O líder da bancada republicana, Kevin McCarthy, trabalha para presidir a Câmara há oito anos. Mesmo assim, foi sangrado em público ao longo da semana, por quem ele se propõe a liderar, fez concessões que praticamente esvaziaram todo o poder do cargo, e continuou sofrendo derrotas sucessivas.
Nicolau Maquiavel escreveu que um governante precisa escolher entre ser amado e temido. McCarthy saiu desse processo sem uma coisa nem outra. Num plano individual, ele está colhendo o que plantou: seu oportunismo compromete sua confiabilidade.
Em seguida à invasão do Capitólio, que completou dois anos na sexta-feira, o líder da bancada republicana responsabilizou Donald Trump publicamente pelo crime, e disse a interlocutores que o então presidente devia renunciar às duas semanas que lhe restavam de mandato. Três semanas depois, McCarthy visitou Trump em seu balneário de Mar-a-Lago, na Flórida (Estado que parece atrair derrotados inconformados), e voltou a defendê-lo ardentemente.
Depois das eleições, McCarthy negociou freneticamente com a chamada Bancada da Liberdade, herdeira do Tea Party, corrente anti-governo ultraconservadora, fundada justamente na rejeição a todo tipo de negociação. A bancada tem 35 membros. Sua prioridade é dedicar os próximos dois anos a destruir a reputação do presidente Joe Biden, para vingar Trump. Restaram 21 rebeldes.
Um apelo público do próprio Trump (depois de falar com McCarthy), para que “não transformassem um grande triunfo (a eleição de 8 de novembro) numa derrota constrangedora” surtiu zero efeito, embora 16 dos 21 tenham sido eleitos com apoio público do ex-presidente. Eles se regozijavam com a paralisia da Câmara, relembrando os tempos da obstrução de verbas para o governo, fosse democrata ou republicano.
Ironicamente, a dependência de McCarthy deles para se eleger está ligada ao radicalismo trumpista, que afastou os eleitores e deu margem pequena de maioria aos republicanos na Câmara – além de não conquistarem o Senado. Ou seja, o radicalismo os torna menores e mais poderosos dentro do partido.
McCarthy abriu mão da destinação de verbas para campanhas de moderados nas primárias; prometeu participação dos rebeldes nos comitês da Câmara desproporcional a sua representatividade; e reduzir o mínimo necessário de deputados para propor a vacância de seu cargo, de maioria simples para um.
Não se sabe o que mais ele prometeu a portas fechadas para os últimos amotinados, que naturalmente cobraram mais caro pelo apoio. A invasão do Capitólio, há dois anos, normalizou a ideia de que a minoria pode subverter a ordem e assumir o poder.