É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião|Otan está em uma encruzilhada sobre a entrada da Ucrânia na Aliança; leia a análise


Expulsar a Rússia do território ucraniano será suficiente para pôr fim ao expansionismo russo?

Por Lourival Sant'Anna

A Otan está imersa em um dilema praticamente insolúvel sobre a entrada da Ucrânia na aliança. “O futuro da Ucrânia está na Otan”, afirma o comunicado final da cúpula. A aliança decidiu isentar o país do Plano de Ação para Adesão, um processo de adaptação institucional e militar que pode levar décadas, e criou um conselho para a Ucrânia. Entretanto, o convite virá “quando os aliados concordarem e as condições forem cumpridas”.

Promessas vagas podem ter consequências nefastas. Na cúpula de 2008 em Bucareste, a Otan anunciou que a Geórgia e a Ucrânia se tornariam membros em um futuro indeterminado. Antes que recebessem o escudo da aliança, Vladimir Putin ordenou as invasões da Geórgia em 2008 e da Ucrânia em 2014 e 2022.

Agora, a Otan não consegue definir como seria uma janela de oportunidade para a entrada dos dois países, ambos com 20% de seus territórios ocupados pela Rússia. Só há três maneiras de eles se tornarem membros da Otan sem que a aliança entre em guerra direta com a Rússia, o que ela quer evitar a todo custo.

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As bandeiras nacionais da Ucrânia e da União Europeia se erguem em frente ao emblema da OTAN, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, no centro de Kiev, Ucrânia, em 11 de julho de 2023.  Foto: Valentyn Ogirenko / REUTERS

A primeira seria a fórmula alemã: a Alemanha Ocidental participou da criação da Otan, e a Oriental, do Pacto de Varsóvia, dominado pelos soviéticos. Isso implicaria a Ucrânia ser dividida e renunciar ao território ocupado pela Rússia. Seria um prêmio à agressão de Putin e um terrível destino para os ucranianos em território controlado pelos russos.

A segunda seria flexibilizar o Artigo 5, que prevê que o ataque a um membro desencadeia sua defesa por todos os outros. O mecanismo ficaria relativizado pelo front móvel do conflito. Isso esvaziaria a aliança, cujo poder de dissuasão está fincado na defesa mútua de fronteiras fixas e inegociáveis.

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A terceira é o fim da guerra. Mas, sendo assim, qual o incentivo de Putin de aceitar até mesmo um cessar-fogo para reagrupar suas forças e atacar novamente, se nesse intervalo a Ucrânia poderia ficar sob o guarda-chuva da Otan, elevando drasticamente o custo de sua ocupação futura?

O presidente dos EUA, Joe Biden, ao lado do ucraniano, Volodmir Zelenski, após declaração conjunta na cúpula da Otan Foto: Andrew Caballero-Reynolds / AFP

Em resposta a esse dilema, os membros da Otan decidiram fornecer mais armas e munição, como as bombas de fragmentação americanas para desbastar as trincheiras russas; mais dezenas de tanques Leopard 1 alemães; os mísseis Storm Shadow britânicos e Scalp franceses, com 250 km de alcance, para atingir a retaguarda das linhas de defesa; e o treinamento de pilotos para os caças F-16.

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Tudo isso será suficiente para derrotar a Rússia? Expulsar a Rússia do território ucraniano será suficiente para pôr fim ao expansionismo russo? Ou será necessário quebrar a espinha dorsal do regime em território russo, como foi com a Alemanha, Itália e Japão, na 2.ª Guerra Mundial?

Guerras nunca produzem escolhas fáceis.

A Otan está imersa em um dilema praticamente insolúvel sobre a entrada da Ucrânia na aliança. “O futuro da Ucrânia está na Otan”, afirma o comunicado final da cúpula. A aliança decidiu isentar o país do Plano de Ação para Adesão, um processo de adaptação institucional e militar que pode levar décadas, e criou um conselho para a Ucrânia. Entretanto, o convite virá “quando os aliados concordarem e as condições forem cumpridas”.

Promessas vagas podem ter consequências nefastas. Na cúpula de 2008 em Bucareste, a Otan anunciou que a Geórgia e a Ucrânia se tornariam membros em um futuro indeterminado. Antes que recebessem o escudo da aliança, Vladimir Putin ordenou as invasões da Geórgia em 2008 e da Ucrânia em 2014 e 2022.

Agora, a Otan não consegue definir como seria uma janela de oportunidade para a entrada dos dois países, ambos com 20% de seus territórios ocupados pela Rússia. Só há três maneiras de eles se tornarem membros da Otan sem que a aliança entre em guerra direta com a Rússia, o que ela quer evitar a todo custo.

As bandeiras nacionais da Ucrânia e da União Europeia se erguem em frente ao emblema da OTAN, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, no centro de Kiev, Ucrânia, em 11 de julho de 2023.  Foto: Valentyn Ogirenko / REUTERS

A primeira seria a fórmula alemã: a Alemanha Ocidental participou da criação da Otan, e a Oriental, do Pacto de Varsóvia, dominado pelos soviéticos. Isso implicaria a Ucrânia ser dividida e renunciar ao território ocupado pela Rússia. Seria um prêmio à agressão de Putin e um terrível destino para os ucranianos em território controlado pelos russos.

A segunda seria flexibilizar o Artigo 5, que prevê que o ataque a um membro desencadeia sua defesa por todos os outros. O mecanismo ficaria relativizado pelo front móvel do conflito. Isso esvaziaria a aliança, cujo poder de dissuasão está fincado na defesa mútua de fronteiras fixas e inegociáveis.

A terceira é o fim da guerra. Mas, sendo assim, qual o incentivo de Putin de aceitar até mesmo um cessar-fogo para reagrupar suas forças e atacar novamente, se nesse intervalo a Ucrânia poderia ficar sob o guarda-chuva da Otan, elevando drasticamente o custo de sua ocupação futura?

O presidente dos EUA, Joe Biden, ao lado do ucraniano, Volodmir Zelenski, após declaração conjunta na cúpula da Otan Foto: Andrew Caballero-Reynolds / AFP

Em resposta a esse dilema, os membros da Otan decidiram fornecer mais armas e munição, como as bombas de fragmentação americanas para desbastar as trincheiras russas; mais dezenas de tanques Leopard 1 alemães; os mísseis Storm Shadow britânicos e Scalp franceses, com 250 km de alcance, para atingir a retaguarda das linhas de defesa; e o treinamento de pilotos para os caças F-16.

Tudo isso será suficiente para derrotar a Rússia? Expulsar a Rússia do território ucraniano será suficiente para pôr fim ao expansionismo russo? Ou será necessário quebrar a espinha dorsal do regime em território russo, como foi com a Alemanha, Itália e Japão, na 2.ª Guerra Mundial?

Guerras nunca produzem escolhas fáceis.

A Otan está imersa em um dilema praticamente insolúvel sobre a entrada da Ucrânia na aliança. “O futuro da Ucrânia está na Otan”, afirma o comunicado final da cúpula. A aliança decidiu isentar o país do Plano de Ação para Adesão, um processo de adaptação institucional e militar que pode levar décadas, e criou um conselho para a Ucrânia. Entretanto, o convite virá “quando os aliados concordarem e as condições forem cumpridas”.

Promessas vagas podem ter consequências nefastas. Na cúpula de 2008 em Bucareste, a Otan anunciou que a Geórgia e a Ucrânia se tornariam membros em um futuro indeterminado. Antes que recebessem o escudo da aliança, Vladimir Putin ordenou as invasões da Geórgia em 2008 e da Ucrânia em 2014 e 2022.

Agora, a Otan não consegue definir como seria uma janela de oportunidade para a entrada dos dois países, ambos com 20% de seus territórios ocupados pela Rússia. Só há três maneiras de eles se tornarem membros da Otan sem que a aliança entre em guerra direta com a Rússia, o que ela quer evitar a todo custo.

As bandeiras nacionais da Ucrânia e da União Europeia se erguem em frente ao emblema da OTAN, em meio ao ataque da Rússia à Ucrânia, no centro de Kiev, Ucrânia, em 11 de julho de 2023.  Foto: Valentyn Ogirenko / REUTERS

A primeira seria a fórmula alemã: a Alemanha Ocidental participou da criação da Otan, e a Oriental, do Pacto de Varsóvia, dominado pelos soviéticos. Isso implicaria a Ucrânia ser dividida e renunciar ao território ocupado pela Rússia. Seria um prêmio à agressão de Putin e um terrível destino para os ucranianos em território controlado pelos russos.

A segunda seria flexibilizar o Artigo 5, que prevê que o ataque a um membro desencadeia sua defesa por todos os outros. O mecanismo ficaria relativizado pelo front móvel do conflito. Isso esvaziaria a aliança, cujo poder de dissuasão está fincado na defesa mútua de fronteiras fixas e inegociáveis.

A terceira é o fim da guerra. Mas, sendo assim, qual o incentivo de Putin de aceitar até mesmo um cessar-fogo para reagrupar suas forças e atacar novamente, se nesse intervalo a Ucrânia poderia ficar sob o guarda-chuva da Otan, elevando drasticamente o custo de sua ocupação futura?

O presidente dos EUA, Joe Biden, ao lado do ucraniano, Volodmir Zelenski, após declaração conjunta na cúpula da Otan Foto: Andrew Caballero-Reynolds / AFP

Em resposta a esse dilema, os membros da Otan decidiram fornecer mais armas e munição, como as bombas de fragmentação americanas para desbastar as trincheiras russas; mais dezenas de tanques Leopard 1 alemães; os mísseis Storm Shadow britânicos e Scalp franceses, com 250 km de alcance, para atingir a retaguarda das linhas de defesa; e o treinamento de pilotos para os caças F-16.

Tudo isso será suficiente para derrotar a Rússia? Expulsar a Rússia do território ucraniano será suficiente para pôr fim ao expansionismo russo? Ou será necessário quebrar a espinha dorsal do regime em território russo, como foi com a Alemanha, Itália e Japão, na 2.ª Guerra Mundial?

Guerras nunca produzem escolhas fáceis.

Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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