O custo do autoritarismo


Comandantes russos não recebem dados suficientes dos líderes civis para preparar suas tropas

Por Lourival Sant'Anna

As derrotas táticas da Rússia na Ucrânia indicam que as disfuncionalidades do regime russo se refletem em suas Forças Armadas. Essa é uma constatação fundamental, na análise do balanço de forças entre democracias e autocracias – o grande embate de nosso tempo.

Antes da invasão, analistas militares ocidentais calculavam que as forças mobilizadas pela Rússia não eram suficientes para dominar o lado ocidental do Rio Dnipro, que divide a Ucrânia ao meio e banha Kiev. Elas poderiam ocupar o leste e a costa sul.

Essa estimativa nem sequer levava em conta duas informações, que só se revelaram depois da invasão: a capacidade dos soldados ucranianos de fazer bom uso do armamento portátil a sua disposição, em especial os mísseis antiaéreos americanos Stinger, os mísseis antitanque Javalin (também americanos) e NLAW (anglo-suecos) e os drones turcos Bayraktar; as falhas de comando e controle, planejamento e logística, somadas à qualidade e moral baixos dos militares russos.

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Ignorando todos esses cálculos e também os fatores adversos que sobreviriam, o presidente Vladimir Putin lançou uma campanha para tomar toda a Ucrânia. No início de março, já na segunda semana da ofensiva, ficou evidente que as forças terrestres russas não conseguiam avançar. Os grupos russos de batalhões táticos foram parados pelas forças ucranianas, e sofreram pesadas baixas e perdas materiais. Para compensar o insucesso no terreno, os militares russos intensificaram os bombardeios, sobretudo de áreas civis. A isso se somaram os cercos de algumas cidades, os cortes de suprimentos de água, alimentos e energia para aquecimento.

Todo o horror causado na população não teve o efeito esperado, de obrigar as autoridades locais a se renderem. Os russos então firmaram acordos de tréguas para a saída de civis, e os violaram, atacando os comboios humanitários, para agravar o desespero. Mas os ucranianos continuaram impondo-lhes derrotas.

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A Rússia afirmou que a Ucrânia bombardeou um depósito de gasolina em seu território Foto: TVE

Foi por isso que o Estado-Maior do Exército russo anunciou a retirada das tropas do território ocidental e a concentração dos esforços no leste. Não se sabe se a revisão dos objetivos é tática ou permanente.

A retirada assegura as linhas de suprimento dos países da Otan para a Ucrânia, que com isso poderá manter e talvez elevar o esforço de guerra. O ataque por dois helicópteros a um depósito de combustível que era usado para abastecer os veículos militares russos em Belgorod, perto da fronteira, pode ser sinal da elevação do poder de contraofensiva.

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O Exército russo é capaz de destruir, mas não de dominar, como pretendia Putin. Em parte, é o custo da opacidade e autoritarismo do regime. Os comandantes russos não têm informações suficientes da liderança civil para preparar adequadamente suas tropas para as missões. Recebem a tarefa, mas não entendem o propósito.

* É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS

As derrotas táticas da Rússia na Ucrânia indicam que as disfuncionalidades do regime russo se refletem em suas Forças Armadas. Essa é uma constatação fundamental, na análise do balanço de forças entre democracias e autocracias – o grande embate de nosso tempo.

Antes da invasão, analistas militares ocidentais calculavam que as forças mobilizadas pela Rússia não eram suficientes para dominar o lado ocidental do Rio Dnipro, que divide a Ucrânia ao meio e banha Kiev. Elas poderiam ocupar o leste e a costa sul.

Essa estimativa nem sequer levava em conta duas informações, que só se revelaram depois da invasão: a capacidade dos soldados ucranianos de fazer bom uso do armamento portátil a sua disposição, em especial os mísseis antiaéreos americanos Stinger, os mísseis antitanque Javalin (também americanos) e NLAW (anglo-suecos) e os drones turcos Bayraktar; as falhas de comando e controle, planejamento e logística, somadas à qualidade e moral baixos dos militares russos.

Ignorando todos esses cálculos e também os fatores adversos que sobreviriam, o presidente Vladimir Putin lançou uma campanha para tomar toda a Ucrânia. No início de março, já na segunda semana da ofensiva, ficou evidente que as forças terrestres russas não conseguiam avançar. Os grupos russos de batalhões táticos foram parados pelas forças ucranianas, e sofreram pesadas baixas e perdas materiais. Para compensar o insucesso no terreno, os militares russos intensificaram os bombardeios, sobretudo de áreas civis. A isso se somaram os cercos de algumas cidades, os cortes de suprimentos de água, alimentos e energia para aquecimento.

Todo o horror causado na população não teve o efeito esperado, de obrigar as autoridades locais a se renderem. Os russos então firmaram acordos de tréguas para a saída de civis, e os violaram, atacando os comboios humanitários, para agravar o desespero. Mas os ucranianos continuaram impondo-lhes derrotas.

A Rússia afirmou que a Ucrânia bombardeou um depósito de gasolina em seu território Foto: TVE

Foi por isso que o Estado-Maior do Exército russo anunciou a retirada das tropas do território ocidental e a concentração dos esforços no leste. Não se sabe se a revisão dos objetivos é tática ou permanente.

A retirada assegura as linhas de suprimento dos países da Otan para a Ucrânia, que com isso poderá manter e talvez elevar o esforço de guerra. O ataque por dois helicópteros a um depósito de combustível que era usado para abastecer os veículos militares russos em Belgorod, perto da fronteira, pode ser sinal da elevação do poder de contraofensiva.

O Exército russo é capaz de destruir, mas não de dominar, como pretendia Putin. Em parte, é o custo da opacidade e autoritarismo do regime. Os comandantes russos não têm informações suficientes da liderança civil para preparar adequadamente suas tropas para as missões. Recebem a tarefa, mas não entendem o propósito.

* É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS

As derrotas táticas da Rússia na Ucrânia indicam que as disfuncionalidades do regime russo se refletem em suas Forças Armadas. Essa é uma constatação fundamental, na análise do balanço de forças entre democracias e autocracias – o grande embate de nosso tempo.

Antes da invasão, analistas militares ocidentais calculavam que as forças mobilizadas pela Rússia não eram suficientes para dominar o lado ocidental do Rio Dnipro, que divide a Ucrânia ao meio e banha Kiev. Elas poderiam ocupar o leste e a costa sul.

Essa estimativa nem sequer levava em conta duas informações, que só se revelaram depois da invasão: a capacidade dos soldados ucranianos de fazer bom uso do armamento portátil a sua disposição, em especial os mísseis antiaéreos americanos Stinger, os mísseis antitanque Javalin (também americanos) e NLAW (anglo-suecos) e os drones turcos Bayraktar; as falhas de comando e controle, planejamento e logística, somadas à qualidade e moral baixos dos militares russos.

Ignorando todos esses cálculos e também os fatores adversos que sobreviriam, o presidente Vladimir Putin lançou uma campanha para tomar toda a Ucrânia. No início de março, já na segunda semana da ofensiva, ficou evidente que as forças terrestres russas não conseguiam avançar. Os grupos russos de batalhões táticos foram parados pelas forças ucranianas, e sofreram pesadas baixas e perdas materiais. Para compensar o insucesso no terreno, os militares russos intensificaram os bombardeios, sobretudo de áreas civis. A isso se somaram os cercos de algumas cidades, os cortes de suprimentos de água, alimentos e energia para aquecimento.

Todo o horror causado na população não teve o efeito esperado, de obrigar as autoridades locais a se renderem. Os russos então firmaram acordos de tréguas para a saída de civis, e os violaram, atacando os comboios humanitários, para agravar o desespero. Mas os ucranianos continuaram impondo-lhes derrotas.

A Rússia afirmou que a Ucrânia bombardeou um depósito de gasolina em seu território Foto: TVE

Foi por isso que o Estado-Maior do Exército russo anunciou a retirada das tropas do território ocidental e a concentração dos esforços no leste. Não se sabe se a revisão dos objetivos é tática ou permanente.

A retirada assegura as linhas de suprimento dos países da Otan para a Ucrânia, que com isso poderá manter e talvez elevar o esforço de guerra. O ataque por dois helicópteros a um depósito de combustível que era usado para abastecer os veículos militares russos em Belgorod, perto da fronteira, pode ser sinal da elevação do poder de contraofensiva.

O Exército russo é capaz de destruir, mas não de dominar, como pretendia Putin. Em parte, é o custo da opacidade e autoritarismo do regime. Os comandantes russos não têm informações suficientes da liderança civil para preparar adequadamente suas tropas para as missões. Recebem a tarefa, mas não entendem o propósito.

* É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS

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