É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião|Explosão de barragem e contraofensiva da Ucrânia indicam nova fase da guerra de Putin


Na primeira fase da campanha, Putin pretendia tomar toda a Ucrânia; agora, quer evitar uma derrota vergonhosa

Por Lourival Sant'Anna
Atualização:

A inundação da região de Kherson e o início da contraofensiva ucraniana levaram a guerra para uma nova fase. A implosão da barragem da represa de Karkhovka indica o reconhecimento por Vladimir Putin de que não pode vencer a Ucrânia militarmente. E que ele está disposto a causar catástrofes humanitárias e ambientais para adiar a derrota.

Na primeira fase da campanha, Putin pretendia tomar toda a Ucrânia. Isso se mostrou impossível. Em setembro, o ditador russo restringiu seu objetivo à anexação de partes do leste e do sul.

Em outubro, a implosão da ponte de Kerch, que liga a Crimeia à Rússia, mostrou que os ucranianos não se acomodariam a esse redesenho do mapa. Putin passou então a atacar a infraestrutura de eletricidade da Ucrânia, para induzir a população a desistir da resistência.

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Pessoas navegam em barcos em uma área residencial inundada, que submergiu na água após o colapso da barragem de Nova Kakhovka durante o conflito Rússia-Ucrânia, na cidade de Hola Prystan, na região de Kherson Foto: Alexander Ermochenko/ REUTERS

Assim como todas as outras estratégias de Putin nessa campanha, o efeito foi o contrário: só aumentou a determinação dos ucranianos. Naquele mês, o presidente Volodmir Zelenski acusou os russos de colocar dinamites na barragem e pediu que observadores internacionais fossem ao local.

A Rússia bloqueou o acesso. Na noite de segunda para terça-feira, quando a contraofensiva ucraniana era lançada, a barragem implodiu.

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Seis elementos pesam na elucidação de um crime: provas materiais, confissão, testemunhas, motivação, oportunidade e antecedentes. Os três primeiros estão ausentes nesse caso, e os três últimos incriminam a Rússia.

Motivação: a implosão da barragem conteve o avanço ucraniano no sul. Desviou recursos da guerra para o socorro aos flagelados. Matou um número ainda não contabilizado de ucranianos, deixou dezenas de milhares sem casa e centenas de milhares sem água.

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Puniu os ucranianos que viviam sob ocupação russa, na margem leste do Rio Dnipro, abandonados à própria sorte pelas autoridades russas. Inundou e espalhou químicos tóxicos e minas no solo mais fértil da Ucrânia, comprometendo por anos a sua produção agrícola, além de destruir os grãos armazenados.

Casas são inundadas na vila de Afanasiyivka, região de Mykolaiv, depois que o nível da água no rio Ingulets aumentou após danos sofridos na barragem da usina hidrelétrica de Kakhovka Foto: Genya Savilov/ AFP

Oportunidade: só os russos poderiam dinamitar a barragem, porque controlam a área desde maio. Não houve disparos à distância contra ela.

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Antecedentes: Josef Stalin, ídolo de Putin, fez a mesma coisa com a barragem de Zaporizhia em 1942, matando milhares de ucranianos, para conter o avanço nazista.

Membros do serviço ucraniano dentro de um veículo blindado M113, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, perto da linha de frente da cidade de Bakhmut, região de Donetsk Foto: Viacheslav Ratynskyi / REUTERS

A implosão da barragem sugere que Putin não hesitaria, por exemplo, em causar um acidente na usina nuclear de Zaporizhia, também controlada pelos russos, diante de derrota iminente.

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É por isso que a implosão leva o Ocidente a escalar a ajuda militar à Ucrânia, para libertar o quanto antes a usina e outros ativos estratégicos. Mais uma vez, Putin conseguirá o inverso do que almeja.

A inundação da região de Kherson e o início da contraofensiva ucraniana levaram a guerra para uma nova fase. A implosão da barragem da represa de Karkhovka indica o reconhecimento por Vladimir Putin de que não pode vencer a Ucrânia militarmente. E que ele está disposto a causar catástrofes humanitárias e ambientais para adiar a derrota.

Na primeira fase da campanha, Putin pretendia tomar toda a Ucrânia. Isso se mostrou impossível. Em setembro, o ditador russo restringiu seu objetivo à anexação de partes do leste e do sul.

Em outubro, a implosão da ponte de Kerch, que liga a Crimeia à Rússia, mostrou que os ucranianos não se acomodariam a esse redesenho do mapa. Putin passou então a atacar a infraestrutura de eletricidade da Ucrânia, para induzir a população a desistir da resistência.

Pessoas navegam em barcos em uma área residencial inundada, que submergiu na água após o colapso da barragem de Nova Kakhovka durante o conflito Rússia-Ucrânia, na cidade de Hola Prystan, na região de Kherson Foto: Alexander Ermochenko/ REUTERS

Assim como todas as outras estratégias de Putin nessa campanha, o efeito foi o contrário: só aumentou a determinação dos ucranianos. Naquele mês, o presidente Volodmir Zelenski acusou os russos de colocar dinamites na barragem e pediu que observadores internacionais fossem ao local.

A Rússia bloqueou o acesso. Na noite de segunda para terça-feira, quando a contraofensiva ucraniana era lançada, a barragem implodiu.

Seis elementos pesam na elucidação de um crime: provas materiais, confissão, testemunhas, motivação, oportunidade e antecedentes. Os três primeiros estão ausentes nesse caso, e os três últimos incriminam a Rússia.

Motivação: a implosão da barragem conteve o avanço ucraniano no sul. Desviou recursos da guerra para o socorro aos flagelados. Matou um número ainda não contabilizado de ucranianos, deixou dezenas de milhares sem casa e centenas de milhares sem água.

Puniu os ucranianos que viviam sob ocupação russa, na margem leste do Rio Dnipro, abandonados à própria sorte pelas autoridades russas. Inundou e espalhou químicos tóxicos e minas no solo mais fértil da Ucrânia, comprometendo por anos a sua produção agrícola, além de destruir os grãos armazenados.

Casas são inundadas na vila de Afanasiyivka, região de Mykolaiv, depois que o nível da água no rio Ingulets aumentou após danos sofridos na barragem da usina hidrelétrica de Kakhovka Foto: Genya Savilov/ AFP

Oportunidade: só os russos poderiam dinamitar a barragem, porque controlam a área desde maio. Não houve disparos à distância contra ela.

Antecedentes: Josef Stalin, ídolo de Putin, fez a mesma coisa com a barragem de Zaporizhia em 1942, matando milhares de ucranianos, para conter o avanço nazista.

Membros do serviço ucraniano dentro de um veículo blindado M113, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, perto da linha de frente da cidade de Bakhmut, região de Donetsk Foto: Viacheslav Ratynskyi / REUTERS

A implosão da barragem sugere que Putin não hesitaria, por exemplo, em causar um acidente na usina nuclear de Zaporizhia, também controlada pelos russos, diante de derrota iminente.

É por isso que a implosão leva o Ocidente a escalar a ajuda militar à Ucrânia, para libertar o quanto antes a usina e outros ativos estratégicos. Mais uma vez, Putin conseguirá o inverso do que almeja.

A inundação da região de Kherson e o início da contraofensiva ucraniana levaram a guerra para uma nova fase. A implosão da barragem da represa de Karkhovka indica o reconhecimento por Vladimir Putin de que não pode vencer a Ucrânia militarmente. E que ele está disposto a causar catástrofes humanitárias e ambientais para adiar a derrota.

Na primeira fase da campanha, Putin pretendia tomar toda a Ucrânia. Isso se mostrou impossível. Em setembro, o ditador russo restringiu seu objetivo à anexação de partes do leste e do sul.

Em outubro, a implosão da ponte de Kerch, que liga a Crimeia à Rússia, mostrou que os ucranianos não se acomodariam a esse redesenho do mapa. Putin passou então a atacar a infraestrutura de eletricidade da Ucrânia, para induzir a população a desistir da resistência.

Pessoas navegam em barcos em uma área residencial inundada, que submergiu na água após o colapso da barragem de Nova Kakhovka durante o conflito Rússia-Ucrânia, na cidade de Hola Prystan, na região de Kherson Foto: Alexander Ermochenko/ REUTERS

Assim como todas as outras estratégias de Putin nessa campanha, o efeito foi o contrário: só aumentou a determinação dos ucranianos. Naquele mês, o presidente Volodmir Zelenski acusou os russos de colocar dinamites na barragem e pediu que observadores internacionais fossem ao local.

A Rússia bloqueou o acesso. Na noite de segunda para terça-feira, quando a contraofensiva ucraniana era lançada, a barragem implodiu.

Seis elementos pesam na elucidação de um crime: provas materiais, confissão, testemunhas, motivação, oportunidade e antecedentes. Os três primeiros estão ausentes nesse caso, e os três últimos incriminam a Rússia.

Motivação: a implosão da barragem conteve o avanço ucraniano no sul. Desviou recursos da guerra para o socorro aos flagelados. Matou um número ainda não contabilizado de ucranianos, deixou dezenas de milhares sem casa e centenas de milhares sem água.

Puniu os ucranianos que viviam sob ocupação russa, na margem leste do Rio Dnipro, abandonados à própria sorte pelas autoridades russas. Inundou e espalhou químicos tóxicos e minas no solo mais fértil da Ucrânia, comprometendo por anos a sua produção agrícola, além de destruir os grãos armazenados.

Casas são inundadas na vila de Afanasiyivka, região de Mykolaiv, depois que o nível da água no rio Ingulets aumentou após danos sofridos na barragem da usina hidrelétrica de Kakhovka Foto: Genya Savilov/ AFP

Oportunidade: só os russos poderiam dinamitar a barragem, porque controlam a área desde maio. Não houve disparos à distância contra ela.

Antecedentes: Josef Stalin, ídolo de Putin, fez a mesma coisa com a barragem de Zaporizhia em 1942, matando milhares de ucranianos, para conter o avanço nazista.

Membros do serviço ucraniano dentro de um veículo blindado M113, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, perto da linha de frente da cidade de Bakhmut, região de Donetsk Foto: Viacheslav Ratynskyi / REUTERS

A implosão da barragem sugere que Putin não hesitaria, por exemplo, em causar um acidente na usina nuclear de Zaporizhia, também controlada pelos russos, diante de derrota iminente.

É por isso que a implosão leva o Ocidente a escalar a ajuda militar à Ucrânia, para libertar o quanto antes a usina e outros ativos estratégicos. Mais uma vez, Putin conseguirá o inverso do que almeja.

Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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