A Câmara dos Deputados dos EUA aprovou ajuda militar e humanitária para a Ucrânia de US$ 40 bilhões, que se somam a outros US$ 13,6 bilhões aprovados este ano. O total se aproxima de todo o orçamento de defesa da Rússia no ano passado: US$ 66 bilhões. O Senado deve contornar a objeção de um republicano, Rand Paul, e aprovar o pacote.
Os EUA se colocam um novo objetivo: impor uma derrota decisiva a Vladimir Putin, para desencorajar novas agressões. Os congressistas não têm conseguido chegar a um acordo sobre recursos para atenuar o sofrimento dos próprios americanos, como a manutenção dos cheques de até US$ 300 por criança para famílias pobres, que custaram US$ 80 bilhões ao longo de seis meses, e os US$ 15,6 bilhões pedidos pelo presidente, Joe Biden, para “necessidades urgentes” causadas pela pandemia.
Nesse contexto, o consenso em torno da Ucrânia é ainda mais emblemático. A guerra vive um momento decisivo. A resistência tem imposto derrotas ao Exército russo no terreno. Os russos têm tido de recuar de Kharkiv, segunda maior cidade ucraniana, bombardeada desde o primeiro dia da invasão, para a fronteira. Ao sul, mesmo depois de arrasar Mariupol, os russos não conseguem avançar em direção a Odessa.
Até aqui, o que os russos conseguiram foi destruir cidades com ataques aéreos, mísseis e artilharia pesada. A infantaria russa não tem sido páreo para a resistência ucraniana. A dinâmica indica que, se os ucranianos receberem sistemas antiaéreos e antitanque mais potentes, serão capazes de rechaçar os avanços dos russos e, em muitos casos, obrigá-los a recuar.
O próximo passo será recuperar os territórios ocupados pelos russos desde 2014 no leste da Ucrânia. De uma população de 6 milhões antes da invasão, em 2014, 1,5 milhão de ucranianos fugiram da limpeza étnica efetuada pelos russos, que incluiu prisão, tortura e desaparecimento de moradores.
Para retomar essas áreas, os ucranianos precisarão intensificar os ataques cirúrgicos contra alvos militares no território russo. O objetivo não é escalar a guerra, mas deslocar os esforços russos de Donbas para a proteção das próprias bases. Para isso, além da inteligência militar oferecida pela Otan, os ucranianos precisam de mais e melhor artilharia.
Passei a semana em três países que sofrem com a chantagem russa: Azerbaijão, Usbequistão e Mongólia. Uma derrota russa na Ucrânia terá consequências políticas, comparáveis à derrota soviética no Afeganistão, em 1989. Poderá ser o início do fim do regime de Putin e da própria Federação Russa. Quanto à ameaça nuclear, apesar da retórica do Kremlin, até aqui não há sinais de elevação da prontidão do arsenal. O Ocidente começa a entender que não se deve deixar chantagear, e apaziguar Putin só o tornou mais sanguinário.
* É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS