Depois de emprestarem os seus deputados para que Pedro Sánchez pudesse governar novamente, os independentistas catalães e bascos veem a nova legislatura na Espanha do líder socialista como uma grande oportunidade para avançar em suas aspirações.
Na Espanha, as 17 regiões, conhecidas como “comunidades autônomas”, têm amplos poderes desde a restauração da democracia após o fim da ditadura franquista em 1975, principalmente em questões de saúde e educação.
Mas o País Basco, no norte, e a Catalunha, ao noroeste, têm ainda mais. Essas regiões têm suas próprias polícias, por exemplo, e suas próprias línguas — assim como a Galícia, no noroeste —que são cooficiais no país e dominantes na educação.
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Esse altíssimo nível de autonomia não apagou, entretanto, o sentimento separatista na Catalunha, palco de uma tentativa de secessão em 2017, nem no País Basco, abalado até 2011 pela luta armada do grupo separatista ETA, onde os herdeiros de sua vitrine política continuam exercendo uma influência considerável.
No poder desde 2018, Pedro Sánchez teve que negociar a aprovação de suas reformas com os partidos dessas duas regiões nos últimos anos, algo que será ainda mais necessário após as últimas eleições legislativas de 23 de julho, nas quais não obteve uma maioria clara.
“Com seu voto, os cidadãos espanhóis nos disseram em 23 de julho passado que a Espanha só pode ser governada se reconhecermos o pluralismo político de nosso país e também sua diversidade territorial”, reconheceu Sánchez no sábado em um evento dos socialistas europeus.
Anistia e transferência de poderes
Como consequência, essas formações estão decididas a arrancar todas as concessões possíveis a Sánchez. Os independentistas catalães, por exemplo, conseguiram nos últimos dias que seja impulsionada uma lei de anistia para seus líderes e militantes perseguidos pela justiça pela tentativa de secessão de 2017, entre eles Carles Puigdemont.
Também conseguiram que se anulem 15 milhões de euros de dívidas da Catalunha com o Estado, ou a gestão dos trens na região, e acreditam que chegou “a hora de avançar (...) até o referendo” de independência, proclamou o presidente regional catalão, Pere Aragonés.
“Se abre uma nova oportunidade e pode ser o momento de dar novos passos” até “o autogoverno das nacionalidades históricas” declarou o o presidente do governo regional basco, Iñigo Urkullu, do Partido Nacionalista Basco (PNV), em referência ao País Basco, à Catalunha e à Galícia.
Sua formação obteve na sexta-feira, 10, novas transferências de competências do governo central. A nova legislatura de Sánchez permitirá “estabelecer o acampamento base para a ascensão à república basca”, estimou o Sortu, formação que integra a coalizão independentista basca EH Bildu, em um documento interno divulgado pelo jornal El País.
Antes disso, Sánchez e seus aliados aprovaram o uso do catalão, basco e galego no Parlamento e iniciaram a batalha para que possam ser usados nas instituições europeias, embora isso dependa de seus parceiros europeus.
Muro intransponível
Para Ana Sofía Cardenal, cientista política da Universidade Aberta da Catalunha, “os acordos fortalecem esses partido dentro de seus territórios”. No entanto, acrescentou, “não necessariamente os aproximam de seus objetivos; pelo contrário, os devolvem ao tabuleiro político e, portanto, ao que é possível”.
“Embora o Partido Socialista Operário Espanhol possa agora conceder uma anistia, não aceitará um referendo. E esse é um muro que terão que enfrentar e explicar a seus seguidores”, concluiu Cardenal.
Nesse sentido, Xavier Arbós, professor de Direito Constitucional, lembrou recentemente em um artigo no El Periódico, que uma independência à força sem acordo com Madri, como a tentada na Catalunha em 2017, esbarraria em um “muro intransponível”.
“O artigo 2″ da Constituição, “que proclama a ‘indissolúvel unidade da Nação espanhola’, é um muro intransponível, a menos que ocorra uma difícil reforma constitucional pelo artigo 168 da Constituição”.
Uma reforma que exigiria o apoio de dois terços dos deputados e senadores, e não teria, portanto, nenhuma chance de prosperar sem o apoio da direita./AFP.