A vice-presidente Kamala Harris tinha três objetivos no debate desta terça-feira, 10, contra o ex-presidente Donald Trump. Se apresentar como uma figura ‘presidenciável’ à grande parte do público que não a conhecia, tornar mais visíveis as falhas de Trump para os eleitores indecisos e se afastar da herança negativa do governo de Joe Biden. Foi bem sucedida em duas das três missões.
Trump também precisava cumprir três metas no encontro: vincular os defeitos do governo Biden à sua vice-presidente, mostrar-se moderado para atrair o eleitor independente que tem dúvidas sobre ele e induzir a adversária ao erro. Conseguiu um dos três objetivos.
Se fosse uma luta de boxe — e em certo momento só faltaram as luvas — daria Kamala, por pontos.
Iscas contra Trump
A vice-presidente recheou suas participações no debate de iscas contra Trump, na tentativa de desestabilizá-lo. Deu certo. Na primeira delas, durante uma discussão sobre imigração ilegal, a democrata provocou Trump sobre seus comícios.
Há algumas semanas, o republicano tinha se irritado com a cobertura da imprensa sobre as multidões nos eventos da rival, e chegou a dizer que os seus eram muito maiores. Kamala então afirmou:
“Ele fala sobre Hannibal Lecter e outros personagens fictícios. As pessoas vão embora mais cedo porque os comícios são mais chatos.”
Debate nos EUA
Trump então se irritou e começou a narrar uma teoria da conspiração difundida no X, a rede social de Elon Musk, de que imigrantes haitianos estariam matando animais de estimação na cidade de Springfield, Ohio, para comer.
Ele foi imediatamente desmentido pelo moderador, David Muir, e foi ficando mais irritado. Por vezes, alterava a voz.
Kamala, então, reagiu com sarcasmo: “É por coisas assim que ele é descrito como radical”.
Jogando pelo empate
Ao longo da maioria das perguntas dirigidas a ela, no entanto, a vice-presidente jogou pelo empate. Tentou mostrar-se como uma democrata ‘moderada’, não muito longe do que foram Biden, Obama e Clinton. Além disso, tentou colocar-se como uma líder ‘presidencial’, ao citar a experiência com política externa ao longo do mandato de Biden.
A vice-presidente, no entanto, não conseguiu esconder seu calcanhar de Aquiles: os erros de Biden na condução da economia e da política migratória. Sempre que questionada sobre o que faria diferente, desviava da pergunta e tentava introduzir algo sobre a sua trajetória pessoal ou seu plano de governo.
Por vezes, também jogou a culpa em Trump e nos republicanos. Foi assim na primeira questão, sobre inflação, e em outras, como em uma sobre a retirada do Afeganistão.
Trump, por sua vez, mais uma vez mostrou uma dificuldade imensa em ater-se ao script desenvolvido pela campanha. Mentiu inúmeras vezes, mas ao contrário do debate contra Biden, foi prontamente rebatido pela moderação da rede de TV ABC.
Nas vezes em que mordeu a isca de Kamala, se descontrolou e chegou por vezes a alterar a voz e falar sobre o microfone silenciado. Na parte final do debate, mostrava claros sinais de irritação, como na questão sobre a identidade racial da rival. “Não me interessa o que ela é (negra ou asiática)”, disse.
Ele também não conseguiu jogar para Kamala iscas como as que ele mordeu. Ela não respondeu quando o candidato chamou ela e o pai de marxistas, e por vezes, parecia irritado que o ex-rival, Joe Biden, não estava mais na disputa.
Apesar disso, tentou focar a mensagem de que o governo Biden falhou sobretudo na imigração e na economia e vinculou Kamala a esses erros. Seu melhor momento ocorreu nas considerações finais, quando questionou. “Se ela promete fazer tantas coisas boas, por que já não fez?”.
Com menos de dois meses para a eleição, Kamala precisava atravessar o debate desta noite sem erros graves e foi bem sucedida. Trump foi colocado na defensiva e agora precisa de um fato novo que o coloque em vantagem.