O mundo devia ter agido há 15 anos, após gripe aviária, diz cientista italiano


Para o presidente do Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negrs, de Milão, em seu país prevaleceu o ‘senso de negócios’ e todos devem se preparar para próxima pandemia 

Por Marcelo Godoy

O momento de o mundo se preparar contra a covid-19 foi perdido há quase 15 anos, após surgirem os primeiros casos de gripe aviária, na Ásia. O vírus H5N1, que matou quase uma centena de pessoas, devia ter sido um aviso. Agora, deve aprender com o coronavírus (Sar-Cov-2) e se preparar para a próxima pandemia. É o que diz o médico e farmacologista, Sílvio Garattini, que tem 91 anos. Trancado em casa em Bérgamo, na Lombardia, centro da epidemia que devasta o norte de seu país, o cientista italiano preside desde 1962 o Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negrs, de Milão. 

No início, não se acreditava que a epidemia chegasse a essa situação. Na epidemia de influenza em 1918 foi o mesmo. Por que as coisas são sempre assim?

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Porque não se preparam, sobretudo, porque há a tendência de pensar que aquilo que acontece em países distantes não se verifique depois em nossos países. E nos esquecemos que, em um mundo globalizado, viajamos para qualquer lugar, assim como as mercadorias e os vírus. 

O sr. disse que houve coisas difíceis para entender o que aconteceu na Lombardia. O sr. poderia explicar?

As coisas difíceis são as ligadas às decisões drásticas. Na Lombardia, agiu-se corretamente em Codogno. Nós a isolamos, mas não pensamos nos outros focos da doença. Por exemplo, em Nembro e em Alzano Lombardo, onde foram muitos os infectados. Ali não se tomou a decisão de fechar. E essas cidades são contíguas a Bérgamo, que foi atingida. Depois, fez-se em Bérgamo algo extraordinário. Talvez nenhuma rede hospitalar no mundo fosse capaz desse heroísmo, mas, no começo, foi uma bagunça. Faltavam todos os equipamentos de proteção individual. E ainda agora a defesa civil não consegue enviar à cidade todas as máscaras necessárias. Tudo porque aqui não aconteceu uma preparação adequada para a situação. Claro que, para se preparar, é necessário tempo. Na última hora, faz-se o que se pode.

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O cientista e pesquisador médico italiano Silvio Garattini, presidente e fundador do Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negri Foto: Armando Rotoletti

O sr. chamou a atenção para um excesso de “sentido dos negócios”. O que queria dizer?

Quero dizer que, em vez de fechar rapidamente o que se devia fechar, prevaleceu a ideia de que tudo devia permanecer aberto, como lojas, bares e negócios, em suma, todas esses lugares que têm mais possibilidade de contágio. E, só quando as coisas começaram a ficar mal, é que se tomou a decisão de fechar, salvo os serviços essenciais. Mas devíamos ter fechado tudo o que não era necessário muito antes. Era muito impopular, mas quem é responsável deve tomar a decisão.

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Era possível estar preparado para um vírus assim?

É preciso se preparar antes, ter um plano. Quando tivemos a epidemia da influenza aviária, houve uma grande letalidade. Aquele era o momento, terminada a emergência, de se preparar para a chegada de uma outra epidemia, mas, infelizmente, nada foi feito. O que quero dizer com se preparar? Antes de tudo ter um programa. Ter em mente quais são as coisa fundamentais em que em uma epidemia são importante. A segunda coisa é ter o material, a estrutura e as coisas úteis, se não prontas, ao menos sabendo como fazê-las. E aqui não é errado ter coisas guardadas para que, em pouco tempo, se possa fazer um hospital com tudo o que é necessário para começar a enfrentar a primeira onda do problema.

A maioria das infecções nessa epidemia aconteceram em ambiente hospitalar. Como enfrentar a falta mundial de equipamentos para as equipes médicas?

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O problema devia ser resolvido ao início, quando não havia essa grande competição internacional para ter o material necessário. Tenho consciência de que dizer isso agora é fácil. Essa epidemia nos fez entender que havia muita coisa que erramos ou nem havíamos pensado. É importante não deixar isso para trás quando tudo acabar. Em vez disso, este deve ser o momento para pensar e construir um sistema a fim de que isso não se repita ou, pelo menos, não seja tão ruim.

Como os governos devem gerir as informações na crise?

Deve haver um canal que seja usado pelos governos que represente a voz oficial não deles, mas das pessoas competentes que administram o problema. Isso deve ser feito por pessoas que a opinião pública julgue confiáveis. Se deixar em outras mãos, as pessoas vão pensar que, sendo do governo, vão defender só os interesses do governo e não da população. É preciso que exista uma oficialidade confiável.

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O sr. acompanhou as pesquisas sobre a hidroxicloroquina. A cura está mesmo próxima?

Há substâncias que deram resultados promissores, entre essas a cloroquina, porém, o melhor é fazer as experiência de modo controlado. De outra forma, nos arriscaríamos a tratar pacientes com produtos que, infelizmente, não servem para nada. E, em vez disso, podem até ter efeitos tóxicos. A hidroxicloroquina não pode ser subministrada a todos. Não deve ser dada a pacientes com problemas cardíacos, pois ela pode ser muito tóxica para o coração. Só uma pesquisa clínica controlada poderá verificar sua eficácia.

Desculpe, professor, mas devo cometer uma indiscrição: posso perguntar que precauções o sr. tomou contra o coronavírus?

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Ficar em casa e fazer meu trabalho: os artigos, as entrevistas. Saio só para obter o que comer. A única recomendação que se pode fazer às pessoas é: fiquem em casa, lavem frequentemente as mãos e sigam as regras de higiene aí no Brasil.

O momento de o mundo se preparar contra a covid-19 foi perdido há quase 15 anos, após surgirem os primeiros casos de gripe aviária, na Ásia. O vírus H5N1, que matou quase uma centena de pessoas, devia ter sido um aviso. Agora, deve aprender com o coronavírus (Sar-Cov-2) e se preparar para a próxima pandemia. É o que diz o médico e farmacologista, Sílvio Garattini, que tem 91 anos. Trancado em casa em Bérgamo, na Lombardia, centro da epidemia que devasta o norte de seu país, o cientista italiano preside desde 1962 o Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negrs, de Milão. 

No início, não se acreditava que a epidemia chegasse a essa situação. Na epidemia de influenza em 1918 foi o mesmo. Por que as coisas são sempre assim?

Porque não se preparam, sobretudo, porque há a tendência de pensar que aquilo que acontece em países distantes não se verifique depois em nossos países. E nos esquecemos que, em um mundo globalizado, viajamos para qualquer lugar, assim como as mercadorias e os vírus. 

O sr. disse que houve coisas difíceis para entender o que aconteceu na Lombardia. O sr. poderia explicar?

As coisas difíceis são as ligadas às decisões drásticas. Na Lombardia, agiu-se corretamente em Codogno. Nós a isolamos, mas não pensamos nos outros focos da doença. Por exemplo, em Nembro e em Alzano Lombardo, onde foram muitos os infectados. Ali não se tomou a decisão de fechar. E essas cidades são contíguas a Bérgamo, que foi atingida. Depois, fez-se em Bérgamo algo extraordinário. Talvez nenhuma rede hospitalar no mundo fosse capaz desse heroísmo, mas, no começo, foi uma bagunça. Faltavam todos os equipamentos de proteção individual. E ainda agora a defesa civil não consegue enviar à cidade todas as máscaras necessárias. Tudo porque aqui não aconteceu uma preparação adequada para a situação. Claro que, para se preparar, é necessário tempo. Na última hora, faz-se o que se pode.

O cientista e pesquisador médico italiano Silvio Garattini, presidente e fundador do Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negri Foto: Armando Rotoletti

O sr. chamou a atenção para um excesso de “sentido dos negócios”. O que queria dizer?

Quero dizer que, em vez de fechar rapidamente o que se devia fechar, prevaleceu a ideia de que tudo devia permanecer aberto, como lojas, bares e negócios, em suma, todas esses lugares que têm mais possibilidade de contágio. E, só quando as coisas começaram a ficar mal, é que se tomou a decisão de fechar, salvo os serviços essenciais. Mas devíamos ter fechado tudo o que não era necessário muito antes. Era muito impopular, mas quem é responsável deve tomar a decisão.

Era possível estar preparado para um vírus assim?

É preciso se preparar antes, ter um plano. Quando tivemos a epidemia da influenza aviária, houve uma grande letalidade. Aquele era o momento, terminada a emergência, de se preparar para a chegada de uma outra epidemia, mas, infelizmente, nada foi feito. O que quero dizer com se preparar? Antes de tudo ter um programa. Ter em mente quais são as coisa fundamentais em que em uma epidemia são importante. A segunda coisa é ter o material, a estrutura e as coisas úteis, se não prontas, ao menos sabendo como fazê-las. E aqui não é errado ter coisas guardadas para que, em pouco tempo, se possa fazer um hospital com tudo o que é necessário para começar a enfrentar a primeira onda do problema.

A maioria das infecções nessa epidemia aconteceram em ambiente hospitalar. Como enfrentar a falta mundial de equipamentos para as equipes médicas?

O problema devia ser resolvido ao início, quando não havia essa grande competição internacional para ter o material necessário. Tenho consciência de que dizer isso agora é fácil. Essa epidemia nos fez entender que havia muita coisa que erramos ou nem havíamos pensado. É importante não deixar isso para trás quando tudo acabar. Em vez disso, este deve ser o momento para pensar e construir um sistema a fim de que isso não se repita ou, pelo menos, não seja tão ruim.

Como os governos devem gerir as informações na crise?

Deve haver um canal que seja usado pelos governos que represente a voz oficial não deles, mas das pessoas competentes que administram o problema. Isso deve ser feito por pessoas que a opinião pública julgue confiáveis. Se deixar em outras mãos, as pessoas vão pensar que, sendo do governo, vão defender só os interesses do governo e não da população. É preciso que exista uma oficialidade confiável.

O sr. acompanhou as pesquisas sobre a hidroxicloroquina. A cura está mesmo próxima?

Há substâncias que deram resultados promissores, entre essas a cloroquina, porém, o melhor é fazer as experiência de modo controlado. De outra forma, nos arriscaríamos a tratar pacientes com produtos que, infelizmente, não servem para nada. E, em vez disso, podem até ter efeitos tóxicos. A hidroxicloroquina não pode ser subministrada a todos. Não deve ser dada a pacientes com problemas cardíacos, pois ela pode ser muito tóxica para o coração. Só uma pesquisa clínica controlada poderá verificar sua eficácia.

Desculpe, professor, mas devo cometer uma indiscrição: posso perguntar que precauções o sr. tomou contra o coronavírus?

Ficar em casa e fazer meu trabalho: os artigos, as entrevistas. Saio só para obter o que comer. A única recomendação que se pode fazer às pessoas é: fiquem em casa, lavem frequentemente as mãos e sigam as regras de higiene aí no Brasil.

O momento de o mundo se preparar contra a covid-19 foi perdido há quase 15 anos, após surgirem os primeiros casos de gripe aviária, na Ásia. O vírus H5N1, que matou quase uma centena de pessoas, devia ter sido um aviso. Agora, deve aprender com o coronavírus (Sar-Cov-2) e se preparar para a próxima pandemia. É o que diz o médico e farmacologista, Sílvio Garattini, que tem 91 anos. Trancado em casa em Bérgamo, na Lombardia, centro da epidemia que devasta o norte de seu país, o cientista italiano preside desde 1962 o Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negrs, de Milão. 

No início, não se acreditava que a epidemia chegasse a essa situação. Na epidemia de influenza em 1918 foi o mesmo. Por que as coisas são sempre assim?

Porque não se preparam, sobretudo, porque há a tendência de pensar que aquilo que acontece em países distantes não se verifique depois em nossos países. E nos esquecemos que, em um mundo globalizado, viajamos para qualquer lugar, assim como as mercadorias e os vírus. 

O sr. disse que houve coisas difíceis para entender o que aconteceu na Lombardia. O sr. poderia explicar?

As coisas difíceis são as ligadas às decisões drásticas. Na Lombardia, agiu-se corretamente em Codogno. Nós a isolamos, mas não pensamos nos outros focos da doença. Por exemplo, em Nembro e em Alzano Lombardo, onde foram muitos os infectados. Ali não se tomou a decisão de fechar. E essas cidades são contíguas a Bérgamo, que foi atingida. Depois, fez-se em Bérgamo algo extraordinário. Talvez nenhuma rede hospitalar no mundo fosse capaz desse heroísmo, mas, no começo, foi uma bagunça. Faltavam todos os equipamentos de proteção individual. E ainda agora a defesa civil não consegue enviar à cidade todas as máscaras necessárias. Tudo porque aqui não aconteceu uma preparação adequada para a situação. Claro que, para se preparar, é necessário tempo. Na última hora, faz-se o que se pode.

O cientista e pesquisador médico italiano Silvio Garattini, presidente e fundador do Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negri Foto: Armando Rotoletti

O sr. chamou a atenção para um excesso de “sentido dos negócios”. O que queria dizer?

Quero dizer que, em vez de fechar rapidamente o que se devia fechar, prevaleceu a ideia de que tudo devia permanecer aberto, como lojas, bares e negócios, em suma, todas esses lugares que têm mais possibilidade de contágio. E, só quando as coisas começaram a ficar mal, é que se tomou a decisão de fechar, salvo os serviços essenciais. Mas devíamos ter fechado tudo o que não era necessário muito antes. Era muito impopular, mas quem é responsável deve tomar a decisão.

Era possível estar preparado para um vírus assim?

É preciso se preparar antes, ter um plano. Quando tivemos a epidemia da influenza aviária, houve uma grande letalidade. Aquele era o momento, terminada a emergência, de se preparar para a chegada de uma outra epidemia, mas, infelizmente, nada foi feito. O que quero dizer com se preparar? Antes de tudo ter um programa. Ter em mente quais são as coisa fundamentais em que em uma epidemia são importante. A segunda coisa é ter o material, a estrutura e as coisas úteis, se não prontas, ao menos sabendo como fazê-las. E aqui não é errado ter coisas guardadas para que, em pouco tempo, se possa fazer um hospital com tudo o que é necessário para começar a enfrentar a primeira onda do problema.

A maioria das infecções nessa epidemia aconteceram em ambiente hospitalar. Como enfrentar a falta mundial de equipamentos para as equipes médicas?

O problema devia ser resolvido ao início, quando não havia essa grande competição internacional para ter o material necessário. Tenho consciência de que dizer isso agora é fácil. Essa epidemia nos fez entender que havia muita coisa que erramos ou nem havíamos pensado. É importante não deixar isso para trás quando tudo acabar. Em vez disso, este deve ser o momento para pensar e construir um sistema a fim de que isso não se repita ou, pelo menos, não seja tão ruim.

Como os governos devem gerir as informações na crise?

Deve haver um canal que seja usado pelos governos que represente a voz oficial não deles, mas das pessoas competentes que administram o problema. Isso deve ser feito por pessoas que a opinião pública julgue confiáveis. Se deixar em outras mãos, as pessoas vão pensar que, sendo do governo, vão defender só os interesses do governo e não da população. É preciso que exista uma oficialidade confiável.

O sr. acompanhou as pesquisas sobre a hidroxicloroquina. A cura está mesmo próxima?

Há substâncias que deram resultados promissores, entre essas a cloroquina, porém, o melhor é fazer as experiência de modo controlado. De outra forma, nos arriscaríamos a tratar pacientes com produtos que, infelizmente, não servem para nada. E, em vez disso, podem até ter efeitos tóxicos. A hidroxicloroquina não pode ser subministrada a todos. Não deve ser dada a pacientes com problemas cardíacos, pois ela pode ser muito tóxica para o coração. Só uma pesquisa clínica controlada poderá verificar sua eficácia.

Desculpe, professor, mas devo cometer uma indiscrição: posso perguntar que precauções o sr. tomou contra o coronavírus?

Ficar em casa e fazer meu trabalho: os artigos, as entrevistas. Saio só para obter o que comer. A única recomendação que se pode fazer às pessoas é: fiquem em casa, lavem frequentemente as mãos e sigam as regras de higiene aí no Brasil.

O momento de o mundo se preparar contra a covid-19 foi perdido há quase 15 anos, após surgirem os primeiros casos de gripe aviária, na Ásia. O vírus H5N1, que matou quase uma centena de pessoas, devia ter sido um aviso. Agora, deve aprender com o coronavírus (Sar-Cov-2) e se preparar para a próxima pandemia. É o que diz o médico e farmacologista, Sílvio Garattini, que tem 91 anos. Trancado em casa em Bérgamo, na Lombardia, centro da epidemia que devasta o norte de seu país, o cientista italiano preside desde 1962 o Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negrs, de Milão. 

No início, não se acreditava que a epidemia chegasse a essa situação. Na epidemia de influenza em 1918 foi o mesmo. Por que as coisas são sempre assim?

Porque não se preparam, sobretudo, porque há a tendência de pensar que aquilo que acontece em países distantes não se verifique depois em nossos países. E nos esquecemos que, em um mundo globalizado, viajamos para qualquer lugar, assim como as mercadorias e os vírus. 

O sr. disse que houve coisas difíceis para entender o que aconteceu na Lombardia. O sr. poderia explicar?

As coisas difíceis são as ligadas às decisões drásticas. Na Lombardia, agiu-se corretamente em Codogno. Nós a isolamos, mas não pensamos nos outros focos da doença. Por exemplo, em Nembro e em Alzano Lombardo, onde foram muitos os infectados. Ali não se tomou a decisão de fechar. E essas cidades são contíguas a Bérgamo, que foi atingida. Depois, fez-se em Bérgamo algo extraordinário. Talvez nenhuma rede hospitalar no mundo fosse capaz desse heroísmo, mas, no começo, foi uma bagunça. Faltavam todos os equipamentos de proteção individual. E ainda agora a defesa civil não consegue enviar à cidade todas as máscaras necessárias. Tudo porque aqui não aconteceu uma preparação adequada para a situação. Claro que, para se preparar, é necessário tempo. Na última hora, faz-se o que se pode.

O cientista e pesquisador médico italiano Silvio Garattini, presidente e fundador do Instituto de Pesquisas Farmacológicas Mario Negri Foto: Armando Rotoletti

O sr. chamou a atenção para um excesso de “sentido dos negócios”. O que queria dizer?

Quero dizer que, em vez de fechar rapidamente o que se devia fechar, prevaleceu a ideia de que tudo devia permanecer aberto, como lojas, bares e negócios, em suma, todas esses lugares que têm mais possibilidade de contágio. E, só quando as coisas começaram a ficar mal, é que se tomou a decisão de fechar, salvo os serviços essenciais. Mas devíamos ter fechado tudo o que não era necessário muito antes. Era muito impopular, mas quem é responsável deve tomar a decisão.

Era possível estar preparado para um vírus assim?

É preciso se preparar antes, ter um plano. Quando tivemos a epidemia da influenza aviária, houve uma grande letalidade. Aquele era o momento, terminada a emergência, de se preparar para a chegada de uma outra epidemia, mas, infelizmente, nada foi feito. O que quero dizer com se preparar? Antes de tudo ter um programa. Ter em mente quais são as coisa fundamentais em que em uma epidemia são importante. A segunda coisa é ter o material, a estrutura e as coisas úteis, se não prontas, ao menos sabendo como fazê-las. E aqui não é errado ter coisas guardadas para que, em pouco tempo, se possa fazer um hospital com tudo o que é necessário para começar a enfrentar a primeira onda do problema.

A maioria das infecções nessa epidemia aconteceram em ambiente hospitalar. Como enfrentar a falta mundial de equipamentos para as equipes médicas?

O problema devia ser resolvido ao início, quando não havia essa grande competição internacional para ter o material necessário. Tenho consciência de que dizer isso agora é fácil. Essa epidemia nos fez entender que havia muita coisa que erramos ou nem havíamos pensado. É importante não deixar isso para trás quando tudo acabar. Em vez disso, este deve ser o momento para pensar e construir um sistema a fim de que isso não se repita ou, pelo menos, não seja tão ruim.

Como os governos devem gerir as informações na crise?

Deve haver um canal que seja usado pelos governos que represente a voz oficial não deles, mas das pessoas competentes que administram o problema. Isso deve ser feito por pessoas que a opinião pública julgue confiáveis. Se deixar em outras mãos, as pessoas vão pensar que, sendo do governo, vão defender só os interesses do governo e não da população. É preciso que exista uma oficialidade confiável.

O sr. acompanhou as pesquisas sobre a hidroxicloroquina. A cura está mesmo próxima?

Há substâncias que deram resultados promissores, entre essas a cloroquina, porém, o melhor é fazer as experiência de modo controlado. De outra forma, nos arriscaríamos a tratar pacientes com produtos que, infelizmente, não servem para nada. E, em vez disso, podem até ter efeitos tóxicos. A hidroxicloroquina não pode ser subministrada a todos. Não deve ser dada a pacientes com problemas cardíacos, pois ela pode ser muito tóxica para o coração. Só uma pesquisa clínica controlada poderá verificar sua eficácia.

Desculpe, professor, mas devo cometer uma indiscrição: posso perguntar que precauções o sr. tomou contra o coronavírus?

Ficar em casa e fazer meu trabalho: os artigos, as entrevistas. Saio só para obter o que comer. A única recomendação que se pode fazer às pessoas é: fiquem em casa, lavem frequentemente as mãos e sigam as regras de higiene aí no Brasil.

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