atuação de Kamala com a de Trump após a crise financeira de 2008.

”Kamala estava protegendo famílias”, disse. “E Donald estava enganando estudantes na Trump University e tentando ganhar dinheiro com pessoas que estavam perdendo suas casas”. “Essa é a diferença entre um criminoso e um promotor”, afirmou a senadora.

A noite democrata também deu espaço para um republicano subir ao palco. O ex-deputado Adam Kinzinger, um conhecido crítico de Trump, mandou um recado direto aos colegas de partido no palco da Convenção Democrata.

“Fui republicano por 12 anos no Congresso e ainda mantenho esse rótulo. Nunca pensei que estaria aqui, mas vocês também nunca pensaram que me veriam aqui, não é mesmo?”, disse rindo. “Aprendi algo sobre o Partido Democrata e quero contar o segredo aos meus colegas republicanos: os democratas são tão patriotas quanto nós”.

“Aos meus colegas republicanos: se vocês ainda juram lealdade a esses princípios, suspeito que vocês também pertencem a este lugar”, declarou Kinzinger, que acusou Trump de ser um “homem fraco que finge ser forte” e de “sufocar a alma do Partido Republicano”.

A participação de Kinzinger faz parte de uma estratégia da campanha democrata de tentar conquistar o apoio de republicanos que não se identificam com o extremismo de Trump. Em seu discurso, Kamala fez um apelo a este público.

“Sei que há pessoas de várias visões políticas assistindo esta noite, e quero que saibam que prometo ser um presidente para todos os americanos”, disse Kamala. “Prometo ser um presidente para todos os americanos para manter os princípios constitucionais sagrados da América, princípios fundamentais, desde o estado de direito e eleições justas até a transferência pacífica de poder.”

Com discurso contundente, Kamala Harris aceitou a nomeação para disputar a presidência no último dia de Convenção Nacional do Partido Democrata. Diante de uma multidão energizada, ela descreveu a eleição como uma oportunidade de superar o passado de “amargura e cinismo”, representado na figura de Donald Trump.

“Ele quer nos levar de volta ao passado, mas não vamos retroceder”, disse Kamala Harris ao apontar o adversário como uma ameaça aos Estados Unidos, apelando aos eleitores para considerar o que ele fará se voltar ao poder. “Imaginem Donald Trump sem freio nenhum. E como ele usaria o poder imenso da presidência dos EUA. Não para melhorar a sua vida, ou para aumentar nossa segurança, mas para servir o único cliente que ele sempre teve: ele mesmo.”

Foi uma autorreferência. Durante o discurso, Kamala relembrou suas origens numa família de imigrantes da classe média e contou que decidiu estudar direito por causa da amiga de escola Wanda, que era sexualmente abusada pelo padrasto.

Kamala Harris aceitou a nomeação para ser a candidata democrata na disputa presidencial contra o rebublicano Donald Trump. Foto: Andrew Caballero-reynolds/AFP

“Enquanto procuradora, eu nomeava as ações não em nome da vítima, mas em nome do povo. Por uma razão simples. No nosso sistema de Justiça, o dano a um de nós é um dano a todos nós”, disse. “Todos os dias no tribunal eu me colocava orgulhosamente diante do juiz e dizia quatro palavras: Kamala Harris pelo povo. Eu tive um único cliente em toda minha carreira: o povo”.

Kamala Harris pelo povo foi, inclusive, o seu lema de campanha em 2020, quando disputou a nomeação democrata. Sem conseguir deslanchar, acabou virando vice-presidente de Joe Biden, antes de se tornar a segunda mulher — depois de Hillary Clinton — e a primeira mulher não branca a disputar a presidência por um grande partido dos Estados Unidos.

“Em nome do povo e todos os americanos independentemente de fé, credo ou etnia, e em nome das pessoas que trabalham duro e cuidam um dos outros, de todos cuja história só poderia ser escrita no melhor do país do mundo, eu aceito a nomeação para disputar a presidência dos Estados Unidos”, declarou.

Em seu discurso, fez acenos claros à classe trabalhadora, eleitorado que deve ser decisivo nas eleições, apresentado a chapa democrata como a única que seria capaz de entender e atender aos anseios do americano comum.

“Vamos fazer a economia crescer e reduzir os preços. E vamos facilitar o acesso a crédito”, prometeu. “Agora comparem isso com Donald Trump. Ele não luta pela classe média. Ele luta por ele mesmo e para os amigos bilionários dele. E ele vai cortar impostos desse pessoal”, acusou.

Discurso de Kamala Harris encerrou quatro dias de Convenção Nacional Democrata, realizada em Chicago. Foto: Brynn Anderson/AP

Kamala passou por temas caros à base democrata, como acesso ao aborto, acusando Donald Trump de tirar a liberdade das mulheres com a nomeação dos juízes conservadores que reverteram Roe versus Wade. “Ele vai criar um programar para banir o aborto nacionalmente. Ele vai forçar os Estados a informar os abortos, espontâneos ou não. Em resumo: ele está maluco”, declarou, embora Trump tenha descartado a proibição nacional e afirme que pretende manter a decisão com os Estados.

A democrata seguiu dizendo que outras liberdades também estão em risco, como a de viver em segurança. Esse foi outro destaque da última noite de Convenção Nacional do Partido Democrata, que levou vítimas da violência armada ao palco do United Center.

Em meio às críticas a Donald Trump, ela aproveitou para atacar uma das principais bandeiras do concorrente: a imigração. Kamala acusou o republicano de matar o projeto bipartidário para reforçar a segurança na fronteira, argumento antecipado nos discursos ao longo da Convenção. “Eu me recuso a fazer política com a segurança da nossa fronteira como ele fez”, disse.

Sobe a política externa, Kamala destacou as negociações do governo americano pelo cessar-fogo na Faixa de Gaza e afirmou que sempre defenderá “o direito de Israel de ser defender e ter acesso ao que precisa para se defender”, disse. “Ao mesmo tempo o que acontece em Gaza é desesperador”, reconheceu. “A escala de sofrimento é de partir o coração. Por isso, queremos encerrar a guerra para que o palestinos tenham direito a liberdade, segurança e autodeterminação.”

Destaque para os direitos civis

Kamala, que pode ser a primeira mulher se tornar presidente dos Estados Unidos, afirmou em seu discurso que cresceu “nos valores dos direitos civis”, ao relembrar o ativismo dos pais, Shyamala Gopalan e Donald Harris, no movimento.

A luta pelos direitos civis foi um tema central na última noite da Convenção Democrata, com o discurso de Al Sharpton, que abordou o racismo de forma mais incisiva ao longo dos quatro dias de evento, sendo um dos momentos mais marcantes desta quinta-feira. “Nós sofremos, morremos e sangramos, fomos para a cadeia para ter o direito de votar. Nós não vamos voltar”, enfatizou.

Sharpton destacou a natureza histórica da nomeação de Kamala, observando que, 52 anos atrás, ele era o jovem diretor da campanha de Shirley Chisholm (primeira mulher negra a ser eleita ao Congresso americano) para as primárias do Partido Democrata em 1972.

(Da esquerda para direita) Kevin Richardson, Yusef Salaam, Korey Wise e Raymond Santana, representando o “Central Park Five”, no palco com Al Sharpton. Foto: CHIP SOMODEVILLA/Getty Images via AFP

Ele também criticou Donald por gastar uma “pequena fortuna” ao comprar um anúncio em uma página inteira de jornal pedindo a pena de morte para adolescentes no caso “Central Park Five”, que condenou injustamente cinco jovens por um estupro no Central Park, em Nova York, em 1989. Quatro dos cinco, que foram inocentados depois de pegar entre seis e 13 anos de prisão, subiram ao palco da convenção após o discurso de Sharpton, provocando uma forte reação do público.

O ativista Korey Wise também lembrou do papel que Trump teve na época do julgamento. “Meus amigos e eu fomos presos por um crime que não cometemos. Nossos anos foram tirados de nós. Todos os dias quando entramos no tribunal as pessoas gritavam conosco por causa de Donald Trump. Ele pagou por um anúncio nos jornais de NY pedindo que fôssemos executados”, disse ele ao que a plateia respondeu com vaias. “Éramos crianças inocentes”.

Yusef Salaam, que hoje atua no Conselho da Cidade de Nova York, reforçou: “Ele queria que fôssemos mortos. Hoje, estamos inocentados porque o real estuprador confessou e isso foi provado. Aquele cara diz que ainda defende o veredito inicial, ele nega as evidências científicas no lugar de admitir que estava errado. Ele nunca mudou e nunca vai mudar”, declarou aplaudido pela multidão. “A América vai dizer adeus aquele homem odioso”. Até hoje, Trump se recusa a se desculpar pelo anúncio pago na época.

‘Nem para mover meu sofá’

Num momento mais descontraído da Convenção, a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, que foi rival de Kamala ao tentar a indicação presidencial democrata em 2020, provocou uma onda de gritos e risadas entre os democratas ao dizer que não confiaria em Trump e J.D. Vance “para mover meu sofá”.

A declaração da democrata foi uma referência a um boato infundado de que Vance, o vice de Trump, teria feito sexo com um sofá. “Confiar em Donald Trump e J.D. Vance para cuidar da sua família? Droga, eu não confiaria neles para mover meu sofá”, disse.

Referindo-se a Trump como “o criminoso”, a senadora ainda comparou a atuação de Kamala com a de Trump após a crise financeira de 2008.

”Kamala estava protegendo famílias”, disse. “E Donald estava enganando estudantes na Trump University e tentando ganhar dinheiro com pessoas que estavam perdendo suas casas”. “Essa é a diferença entre um criminoso e um promotor”, afirmou a senadora.

A noite democrata também deu espaço para um republicano subir ao palco. O ex-deputado Adam Kinzinger, um conhecido crítico de Trump, mandou um recado direto aos colegas de partido no palco da Convenção Democrata.

“Fui republicano por 12 anos no Congresso e ainda mantenho esse rótulo. Nunca pensei que estaria aqui, mas vocês também nunca pensaram que me veriam aqui, não é mesmo?”, disse rindo. “Aprendi algo sobre o Partido Democrata e quero contar o segredo aos meus colegas republicanos: os democratas são tão patriotas quanto nós”.

“Aos meus colegas republicanos: se vocês ainda juram lealdade a esses princípios, suspeito que vocês também pertencem a este lugar”, declarou Kinzinger, que acusou Trump de ser um “homem fraco que finge ser forte” e de “sufocar a alma do Partido Republicano”.

A participação de Kinzinger faz parte de uma estratégia da campanha democrata de tentar conquistar o apoio de republicanos que não se identificam com o extremismo de Trump. Em seu discurso, Kamala fez um apelo a este público.

“Sei que há pessoas de várias visões políticas assistindo esta noite, e quero que saibam que prometo ser um presidente para todos os americanos”, disse Kamala. “Prometo ser um presidente para todos os americanos para manter os princípios constitucionais sagrados da América, princípios fundamentais, desde o estado de direito e eleições justas até a transferência pacífica de poder.”

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