A tomada de Nagorno-Karabakh pelo Azerbaijão e a fuga em massa da população armênia do enclave são mais um capítulo da perda de influência da Rússia depois da invasão da Ucrânia.
Além da tragédia humana envolvendo os 120 mil armênios que moravam ou ainda moram no território, a assertividade do Azerbaijão e da Turquia incentiva a Armênia a se aproximar da Europa e dos Estados Unidos.
No período soviético, o Nagorno-Karabakh era uma região autônoma de maioria armênia dentro do Azerbaijão. Em 1988, quando o fim da União Soviética parecia iminente, a liderança local aprovou a incorporação do território à Armênia.
Seguiu-se uma guerra de seis anos, que matou 30 mil pessoas. A Rússia mediou um cessar-fogo, embora apoiasse a Armênia,-- como ela cristã ortodoxa, enquanto o Azerbajião é muçulmano e etnicamente túrquico.
O governo russo assegurou o controle do território à Armênia. A comunidade internacional continuou reconhecendo a soberania do Azerbaijão sobre o Karabakh, já que fronteiras não podem ser mudadas à força.
Depois de quase três décadas de conflitos esporádicos, o Azerbaijâo lançou uma ofensiva militar no dia 27 de setembro de 2020, com apoio da Turquia, que historicamente disputa influência com a Rússia sobre as nações túrquicas do Sul do Cáucaso e da Ásia Central. Depois de 44 dias de guerra, chegou-se a um cessar-fogo mediado pela Rússia, que enviou novamente “forças de paz” para o território.
Entenda a crise
O primeiro-ministro da Armênia, Nikol Pashinyan, eleito em 2018 depois de liderar uma revolta popular contra políticos pró-Rússia, alguns deles chefes de milícias do Karabakh, tentou se aproximar dos Estados Unidos e da União Europeia.
A movimentação foi vetada por Vladimir Putin. As escaramuças continuaram. Os militares dos dois lados sentiram no terreno que, sobretudo depois de invadir a Ucrânia, em fevereiro de 2022, a Rússia se desengajou. Putin passou a depender do Azerbaijão, situado entre Rússia e Irã, que lhe fornece drones.
Ao mesmo tempo, a União Europeia passou a ver o gás do Azerbaijão como substituto ao russo, alvo de sanções. Quando estive em Baku em maio do ano passado, analistas e integrantes do governo, como o embaixador Elchin Amirbayov, assessor da vice-presidente e primeira-dama Mehriban Aliyeva, falaram com otimismo dessa perspectiva.
Apurei que o Azerbaijão ofereceu fertilizantes ao Brasil no final de 2021, mas foi ignorado pelo Palácio do Planalto, que se esforçava em justificar a visita do então presidente Jair Bolsonaro a Putin, realizada oito dias antes da invasão da Ucrânia.
No dia 19 de setembro, o Azerbaijão tomou o controle do território, depois de submetê-lo a um bloqueio de dez meses. À população armênia foi dada a escolha de adotar a cidadania azerbaijana ou partir. Mais de dois terços já se refugiaram na Armênia.