Desde novembro, as linhas de frente permaneciam em grande medida estagnadas, conforme ambos os lados se entrincheiraram durante o inverno frio e lamacento. Mas enquanto as forças russas reforçaram suas posições, um elemento faz pender as condições do jogo a favor da Ucrânia: o fornecimento, por parte dos aliados ocidentais, de armas cada vez mais sofisticadas e altamente cobiçadas, algumas das quais capazes de produzir vantagens relevantes no campo de batalha.
Alguns desses sistemas, porém, demandam tempo e logísticas complexas para serem entregues e requerem treinamento extenso para sua operação, o que significa que poderão desempenhar um papel mais importante nos próximos meses. Conheça alguns dos armamentos cruciais que os Estados Unidos providenciaram durante os preparativos do contra-ataque.
Equipamentos sofisticados e treinamento
Preparações para a aguardada contraofensiva de Kiev foram empreendidas por meses, com um foco substancial em consolidar as armas e equipamentos do Ocidente, assim como completar o treinamento necessário para muitos soldados ucranianos aprenderem a operar sistemas que desconheciam anteriormente. Essa abordagem dos EUA e dos aliados ocidentais vai além de inundar o país com equipamentos, enfatiza sistemas que complementam um ao outro no campo de batalha.
A estratégia de “armas combinadas” tem foco na ideia de que blindados, infantaria, aviação e outras capacidades trabalhem em concerto para proteger e reforçar uma à outra. Isso é essencial em contraofensivas, para explorar fraquezas e lapsos nas linhas inimigas e rompê-las.
Com isso vem a necessidade de envios substanciais de veículos e meses de treinamento. Washington destinou 90 blindados Stryker para transporte de soldados e mais de 100 tanques Bradley para ajudar a cumprir a estratégia de armas combinadas. Os Strykers e Bradleys são geralmente mais velozes, mais avançados e mais bem protegidos do que os envelhecidos veículos soviéticos e russos que os ucranianos operavam, mas são mais exigentes tecnicamente para serem mantidos no campo de batalha. Os Strykers são projetados para inserir infantaria em combate rapidamente, enquanto os Bradleys são capazes de enfrentar outros veículos blindados com seus poderosos canhões, mas têm menos espaço interno para soldados.
Os EUA também prometeram enviar 31 tanques Abrams, que possuem blindagem mais forte e sistemas mais avançados do que os veículos de combate ucranianos. Cerca de 200 soldados ucranianos iniciaram um programa de treinamento de 12 semanas na Alemanha para aprender a operar os tanques no começo de junho, portanto estarão prontos para o combate por volta do início de setembro.
Equipamento para combate próximo
À parte o ataque inicial contra Kiev e as contraofensivas no leste e no sul, no ano passado, o conflito na Ucrânia definiu-se principalmente por uma guerra de trincheiras estática e trocas de fogo de artilharia à distância.
Operações de contraofensiva têm muito mais fluidez e proximidade. Para serem bem-sucedidas, as tropas ucranianas terão de se movimentar rapidamente para tomar território dos russos, o que as colocará em posições muito mais próximas às linhas inimigas.
Os EUA forneceram armas com alcance de até 4,8 quilômetros para essas operações, incluindo 4 mil mísseis TOW — que podem ser lançados de tripés pesados ou de Humvees, permitindo aos soldados dispará-los e se evadir rapidamente para evitar que o inimigo ataque sua posição, uma técnica conhecida como “atira e sai correndo”.
Washington também enviou à Ucrânia peças de artilharia de 105 milímetros, que trocam potência e alcance por facilidade de transporte, o que simplifica sua movimentação em um campo de batalha em constante mudança em comparação a pesados obuses como os M777. Outras armas, incluindo um trio de sistemas antiblindados — Javelins, AT4s e lançadores sem recuo Carl Gustaf —, são destinadas para soldados de infantaria terrestre atacarem veículos.
Operações bem-sucedidas de contraofensiva exigirão movimentações através de território em que os soldados inimigos instalaram barreiras físicas e campos minados, destinados a diminuir o ritmo de avanço das tropas ucranianas e direcioná-las para posições que as deixem mais vulneráveis.
De acordo com Mark Cancian, conselheiro sênior do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, a solução é apressar envios de equipamentos antiminas e explosivos para Kiev. Os EUA enviaram para a Ucrânia veículos resistentes a bombas conhecidos como MRAPs com rolos de minas instalados na frente, destinados a detonar minas antes que elas possam atingir o veículo. Os americanos também enviaram trajes de proteção e explosivos que ajudarão peritos em bombas e engenheiros recolher e destruir obstáculos e dispositivos que ofereçam perigo.
Veículos usados atrás das linhas de combate recebidos pela Ucrânia também são cruciais, afirmou Cancian. Caminhões de combustível ajudam a abastecer veículos a gasolina, e caminhões de transporte de veículos carregam tanques para o front, ajudando a diminuir o desgaste que sofreriam no caminho. Frotas de caminhões de reboque também ajudam a transportar para oficinas de reparos veículos destruídos ou danificados para reabilitá-los para os combates.
‘Isolar o campo de batalha’
Armas como artilharia de longo alcance desempenham uma importante função de apoio em contraofensivas, afirmou Cancian, atacando unidades reserva que tentam chegar às áreas de ataque.
“A situação clássica é você atacar uma linha defensiva e eles segurarem você um tempo, mas então eles têm de acionar imediatamente reforços de outras áreas”, afirmou Cancian. “E se eles conseguem posicionar esses reforços, eles podem te empacar e talvez impedir que você rompa as linhas ou limitar seu avanço”, afirmou ele.
Ao usar armas de longo alcance, os ucranianos “podem isolar o campo de batalha, para que o outro lado não consiga trazer nenhum reforço”. Essas armas também podem evitar que unidades de logística reabasteçam os russos, afirmou Cancian.
Ainda que os EUA tenham fornecido veículos HIMARS capazes de disparar foguetes contra alvos a até 80,5 quilômetros de distância, os americanos têm negado pedidos insistentes de Kiev por mísseis com alcance de aproximadamente 320 quilômetros, limitando as opções dos comandantes ucranianos de ataques contra alvos distantes. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO