Elas deixaram família, cidade natal e carreira para trabalhar em um projeto secreto, num lugar desconhecido, cuja única certeza era de que ajudariam a acabar com a 2ª Guerra. Quando descobriram o que realmente faziam no Projeto Manhattan, conta a jornalista Denise Kiernan, algumas dessas mulheres ficaram felizes por ter ajudado a pôr fim ao conflito. Outras, perplexas com a grandiosidade do que nem sequer conheciam. A pouco explorada perspectiva dessas trabalhadoras foi o caminho que Denise escolheu para contar um pouco mais sobre o controvertido Projeto – que resultou nas duas bombas jogadas pelos americanos sobre Hiroshima e Nagasaki, há 70 anos – no livro As Garotas da Cidade Atômica, lançado pela Editora Saraiva no Brasil este mês. A seguir, a entrevista que ela concedeu ao Estado.
Como e quando a sra. começou a pesquisar e escrever sobre o Projeto Manhattan?
Sempre fui amante da história. Já escrevi outros livros sobre história americana. No entanto, foi uma foto que chamou minha atenção. Eu estava em processo de pesquisa sobre outro livro quando me deparei com uma velha fotografia de uma jovem mulher trabalhando na planta Y-12 em Oak Ridge, Tennessee. Aquela foto, que está no livro, foi o que primeiro me fez interessar por esse aspecto em particular da história da 2ª Guerra e do Projeto Manhattan.
E como foi a decisão de escrever sobre a perspectiva dos trabalhadores do projeto?
Como leitora, gosto de aprender sobre momentos na história por meio das experiências das pessoas. Consigo me relacionar com elas. Esse é o meu tipo favorito de livro de não ficção porque posso me imaginar, com mais facilidade, passando pela mesma experiência. Muitos dos livros de história são escritos pelo ponto de vista das pessoas no poder, das que tomam as decisões. No entanto, há tantas outras pessoas envolvidas e suas experiências não são sempre compartilhadas, mesmo que muito válidas. Gosto de ver a história pelos olhos das mulheres, homens, crianças, nas pessoas do dia a dia que estão apenas vivendo suas vidas.
Mas por que você escolheu especificamente a perspectiva das mulheres?
Achei fascinante que enquanto dezenas de milhares de jovens mulheres tenham desempenhado um papel enorme no Projeto Manhattan, quando se fala sobre ele, sempre se foca no papel dos homens. Havia uma grande história para ser contada, uma perspectiva valiosa, não explorada, muito acessível aos leitores, tanto homens como mulheres.
Em geral, qual foi o sentimento que permaneceu depois de descobrirem qual era o objetivo do projeto?
Como você pode imaginar, as reações dos que viviam e trabalhavam em Oak Ridge foram muito complexas. Por um lado, todo mundo que entrevistei tinha um amigo ou parente lutando a guerra e muitos ficaram aliviados que ela finalmente acabou e eles retornaram para casa. Por outro lado, foi chocante para algumas pessoas compreender a magnitude do que elas estavam envolvidas. Em alguns casos, esses sentimentos evoluíram ao longo do tempo. A realidade sobre o quanto o mundo mudou e como fizeram parte disso levou um tempo para ser digerida. Uma das entrevistadas me contou que ela sentiu, ao mesmo tempo, alívio e tristeza. Estava feliz que seu irmão finalmente voltaria do Pacífico, mas triste porque tantas pessoas tiveram de morrer nos bombardeios.
Um dos episódios que você menciona no livro é sobre os encontros dos militares para discutir o projeto em um acampamento secreto em San Francisco. Como eram esses encontros?
Há muitos lugares, alguns de localização escondida, onde vários encontros e discussões sobre o Projeto Manhattan aconteceram. Bohemian Grove foi um desses lugares. O Bohemian Club surgiu no fim do século 19 em San Francisco e o Grove é o acampamento de verão associado a ele, atualmente localizado no Condado de Sonoma, na Califórnia. Era,
e ainda é, um clube privado. Apenas membros e seus convidados têm permissão para entrar. Artistas, políticos, presidentes, líderes industriais, muitos poderosos têm sido membro ou convidado ao longo dos anos. É um lugar interessante de se observar e alguns artigos têm sido escritos por pessoas que conseguiram se infiltrar e entrar.