BRASÍLIA - Às vésperas da cúpula do clima organizada pelos EUA, o presidente americano, Joe Biden, foi bombardeado ontem por cartas de governadores, ex-ministros, artistas brasileiros, americanos e britânicos que pedem o endurecimento da posição da Casa Branca com Jair Bolsonaro na área ambiental.
Só ontem foram três cartas: uma mensagem de 23 governadores brasileiros, outra de ex-ministros dos governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva, assinada também por sociólogos, cientistas políticos, economistas e professores, e uma terceira enviada por artistas brasileiros, americanos e britânicos. Na carta dos governadores, eles se colocam como porta de entrada para compartilhar ações de combate ao desmatamento e redução de emissões de gases estufa. No documento, que é assinado por nomes como João Doria (SP), Flávio Dino (MA), Ronaldo Caiado (GO), Wilson Lima (AM) e Mauro Mendes (MT), eles afirmam que podem “contribuir com a captura de emissões globais”.
“Nossos Estados possuem fundos e mecanismos criados especialmente para responder à emergência climática, disponíveis para aplicação segura e transparente de recursos internacionais, garantindo resultados rápidos e verificáveis”, disseram os 23 governadores – apenas Carlos Moisés (SC), Coronel Marcos Rocha (RO), Antonio Denarium (RR) e Ibaneis Rocha (DF) não assinaram.
Em outra carta endereçada ontem a Biden, membros da Comissão Arns de Direitos Humanos ressaltaram o protagonismo que o Brasil já teve em medidas de proteção ambiental, mas lamentaram que essas conquistas têm se revertido em prejuízos com Bolsonaro.
“No plano da ação, o governo vem enfraquecendo sistematicamente os órgãos de gestão ambiental. Revisou regulamentos, flexibilizou normas, revogou dispositivos legais, alterou a composição de órgãos públicos encarregados de monitoramento e aplicação de multas, substituiu chefias competentes por pessoas sem qualificação apropriada – quando não, por sócios da devastação –, perseguiu funcionários, reduziu o orçamento destinado ao meio ambiente”, diz a carta, firmada por ex-ministros, advogados, professores, lideranças indígenas e especialistas em meio ambiente.
Biden também recebeu ontem críticas a Bolsonaro enviadas por artistas. O documento foi assinado por 35 personalidades, incluindo os atores Alec Baldwin, Joaquin Phoenix, Leonardo DiCaprio, Mark Ruffalo, Sigourney Weaver, Jane Fonda, Orlando Bloom, e os cantores Roger Waters e Katy Perry. Do lado brasileiro, firmaram a carta Caetano Veloso, Fernando Meirelles, Walter Salles, Marisa Monte, Sonia Braga e Wagner Moura, entre outros artistas.
“Desde que Bolsonaro assumiu o cargo, em janeiro de 2019, a legislação ambiental foi sistematicamente enfraquecida e as taxas de desmatamento triplicaram. As terras indígenas, que são as mais protegidas da Amazônia, foram invadidas, desmatadas e queimadas impunemente. Os direitos dos povos indígenas, guardiões da floresta, foram violados por Bolsonaro e seu governo”, diz a carta.
“Estamos preocupados que seu governo possa estar negociando um acordo para proteger a Amazônia com Bolsonaro neste momento”, diz a mensagem. “Pedimos que o senhor (Biden) continue o diálogo com povos indígenas e comunidades tradicionais da Bacia Amazônica, com governos subnacionais e a sociedade civil antes de anunciar qualquer compromisso ou liberar qualquer fundo”, conclui o texto.
Pressão por cartas
Desde que assumiu, Biden vem sendo intimado a endurecer as negociações com Bolsonaro – e grande parte da pressão vem por meio de cartas. Em abril, cerca de 200 ONGs ligadas ao meio ambiente enviaram uma mensagem ao presidente americano com críticas às negociações feitas “a portas fechadas” com o Brasil sobre a Amazônia. “As negociações ocorrem longe dos olhos da sociedade civil, que o presidente brasileiro já comparou a um câncer”, dizia o texto. “Não é razoável esperar que as soluções para a Amazônia e seus povos venham de negociações feitas a portas fechadas com seu pior inimigo.”
Biden tem sido pressionado até por membros do próprio partido. Na semana passada, também em carta enviada à Casa Branca, senadores democratas afirmaram que Bolsonaro “não demonstrou nenhum interesse sério” em proteger a Amazônia. A mensagem foi assinada por 15 senadores, entre eles Bernie Sanders, Elizabeth Warren e Robert Menendez.
Há duas semanas, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, movimento que reúne mais de 280 empresas e instituições representantes do agronegócio, meio ambiente, setor financeiro e academia, enviou uma carta a Bolsonaro para cobrar metas mais ambiciosas.
O entendimento é de que houve “redução no nível de ambição” e isso torna o País menos atraente para investimentos internacionais. “O Brasil só vai receber apoio e parcerias externas por esforços de mitigação como contrapartida a avanços efetivos na agenda climática”, escreveram. O Palácio do Planalto foi questionado sobre as manifestações citadas nesta reportagem, mas não deu uma resposta.