Quem são as mulheres defensoras do direito ao aborto — e de Donald Trump


Kamala está fazendo do aborto parte de seus argumentos finais. Mas alguns eleitores dizem que não estão preocupados com o eventual significado de uma presidência de Trump para o aborto

Por Caroline Kitchener
Atualização:

Quando sua cédula de votação pelo correio chegou no início deste mês, Emily Jones mal podia esperar para votar pela consagração dos direitos ao aborto na constituição estadual do Arizona — e para lutar contra a decisão da Suprema Corte que anulou a decisão do caso Roe vs. Wade.

Para a mãe de 27 anos de San Tan Valley, no Arizona, a questão era pessoal: um aborto provavelmente salvou sua vida depois que ela foi diagnosticada há alguns anos com uma gravidez ectópica, ela disse. A decisão da Suprema corte em relação ao aborto em 2022 a aterrorizou, ela disse, fazendo as mulheres “recuarem 10 passos”.

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Eleitora independente com um histórico de votar principalmente em candidatos republicanos, Jones disse que sabia que a vice-presidente Kamala Harris estava tentando usar a questão do aborto para conquistar mulheres como ela na eleição presidencial. Mas, embora ela tenha visto dezenas de anúncios de Kamala a respeito do aborto, eles não a influenciaram.

Então, na mesma cédula em que votou para proteger os direitos ao aborto, ela também votou em Donald Trump.

Candidato republicano para a presidência dos EUA, Donald Trump fala em evento de campanha em Tempe, Arizona Foto: Alex Brandon/AP
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Com comícios repletos de músicas de Beyoncé e anúncios angustiantes mostrando complicações na gravidez após a reversão de Roe, Kamala intensificou seus esforços para vincular sua candidatura à luta pelo acesso ao aborto — esperando aproveitar o momento que levou eleitores em todo o país, mesmo nos estados conservadores de Ohio, Kansas e Kentucky, a apoiar os direitos ao aborto quando a questão apareceu em suas cédulas nos anos desde que a decisão do caso Roe foi anulada. No sábado, Michelle Obama apelou para mulheres que talvez estejam considerando votar diferentemente de seus maridos e namorados.

“Seu voto é uma questão privada”, disse ela. “Independentemente das opiniões políticas de seu parceiro.”

Mas, embora as pesquisas continuem a mostrar um apoio considerável em ambos os partidos quando as pessoas são questionadas se apoiam um referendo a respeito dos direitos ao aborto, é menos claro se Kamala pode convencer independentes e republicanos moderados que apoiam os direitos ao aborto a votar nela— e essa questão pode ser crítica para o resultado da eleição.

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Enquanto uma pesquisa do Washington Post-Schar School realizada em outubro descobriu que 68% dos eleitores no Arizona e 80% dos eleitores em Nevada disseram que planejavam apoiar o referendo envolvendo o aborto em seu Estado, a mesma pesquisa mostrou Kamala ligeiramente atrás de Trump no Arizona e empatada com ele em Nevada. O apoio a Kamala entre os prováveis eleitores na pesquisa foi de 46% no Arizona ante 49% de apoio a Trump, e ambos tiveram 48% de apoio em Nevada.

Enquanto isso, Trump — que reivindicou o crédito pela reversão da decisão do caso Roe — tem trabalhado para amenizar as preocupações dos eleitores independentes e republicanos que apoiam os direitos ao aborto. Nas semanas mais recentes, o ex-presidente prometeu vetar uma proibição nacional ao aborto, após se recusar repetidamente a fazer tal promessa. Embora tenha afirmado que cada Estado deve escolher suas próprias leis sobre o aborto, ele disse em um comício recente voltado para eleitoras que muitas das proibições atuais são “duras demais”.

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Eleitores republicanos e independentes que planejam dividir seu voto na questão do aborto — votando em favor de um referendo sobre o aborto e votando em Trump — disseram que estavam dispostos a dar a Trump o benefício da dúvida em relação ao assunto, com alguns se sentindo seguros por causa das promessas recentes dele de não reprimir mais o aborto. Apesar da decisão de Trump de nomear os três juízes conservadores da Suprema Corte que ajudaram a revogar o direito constitucional ao aborto, alguns eleitores disseram acreditar que Trump era secretamente “pró-escolha”.

“Isso me incomoda um pouco”, disse Jones quando questionada a respeito de Trump levar o crédito pela queda da decisão do caso Roe. Mas, na opinião dela, Trump só quer impedir que abortos ocorram no terceiro trimestre da gravidez — uma posição que ele enfatizou frequentemente em debates e na campanha eleitoral.

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“Não acho que ele fez isso para prejudicar as mulheres”, acrescentou Jones. “Acho que, no fundo, ele tem boas intenções.”

A decisão do caso Roe só protegia o direito ao aborto até o ponto em que um feto pode se tornar viável, ou por volta de 24 semanas, antes do início do terceiro trimestre. Abortos no terceiro trimestre da gravidez são extremamente raros e geralmente ocorrem apenas quando há uma anomalia fetal grave ou quando a saúde da mãe está em risco.

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Campanha de Kamala

A campanha de Kamala acredita que ela pode fazer avanços significativos entre mulheres independentes e de tendência republicana enfatizando os perigos que um segundo mandato de Trump pode representar para os direitos ao aborto, disse Molly Murphy, uma pesquisadora da campanha. Nas semanas mais recentes, Kamala apareceu em vários eventos projetados para atingir esse grupo, disse Murphy, incluindo vários encontros com a ex-congressista republicana Liz Cheney, que, ao falar com Kamala, denunciou as “coisas fundamentalmente perigosas que aconteceram” nos Estados Unidos após a reversão do caso Roe.

Ainda assim, Murphy disse que a campanha tem “clareza” quanto à dificuldade de conquistar as mulheres republicanas. Embora eles certamente esperem arrancar alguns ex-eleitores de Trump com a questão do aborto, ela disse que eles estão mais focados nas eleitoras que ela descreveu como “no meio do caminho”, que não gostam de nenhum dos candidatos. A dificuldade com as mulheres que votaram em Trump no passado, ela disse, é que elas estão mais inclinadas a confiar no que ele diz — a acreditar, por exemplo, que ele vetaria uma proibição nacional ao aborto.

“Quando dá suas garantias, ele tem credibilidade porque elas são conservadoras e de tendência republicana”, disse Murphy. “Mas isso não significa que não podemos conquistá-las.”

Nos sete estados-campo de batalha, 45% dos apoiadores de Trump dizem que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos, de acordo com uma pesquisa recente do Washington Post-Schar School. As pesquisas mostram que a maioria dos democratas e dos independentes e pelo menos 4 em cada 10 republicanos apoiam os referendos quanto ao direito ao aborto.

Donald Trump e Kamala Harris se enfrentam nas eleições presidenciais americanas  Foto: AP / AP

Outro foco

Para muitos dos eleitores de Trump que também apoiam os direitos ao aborto, o aborto simplesmente não é uma das principais questões, disse Tresa Undem, uma pesquisadora independente que estuda opiniões a respeito do aborto. Embora eles preferissem ver os direitos ao aborto protegidos — e votarão para expandir as proteções se tiverem a chance de votar diretamente no assunto — eles estão mais focados na economia ou na imigração, ela disse.

Outros que se importam profundamente com os direitos ao aborto não acreditam que Trump imporá mais restrições ao aborto. Em uma pesquisa do New York Times/Siena realizada em setembro, 22% dos apoiadores de Trump disseram achar que Trump tentaria aprovar uma proibição nacional ao aborto, em comparação com 79% dos apoiadores de Kamala.

“Acho que a mensagem está chegando”, disse Undem, referindo-se às tentativas de Trump de tranquilizar os eleitores que apoiam os direitos ao aborto. “Acho que há pessoas que pensam: ‘Ah, ele já fez o que queria fazer em relação ao aborto’. Não acho que os democratas acreditem nisso nem por um segundo, mas acho que os republicanos acreditam.”

Raymond Fillion, um republicano de 60 anos de Tucson, votará no referendo dos direitos ao aborto do Arizona, que protege o aborto até o ponto de viabilidade do feto. Mas ele disse que a questão está “mais perto do fim da lista” de critérios para ele decidir em quem votar para presidente, principalmente porque ele acredita que as decisões importantes agora estão diretamente nos Estados.

“Não há mais nada que o poder executivo possa fazer”, disse Fillion, um veterano militar que trabalha com desarmamento de bombas. “Ele já disse que não assinará uma proibição nacional.”

Trump poderia acabar com o acesso ao aborto sem uma proibição nacional por meio de ação executiva, reprimindo as pílulas abortivas — um plano delineado no Projeto 2025, um controverso plano de 900 páginas para o próximo governo republicano que Trump desmentiu, embora tenha sido escrito por seus aliados.

Para uma mulher republicana de 63 anos em Phoenix, a questão de como o aborto deve afetar seu voto para presidente levou recentemente a uma discussão acalorada de duas horas com sua filha.

Janice Albert e sua filha, Michelle, têm fortes opiniões a respeito dos direitos ao aborto. Michelle Albert, uma independente de esquerda que está votando em Kamala, não conseguia entender como sua mãe podia apoiar o homem que assumiu o crédito pela decisão do caso Dobbs vs. Jackson Women’s Health Organization.

“Eu simplesmente não consigo acreditar que você sequer tenha considerado isso”, Michelle, 33 anos, lembrou-se de ter dito a Janice em um telefonema. “É algo que realmente parte meu coração.”

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato presidencial republicano, Donald Trump, participa de um comício ao lado de Tucker Carlson, em Glendale, Arizona  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

Janice disse à filha que Trump afirmou que não imporia restrições nacionais, lembraram ambas as mulheres. “Eu não acredito nisso”, disse Michelle.

Em uma entrevista ao Post, Janice Albert disse que Trump e seu companheiro de chapa, JD Vance, amenizaram suas preocupações em relação à questão do aborto. Ela reconheceu como Vance — que havia dito anteriormente que queria que o aborto fosse ilegal em todo o país — falou no assunto durante o debate vice-presidencial, enfatizando a importância de “reconquistar a confiança do povo americano nessa questão”. Vance falou de uma amiga anônima em um relacionamento abusivo que lhe disse o quão grata ela estava por ter conseguido fazer um aborto, parecendo implicar que ele apoiava sua decisão de interromper a gravidez.

“Achei ótimo que ele tenha admitido que mudou de opinião, e respeito isso”, disse Janice. “Isso me dá esperança.”

Ela disse que está fazendo o que pode para proteger o acesso ao aborto votando no referendo dos direitos ao aborto do Arizona.

Referendos sobre o aborto podem impulsionar a participação de candidatos democratas, disse Sarah Longwell, uma estrategista republicana anti-Trump que organiza grupos de foco regulares com eleitores. Mas, ela acrescentou, eles também podem fornecer uma “rampa de saída” conveniente para eleitores republicanos e de tendência republicana como Albert, que se importam com os direitos ao aborto.

“É uma maneira de votar estritamente em uma questão e dá ao eleitor a capacidade de dizer: ‘Tirei da mesa aquela questão que importa para mim, agora posso votar em... Trump’”, disse Longwell.

Em relação à questão do aborto, Longwell disse que Trump se beneficia de um de seus maiores “superpoderes”: o fato de as pessoas o perceberem como um moderado social — mesmo que suas declarações e ações não sejam nem um pouco moderadas. Nos grupos de foco que organizou antes da eleição presidencial, ela disse que as pessoas frequentemente dizem achar que Trump não é “pró-vida”, às vezes brincando que ele “provavelmente pagou por um aborto” (questionado em 2016 se ele já havia se envolvido com alguém que fez um aborto, Trump disse: “Uma pergunta muito interessante” e seguiu em frente).

A sensação geral de que Trump não se opõe ao aborto pode funcionar a seu favor com mulheres independentes e de tendência republicana, disse Longwell.

Em San Tan Valley, Arizona, Jones e seu marido decidiram que não querem mais ter filhos. Suas gestações anteriores, ela disse, representaram um risco muito grande para sua saúde.

“Fisicamente, não acho que meu corpo conseguiria fazer isso de novo”, disse ela. Se engravidar, disse, ela quer a opção de fazer um aborto. Jones decidiu acreditar que, se eleito, Trump manterá essa opção aberta para ela. “Eu não acho que ele realmente proibirá isso completamente”, disse. “Eu acho que ele aprendeu a lição.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando sua cédula de votação pelo correio chegou no início deste mês, Emily Jones mal podia esperar para votar pela consagração dos direitos ao aborto na constituição estadual do Arizona — e para lutar contra a decisão da Suprema Corte que anulou a decisão do caso Roe vs. Wade.

Para a mãe de 27 anos de San Tan Valley, no Arizona, a questão era pessoal: um aborto provavelmente salvou sua vida depois que ela foi diagnosticada há alguns anos com uma gravidez ectópica, ela disse. A decisão da Suprema corte em relação ao aborto em 2022 a aterrorizou, ela disse, fazendo as mulheres “recuarem 10 passos”.

Eleitora independente com um histórico de votar principalmente em candidatos republicanos, Jones disse que sabia que a vice-presidente Kamala Harris estava tentando usar a questão do aborto para conquistar mulheres como ela na eleição presidencial. Mas, embora ela tenha visto dezenas de anúncios de Kamala a respeito do aborto, eles não a influenciaram.

Então, na mesma cédula em que votou para proteger os direitos ao aborto, ela também votou em Donald Trump.

Candidato republicano para a presidência dos EUA, Donald Trump fala em evento de campanha em Tempe, Arizona Foto: Alex Brandon/AP

Com comícios repletos de músicas de Beyoncé e anúncios angustiantes mostrando complicações na gravidez após a reversão de Roe, Kamala intensificou seus esforços para vincular sua candidatura à luta pelo acesso ao aborto — esperando aproveitar o momento que levou eleitores em todo o país, mesmo nos estados conservadores de Ohio, Kansas e Kentucky, a apoiar os direitos ao aborto quando a questão apareceu em suas cédulas nos anos desde que a decisão do caso Roe foi anulada. No sábado, Michelle Obama apelou para mulheres que talvez estejam considerando votar diferentemente de seus maridos e namorados.

“Seu voto é uma questão privada”, disse ela. “Independentemente das opiniões políticas de seu parceiro.”

Mas, embora as pesquisas continuem a mostrar um apoio considerável em ambos os partidos quando as pessoas são questionadas se apoiam um referendo a respeito dos direitos ao aborto, é menos claro se Kamala pode convencer independentes e republicanos moderados que apoiam os direitos ao aborto a votar nela— e essa questão pode ser crítica para o resultado da eleição.

Enquanto uma pesquisa do Washington Post-Schar School realizada em outubro descobriu que 68% dos eleitores no Arizona e 80% dos eleitores em Nevada disseram que planejavam apoiar o referendo envolvendo o aborto em seu Estado, a mesma pesquisa mostrou Kamala ligeiramente atrás de Trump no Arizona e empatada com ele em Nevada. O apoio a Kamala entre os prováveis eleitores na pesquisa foi de 46% no Arizona ante 49% de apoio a Trump, e ambos tiveram 48% de apoio em Nevada.

Enquanto isso, Trump — que reivindicou o crédito pela reversão da decisão do caso Roe — tem trabalhado para amenizar as preocupações dos eleitores independentes e republicanos que apoiam os direitos ao aborto. Nas semanas mais recentes, o ex-presidente prometeu vetar uma proibição nacional ao aborto, após se recusar repetidamente a fazer tal promessa. Embora tenha afirmado que cada Estado deve escolher suas próprias leis sobre o aborto, ele disse em um comício recente voltado para eleitoras que muitas das proibições atuais são “duras demais”.

Eleitores republicanos e independentes que planejam dividir seu voto na questão do aborto — votando em favor de um referendo sobre o aborto e votando em Trump — disseram que estavam dispostos a dar a Trump o benefício da dúvida em relação ao assunto, com alguns se sentindo seguros por causa das promessas recentes dele de não reprimir mais o aborto. Apesar da decisão de Trump de nomear os três juízes conservadores da Suprema Corte que ajudaram a revogar o direito constitucional ao aborto, alguns eleitores disseram acreditar que Trump era secretamente “pró-escolha”.

“Isso me incomoda um pouco”, disse Jones quando questionada a respeito de Trump levar o crédito pela queda da decisão do caso Roe. Mas, na opinião dela, Trump só quer impedir que abortos ocorram no terceiro trimestre da gravidez — uma posição que ele enfatizou frequentemente em debates e na campanha eleitoral.

“Não acho que ele fez isso para prejudicar as mulheres”, acrescentou Jones. “Acho que, no fundo, ele tem boas intenções.”

A decisão do caso Roe só protegia o direito ao aborto até o ponto em que um feto pode se tornar viável, ou por volta de 24 semanas, antes do início do terceiro trimestre. Abortos no terceiro trimestre da gravidez são extremamente raros e geralmente ocorrem apenas quando há uma anomalia fetal grave ou quando a saúde da mãe está em risco.

Campanha de Kamala

A campanha de Kamala acredita que ela pode fazer avanços significativos entre mulheres independentes e de tendência republicana enfatizando os perigos que um segundo mandato de Trump pode representar para os direitos ao aborto, disse Molly Murphy, uma pesquisadora da campanha. Nas semanas mais recentes, Kamala apareceu em vários eventos projetados para atingir esse grupo, disse Murphy, incluindo vários encontros com a ex-congressista republicana Liz Cheney, que, ao falar com Kamala, denunciou as “coisas fundamentalmente perigosas que aconteceram” nos Estados Unidos após a reversão do caso Roe.

Ainda assim, Murphy disse que a campanha tem “clareza” quanto à dificuldade de conquistar as mulheres republicanas. Embora eles certamente esperem arrancar alguns ex-eleitores de Trump com a questão do aborto, ela disse que eles estão mais focados nas eleitoras que ela descreveu como “no meio do caminho”, que não gostam de nenhum dos candidatos. A dificuldade com as mulheres que votaram em Trump no passado, ela disse, é que elas estão mais inclinadas a confiar no que ele diz — a acreditar, por exemplo, que ele vetaria uma proibição nacional ao aborto.

“Quando dá suas garantias, ele tem credibilidade porque elas são conservadoras e de tendência republicana”, disse Murphy. “Mas isso não significa que não podemos conquistá-las.”

Nos sete estados-campo de batalha, 45% dos apoiadores de Trump dizem que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos, de acordo com uma pesquisa recente do Washington Post-Schar School. As pesquisas mostram que a maioria dos democratas e dos independentes e pelo menos 4 em cada 10 republicanos apoiam os referendos quanto ao direito ao aborto.

Donald Trump e Kamala Harris se enfrentam nas eleições presidenciais americanas  Foto: AP / AP

Outro foco

Para muitos dos eleitores de Trump que também apoiam os direitos ao aborto, o aborto simplesmente não é uma das principais questões, disse Tresa Undem, uma pesquisadora independente que estuda opiniões a respeito do aborto. Embora eles preferissem ver os direitos ao aborto protegidos — e votarão para expandir as proteções se tiverem a chance de votar diretamente no assunto — eles estão mais focados na economia ou na imigração, ela disse.

Outros que se importam profundamente com os direitos ao aborto não acreditam que Trump imporá mais restrições ao aborto. Em uma pesquisa do New York Times/Siena realizada em setembro, 22% dos apoiadores de Trump disseram achar que Trump tentaria aprovar uma proibição nacional ao aborto, em comparação com 79% dos apoiadores de Kamala.

“Acho que a mensagem está chegando”, disse Undem, referindo-se às tentativas de Trump de tranquilizar os eleitores que apoiam os direitos ao aborto. “Acho que há pessoas que pensam: ‘Ah, ele já fez o que queria fazer em relação ao aborto’. Não acho que os democratas acreditem nisso nem por um segundo, mas acho que os republicanos acreditam.”

Raymond Fillion, um republicano de 60 anos de Tucson, votará no referendo dos direitos ao aborto do Arizona, que protege o aborto até o ponto de viabilidade do feto. Mas ele disse que a questão está “mais perto do fim da lista” de critérios para ele decidir em quem votar para presidente, principalmente porque ele acredita que as decisões importantes agora estão diretamente nos Estados.

“Não há mais nada que o poder executivo possa fazer”, disse Fillion, um veterano militar que trabalha com desarmamento de bombas. “Ele já disse que não assinará uma proibição nacional.”

Trump poderia acabar com o acesso ao aborto sem uma proibição nacional por meio de ação executiva, reprimindo as pílulas abortivas — um plano delineado no Projeto 2025, um controverso plano de 900 páginas para o próximo governo republicano que Trump desmentiu, embora tenha sido escrito por seus aliados.

Para uma mulher republicana de 63 anos em Phoenix, a questão de como o aborto deve afetar seu voto para presidente levou recentemente a uma discussão acalorada de duas horas com sua filha.

Janice Albert e sua filha, Michelle, têm fortes opiniões a respeito dos direitos ao aborto. Michelle Albert, uma independente de esquerda que está votando em Kamala, não conseguia entender como sua mãe podia apoiar o homem que assumiu o crédito pela decisão do caso Dobbs vs. Jackson Women’s Health Organization.

“Eu simplesmente não consigo acreditar que você sequer tenha considerado isso”, Michelle, 33 anos, lembrou-se de ter dito a Janice em um telefonema. “É algo que realmente parte meu coração.”

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato presidencial republicano, Donald Trump, participa de um comício ao lado de Tucker Carlson, em Glendale, Arizona  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

Janice disse à filha que Trump afirmou que não imporia restrições nacionais, lembraram ambas as mulheres. “Eu não acredito nisso”, disse Michelle.

Em uma entrevista ao Post, Janice Albert disse que Trump e seu companheiro de chapa, JD Vance, amenizaram suas preocupações em relação à questão do aborto. Ela reconheceu como Vance — que havia dito anteriormente que queria que o aborto fosse ilegal em todo o país — falou no assunto durante o debate vice-presidencial, enfatizando a importância de “reconquistar a confiança do povo americano nessa questão”. Vance falou de uma amiga anônima em um relacionamento abusivo que lhe disse o quão grata ela estava por ter conseguido fazer um aborto, parecendo implicar que ele apoiava sua decisão de interromper a gravidez.

“Achei ótimo que ele tenha admitido que mudou de opinião, e respeito isso”, disse Janice. “Isso me dá esperança.”

Ela disse que está fazendo o que pode para proteger o acesso ao aborto votando no referendo dos direitos ao aborto do Arizona.

Referendos sobre o aborto podem impulsionar a participação de candidatos democratas, disse Sarah Longwell, uma estrategista republicana anti-Trump que organiza grupos de foco regulares com eleitores. Mas, ela acrescentou, eles também podem fornecer uma “rampa de saída” conveniente para eleitores republicanos e de tendência republicana como Albert, que se importam com os direitos ao aborto.

“É uma maneira de votar estritamente em uma questão e dá ao eleitor a capacidade de dizer: ‘Tirei da mesa aquela questão que importa para mim, agora posso votar em... Trump’”, disse Longwell.

Em relação à questão do aborto, Longwell disse que Trump se beneficia de um de seus maiores “superpoderes”: o fato de as pessoas o perceberem como um moderado social — mesmo que suas declarações e ações não sejam nem um pouco moderadas. Nos grupos de foco que organizou antes da eleição presidencial, ela disse que as pessoas frequentemente dizem achar que Trump não é “pró-vida”, às vezes brincando que ele “provavelmente pagou por um aborto” (questionado em 2016 se ele já havia se envolvido com alguém que fez um aborto, Trump disse: “Uma pergunta muito interessante” e seguiu em frente).

A sensação geral de que Trump não se opõe ao aborto pode funcionar a seu favor com mulheres independentes e de tendência republicana, disse Longwell.

Em San Tan Valley, Arizona, Jones e seu marido decidiram que não querem mais ter filhos. Suas gestações anteriores, ela disse, representaram um risco muito grande para sua saúde.

“Fisicamente, não acho que meu corpo conseguiria fazer isso de novo”, disse ela. Se engravidar, disse, ela quer a opção de fazer um aborto. Jones decidiu acreditar que, se eleito, Trump manterá essa opção aberta para ela. “Eu não acho que ele realmente proibirá isso completamente”, disse. “Eu acho que ele aprendeu a lição.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando sua cédula de votação pelo correio chegou no início deste mês, Emily Jones mal podia esperar para votar pela consagração dos direitos ao aborto na constituição estadual do Arizona — e para lutar contra a decisão da Suprema Corte que anulou a decisão do caso Roe vs. Wade.

Para a mãe de 27 anos de San Tan Valley, no Arizona, a questão era pessoal: um aborto provavelmente salvou sua vida depois que ela foi diagnosticada há alguns anos com uma gravidez ectópica, ela disse. A decisão da Suprema corte em relação ao aborto em 2022 a aterrorizou, ela disse, fazendo as mulheres “recuarem 10 passos”.

Eleitora independente com um histórico de votar principalmente em candidatos republicanos, Jones disse que sabia que a vice-presidente Kamala Harris estava tentando usar a questão do aborto para conquistar mulheres como ela na eleição presidencial. Mas, embora ela tenha visto dezenas de anúncios de Kamala a respeito do aborto, eles não a influenciaram.

Então, na mesma cédula em que votou para proteger os direitos ao aborto, ela também votou em Donald Trump.

Candidato republicano para a presidência dos EUA, Donald Trump fala em evento de campanha em Tempe, Arizona Foto: Alex Brandon/AP

Com comícios repletos de músicas de Beyoncé e anúncios angustiantes mostrando complicações na gravidez após a reversão de Roe, Kamala intensificou seus esforços para vincular sua candidatura à luta pelo acesso ao aborto — esperando aproveitar o momento que levou eleitores em todo o país, mesmo nos estados conservadores de Ohio, Kansas e Kentucky, a apoiar os direitos ao aborto quando a questão apareceu em suas cédulas nos anos desde que a decisão do caso Roe foi anulada. No sábado, Michelle Obama apelou para mulheres que talvez estejam considerando votar diferentemente de seus maridos e namorados.

“Seu voto é uma questão privada”, disse ela. “Independentemente das opiniões políticas de seu parceiro.”

Mas, embora as pesquisas continuem a mostrar um apoio considerável em ambos os partidos quando as pessoas são questionadas se apoiam um referendo a respeito dos direitos ao aborto, é menos claro se Kamala pode convencer independentes e republicanos moderados que apoiam os direitos ao aborto a votar nela— e essa questão pode ser crítica para o resultado da eleição.

Enquanto uma pesquisa do Washington Post-Schar School realizada em outubro descobriu que 68% dos eleitores no Arizona e 80% dos eleitores em Nevada disseram que planejavam apoiar o referendo envolvendo o aborto em seu Estado, a mesma pesquisa mostrou Kamala ligeiramente atrás de Trump no Arizona e empatada com ele em Nevada. O apoio a Kamala entre os prováveis eleitores na pesquisa foi de 46% no Arizona ante 49% de apoio a Trump, e ambos tiveram 48% de apoio em Nevada.

Enquanto isso, Trump — que reivindicou o crédito pela reversão da decisão do caso Roe — tem trabalhado para amenizar as preocupações dos eleitores independentes e republicanos que apoiam os direitos ao aborto. Nas semanas mais recentes, o ex-presidente prometeu vetar uma proibição nacional ao aborto, após se recusar repetidamente a fazer tal promessa. Embora tenha afirmado que cada Estado deve escolher suas próprias leis sobre o aborto, ele disse em um comício recente voltado para eleitoras que muitas das proibições atuais são “duras demais”.

Eleitores republicanos e independentes que planejam dividir seu voto na questão do aborto — votando em favor de um referendo sobre o aborto e votando em Trump — disseram que estavam dispostos a dar a Trump o benefício da dúvida em relação ao assunto, com alguns se sentindo seguros por causa das promessas recentes dele de não reprimir mais o aborto. Apesar da decisão de Trump de nomear os três juízes conservadores da Suprema Corte que ajudaram a revogar o direito constitucional ao aborto, alguns eleitores disseram acreditar que Trump era secretamente “pró-escolha”.

“Isso me incomoda um pouco”, disse Jones quando questionada a respeito de Trump levar o crédito pela queda da decisão do caso Roe. Mas, na opinião dela, Trump só quer impedir que abortos ocorram no terceiro trimestre da gravidez — uma posição que ele enfatizou frequentemente em debates e na campanha eleitoral.

“Não acho que ele fez isso para prejudicar as mulheres”, acrescentou Jones. “Acho que, no fundo, ele tem boas intenções.”

A decisão do caso Roe só protegia o direito ao aborto até o ponto em que um feto pode se tornar viável, ou por volta de 24 semanas, antes do início do terceiro trimestre. Abortos no terceiro trimestre da gravidez são extremamente raros e geralmente ocorrem apenas quando há uma anomalia fetal grave ou quando a saúde da mãe está em risco.

Campanha de Kamala

A campanha de Kamala acredita que ela pode fazer avanços significativos entre mulheres independentes e de tendência republicana enfatizando os perigos que um segundo mandato de Trump pode representar para os direitos ao aborto, disse Molly Murphy, uma pesquisadora da campanha. Nas semanas mais recentes, Kamala apareceu em vários eventos projetados para atingir esse grupo, disse Murphy, incluindo vários encontros com a ex-congressista republicana Liz Cheney, que, ao falar com Kamala, denunciou as “coisas fundamentalmente perigosas que aconteceram” nos Estados Unidos após a reversão do caso Roe.

Ainda assim, Murphy disse que a campanha tem “clareza” quanto à dificuldade de conquistar as mulheres republicanas. Embora eles certamente esperem arrancar alguns ex-eleitores de Trump com a questão do aborto, ela disse que eles estão mais focados nas eleitoras que ela descreveu como “no meio do caminho”, que não gostam de nenhum dos candidatos. A dificuldade com as mulheres que votaram em Trump no passado, ela disse, é que elas estão mais inclinadas a confiar no que ele diz — a acreditar, por exemplo, que ele vetaria uma proibição nacional ao aborto.

“Quando dá suas garantias, ele tem credibilidade porque elas são conservadoras e de tendência republicana”, disse Murphy. “Mas isso não significa que não podemos conquistá-las.”

Nos sete estados-campo de batalha, 45% dos apoiadores de Trump dizem que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos, de acordo com uma pesquisa recente do Washington Post-Schar School. As pesquisas mostram que a maioria dos democratas e dos independentes e pelo menos 4 em cada 10 republicanos apoiam os referendos quanto ao direito ao aborto.

Donald Trump e Kamala Harris se enfrentam nas eleições presidenciais americanas  Foto: AP / AP

Outro foco

Para muitos dos eleitores de Trump que também apoiam os direitos ao aborto, o aborto simplesmente não é uma das principais questões, disse Tresa Undem, uma pesquisadora independente que estuda opiniões a respeito do aborto. Embora eles preferissem ver os direitos ao aborto protegidos — e votarão para expandir as proteções se tiverem a chance de votar diretamente no assunto — eles estão mais focados na economia ou na imigração, ela disse.

Outros que se importam profundamente com os direitos ao aborto não acreditam que Trump imporá mais restrições ao aborto. Em uma pesquisa do New York Times/Siena realizada em setembro, 22% dos apoiadores de Trump disseram achar que Trump tentaria aprovar uma proibição nacional ao aborto, em comparação com 79% dos apoiadores de Kamala.

“Acho que a mensagem está chegando”, disse Undem, referindo-se às tentativas de Trump de tranquilizar os eleitores que apoiam os direitos ao aborto. “Acho que há pessoas que pensam: ‘Ah, ele já fez o que queria fazer em relação ao aborto’. Não acho que os democratas acreditem nisso nem por um segundo, mas acho que os republicanos acreditam.”

Raymond Fillion, um republicano de 60 anos de Tucson, votará no referendo dos direitos ao aborto do Arizona, que protege o aborto até o ponto de viabilidade do feto. Mas ele disse que a questão está “mais perto do fim da lista” de critérios para ele decidir em quem votar para presidente, principalmente porque ele acredita que as decisões importantes agora estão diretamente nos Estados.

“Não há mais nada que o poder executivo possa fazer”, disse Fillion, um veterano militar que trabalha com desarmamento de bombas. “Ele já disse que não assinará uma proibição nacional.”

Trump poderia acabar com o acesso ao aborto sem uma proibição nacional por meio de ação executiva, reprimindo as pílulas abortivas — um plano delineado no Projeto 2025, um controverso plano de 900 páginas para o próximo governo republicano que Trump desmentiu, embora tenha sido escrito por seus aliados.

Para uma mulher republicana de 63 anos em Phoenix, a questão de como o aborto deve afetar seu voto para presidente levou recentemente a uma discussão acalorada de duas horas com sua filha.

Janice Albert e sua filha, Michelle, têm fortes opiniões a respeito dos direitos ao aborto. Michelle Albert, uma independente de esquerda que está votando em Kamala, não conseguia entender como sua mãe podia apoiar o homem que assumiu o crédito pela decisão do caso Dobbs vs. Jackson Women’s Health Organization.

“Eu simplesmente não consigo acreditar que você sequer tenha considerado isso”, Michelle, 33 anos, lembrou-se de ter dito a Janice em um telefonema. “É algo que realmente parte meu coração.”

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato presidencial republicano, Donald Trump, participa de um comício ao lado de Tucker Carlson, em Glendale, Arizona  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

Janice disse à filha que Trump afirmou que não imporia restrições nacionais, lembraram ambas as mulheres. “Eu não acredito nisso”, disse Michelle.

Em uma entrevista ao Post, Janice Albert disse que Trump e seu companheiro de chapa, JD Vance, amenizaram suas preocupações em relação à questão do aborto. Ela reconheceu como Vance — que havia dito anteriormente que queria que o aborto fosse ilegal em todo o país — falou no assunto durante o debate vice-presidencial, enfatizando a importância de “reconquistar a confiança do povo americano nessa questão”. Vance falou de uma amiga anônima em um relacionamento abusivo que lhe disse o quão grata ela estava por ter conseguido fazer um aborto, parecendo implicar que ele apoiava sua decisão de interromper a gravidez.

“Achei ótimo que ele tenha admitido que mudou de opinião, e respeito isso”, disse Janice. “Isso me dá esperança.”

Ela disse que está fazendo o que pode para proteger o acesso ao aborto votando no referendo dos direitos ao aborto do Arizona.

Referendos sobre o aborto podem impulsionar a participação de candidatos democratas, disse Sarah Longwell, uma estrategista republicana anti-Trump que organiza grupos de foco regulares com eleitores. Mas, ela acrescentou, eles também podem fornecer uma “rampa de saída” conveniente para eleitores republicanos e de tendência republicana como Albert, que se importam com os direitos ao aborto.

“É uma maneira de votar estritamente em uma questão e dá ao eleitor a capacidade de dizer: ‘Tirei da mesa aquela questão que importa para mim, agora posso votar em... Trump’”, disse Longwell.

Em relação à questão do aborto, Longwell disse que Trump se beneficia de um de seus maiores “superpoderes”: o fato de as pessoas o perceberem como um moderado social — mesmo que suas declarações e ações não sejam nem um pouco moderadas. Nos grupos de foco que organizou antes da eleição presidencial, ela disse que as pessoas frequentemente dizem achar que Trump não é “pró-vida”, às vezes brincando que ele “provavelmente pagou por um aborto” (questionado em 2016 se ele já havia se envolvido com alguém que fez um aborto, Trump disse: “Uma pergunta muito interessante” e seguiu em frente).

A sensação geral de que Trump não se opõe ao aborto pode funcionar a seu favor com mulheres independentes e de tendência republicana, disse Longwell.

Em San Tan Valley, Arizona, Jones e seu marido decidiram que não querem mais ter filhos. Suas gestações anteriores, ela disse, representaram um risco muito grande para sua saúde.

“Fisicamente, não acho que meu corpo conseguiria fazer isso de novo”, disse ela. Se engravidar, disse, ela quer a opção de fazer um aborto. Jones decidiu acreditar que, se eleito, Trump manterá essa opção aberta para ela. “Eu não acho que ele realmente proibirá isso completamente”, disse. “Eu acho que ele aprendeu a lição.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando sua cédula de votação pelo correio chegou no início deste mês, Emily Jones mal podia esperar para votar pela consagração dos direitos ao aborto na constituição estadual do Arizona — e para lutar contra a decisão da Suprema Corte que anulou a decisão do caso Roe vs. Wade.

Para a mãe de 27 anos de San Tan Valley, no Arizona, a questão era pessoal: um aborto provavelmente salvou sua vida depois que ela foi diagnosticada há alguns anos com uma gravidez ectópica, ela disse. A decisão da Suprema corte em relação ao aborto em 2022 a aterrorizou, ela disse, fazendo as mulheres “recuarem 10 passos”.

Eleitora independente com um histórico de votar principalmente em candidatos republicanos, Jones disse que sabia que a vice-presidente Kamala Harris estava tentando usar a questão do aborto para conquistar mulheres como ela na eleição presidencial. Mas, embora ela tenha visto dezenas de anúncios de Kamala a respeito do aborto, eles não a influenciaram.

Então, na mesma cédula em que votou para proteger os direitos ao aborto, ela também votou em Donald Trump.

Candidato republicano para a presidência dos EUA, Donald Trump fala em evento de campanha em Tempe, Arizona Foto: Alex Brandon/AP

Com comícios repletos de músicas de Beyoncé e anúncios angustiantes mostrando complicações na gravidez após a reversão de Roe, Kamala intensificou seus esforços para vincular sua candidatura à luta pelo acesso ao aborto — esperando aproveitar o momento que levou eleitores em todo o país, mesmo nos estados conservadores de Ohio, Kansas e Kentucky, a apoiar os direitos ao aborto quando a questão apareceu em suas cédulas nos anos desde que a decisão do caso Roe foi anulada. No sábado, Michelle Obama apelou para mulheres que talvez estejam considerando votar diferentemente de seus maridos e namorados.

“Seu voto é uma questão privada”, disse ela. “Independentemente das opiniões políticas de seu parceiro.”

Mas, embora as pesquisas continuem a mostrar um apoio considerável em ambos os partidos quando as pessoas são questionadas se apoiam um referendo a respeito dos direitos ao aborto, é menos claro se Kamala pode convencer independentes e republicanos moderados que apoiam os direitos ao aborto a votar nela— e essa questão pode ser crítica para o resultado da eleição.

Enquanto uma pesquisa do Washington Post-Schar School realizada em outubro descobriu que 68% dos eleitores no Arizona e 80% dos eleitores em Nevada disseram que planejavam apoiar o referendo envolvendo o aborto em seu Estado, a mesma pesquisa mostrou Kamala ligeiramente atrás de Trump no Arizona e empatada com ele em Nevada. O apoio a Kamala entre os prováveis eleitores na pesquisa foi de 46% no Arizona ante 49% de apoio a Trump, e ambos tiveram 48% de apoio em Nevada.

Enquanto isso, Trump — que reivindicou o crédito pela reversão da decisão do caso Roe — tem trabalhado para amenizar as preocupações dos eleitores independentes e republicanos que apoiam os direitos ao aborto. Nas semanas mais recentes, o ex-presidente prometeu vetar uma proibição nacional ao aborto, após se recusar repetidamente a fazer tal promessa. Embora tenha afirmado que cada Estado deve escolher suas próprias leis sobre o aborto, ele disse em um comício recente voltado para eleitoras que muitas das proibições atuais são “duras demais”.

Eleitores republicanos e independentes que planejam dividir seu voto na questão do aborto — votando em favor de um referendo sobre o aborto e votando em Trump — disseram que estavam dispostos a dar a Trump o benefício da dúvida em relação ao assunto, com alguns se sentindo seguros por causa das promessas recentes dele de não reprimir mais o aborto. Apesar da decisão de Trump de nomear os três juízes conservadores da Suprema Corte que ajudaram a revogar o direito constitucional ao aborto, alguns eleitores disseram acreditar que Trump era secretamente “pró-escolha”.

“Isso me incomoda um pouco”, disse Jones quando questionada a respeito de Trump levar o crédito pela queda da decisão do caso Roe. Mas, na opinião dela, Trump só quer impedir que abortos ocorram no terceiro trimestre da gravidez — uma posição que ele enfatizou frequentemente em debates e na campanha eleitoral.

“Não acho que ele fez isso para prejudicar as mulheres”, acrescentou Jones. “Acho que, no fundo, ele tem boas intenções.”

A decisão do caso Roe só protegia o direito ao aborto até o ponto em que um feto pode se tornar viável, ou por volta de 24 semanas, antes do início do terceiro trimestre. Abortos no terceiro trimestre da gravidez são extremamente raros e geralmente ocorrem apenas quando há uma anomalia fetal grave ou quando a saúde da mãe está em risco.

Campanha de Kamala

A campanha de Kamala acredita que ela pode fazer avanços significativos entre mulheres independentes e de tendência republicana enfatizando os perigos que um segundo mandato de Trump pode representar para os direitos ao aborto, disse Molly Murphy, uma pesquisadora da campanha. Nas semanas mais recentes, Kamala apareceu em vários eventos projetados para atingir esse grupo, disse Murphy, incluindo vários encontros com a ex-congressista republicana Liz Cheney, que, ao falar com Kamala, denunciou as “coisas fundamentalmente perigosas que aconteceram” nos Estados Unidos após a reversão do caso Roe.

Ainda assim, Murphy disse que a campanha tem “clareza” quanto à dificuldade de conquistar as mulheres republicanas. Embora eles certamente esperem arrancar alguns ex-eleitores de Trump com a questão do aborto, ela disse que eles estão mais focados nas eleitoras que ela descreveu como “no meio do caminho”, que não gostam de nenhum dos candidatos. A dificuldade com as mulheres que votaram em Trump no passado, ela disse, é que elas estão mais inclinadas a confiar no que ele diz — a acreditar, por exemplo, que ele vetaria uma proibição nacional ao aborto.

“Quando dá suas garantias, ele tem credibilidade porque elas são conservadoras e de tendência republicana”, disse Murphy. “Mas isso não significa que não podemos conquistá-las.”

Nos sete estados-campo de batalha, 45% dos apoiadores de Trump dizem que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos, de acordo com uma pesquisa recente do Washington Post-Schar School. As pesquisas mostram que a maioria dos democratas e dos independentes e pelo menos 4 em cada 10 republicanos apoiam os referendos quanto ao direito ao aborto.

Donald Trump e Kamala Harris se enfrentam nas eleições presidenciais americanas  Foto: AP / AP

Outro foco

Para muitos dos eleitores de Trump que também apoiam os direitos ao aborto, o aborto simplesmente não é uma das principais questões, disse Tresa Undem, uma pesquisadora independente que estuda opiniões a respeito do aborto. Embora eles preferissem ver os direitos ao aborto protegidos — e votarão para expandir as proteções se tiverem a chance de votar diretamente no assunto — eles estão mais focados na economia ou na imigração, ela disse.

Outros que se importam profundamente com os direitos ao aborto não acreditam que Trump imporá mais restrições ao aborto. Em uma pesquisa do New York Times/Siena realizada em setembro, 22% dos apoiadores de Trump disseram achar que Trump tentaria aprovar uma proibição nacional ao aborto, em comparação com 79% dos apoiadores de Kamala.

“Acho que a mensagem está chegando”, disse Undem, referindo-se às tentativas de Trump de tranquilizar os eleitores que apoiam os direitos ao aborto. “Acho que há pessoas que pensam: ‘Ah, ele já fez o que queria fazer em relação ao aborto’. Não acho que os democratas acreditem nisso nem por um segundo, mas acho que os republicanos acreditam.”

Raymond Fillion, um republicano de 60 anos de Tucson, votará no referendo dos direitos ao aborto do Arizona, que protege o aborto até o ponto de viabilidade do feto. Mas ele disse que a questão está “mais perto do fim da lista” de critérios para ele decidir em quem votar para presidente, principalmente porque ele acredita que as decisões importantes agora estão diretamente nos Estados.

“Não há mais nada que o poder executivo possa fazer”, disse Fillion, um veterano militar que trabalha com desarmamento de bombas. “Ele já disse que não assinará uma proibição nacional.”

Trump poderia acabar com o acesso ao aborto sem uma proibição nacional por meio de ação executiva, reprimindo as pílulas abortivas — um plano delineado no Projeto 2025, um controverso plano de 900 páginas para o próximo governo republicano que Trump desmentiu, embora tenha sido escrito por seus aliados.

Para uma mulher republicana de 63 anos em Phoenix, a questão de como o aborto deve afetar seu voto para presidente levou recentemente a uma discussão acalorada de duas horas com sua filha.

Janice Albert e sua filha, Michelle, têm fortes opiniões a respeito dos direitos ao aborto. Michelle Albert, uma independente de esquerda que está votando em Kamala, não conseguia entender como sua mãe podia apoiar o homem que assumiu o crédito pela decisão do caso Dobbs vs. Jackson Women’s Health Organization.

“Eu simplesmente não consigo acreditar que você sequer tenha considerado isso”, Michelle, 33 anos, lembrou-se de ter dito a Janice em um telefonema. “É algo que realmente parte meu coração.”

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato presidencial republicano, Donald Trump, participa de um comício ao lado de Tucker Carlson, em Glendale, Arizona  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

Janice disse à filha que Trump afirmou que não imporia restrições nacionais, lembraram ambas as mulheres. “Eu não acredito nisso”, disse Michelle.

Em uma entrevista ao Post, Janice Albert disse que Trump e seu companheiro de chapa, JD Vance, amenizaram suas preocupações em relação à questão do aborto. Ela reconheceu como Vance — que havia dito anteriormente que queria que o aborto fosse ilegal em todo o país — falou no assunto durante o debate vice-presidencial, enfatizando a importância de “reconquistar a confiança do povo americano nessa questão”. Vance falou de uma amiga anônima em um relacionamento abusivo que lhe disse o quão grata ela estava por ter conseguido fazer um aborto, parecendo implicar que ele apoiava sua decisão de interromper a gravidez.

“Achei ótimo que ele tenha admitido que mudou de opinião, e respeito isso”, disse Janice. “Isso me dá esperança.”

Ela disse que está fazendo o que pode para proteger o acesso ao aborto votando no referendo dos direitos ao aborto do Arizona.

Referendos sobre o aborto podem impulsionar a participação de candidatos democratas, disse Sarah Longwell, uma estrategista republicana anti-Trump que organiza grupos de foco regulares com eleitores. Mas, ela acrescentou, eles também podem fornecer uma “rampa de saída” conveniente para eleitores republicanos e de tendência republicana como Albert, que se importam com os direitos ao aborto.

“É uma maneira de votar estritamente em uma questão e dá ao eleitor a capacidade de dizer: ‘Tirei da mesa aquela questão que importa para mim, agora posso votar em... Trump’”, disse Longwell.

Em relação à questão do aborto, Longwell disse que Trump se beneficia de um de seus maiores “superpoderes”: o fato de as pessoas o perceberem como um moderado social — mesmo que suas declarações e ações não sejam nem um pouco moderadas. Nos grupos de foco que organizou antes da eleição presidencial, ela disse que as pessoas frequentemente dizem achar que Trump não é “pró-vida”, às vezes brincando que ele “provavelmente pagou por um aborto” (questionado em 2016 se ele já havia se envolvido com alguém que fez um aborto, Trump disse: “Uma pergunta muito interessante” e seguiu em frente).

A sensação geral de que Trump não se opõe ao aborto pode funcionar a seu favor com mulheres independentes e de tendência republicana, disse Longwell.

Em San Tan Valley, Arizona, Jones e seu marido decidiram que não querem mais ter filhos. Suas gestações anteriores, ela disse, representaram um risco muito grande para sua saúde.

“Fisicamente, não acho que meu corpo conseguiria fazer isso de novo”, disse ela. Se engravidar, disse, ela quer a opção de fazer um aborto. Jones decidiu acreditar que, se eleito, Trump manterá essa opção aberta para ela. “Eu não acho que ele realmente proibirá isso completamente”, disse. “Eu acho que ele aprendeu a lição.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando sua cédula de votação pelo correio chegou no início deste mês, Emily Jones mal podia esperar para votar pela consagração dos direitos ao aborto na constituição estadual do Arizona — e para lutar contra a decisão da Suprema Corte que anulou a decisão do caso Roe vs. Wade.

Para a mãe de 27 anos de San Tan Valley, no Arizona, a questão era pessoal: um aborto provavelmente salvou sua vida depois que ela foi diagnosticada há alguns anos com uma gravidez ectópica, ela disse. A decisão da Suprema corte em relação ao aborto em 2022 a aterrorizou, ela disse, fazendo as mulheres “recuarem 10 passos”.

Eleitora independente com um histórico de votar principalmente em candidatos republicanos, Jones disse que sabia que a vice-presidente Kamala Harris estava tentando usar a questão do aborto para conquistar mulheres como ela na eleição presidencial. Mas, embora ela tenha visto dezenas de anúncios de Kamala a respeito do aborto, eles não a influenciaram.

Então, na mesma cédula em que votou para proteger os direitos ao aborto, ela também votou em Donald Trump.

Candidato republicano para a presidência dos EUA, Donald Trump fala em evento de campanha em Tempe, Arizona Foto: Alex Brandon/AP

Com comícios repletos de músicas de Beyoncé e anúncios angustiantes mostrando complicações na gravidez após a reversão de Roe, Kamala intensificou seus esforços para vincular sua candidatura à luta pelo acesso ao aborto — esperando aproveitar o momento que levou eleitores em todo o país, mesmo nos estados conservadores de Ohio, Kansas e Kentucky, a apoiar os direitos ao aborto quando a questão apareceu em suas cédulas nos anos desde que a decisão do caso Roe foi anulada. No sábado, Michelle Obama apelou para mulheres que talvez estejam considerando votar diferentemente de seus maridos e namorados.

“Seu voto é uma questão privada”, disse ela. “Independentemente das opiniões políticas de seu parceiro.”

Mas, embora as pesquisas continuem a mostrar um apoio considerável em ambos os partidos quando as pessoas são questionadas se apoiam um referendo a respeito dos direitos ao aborto, é menos claro se Kamala pode convencer independentes e republicanos moderados que apoiam os direitos ao aborto a votar nela— e essa questão pode ser crítica para o resultado da eleição.

Enquanto uma pesquisa do Washington Post-Schar School realizada em outubro descobriu que 68% dos eleitores no Arizona e 80% dos eleitores em Nevada disseram que planejavam apoiar o referendo envolvendo o aborto em seu Estado, a mesma pesquisa mostrou Kamala ligeiramente atrás de Trump no Arizona e empatada com ele em Nevada. O apoio a Kamala entre os prováveis eleitores na pesquisa foi de 46% no Arizona ante 49% de apoio a Trump, e ambos tiveram 48% de apoio em Nevada.

Enquanto isso, Trump — que reivindicou o crédito pela reversão da decisão do caso Roe — tem trabalhado para amenizar as preocupações dos eleitores independentes e republicanos que apoiam os direitos ao aborto. Nas semanas mais recentes, o ex-presidente prometeu vetar uma proibição nacional ao aborto, após se recusar repetidamente a fazer tal promessa. Embora tenha afirmado que cada Estado deve escolher suas próprias leis sobre o aborto, ele disse em um comício recente voltado para eleitoras que muitas das proibições atuais são “duras demais”.

Eleitores republicanos e independentes que planejam dividir seu voto na questão do aborto — votando em favor de um referendo sobre o aborto e votando em Trump — disseram que estavam dispostos a dar a Trump o benefício da dúvida em relação ao assunto, com alguns se sentindo seguros por causa das promessas recentes dele de não reprimir mais o aborto. Apesar da decisão de Trump de nomear os três juízes conservadores da Suprema Corte que ajudaram a revogar o direito constitucional ao aborto, alguns eleitores disseram acreditar que Trump era secretamente “pró-escolha”.

“Isso me incomoda um pouco”, disse Jones quando questionada a respeito de Trump levar o crédito pela queda da decisão do caso Roe. Mas, na opinião dela, Trump só quer impedir que abortos ocorram no terceiro trimestre da gravidez — uma posição que ele enfatizou frequentemente em debates e na campanha eleitoral.

“Não acho que ele fez isso para prejudicar as mulheres”, acrescentou Jones. “Acho que, no fundo, ele tem boas intenções.”

A decisão do caso Roe só protegia o direito ao aborto até o ponto em que um feto pode se tornar viável, ou por volta de 24 semanas, antes do início do terceiro trimestre. Abortos no terceiro trimestre da gravidez são extremamente raros e geralmente ocorrem apenas quando há uma anomalia fetal grave ou quando a saúde da mãe está em risco.

Campanha de Kamala

A campanha de Kamala acredita que ela pode fazer avanços significativos entre mulheres independentes e de tendência republicana enfatizando os perigos que um segundo mandato de Trump pode representar para os direitos ao aborto, disse Molly Murphy, uma pesquisadora da campanha. Nas semanas mais recentes, Kamala apareceu em vários eventos projetados para atingir esse grupo, disse Murphy, incluindo vários encontros com a ex-congressista republicana Liz Cheney, que, ao falar com Kamala, denunciou as “coisas fundamentalmente perigosas que aconteceram” nos Estados Unidos após a reversão do caso Roe.

Ainda assim, Murphy disse que a campanha tem “clareza” quanto à dificuldade de conquistar as mulheres republicanas. Embora eles certamente esperem arrancar alguns ex-eleitores de Trump com a questão do aborto, ela disse que eles estão mais focados nas eleitoras que ela descreveu como “no meio do caminho”, que não gostam de nenhum dos candidatos. A dificuldade com as mulheres que votaram em Trump no passado, ela disse, é que elas estão mais inclinadas a confiar no que ele diz — a acreditar, por exemplo, que ele vetaria uma proibição nacional ao aborto.

“Quando dá suas garantias, ele tem credibilidade porque elas são conservadoras e de tendência republicana”, disse Murphy. “Mas isso não significa que não podemos conquistá-las.”

Nos sete estados-campo de batalha, 45% dos apoiadores de Trump dizem que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos, de acordo com uma pesquisa recente do Washington Post-Schar School. As pesquisas mostram que a maioria dos democratas e dos independentes e pelo menos 4 em cada 10 republicanos apoiam os referendos quanto ao direito ao aborto.

Donald Trump e Kamala Harris se enfrentam nas eleições presidenciais americanas  Foto: AP / AP

Outro foco

Para muitos dos eleitores de Trump que também apoiam os direitos ao aborto, o aborto simplesmente não é uma das principais questões, disse Tresa Undem, uma pesquisadora independente que estuda opiniões a respeito do aborto. Embora eles preferissem ver os direitos ao aborto protegidos — e votarão para expandir as proteções se tiverem a chance de votar diretamente no assunto — eles estão mais focados na economia ou na imigração, ela disse.

Outros que se importam profundamente com os direitos ao aborto não acreditam que Trump imporá mais restrições ao aborto. Em uma pesquisa do New York Times/Siena realizada em setembro, 22% dos apoiadores de Trump disseram achar que Trump tentaria aprovar uma proibição nacional ao aborto, em comparação com 79% dos apoiadores de Kamala.

“Acho que a mensagem está chegando”, disse Undem, referindo-se às tentativas de Trump de tranquilizar os eleitores que apoiam os direitos ao aborto. “Acho que há pessoas que pensam: ‘Ah, ele já fez o que queria fazer em relação ao aborto’. Não acho que os democratas acreditem nisso nem por um segundo, mas acho que os republicanos acreditam.”

Raymond Fillion, um republicano de 60 anos de Tucson, votará no referendo dos direitos ao aborto do Arizona, que protege o aborto até o ponto de viabilidade do feto. Mas ele disse que a questão está “mais perto do fim da lista” de critérios para ele decidir em quem votar para presidente, principalmente porque ele acredita que as decisões importantes agora estão diretamente nos Estados.

“Não há mais nada que o poder executivo possa fazer”, disse Fillion, um veterano militar que trabalha com desarmamento de bombas. “Ele já disse que não assinará uma proibição nacional.”

Trump poderia acabar com o acesso ao aborto sem uma proibição nacional por meio de ação executiva, reprimindo as pílulas abortivas — um plano delineado no Projeto 2025, um controverso plano de 900 páginas para o próximo governo republicano que Trump desmentiu, embora tenha sido escrito por seus aliados.

Para uma mulher republicana de 63 anos em Phoenix, a questão de como o aborto deve afetar seu voto para presidente levou recentemente a uma discussão acalorada de duas horas com sua filha.

Janice Albert e sua filha, Michelle, têm fortes opiniões a respeito dos direitos ao aborto. Michelle Albert, uma independente de esquerda que está votando em Kamala, não conseguia entender como sua mãe podia apoiar o homem que assumiu o crédito pela decisão do caso Dobbs vs. Jackson Women’s Health Organization.

“Eu simplesmente não consigo acreditar que você sequer tenha considerado isso”, Michelle, 33 anos, lembrou-se de ter dito a Janice em um telefonema. “É algo que realmente parte meu coração.”

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato presidencial republicano, Donald Trump, participa de um comício ao lado de Tucker Carlson, em Glendale, Arizona  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

Janice disse à filha que Trump afirmou que não imporia restrições nacionais, lembraram ambas as mulheres. “Eu não acredito nisso”, disse Michelle.

Em uma entrevista ao Post, Janice Albert disse que Trump e seu companheiro de chapa, JD Vance, amenizaram suas preocupações em relação à questão do aborto. Ela reconheceu como Vance — que havia dito anteriormente que queria que o aborto fosse ilegal em todo o país — falou no assunto durante o debate vice-presidencial, enfatizando a importância de “reconquistar a confiança do povo americano nessa questão”. Vance falou de uma amiga anônima em um relacionamento abusivo que lhe disse o quão grata ela estava por ter conseguido fazer um aborto, parecendo implicar que ele apoiava sua decisão de interromper a gravidez.

“Achei ótimo que ele tenha admitido que mudou de opinião, e respeito isso”, disse Janice. “Isso me dá esperança.”

Ela disse que está fazendo o que pode para proteger o acesso ao aborto votando no referendo dos direitos ao aborto do Arizona.

Referendos sobre o aborto podem impulsionar a participação de candidatos democratas, disse Sarah Longwell, uma estrategista republicana anti-Trump que organiza grupos de foco regulares com eleitores. Mas, ela acrescentou, eles também podem fornecer uma “rampa de saída” conveniente para eleitores republicanos e de tendência republicana como Albert, que se importam com os direitos ao aborto.

“É uma maneira de votar estritamente em uma questão e dá ao eleitor a capacidade de dizer: ‘Tirei da mesa aquela questão que importa para mim, agora posso votar em... Trump’”, disse Longwell.

Em relação à questão do aborto, Longwell disse que Trump se beneficia de um de seus maiores “superpoderes”: o fato de as pessoas o perceberem como um moderado social — mesmo que suas declarações e ações não sejam nem um pouco moderadas. Nos grupos de foco que organizou antes da eleição presidencial, ela disse que as pessoas frequentemente dizem achar que Trump não é “pró-vida”, às vezes brincando que ele “provavelmente pagou por um aborto” (questionado em 2016 se ele já havia se envolvido com alguém que fez um aborto, Trump disse: “Uma pergunta muito interessante” e seguiu em frente).

A sensação geral de que Trump não se opõe ao aborto pode funcionar a seu favor com mulheres independentes e de tendência republicana, disse Longwell.

Em San Tan Valley, Arizona, Jones e seu marido decidiram que não querem mais ter filhos. Suas gestações anteriores, ela disse, representaram um risco muito grande para sua saúde.

“Fisicamente, não acho que meu corpo conseguiria fazer isso de novo”, disse ela. Se engravidar, disse, ela quer a opção de fazer um aborto. Jones decidiu acreditar que, se eleito, Trump manterá essa opção aberta para ela. “Eu não acho que ele realmente proibirá isso completamente”, disse. “Eu acho que ele aprendeu a lição.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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