‘Negação da derrota é um desastre para republicanos’, diz Adam Tooze


Historiador e economista prevê relação dos EUA mais profissional com o Brasil e não descarta volta de Trump em 2024

Por Alexandra Martins

O historiador e economista britânico da Universidade de Columbia, Adam Tooze, autor do best-seller Crashed, conversou com o BRPolítico sobre o cenário nos EUA após a vitória de Joe Biden. Na conversa, Tooze não descartou a possibilidade da volta de Donald Trump em 2024 e avaliou que a relação do novo governo com o Brasil será “profissional”. A seguir, trechos da entrevista de Tooze. 

Que tipo de análise podemos fazer sobre a democracia no mundo, considerando a recusa de Donald Trump em aceitar a derrota?  Mais significativo que a recusa de Trump em aceitar o resultado é o Partido Republicano como um todo não reconhecer a vitória de Joe Biden. Eles estão mantendo a fé no presidente. Isso é desastroso. Você tem que lembrar que Trump não aceitou o resultado nem da eleição que ele venceu, em 2016. Ele acredita que houve fraude. Ele tem um problema com a realidade, em geral. 

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O historiador e economista Adam Tooze, autor do best-seller Crashed Foto: Columbia University

Existe risco de outras democracias seguirem esse exemplo?

Se você tem o Brasil em mente, a questão fundamental é se as pessoas estão perto de serem reprimidas ou em situações de guerra civil. Se estiverem, esse tipo de comportamento será um risco, porque a base da política de alternância, em que você aceita as diferenças de outros partidos, não é mais aceita e virou uma luta existencial pela identidade de uma nação. Sabemos como Trump e Jair Bolsonaro brincam com esse imaginário. 

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Qual o futuro de Trump?

Eu não gostaria de tentar adivinhar como ele reagirá, ele é imprevisível. É certo que ele não vai sair de cena. A ideia de se aposentar silenciosamente não deve ser o futuro de Trump. Ele ama a atenção pública e pode ser uma espécie de esperança perdida da direita. Muitas pessoas dizem que ele pode ser a aposta dos republicanos em 2024. Mas, se voltarmos a 2016, temos de nos perguntar por que alguém como Trump emergiu desta forma. Os republicanos não têm uma lista de nomes fortes, de alternativas. Então, em um cenário de horror pode ser que ele seja candidato novamente. Ele já estará velho, mas, como ele diz, é vigoroso, está em boa forma. Então, talvez, o cheese burguer seja nossa melhor esperança.

Qual o futuro do Partido Republicano sem Trump?

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Existem outras vozes. Afinal, esta é a mensagem da eleição. Trump era muito popular com uma minoria e parece ter ido longe demais ao perder os republicanos centristas, muitos dos quais votaram em Biden. Essas pessoas ainda são políticos formidáveis. Os EUA, como o Brasil, são um país gigante. Mitch McConnell (líder republicano no Senado) domina o Kentucky. Toda a política é local ou regional, em grandes Estados, com 10, 15 ou 20 milhões de pessoas. E essa política continua inalterada. Há vários empresários, como Thomas Cotton (senador de Arkansas), que são considerados expoentes ideológicos da classe média. Trump deixa o poder, mas a máquina continuará funcionando. Espero uma boa exibição na eleição de meio de mandato, em 2022, a menos que Biden tenha sucesso nos próximos dois anos.

Como será a relação de Biden com o Brasil de Bolsonaro?

Será uma política externa profissional. Não haverá chamego, convite para Mar-a-Lago (mansão de Trump em Palm Beach). Tudo isso desaparece. O problema é que existem pontos de desacordo sobre o clima. Mas há solução. Os dois países são continentais, ricos em fontes alternativas de energia, com grande talento humano e potencial tecnológico. Certamente, esse deve ser o caminho a seguir. Temos um dos maiores tesouros de recursos naturais que qualquer outro grupo humano tem a sorte de possuir. É nesse ponto que a relação se dará de forma mais séria.

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É um problema Bolsonaro não ter parabenizado Biden? 

Eles são bastante crescidinhos. Alguém esperava que Bolsonaro parabenizasse Biden? Não. Isso é superável. Ninguém guarda rancores por causa desse tipo de coisa. Eles são adultos. Não espero que retaliem o Brasil porque Brasília não mandou um e-mail.

O Senado controlado pelos republicanos pode ser um obstáculo para Biden?

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Sim. Os EUA têm um sistema bipartidário, não há coalizões, como na Europa. Pensamos que o presidente manda no país, mas não é verdade. Desde 2018, Trump não aprovou nenhuma legislação significativa. De 2010 a 2016, Obama não aprovou nenhum legislação nacional importante e a forma como eles governaram foi por meio de regulamentos publicados com base na lei existente. Então, o desafio é lutar contra isso no sistema Judiciário, subindo pelo sistema federal até chegar na Suprema Corte. É assim que o governo americano realmente funciona. Tudo que o governo Biden for capaz e incapaz de fazer dependerá de negociações com os republicanos.

O historiador e economista britânico da Universidade de Columbia, Adam Tooze, autor do best-seller Crashed, conversou com o BRPolítico sobre o cenário nos EUA após a vitória de Joe Biden. Na conversa, Tooze não descartou a possibilidade da volta de Donald Trump em 2024 e avaliou que a relação do novo governo com o Brasil será “profissional”. A seguir, trechos da entrevista de Tooze. 

Que tipo de análise podemos fazer sobre a democracia no mundo, considerando a recusa de Donald Trump em aceitar a derrota?  Mais significativo que a recusa de Trump em aceitar o resultado é o Partido Republicano como um todo não reconhecer a vitória de Joe Biden. Eles estão mantendo a fé no presidente. Isso é desastroso. Você tem que lembrar que Trump não aceitou o resultado nem da eleição que ele venceu, em 2016. Ele acredita que houve fraude. Ele tem um problema com a realidade, em geral. 

O historiador e economista Adam Tooze, autor do best-seller Crashed Foto: Columbia University

Existe risco de outras democracias seguirem esse exemplo?

Se você tem o Brasil em mente, a questão fundamental é se as pessoas estão perto de serem reprimidas ou em situações de guerra civil. Se estiverem, esse tipo de comportamento será um risco, porque a base da política de alternância, em que você aceita as diferenças de outros partidos, não é mais aceita e virou uma luta existencial pela identidade de uma nação. Sabemos como Trump e Jair Bolsonaro brincam com esse imaginário. 

Qual o futuro de Trump?

Eu não gostaria de tentar adivinhar como ele reagirá, ele é imprevisível. É certo que ele não vai sair de cena. A ideia de se aposentar silenciosamente não deve ser o futuro de Trump. Ele ama a atenção pública e pode ser uma espécie de esperança perdida da direita. Muitas pessoas dizem que ele pode ser a aposta dos republicanos em 2024. Mas, se voltarmos a 2016, temos de nos perguntar por que alguém como Trump emergiu desta forma. Os republicanos não têm uma lista de nomes fortes, de alternativas. Então, em um cenário de horror pode ser que ele seja candidato novamente. Ele já estará velho, mas, como ele diz, é vigoroso, está em boa forma. Então, talvez, o cheese burguer seja nossa melhor esperança.

Qual o futuro do Partido Republicano sem Trump?

Existem outras vozes. Afinal, esta é a mensagem da eleição. Trump era muito popular com uma minoria e parece ter ido longe demais ao perder os republicanos centristas, muitos dos quais votaram em Biden. Essas pessoas ainda são políticos formidáveis. Os EUA, como o Brasil, são um país gigante. Mitch McConnell (líder republicano no Senado) domina o Kentucky. Toda a política é local ou regional, em grandes Estados, com 10, 15 ou 20 milhões de pessoas. E essa política continua inalterada. Há vários empresários, como Thomas Cotton (senador de Arkansas), que são considerados expoentes ideológicos da classe média. Trump deixa o poder, mas a máquina continuará funcionando. Espero uma boa exibição na eleição de meio de mandato, em 2022, a menos que Biden tenha sucesso nos próximos dois anos.

Como será a relação de Biden com o Brasil de Bolsonaro?

Será uma política externa profissional. Não haverá chamego, convite para Mar-a-Lago (mansão de Trump em Palm Beach). Tudo isso desaparece. O problema é que existem pontos de desacordo sobre o clima. Mas há solução. Os dois países são continentais, ricos em fontes alternativas de energia, com grande talento humano e potencial tecnológico. Certamente, esse deve ser o caminho a seguir. Temos um dos maiores tesouros de recursos naturais que qualquer outro grupo humano tem a sorte de possuir. É nesse ponto que a relação se dará de forma mais séria.

É um problema Bolsonaro não ter parabenizado Biden? 

Eles são bastante crescidinhos. Alguém esperava que Bolsonaro parabenizasse Biden? Não. Isso é superável. Ninguém guarda rancores por causa desse tipo de coisa. Eles são adultos. Não espero que retaliem o Brasil porque Brasília não mandou um e-mail.

O Senado controlado pelos republicanos pode ser um obstáculo para Biden?

Sim. Os EUA têm um sistema bipartidário, não há coalizões, como na Europa. Pensamos que o presidente manda no país, mas não é verdade. Desde 2018, Trump não aprovou nenhuma legislação significativa. De 2010 a 2016, Obama não aprovou nenhum legislação nacional importante e a forma como eles governaram foi por meio de regulamentos publicados com base na lei existente. Então, o desafio é lutar contra isso no sistema Judiciário, subindo pelo sistema federal até chegar na Suprema Corte. É assim que o governo americano realmente funciona. Tudo que o governo Biden for capaz e incapaz de fazer dependerá de negociações com os republicanos.

O historiador e economista britânico da Universidade de Columbia, Adam Tooze, autor do best-seller Crashed, conversou com o BRPolítico sobre o cenário nos EUA após a vitória de Joe Biden. Na conversa, Tooze não descartou a possibilidade da volta de Donald Trump em 2024 e avaliou que a relação do novo governo com o Brasil será “profissional”. A seguir, trechos da entrevista de Tooze. 

Que tipo de análise podemos fazer sobre a democracia no mundo, considerando a recusa de Donald Trump em aceitar a derrota?  Mais significativo que a recusa de Trump em aceitar o resultado é o Partido Republicano como um todo não reconhecer a vitória de Joe Biden. Eles estão mantendo a fé no presidente. Isso é desastroso. Você tem que lembrar que Trump não aceitou o resultado nem da eleição que ele venceu, em 2016. Ele acredita que houve fraude. Ele tem um problema com a realidade, em geral. 

O historiador e economista Adam Tooze, autor do best-seller Crashed Foto: Columbia University

Existe risco de outras democracias seguirem esse exemplo?

Se você tem o Brasil em mente, a questão fundamental é se as pessoas estão perto de serem reprimidas ou em situações de guerra civil. Se estiverem, esse tipo de comportamento será um risco, porque a base da política de alternância, em que você aceita as diferenças de outros partidos, não é mais aceita e virou uma luta existencial pela identidade de uma nação. Sabemos como Trump e Jair Bolsonaro brincam com esse imaginário. 

Qual o futuro de Trump?

Eu não gostaria de tentar adivinhar como ele reagirá, ele é imprevisível. É certo que ele não vai sair de cena. A ideia de se aposentar silenciosamente não deve ser o futuro de Trump. Ele ama a atenção pública e pode ser uma espécie de esperança perdida da direita. Muitas pessoas dizem que ele pode ser a aposta dos republicanos em 2024. Mas, se voltarmos a 2016, temos de nos perguntar por que alguém como Trump emergiu desta forma. Os republicanos não têm uma lista de nomes fortes, de alternativas. Então, em um cenário de horror pode ser que ele seja candidato novamente. Ele já estará velho, mas, como ele diz, é vigoroso, está em boa forma. Então, talvez, o cheese burguer seja nossa melhor esperança.

Qual o futuro do Partido Republicano sem Trump?

Existem outras vozes. Afinal, esta é a mensagem da eleição. Trump era muito popular com uma minoria e parece ter ido longe demais ao perder os republicanos centristas, muitos dos quais votaram em Biden. Essas pessoas ainda são políticos formidáveis. Os EUA, como o Brasil, são um país gigante. Mitch McConnell (líder republicano no Senado) domina o Kentucky. Toda a política é local ou regional, em grandes Estados, com 10, 15 ou 20 milhões de pessoas. E essa política continua inalterada. Há vários empresários, como Thomas Cotton (senador de Arkansas), que são considerados expoentes ideológicos da classe média. Trump deixa o poder, mas a máquina continuará funcionando. Espero uma boa exibição na eleição de meio de mandato, em 2022, a menos que Biden tenha sucesso nos próximos dois anos.

Como será a relação de Biden com o Brasil de Bolsonaro?

Será uma política externa profissional. Não haverá chamego, convite para Mar-a-Lago (mansão de Trump em Palm Beach). Tudo isso desaparece. O problema é que existem pontos de desacordo sobre o clima. Mas há solução. Os dois países são continentais, ricos em fontes alternativas de energia, com grande talento humano e potencial tecnológico. Certamente, esse deve ser o caminho a seguir. Temos um dos maiores tesouros de recursos naturais que qualquer outro grupo humano tem a sorte de possuir. É nesse ponto que a relação se dará de forma mais séria.

É um problema Bolsonaro não ter parabenizado Biden? 

Eles são bastante crescidinhos. Alguém esperava que Bolsonaro parabenizasse Biden? Não. Isso é superável. Ninguém guarda rancores por causa desse tipo de coisa. Eles são adultos. Não espero que retaliem o Brasil porque Brasília não mandou um e-mail.

O Senado controlado pelos republicanos pode ser um obstáculo para Biden?

Sim. Os EUA têm um sistema bipartidário, não há coalizões, como na Europa. Pensamos que o presidente manda no país, mas não é verdade. Desde 2018, Trump não aprovou nenhuma legislação significativa. De 2010 a 2016, Obama não aprovou nenhum legislação nacional importante e a forma como eles governaram foi por meio de regulamentos publicados com base na lei existente. Então, o desafio é lutar contra isso no sistema Judiciário, subindo pelo sistema federal até chegar na Suprema Corte. É assim que o governo americano realmente funciona. Tudo que o governo Biden for capaz e incapaz de fazer dependerá de negociações com os republicanos.

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