O presidente eleito do Uruguai, Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, protagonizou uma das eleições mais acirradas do país, ao ter obtido vantagem de somente 1,2 pontos porcentuais frente ao candidato da Frente Ampla, Daniel Martínez. Os números fizeram com que a Justiça Eleitoral contabilizasse, pela primeira vez na história, os chamados "votos observados", dos mesários e militares que trabalharam no dia das eleições, que poderiam alterar o resultado.
Os 35 mil votos que normalmente não são computados acabaram não alterando o resultado já previsto na contagem do último domingo, 24, quando os uruguaios foram às urnas. Porém, para o sociólogo e cientista político Rafael Bayce, da Universidade da República, em Montevidéu, os resultados já demonstram uma fragilidade do novo governo, que não deve ter espaço para tocar pautas essenciais, enquanto se preocupa em formar maioria no Congresso.
A baixa vantagem nas urnas que garantiu a vitória a Lacalle Pou significa algo?
A leitura externa que se faz é que se trata de um governo muito fraco e frágil, que não tem sequer a maioria simples parlamentar, e que também tem uma situação interna complicada no próprio Partido Nacional. Creio que tenha sido a eleição mais disputada do país. Para a população, é uma situação terrível, porque se trata de um governo que, a fim de governar, terá o trabalho de fazer e desfazer alianças, maior do que pensar em problemas e soluções para o país. Governar por decretos ou medidas urgentes são mecanismos que talvez Lacalle Pou tenha que recorrer, que pode interferir na qualidade da democracia e do republicanismo.
O esforço para fazer alianças é decorrente da coalizão muito diversa formada pelo Partido Nacional para as eleições?
Sim. Na realidade, a coalizão de Lacalle Pou não era para ele e a favor dele, mas sim uma coalizão contra a Frente Ampla. O único vínculo forte que eles tinham é a inquietude de derrotar a Frente Ampla nas urnas, e frear a vantagem que o partido de esquerda tinha no início, o que conseguiram. É a união pelo negativo, não pelo positivo.
Na sua avaliação, será possível tocar as pautas relacionadas ao aumento da violência e desaceleração econômica no Uruguai, motes principais da campanha de Lacalle Pou?
Não. A má situação econômica é internacional, onde o Uruguai é um país muito pequeno e fraco que não pode fazer nada. A conjuntura econômica está determinada externamente. Não acredito que o Uruguai esteja protegido de acontecimentos externos pela política econômica proposta por Lacalle Pou, e nem como esteve pela política da Frente Ampla. Já na questão da segurança, é absolutamente impossível que melhore, porque os responsáveis pelas mudanças não entendem os sintomas, não querem entender as causas. Então, são medidas que não darão resultado nunca. Nenhum país do mundo conseguiu aplicá-las.
O fato do Uruguai ter passado por eleições e permanecer politicamente estável frente a distúrbios em diversos países na América Latina coloca o país em um patamar diferente dos seus vizinhos?
O Uruguai seria uma exceção ao atual panorama da América Latina, e sempre que um governo de esquerda está no governo, e em seguida é assumido por um poder Executivo e boa parte do Legislativo que estão por um partido de direita, que têm como principal bandeira ser contra a esquerda. O Uruguai é um país que mantém um estilo de resolução de conflitos democrático, não é como o que acontece na Bolívia e no Chile. Então, é o mais civilizado e democrático do processo. Do ponto de vista de significado político, não existe, é uma situação normal; a esquerda perdeu no Uruguai, assim como em outros países, como no Brasil e como havia acontecido na Argentina, com a eleição do atual presidente Mauricio Macri, que agora foi derrotado.