Novas sanções dos EUA à Nicarágua: quais são e como elas afetam a ditadura Daniel Ortega


O presidente Joe Biden assinou uma ordem executiva que proíbe empresas americanas de fazer negócios que envolvam ouro ou outros produtos minerais no país

Por Redação
Atualização:

O governo dos Estados Unidos adotou novas medidas para tentar isolar a Nicarágua economicamente.

O presidente Joe Biden assinou na segunda-feira, 24, uma ordem executiva que proíbe empresas americanas de fazer negócios que envolvam ouro ou outros produtos minerais na Nicarágua.

O Departamento do Tesouro dos EUA impôs sanções ao chefe do órgão responsável pelas atividades ligadas à mineração da Nicarágua e um um dirigente do governo, disse o departamento.

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O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega Foto: Cesar Perez/Presidência da Nicarágua via Reuters

Entenda quais os efeitos destas sanções:

Quem é o presidente na Nicarágua?

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Nos anos 1970, o então guerrilheiro Daniel Ortega combatia a ditadura de Anastasio Somoza ao lado de figuras que se tornaram símbolos da política da Nicarágua, como Dora María Téllez, Víctor Hugo Tinoco e Hugo Torres.

Hoje, passados 49 anos de atos importantes para a derrubada de Somoza, o presidente Ortega é o responsável pela prisão dos três ex-companheiros, de dezenas de outros opositores, do silenciamento da mídia e da perseguição à Igreja Católica. Desde 2018, ele se consolida como autocrata no poder, despertando a atenção e as críticas internacionais.

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Daniel Ortega está no poder de forma ininterrupta desde 2007 e, em novembro do ano passado, venceu uma eleição de fachada que o habilitou a um quarto mandato consecutivo. A eleição não foi reconhecida pela maior parte da comunidade internacional porque o regime prendeu, sob acusações de lavagem de dinheiro e traição à pátria, sete candidatos opositores.

A repressão de Ortega se intensificou depois de 2018, quando protestos contra a ditadura acabaram com mais de 300 manifestantes mortos, após a repressão brutal por forças de segurança e grupos paramilitares alinhados ao regime.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega e a vice-presidente, Rosario Murillo Foto: Oswaldo Rivas/Reuters
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“Desde que Ortega assumiu o poder em 2007, iniciou um processo de controle das instituições do Estado e a privatizar os resultados da cooperação econômica petroleira com a Venezuela. Isso foi destruindo a institucionalidade do país e cada vez mais limitando o exercício dos direitos democráticos”, afirmou ao Estadão o jornalista nicaraguense que vive na Alemanha Héctor Mairena.

Em 2009, o Supremo Tribunal de Justiça da Nicarágua permitiu que Ortega concorresse a um segundo mandato consecutivo. Em seguida, uma emenda constitucional aprovada em 2014 por seu partido, que ainda controla a Assembleia Nacional, derrubou os limites de mandato. Em 2016, Ortega concorre e vence novamente.

Em abril de 2018, Ortega decretou uma reforma no sistema de pensões dos aposentados, que começaram a protestar. Com a repressão policial, grupos universitários se uniram aos protestos, que rapidamente se espalharam pelo país. A partir de então, as prisões de políticos se tornaram mais comuns na Nicarágua.

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Desde 2020, novas leis foram aprovadas sob o governo de Ortega e sua mulher, Rosario Murillo, e têm levado à prisão ou fuga de opositores. Em julho deste ano, o principal jornal independente, La Prensa, retirou todos os seus funcionários do país.

Há menos de duas semanas, em 13 de outubro, o Parlamento aprovou uma legislação para controlar a produção audiovisual do país, classificada como censura. O regime também tem avançado contra a Igreja Católica, a qual chamou recentemente de “ditadura perfeita”.

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Como as sanções dos EUA afetam a ditadura de Daniel Ortega?

Os poderes de sanções ampliados da ordem também podem ser usados para bloquear novos investimentos dos EUA em certos outros setores na Nicarágua, a importação de certos produtos nicaraguenses ou a exportação de certos itens para a Nicarágua, afirmou o departamento.

“Os ataques contínuos do regime de Ortega-Murillo a atores democráticos e membros da sociedade civil e a detenção injusta de presos políticos demonstram que o regime sente que não está vinculado ao Estado de Direito”, disse o subsecretário do Tesouro para Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian Nelson.

Ele afirmou que as ações dos EUA visam negar-lhes “os recursos de que precisam para continuar a minar as instituições democráticas na Nicarágua”.

As sanções miram especialmente a chefia da Direção-Geral de Minas, que administra as maiores operações, e especificamente Reinaldo Gregorio Lenin Cerna Juárez, descrito pelo Departamento do Tesouro americano como confidente próximo de Ortega.

O ouro foi o principal produto de exportação da Nicarágua no ano passado, movimentando US$ 867,6 milhões (R$ 4,6 bilhões). Do total, 79% das vendas foram para os EUA, de acordo com dados do Banco Central do país.

Segundo o Banco Mundial, a economia do país da América Central cresceu 10,3% em 2021, principalmente graças a remessas de nicaraguenses que vivem nos EUA e a exportações de ouro e café. Neste ano, porém, a atividade econômica deve enfrentar uma queda acentuada.

O governo Biden também impôs nesta segunda restrições a 500 pessoas e suas famílias que “trabalhem para o governo da Nicarágua ou formulem, implementem ou se beneficiem” de políticas que minem as instituições democráticas do país.

Há outras sanções contra a Nicarágua?

Não são as primeiras sanções do tipo anunciadas pelo governo democrata. Em junho, a Casa Branca já havia avançado contra a estatal de mineração Eniminas. No mês seguinte, retirou o país da lista de nações com quotas com tarifas baixas para importação de cana-de-açúcar.

A União Europeia também aprovou uma série de sanções desde 2020 contra uma filha e um filho do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, e outras cinco pessoas ligadas ao regime, assim como contra três entidades do país.

Os países membros aprovaram as sanções porque consideram que as pessoas e entidades envolvidas cometeram “graves violações dos direitos humanos” e apoiaram as eleições “fraudulentas” de novembro de 2021, nas quais Ortega se reelegeu sem enfrentar os principais opositores nas urnas, todos presos pelo regime.

Como é a vida na Nicarágua?

Hoje, a Nicarágua é um país dominado pelo medo, como mostrou a matéria publicada pelo Estadão em uma série de reportagens especiais sobre a esquerda na América Latina.

Como na antiga União Soviética, as pessoas têm receio de emitir suas opiniões em público e são vigiadas por “espiões de quarteirão” do regime, que fazem parte dos Conselhos de Poder Cidadão (PCC), empoderados por Ortega.

Talvez, por isso, a Nicarágua tenha sido chamada pelo jornal espanhol El País de “Gulag latino-americano”, em referência aos campos de trabalhos forçados destinados a prisioneiros políticos e cidadãos que se opunham ao regime comunista soviético, principalmente durante o governo de Josef Stalin, que comandou a ex-URSS com mão de ferro por 31 anos. “A Nicarágua se transformou num Estado policial”, afirma Chamorro.

O ditador da Nicarágua e sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo Foto: Alfredo Zuniga/AP

Isolado pelas sanções que lhe foram impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia, estendidas a seus familiares e a autoridades do governo, Ortega se escora hoje, mais que nunca, em países como Cuba, Venezuela, Irã, Coreia do Norte, China e Rússia. Contra as grandes democracias ocidentais, ficou do lado de Vladimir Putin na invasão da Ucrânia pela Rússia, e expulsou a OEA (Organização dos Estados Americanos) da Nicarágua, depois de a entidade criticar as “eleições” realizadas em novembro de 2021.

Perseguição da Igreja Católica

Num movimento que já levou o papa Francisco a expressar sua “preocupação”, o regime desencadeou também uma onda repressiva contra autoridades da Igreja Católica, que culminou com a prisão do bispo Rolando Álvarez, em meados de agosto, depois de ele e seus auxiliares ficarem cerca de duas semanas confinados, sob vigilância policial, no arcebispado de Matagualpa (a 131 km de Manágua).

Nos últimos meses, o governo também expulsou do país 18 freiras da congregação Missionárias da Caridade, fundada por Madre Teresa de Calcutá, e o núncio apostólico Waldemar Stanislaw Sommertag. Fechou, ainda, oito emissoras de rádio católicas e forçou a exclusão de três canais ligados à Igreja da TV por assinatura. “O regime está tentando silenciar a Igreja porque ela tem sido a única voz independente na Nicarágua, depois do cancelamento dos partidos políticos de oposição e da prisão de seus líderes”, diz o ex-ministro Humberto Belli.

Além da repressão contra religiosos, líderes e partidos políticos e a imprensa independente, cerca de 1.400 ONGs (organizações não governamentais) humanitárias e de defesa dos direitos humanos e pelo menos cinco universidades privadas, que agora deverão ser administradas pelo governo, tiveram suas licenças para funcionar canceladas.

“Na Nicarágua, não existe mais autonomia universitária. As universidades têm de seguir o currículo que o Estado dita, porque elas sabem que podem ser fechadas a qualquer momento se o governo achar que não estão seguindo as políticas que ele quer ditar”, afirma Belli. “Acredito que vão demandar de todas as escolas de nível médio e elementar que sigam só o currículo determinado pelo governo, incluindo a propaganda que ele promove para se apresentar como salvador da Nicarágua.”

Nem mesmo ex-companheiros de Ortega – que deixaram o partido da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e fundaram o Movimento de Renovação Sandinista (MRS), hoje rebatizado de União Democratica Renovadora (Unamos) – escaparam das garras do regime.

A ex-guerrilheira Dora Maria Tellez, de 66 anos, chamada de “Comandante 2″, foi condenada a 8 anos de prisão por suposta “conspiração”. O general aposentado, Hugo Torres, um dos líderes do movimento sandinista nos anos 1970, chamado de “Comandante Uno”, morreu na prisão antes de ser julgado.

Num vídeo gravado em junho de 2021, pouco antes de ser detido pelas forças de segurança, Torres afirmou: “Há 46 anos, arrisquei a minha vida para tirar Daniel Ortega e outros prisioneiros políticos-colegas da prisão. Hoje, tenho 73 anos. Nesta fase da minha vida, nunca pensei que estaria lutando contra outra ditadura mais brutal, mais inescrupulosa, mais irracional e mais autocrática do que a ditadura de Somoza”.

Para amparar suas ações autoritárias, Ortega aprovou uma série de leis que cerceiam os direitos e as liberdades dos cidadãos desde os protestos de 2018. Em outubro de 2020, sob a desculpa de regular a área digital e punir propagadores de fake news, a Assembleia Nacional, que ele controla, aprovou a Lei Especial de Crimes Cibernéticos.

O governo dos Estados Unidos adotou novas medidas para tentar isolar a Nicarágua economicamente.

O presidente Joe Biden assinou na segunda-feira, 24, uma ordem executiva que proíbe empresas americanas de fazer negócios que envolvam ouro ou outros produtos minerais na Nicarágua.

O Departamento do Tesouro dos EUA impôs sanções ao chefe do órgão responsável pelas atividades ligadas à mineração da Nicarágua e um um dirigente do governo, disse o departamento.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega Foto: Cesar Perez/Presidência da Nicarágua via Reuters

Entenda quais os efeitos destas sanções:

Quem é o presidente na Nicarágua?

Nos anos 1970, o então guerrilheiro Daniel Ortega combatia a ditadura de Anastasio Somoza ao lado de figuras que se tornaram símbolos da política da Nicarágua, como Dora María Téllez, Víctor Hugo Tinoco e Hugo Torres.

Hoje, passados 49 anos de atos importantes para a derrubada de Somoza, o presidente Ortega é o responsável pela prisão dos três ex-companheiros, de dezenas de outros opositores, do silenciamento da mídia e da perseguição à Igreja Católica. Desde 2018, ele se consolida como autocrata no poder, despertando a atenção e as críticas internacionais.

Daniel Ortega está no poder de forma ininterrupta desde 2007 e, em novembro do ano passado, venceu uma eleição de fachada que o habilitou a um quarto mandato consecutivo. A eleição não foi reconhecida pela maior parte da comunidade internacional porque o regime prendeu, sob acusações de lavagem de dinheiro e traição à pátria, sete candidatos opositores.

A repressão de Ortega se intensificou depois de 2018, quando protestos contra a ditadura acabaram com mais de 300 manifestantes mortos, após a repressão brutal por forças de segurança e grupos paramilitares alinhados ao regime.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega e a vice-presidente, Rosario Murillo Foto: Oswaldo Rivas/Reuters

“Desde que Ortega assumiu o poder em 2007, iniciou um processo de controle das instituições do Estado e a privatizar os resultados da cooperação econômica petroleira com a Venezuela. Isso foi destruindo a institucionalidade do país e cada vez mais limitando o exercício dos direitos democráticos”, afirmou ao Estadão o jornalista nicaraguense que vive na Alemanha Héctor Mairena.

Em 2009, o Supremo Tribunal de Justiça da Nicarágua permitiu que Ortega concorresse a um segundo mandato consecutivo. Em seguida, uma emenda constitucional aprovada em 2014 por seu partido, que ainda controla a Assembleia Nacional, derrubou os limites de mandato. Em 2016, Ortega concorre e vence novamente.

Em abril de 2018, Ortega decretou uma reforma no sistema de pensões dos aposentados, que começaram a protestar. Com a repressão policial, grupos universitários se uniram aos protestos, que rapidamente se espalharam pelo país. A partir de então, as prisões de políticos se tornaram mais comuns na Nicarágua.

Desde 2020, novas leis foram aprovadas sob o governo de Ortega e sua mulher, Rosario Murillo, e têm levado à prisão ou fuga de opositores. Em julho deste ano, o principal jornal independente, La Prensa, retirou todos os seus funcionários do país.

Há menos de duas semanas, em 13 de outubro, o Parlamento aprovou uma legislação para controlar a produção audiovisual do país, classificada como censura. O regime também tem avançado contra a Igreja Católica, a qual chamou recentemente de “ditadura perfeita”.

Como as sanções dos EUA afetam a ditadura de Daniel Ortega?

Os poderes de sanções ampliados da ordem também podem ser usados para bloquear novos investimentos dos EUA em certos outros setores na Nicarágua, a importação de certos produtos nicaraguenses ou a exportação de certos itens para a Nicarágua, afirmou o departamento.

“Os ataques contínuos do regime de Ortega-Murillo a atores democráticos e membros da sociedade civil e a detenção injusta de presos políticos demonstram que o regime sente que não está vinculado ao Estado de Direito”, disse o subsecretário do Tesouro para Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian Nelson.

Ele afirmou que as ações dos EUA visam negar-lhes “os recursos de que precisam para continuar a minar as instituições democráticas na Nicarágua”.

As sanções miram especialmente a chefia da Direção-Geral de Minas, que administra as maiores operações, e especificamente Reinaldo Gregorio Lenin Cerna Juárez, descrito pelo Departamento do Tesouro americano como confidente próximo de Ortega.

O ouro foi o principal produto de exportação da Nicarágua no ano passado, movimentando US$ 867,6 milhões (R$ 4,6 bilhões). Do total, 79% das vendas foram para os EUA, de acordo com dados do Banco Central do país.

Segundo o Banco Mundial, a economia do país da América Central cresceu 10,3% em 2021, principalmente graças a remessas de nicaraguenses que vivem nos EUA e a exportações de ouro e café. Neste ano, porém, a atividade econômica deve enfrentar uma queda acentuada.

O governo Biden também impôs nesta segunda restrições a 500 pessoas e suas famílias que “trabalhem para o governo da Nicarágua ou formulem, implementem ou se beneficiem” de políticas que minem as instituições democráticas do país.

Há outras sanções contra a Nicarágua?

Não são as primeiras sanções do tipo anunciadas pelo governo democrata. Em junho, a Casa Branca já havia avançado contra a estatal de mineração Eniminas. No mês seguinte, retirou o país da lista de nações com quotas com tarifas baixas para importação de cana-de-açúcar.

A União Europeia também aprovou uma série de sanções desde 2020 contra uma filha e um filho do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, e outras cinco pessoas ligadas ao regime, assim como contra três entidades do país.

Os países membros aprovaram as sanções porque consideram que as pessoas e entidades envolvidas cometeram “graves violações dos direitos humanos” e apoiaram as eleições “fraudulentas” de novembro de 2021, nas quais Ortega se reelegeu sem enfrentar os principais opositores nas urnas, todos presos pelo regime.

Como é a vida na Nicarágua?

Hoje, a Nicarágua é um país dominado pelo medo, como mostrou a matéria publicada pelo Estadão em uma série de reportagens especiais sobre a esquerda na América Latina.

Como na antiga União Soviética, as pessoas têm receio de emitir suas opiniões em público e são vigiadas por “espiões de quarteirão” do regime, que fazem parte dos Conselhos de Poder Cidadão (PCC), empoderados por Ortega.

Talvez, por isso, a Nicarágua tenha sido chamada pelo jornal espanhol El País de “Gulag latino-americano”, em referência aos campos de trabalhos forçados destinados a prisioneiros políticos e cidadãos que se opunham ao regime comunista soviético, principalmente durante o governo de Josef Stalin, que comandou a ex-URSS com mão de ferro por 31 anos. “A Nicarágua se transformou num Estado policial”, afirma Chamorro.

O ditador da Nicarágua e sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo Foto: Alfredo Zuniga/AP

Isolado pelas sanções que lhe foram impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia, estendidas a seus familiares e a autoridades do governo, Ortega se escora hoje, mais que nunca, em países como Cuba, Venezuela, Irã, Coreia do Norte, China e Rússia. Contra as grandes democracias ocidentais, ficou do lado de Vladimir Putin na invasão da Ucrânia pela Rússia, e expulsou a OEA (Organização dos Estados Americanos) da Nicarágua, depois de a entidade criticar as “eleições” realizadas em novembro de 2021.

Perseguição da Igreja Católica

Num movimento que já levou o papa Francisco a expressar sua “preocupação”, o regime desencadeou também uma onda repressiva contra autoridades da Igreja Católica, que culminou com a prisão do bispo Rolando Álvarez, em meados de agosto, depois de ele e seus auxiliares ficarem cerca de duas semanas confinados, sob vigilância policial, no arcebispado de Matagualpa (a 131 km de Manágua).

Nos últimos meses, o governo também expulsou do país 18 freiras da congregação Missionárias da Caridade, fundada por Madre Teresa de Calcutá, e o núncio apostólico Waldemar Stanislaw Sommertag. Fechou, ainda, oito emissoras de rádio católicas e forçou a exclusão de três canais ligados à Igreja da TV por assinatura. “O regime está tentando silenciar a Igreja porque ela tem sido a única voz independente na Nicarágua, depois do cancelamento dos partidos políticos de oposição e da prisão de seus líderes”, diz o ex-ministro Humberto Belli.

Além da repressão contra religiosos, líderes e partidos políticos e a imprensa independente, cerca de 1.400 ONGs (organizações não governamentais) humanitárias e de defesa dos direitos humanos e pelo menos cinco universidades privadas, que agora deverão ser administradas pelo governo, tiveram suas licenças para funcionar canceladas.

“Na Nicarágua, não existe mais autonomia universitária. As universidades têm de seguir o currículo que o Estado dita, porque elas sabem que podem ser fechadas a qualquer momento se o governo achar que não estão seguindo as políticas que ele quer ditar”, afirma Belli. “Acredito que vão demandar de todas as escolas de nível médio e elementar que sigam só o currículo determinado pelo governo, incluindo a propaganda que ele promove para se apresentar como salvador da Nicarágua.”

Nem mesmo ex-companheiros de Ortega – que deixaram o partido da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e fundaram o Movimento de Renovação Sandinista (MRS), hoje rebatizado de União Democratica Renovadora (Unamos) – escaparam das garras do regime.

A ex-guerrilheira Dora Maria Tellez, de 66 anos, chamada de “Comandante 2″, foi condenada a 8 anos de prisão por suposta “conspiração”. O general aposentado, Hugo Torres, um dos líderes do movimento sandinista nos anos 1970, chamado de “Comandante Uno”, morreu na prisão antes de ser julgado.

Num vídeo gravado em junho de 2021, pouco antes de ser detido pelas forças de segurança, Torres afirmou: “Há 46 anos, arrisquei a minha vida para tirar Daniel Ortega e outros prisioneiros políticos-colegas da prisão. Hoje, tenho 73 anos. Nesta fase da minha vida, nunca pensei que estaria lutando contra outra ditadura mais brutal, mais inescrupulosa, mais irracional e mais autocrática do que a ditadura de Somoza”.

Para amparar suas ações autoritárias, Ortega aprovou uma série de leis que cerceiam os direitos e as liberdades dos cidadãos desde os protestos de 2018. Em outubro de 2020, sob a desculpa de regular a área digital e punir propagadores de fake news, a Assembleia Nacional, que ele controla, aprovou a Lei Especial de Crimes Cibernéticos.

O governo dos Estados Unidos adotou novas medidas para tentar isolar a Nicarágua economicamente.

O presidente Joe Biden assinou na segunda-feira, 24, uma ordem executiva que proíbe empresas americanas de fazer negócios que envolvam ouro ou outros produtos minerais na Nicarágua.

O Departamento do Tesouro dos EUA impôs sanções ao chefe do órgão responsável pelas atividades ligadas à mineração da Nicarágua e um um dirigente do governo, disse o departamento.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega Foto: Cesar Perez/Presidência da Nicarágua via Reuters

Entenda quais os efeitos destas sanções:

Quem é o presidente na Nicarágua?

Nos anos 1970, o então guerrilheiro Daniel Ortega combatia a ditadura de Anastasio Somoza ao lado de figuras que se tornaram símbolos da política da Nicarágua, como Dora María Téllez, Víctor Hugo Tinoco e Hugo Torres.

Hoje, passados 49 anos de atos importantes para a derrubada de Somoza, o presidente Ortega é o responsável pela prisão dos três ex-companheiros, de dezenas de outros opositores, do silenciamento da mídia e da perseguição à Igreja Católica. Desde 2018, ele se consolida como autocrata no poder, despertando a atenção e as críticas internacionais.

Daniel Ortega está no poder de forma ininterrupta desde 2007 e, em novembro do ano passado, venceu uma eleição de fachada que o habilitou a um quarto mandato consecutivo. A eleição não foi reconhecida pela maior parte da comunidade internacional porque o regime prendeu, sob acusações de lavagem de dinheiro e traição à pátria, sete candidatos opositores.

A repressão de Ortega se intensificou depois de 2018, quando protestos contra a ditadura acabaram com mais de 300 manifestantes mortos, após a repressão brutal por forças de segurança e grupos paramilitares alinhados ao regime.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega e a vice-presidente, Rosario Murillo Foto: Oswaldo Rivas/Reuters

“Desde que Ortega assumiu o poder em 2007, iniciou um processo de controle das instituições do Estado e a privatizar os resultados da cooperação econômica petroleira com a Venezuela. Isso foi destruindo a institucionalidade do país e cada vez mais limitando o exercício dos direitos democráticos”, afirmou ao Estadão o jornalista nicaraguense que vive na Alemanha Héctor Mairena.

Em 2009, o Supremo Tribunal de Justiça da Nicarágua permitiu que Ortega concorresse a um segundo mandato consecutivo. Em seguida, uma emenda constitucional aprovada em 2014 por seu partido, que ainda controla a Assembleia Nacional, derrubou os limites de mandato. Em 2016, Ortega concorre e vence novamente.

Em abril de 2018, Ortega decretou uma reforma no sistema de pensões dos aposentados, que começaram a protestar. Com a repressão policial, grupos universitários se uniram aos protestos, que rapidamente se espalharam pelo país. A partir de então, as prisões de políticos se tornaram mais comuns na Nicarágua.

Desde 2020, novas leis foram aprovadas sob o governo de Ortega e sua mulher, Rosario Murillo, e têm levado à prisão ou fuga de opositores. Em julho deste ano, o principal jornal independente, La Prensa, retirou todos os seus funcionários do país.

Há menos de duas semanas, em 13 de outubro, o Parlamento aprovou uma legislação para controlar a produção audiovisual do país, classificada como censura. O regime também tem avançado contra a Igreja Católica, a qual chamou recentemente de “ditadura perfeita”.

Como as sanções dos EUA afetam a ditadura de Daniel Ortega?

Os poderes de sanções ampliados da ordem também podem ser usados para bloquear novos investimentos dos EUA em certos outros setores na Nicarágua, a importação de certos produtos nicaraguenses ou a exportação de certos itens para a Nicarágua, afirmou o departamento.

“Os ataques contínuos do regime de Ortega-Murillo a atores democráticos e membros da sociedade civil e a detenção injusta de presos políticos demonstram que o regime sente que não está vinculado ao Estado de Direito”, disse o subsecretário do Tesouro para Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian Nelson.

Ele afirmou que as ações dos EUA visam negar-lhes “os recursos de que precisam para continuar a minar as instituições democráticas na Nicarágua”.

As sanções miram especialmente a chefia da Direção-Geral de Minas, que administra as maiores operações, e especificamente Reinaldo Gregorio Lenin Cerna Juárez, descrito pelo Departamento do Tesouro americano como confidente próximo de Ortega.

O ouro foi o principal produto de exportação da Nicarágua no ano passado, movimentando US$ 867,6 milhões (R$ 4,6 bilhões). Do total, 79% das vendas foram para os EUA, de acordo com dados do Banco Central do país.

Segundo o Banco Mundial, a economia do país da América Central cresceu 10,3% em 2021, principalmente graças a remessas de nicaraguenses que vivem nos EUA e a exportações de ouro e café. Neste ano, porém, a atividade econômica deve enfrentar uma queda acentuada.

O governo Biden também impôs nesta segunda restrições a 500 pessoas e suas famílias que “trabalhem para o governo da Nicarágua ou formulem, implementem ou se beneficiem” de políticas que minem as instituições democráticas do país.

Há outras sanções contra a Nicarágua?

Não são as primeiras sanções do tipo anunciadas pelo governo democrata. Em junho, a Casa Branca já havia avançado contra a estatal de mineração Eniminas. No mês seguinte, retirou o país da lista de nações com quotas com tarifas baixas para importação de cana-de-açúcar.

A União Europeia também aprovou uma série de sanções desde 2020 contra uma filha e um filho do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, e outras cinco pessoas ligadas ao regime, assim como contra três entidades do país.

Os países membros aprovaram as sanções porque consideram que as pessoas e entidades envolvidas cometeram “graves violações dos direitos humanos” e apoiaram as eleições “fraudulentas” de novembro de 2021, nas quais Ortega se reelegeu sem enfrentar os principais opositores nas urnas, todos presos pelo regime.

Como é a vida na Nicarágua?

Hoje, a Nicarágua é um país dominado pelo medo, como mostrou a matéria publicada pelo Estadão em uma série de reportagens especiais sobre a esquerda na América Latina.

Como na antiga União Soviética, as pessoas têm receio de emitir suas opiniões em público e são vigiadas por “espiões de quarteirão” do regime, que fazem parte dos Conselhos de Poder Cidadão (PCC), empoderados por Ortega.

Talvez, por isso, a Nicarágua tenha sido chamada pelo jornal espanhol El País de “Gulag latino-americano”, em referência aos campos de trabalhos forçados destinados a prisioneiros políticos e cidadãos que se opunham ao regime comunista soviético, principalmente durante o governo de Josef Stalin, que comandou a ex-URSS com mão de ferro por 31 anos. “A Nicarágua se transformou num Estado policial”, afirma Chamorro.

O ditador da Nicarágua e sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo Foto: Alfredo Zuniga/AP

Isolado pelas sanções que lhe foram impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia, estendidas a seus familiares e a autoridades do governo, Ortega se escora hoje, mais que nunca, em países como Cuba, Venezuela, Irã, Coreia do Norte, China e Rússia. Contra as grandes democracias ocidentais, ficou do lado de Vladimir Putin na invasão da Ucrânia pela Rússia, e expulsou a OEA (Organização dos Estados Americanos) da Nicarágua, depois de a entidade criticar as “eleições” realizadas em novembro de 2021.

Perseguição da Igreja Católica

Num movimento que já levou o papa Francisco a expressar sua “preocupação”, o regime desencadeou também uma onda repressiva contra autoridades da Igreja Católica, que culminou com a prisão do bispo Rolando Álvarez, em meados de agosto, depois de ele e seus auxiliares ficarem cerca de duas semanas confinados, sob vigilância policial, no arcebispado de Matagualpa (a 131 km de Manágua).

Nos últimos meses, o governo também expulsou do país 18 freiras da congregação Missionárias da Caridade, fundada por Madre Teresa de Calcutá, e o núncio apostólico Waldemar Stanislaw Sommertag. Fechou, ainda, oito emissoras de rádio católicas e forçou a exclusão de três canais ligados à Igreja da TV por assinatura. “O regime está tentando silenciar a Igreja porque ela tem sido a única voz independente na Nicarágua, depois do cancelamento dos partidos políticos de oposição e da prisão de seus líderes”, diz o ex-ministro Humberto Belli.

Além da repressão contra religiosos, líderes e partidos políticos e a imprensa independente, cerca de 1.400 ONGs (organizações não governamentais) humanitárias e de defesa dos direitos humanos e pelo menos cinco universidades privadas, que agora deverão ser administradas pelo governo, tiveram suas licenças para funcionar canceladas.

“Na Nicarágua, não existe mais autonomia universitária. As universidades têm de seguir o currículo que o Estado dita, porque elas sabem que podem ser fechadas a qualquer momento se o governo achar que não estão seguindo as políticas que ele quer ditar”, afirma Belli. “Acredito que vão demandar de todas as escolas de nível médio e elementar que sigam só o currículo determinado pelo governo, incluindo a propaganda que ele promove para se apresentar como salvador da Nicarágua.”

Nem mesmo ex-companheiros de Ortega – que deixaram o partido da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e fundaram o Movimento de Renovação Sandinista (MRS), hoje rebatizado de União Democratica Renovadora (Unamos) – escaparam das garras do regime.

A ex-guerrilheira Dora Maria Tellez, de 66 anos, chamada de “Comandante 2″, foi condenada a 8 anos de prisão por suposta “conspiração”. O general aposentado, Hugo Torres, um dos líderes do movimento sandinista nos anos 1970, chamado de “Comandante Uno”, morreu na prisão antes de ser julgado.

Num vídeo gravado em junho de 2021, pouco antes de ser detido pelas forças de segurança, Torres afirmou: “Há 46 anos, arrisquei a minha vida para tirar Daniel Ortega e outros prisioneiros políticos-colegas da prisão. Hoje, tenho 73 anos. Nesta fase da minha vida, nunca pensei que estaria lutando contra outra ditadura mais brutal, mais inescrupulosa, mais irracional e mais autocrática do que a ditadura de Somoza”.

Para amparar suas ações autoritárias, Ortega aprovou uma série de leis que cerceiam os direitos e as liberdades dos cidadãos desde os protestos de 2018. Em outubro de 2020, sob a desculpa de regular a área digital e punir propagadores de fake news, a Assembleia Nacional, que ele controla, aprovou a Lei Especial de Crimes Cibernéticos.

O governo dos Estados Unidos adotou novas medidas para tentar isolar a Nicarágua economicamente.

O presidente Joe Biden assinou na segunda-feira, 24, uma ordem executiva que proíbe empresas americanas de fazer negócios que envolvam ouro ou outros produtos minerais na Nicarágua.

O Departamento do Tesouro dos EUA impôs sanções ao chefe do órgão responsável pelas atividades ligadas à mineração da Nicarágua e um um dirigente do governo, disse o departamento.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega Foto: Cesar Perez/Presidência da Nicarágua via Reuters

Entenda quais os efeitos destas sanções:

Quem é o presidente na Nicarágua?

Nos anos 1970, o então guerrilheiro Daniel Ortega combatia a ditadura de Anastasio Somoza ao lado de figuras que se tornaram símbolos da política da Nicarágua, como Dora María Téllez, Víctor Hugo Tinoco e Hugo Torres.

Hoje, passados 49 anos de atos importantes para a derrubada de Somoza, o presidente Ortega é o responsável pela prisão dos três ex-companheiros, de dezenas de outros opositores, do silenciamento da mídia e da perseguição à Igreja Católica. Desde 2018, ele se consolida como autocrata no poder, despertando a atenção e as críticas internacionais.

Daniel Ortega está no poder de forma ininterrupta desde 2007 e, em novembro do ano passado, venceu uma eleição de fachada que o habilitou a um quarto mandato consecutivo. A eleição não foi reconhecida pela maior parte da comunidade internacional porque o regime prendeu, sob acusações de lavagem de dinheiro e traição à pátria, sete candidatos opositores.

A repressão de Ortega se intensificou depois de 2018, quando protestos contra a ditadura acabaram com mais de 300 manifestantes mortos, após a repressão brutal por forças de segurança e grupos paramilitares alinhados ao regime.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega e a vice-presidente, Rosario Murillo Foto: Oswaldo Rivas/Reuters

“Desde que Ortega assumiu o poder em 2007, iniciou um processo de controle das instituições do Estado e a privatizar os resultados da cooperação econômica petroleira com a Venezuela. Isso foi destruindo a institucionalidade do país e cada vez mais limitando o exercício dos direitos democráticos”, afirmou ao Estadão o jornalista nicaraguense que vive na Alemanha Héctor Mairena.

Em 2009, o Supremo Tribunal de Justiça da Nicarágua permitiu que Ortega concorresse a um segundo mandato consecutivo. Em seguida, uma emenda constitucional aprovada em 2014 por seu partido, que ainda controla a Assembleia Nacional, derrubou os limites de mandato. Em 2016, Ortega concorre e vence novamente.

Em abril de 2018, Ortega decretou uma reforma no sistema de pensões dos aposentados, que começaram a protestar. Com a repressão policial, grupos universitários se uniram aos protestos, que rapidamente se espalharam pelo país. A partir de então, as prisões de políticos se tornaram mais comuns na Nicarágua.

Desde 2020, novas leis foram aprovadas sob o governo de Ortega e sua mulher, Rosario Murillo, e têm levado à prisão ou fuga de opositores. Em julho deste ano, o principal jornal independente, La Prensa, retirou todos os seus funcionários do país.

Há menos de duas semanas, em 13 de outubro, o Parlamento aprovou uma legislação para controlar a produção audiovisual do país, classificada como censura. O regime também tem avançado contra a Igreja Católica, a qual chamou recentemente de “ditadura perfeita”.

Como as sanções dos EUA afetam a ditadura de Daniel Ortega?

Os poderes de sanções ampliados da ordem também podem ser usados para bloquear novos investimentos dos EUA em certos outros setores na Nicarágua, a importação de certos produtos nicaraguenses ou a exportação de certos itens para a Nicarágua, afirmou o departamento.

“Os ataques contínuos do regime de Ortega-Murillo a atores democráticos e membros da sociedade civil e a detenção injusta de presos políticos demonstram que o regime sente que não está vinculado ao Estado de Direito”, disse o subsecretário do Tesouro para Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian Nelson.

Ele afirmou que as ações dos EUA visam negar-lhes “os recursos de que precisam para continuar a minar as instituições democráticas na Nicarágua”.

As sanções miram especialmente a chefia da Direção-Geral de Minas, que administra as maiores operações, e especificamente Reinaldo Gregorio Lenin Cerna Juárez, descrito pelo Departamento do Tesouro americano como confidente próximo de Ortega.

O ouro foi o principal produto de exportação da Nicarágua no ano passado, movimentando US$ 867,6 milhões (R$ 4,6 bilhões). Do total, 79% das vendas foram para os EUA, de acordo com dados do Banco Central do país.

Segundo o Banco Mundial, a economia do país da América Central cresceu 10,3% em 2021, principalmente graças a remessas de nicaraguenses que vivem nos EUA e a exportações de ouro e café. Neste ano, porém, a atividade econômica deve enfrentar uma queda acentuada.

O governo Biden também impôs nesta segunda restrições a 500 pessoas e suas famílias que “trabalhem para o governo da Nicarágua ou formulem, implementem ou se beneficiem” de políticas que minem as instituições democráticas do país.

Há outras sanções contra a Nicarágua?

Não são as primeiras sanções do tipo anunciadas pelo governo democrata. Em junho, a Casa Branca já havia avançado contra a estatal de mineração Eniminas. No mês seguinte, retirou o país da lista de nações com quotas com tarifas baixas para importação de cana-de-açúcar.

A União Europeia também aprovou uma série de sanções desde 2020 contra uma filha e um filho do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, e outras cinco pessoas ligadas ao regime, assim como contra três entidades do país.

Os países membros aprovaram as sanções porque consideram que as pessoas e entidades envolvidas cometeram “graves violações dos direitos humanos” e apoiaram as eleições “fraudulentas” de novembro de 2021, nas quais Ortega se reelegeu sem enfrentar os principais opositores nas urnas, todos presos pelo regime.

Como é a vida na Nicarágua?

Hoje, a Nicarágua é um país dominado pelo medo, como mostrou a matéria publicada pelo Estadão em uma série de reportagens especiais sobre a esquerda na América Latina.

Como na antiga União Soviética, as pessoas têm receio de emitir suas opiniões em público e são vigiadas por “espiões de quarteirão” do regime, que fazem parte dos Conselhos de Poder Cidadão (PCC), empoderados por Ortega.

Talvez, por isso, a Nicarágua tenha sido chamada pelo jornal espanhol El País de “Gulag latino-americano”, em referência aos campos de trabalhos forçados destinados a prisioneiros políticos e cidadãos que se opunham ao regime comunista soviético, principalmente durante o governo de Josef Stalin, que comandou a ex-URSS com mão de ferro por 31 anos. “A Nicarágua se transformou num Estado policial”, afirma Chamorro.

O ditador da Nicarágua e sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo Foto: Alfredo Zuniga/AP

Isolado pelas sanções que lhe foram impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia, estendidas a seus familiares e a autoridades do governo, Ortega se escora hoje, mais que nunca, em países como Cuba, Venezuela, Irã, Coreia do Norte, China e Rússia. Contra as grandes democracias ocidentais, ficou do lado de Vladimir Putin na invasão da Ucrânia pela Rússia, e expulsou a OEA (Organização dos Estados Americanos) da Nicarágua, depois de a entidade criticar as “eleições” realizadas em novembro de 2021.

Perseguição da Igreja Católica

Num movimento que já levou o papa Francisco a expressar sua “preocupação”, o regime desencadeou também uma onda repressiva contra autoridades da Igreja Católica, que culminou com a prisão do bispo Rolando Álvarez, em meados de agosto, depois de ele e seus auxiliares ficarem cerca de duas semanas confinados, sob vigilância policial, no arcebispado de Matagualpa (a 131 km de Manágua).

Nos últimos meses, o governo também expulsou do país 18 freiras da congregação Missionárias da Caridade, fundada por Madre Teresa de Calcutá, e o núncio apostólico Waldemar Stanislaw Sommertag. Fechou, ainda, oito emissoras de rádio católicas e forçou a exclusão de três canais ligados à Igreja da TV por assinatura. “O regime está tentando silenciar a Igreja porque ela tem sido a única voz independente na Nicarágua, depois do cancelamento dos partidos políticos de oposição e da prisão de seus líderes”, diz o ex-ministro Humberto Belli.

Além da repressão contra religiosos, líderes e partidos políticos e a imprensa independente, cerca de 1.400 ONGs (organizações não governamentais) humanitárias e de defesa dos direitos humanos e pelo menos cinco universidades privadas, que agora deverão ser administradas pelo governo, tiveram suas licenças para funcionar canceladas.

“Na Nicarágua, não existe mais autonomia universitária. As universidades têm de seguir o currículo que o Estado dita, porque elas sabem que podem ser fechadas a qualquer momento se o governo achar que não estão seguindo as políticas que ele quer ditar”, afirma Belli. “Acredito que vão demandar de todas as escolas de nível médio e elementar que sigam só o currículo determinado pelo governo, incluindo a propaganda que ele promove para se apresentar como salvador da Nicarágua.”

Nem mesmo ex-companheiros de Ortega – que deixaram o partido da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e fundaram o Movimento de Renovação Sandinista (MRS), hoje rebatizado de União Democratica Renovadora (Unamos) – escaparam das garras do regime.

A ex-guerrilheira Dora Maria Tellez, de 66 anos, chamada de “Comandante 2″, foi condenada a 8 anos de prisão por suposta “conspiração”. O general aposentado, Hugo Torres, um dos líderes do movimento sandinista nos anos 1970, chamado de “Comandante Uno”, morreu na prisão antes de ser julgado.

Num vídeo gravado em junho de 2021, pouco antes de ser detido pelas forças de segurança, Torres afirmou: “Há 46 anos, arrisquei a minha vida para tirar Daniel Ortega e outros prisioneiros políticos-colegas da prisão. Hoje, tenho 73 anos. Nesta fase da minha vida, nunca pensei que estaria lutando contra outra ditadura mais brutal, mais inescrupulosa, mais irracional e mais autocrática do que a ditadura de Somoza”.

Para amparar suas ações autoritárias, Ortega aprovou uma série de leis que cerceiam os direitos e as liberdades dos cidadãos desde os protestos de 2018. Em outubro de 2020, sob a desculpa de regular a área digital e punir propagadores de fake news, a Assembleia Nacional, que ele controla, aprovou a Lei Especial de Crimes Cibernéticos.

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