Analista político e professor de Relações Internacionais da FGV-SP. Escreve quinzenalmente

Opinião|A Cúpula das Américas e o novo papel dos EUA


Tudo indica que a cúpula seguirá tendo pouca relevância na vida de 1 bilhão de pessoas que vivem entre o Alasca e a Terra do Fogo

Por Oliver Stuenkel
Atualização:

A Cúpula das Américas, que começa hoje em Los Angeles, na Califórnia, e reunirá a maioria dos chefes de Estado do Hemisfério Ocidental, marca o fim de uma era nas relações interamericanas. O cenário político e econômico das Américas diverge profundamente daquele de 1994, quando o presidente Bill Clinton convidou todos os líderes da região, exceto Fidel Castro, para a primeira Cúpula das Américas em Miami e para o lançamento de sua campanha à Alca, uma expansão do Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta) para toda a região.

Apesar da ideia nunca ter vingado, os EUA, uma nação confiante na época, chegou a assinar, nas décadas seguintes, tratados de livre-comércio com dez países latino-americanos – entre eles Colômbia, Peru e Chile – e buscou pautar a agenda regional.

Várias das cúpulas seguintes – essas cimeiras acontecem de três em três anos – não são lembradas pelas ideias apresentadas ou pelos resultados negociados, mas acima de tudo por desentendimentos, como o encontro de 2005, em Mar del Plata, na Argentina, quando os líderes Nestor Kirchner e Hugo Chávez fizeram frente a George W. Bush.

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Milhares marcham com faixa com os retratos dos presidentes de esquerda na América Latina na época (da esq. para a direita) Fidel Castro, Hugo Chávez, Néstor Kirchner, Luiz Inácio Lula da Silva e Tabaré Vázquez, durante um protesto contra a presença de George W. Bush na 4ª Cúpula das Américas, em Mar del Plata, em 4 de novembro de 2005 Foto: David Mercado/Reuters

Mesmo assim, nenhuma delas mostrou de forma tão nítida, como deverá mostrar a cúpula de Los Angeles, que a influência americana atingiu seu ponto mais baixo nas Américas desde o fim da Guerra Fria – situação que levou Michael Shifter, um dos latino-americanistas mais influentes dos EUA, a cunhar o termo “América Latina pós-estadunidense”.

Três motivos explicam a transformação na política regional – e por que, nas atuais condições, o encontro em Los Angeles dificilmente produzirá resultados concretos.

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Em primeiro lugar, no contexto da desindustrialização da América Latina, o comércio inter-regional torna-se menos relevante, sendo substituído cada vez mais pelo comércio com a China. Enquanto os EUA eram o parceiro econômico dominante em toda a América Latina, durante os anos de 1990, a China vem ganhando espaço há duas décadas e hoje é o principal parceiro comercial de países como o Brasil, a Argentina, o Chile e o Peru.

A decisão de vários líderes latino-americanos de deixar em aberto, ao longo das últimas semanas, se iriam à cúpula nos EUA foi humilhante para o governo Biden, mas é reflexo de uma nova realidade na qual a América Latina depende menos dos EUA do que em qualquer momento ao longo das últimas décadas.

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Isso explica por que Jair Bolsonaro pode zombar publicamente do presidente americano e, em interferência direta nos assuntos internos dos EUA, questionar sua legitimidade – alegando supostas fraudes na eleição, sem apresentar evidências – despreocupado em relação a possíveis críticas da elite empresarial brasileira. Fazer ataques semelhantes contra o governo chinês causou reação bem diferente, como o ex-chanceler Ernesto Araújo sabe muito bem.

Ferramentas

Em segundo, com a opinião pública americana cética em relação à globalização, as condições políticas domésticas nos EUA dificultam negociar novos acordos comerciais com os países da América Latina. A China, por outro lado, negocia atualmente com vários países, entre eles Equador e Uruguai, para consolidar sua parceria com a região.

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Sem poder oferecer acesso privilegiado ao mercado dos EUA e incapaz de competir com o financiamento chinês de infraestrutura na América Latina, restaria a Washington a cooperação para defender a democracia – mas é justamente nesse quesito que os EUA hoje carecem de legitimidade, tendo recentemente evitado, por pouco, uma ruptura de seu próprio estado democrático de direito.

Por fim, os profundos desafios econômicos na região e a ascensão de líderes populistas “antiglobalistas” no México e no Brasil inviabilizam hoje qualquer projeto sério de fomentar a cooperação regional nas Américas. Da mesma forma, a erosão da democracia em um número crescente de países da região – mais recentemente Nicarágua e El Salvador, ambos regimes autoritários no momento – limitam ainda mais o espaço para o diálogo.

A frustração com a falta de resultados concretos das Cúpulas das Américas e com os preparativos caóticos do encontro em Los Angeles levou Dan Restrepo, que atuou como assessor do ex-presidente Obama para assuntos do Hemisfério Ocidental, a recomendar, em recente artigo no Los Angeles Times, abrir mão do atual formato da cúpula, argumentando que seria melhor organizar encontros com grupos menores de presidentes da região. É improvável que a Cúpula das Américas deixe de existir. Tudo indica, porém, que ela continuará tendo pouca relevância para o cotidiano de 1 bilhão de pessoas que vivem entre o Alasca e a Terra do Fogo.

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É ANALISTA POLÍTICO E COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FGV-SP

A Cúpula das Américas, que começa hoje em Los Angeles, na Califórnia, e reunirá a maioria dos chefes de Estado do Hemisfério Ocidental, marca o fim de uma era nas relações interamericanas. O cenário político e econômico das Américas diverge profundamente daquele de 1994, quando o presidente Bill Clinton convidou todos os líderes da região, exceto Fidel Castro, para a primeira Cúpula das Américas em Miami e para o lançamento de sua campanha à Alca, uma expansão do Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta) para toda a região.

Apesar da ideia nunca ter vingado, os EUA, uma nação confiante na época, chegou a assinar, nas décadas seguintes, tratados de livre-comércio com dez países latino-americanos – entre eles Colômbia, Peru e Chile – e buscou pautar a agenda regional.

Várias das cúpulas seguintes – essas cimeiras acontecem de três em três anos – não são lembradas pelas ideias apresentadas ou pelos resultados negociados, mas acima de tudo por desentendimentos, como o encontro de 2005, em Mar del Plata, na Argentina, quando os líderes Nestor Kirchner e Hugo Chávez fizeram frente a George W. Bush.

Milhares marcham com faixa com os retratos dos presidentes de esquerda na América Latina na época (da esq. para a direita) Fidel Castro, Hugo Chávez, Néstor Kirchner, Luiz Inácio Lula da Silva e Tabaré Vázquez, durante um protesto contra a presença de George W. Bush na 4ª Cúpula das Américas, em Mar del Plata, em 4 de novembro de 2005 Foto: David Mercado/Reuters

Mesmo assim, nenhuma delas mostrou de forma tão nítida, como deverá mostrar a cúpula de Los Angeles, que a influência americana atingiu seu ponto mais baixo nas Américas desde o fim da Guerra Fria – situação que levou Michael Shifter, um dos latino-americanistas mais influentes dos EUA, a cunhar o termo “América Latina pós-estadunidense”.

Três motivos explicam a transformação na política regional – e por que, nas atuais condições, o encontro em Los Angeles dificilmente produzirá resultados concretos.

Em primeiro lugar, no contexto da desindustrialização da América Latina, o comércio inter-regional torna-se menos relevante, sendo substituído cada vez mais pelo comércio com a China. Enquanto os EUA eram o parceiro econômico dominante em toda a América Latina, durante os anos de 1990, a China vem ganhando espaço há duas décadas e hoje é o principal parceiro comercial de países como o Brasil, a Argentina, o Chile e o Peru.

A decisão de vários líderes latino-americanos de deixar em aberto, ao longo das últimas semanas, se iriam à cúpula nos EUA foi humilhante para o governo Biden, mas é reflexo de uma nova realidade na qual a América Latina depende menos dos EUA do que em qualquer momento ao longo das últimas décadas.

Isso explica por que Jair Bolsonaro pode zombar publicamente do presidente americano e, em interferência direta nos assuntos internos dos EUA, questionar sua legitimidade – alegando supostas fraudes na eleição, sem apresentar evidências – despreocupado em relação a possíveis críticas da elite empresarial brasileira. Fazer ataques semelhantes contra o governo chinês causou reação bem diferente, como o ex-chanceler Ernesto Araújo sabe muito bem.

Ferramentas

Em segundo, com a opinião pública americana cética em relação à globalização, as condições políticas domésticas nos EUA dificultam negociar novos acordos comerciais com os países da América Latina. A China, por outro lado, negocia atualmente com vários países, entre eles Equador e Uruguai, para consolidar sua parceria com a região.

Sem poder oferecer acesso privilegiado ao mercado dos EUA e incapaz de competir com o financiamento chinês de infraestrutura na América Latina, restaria a Washington a cooperação para defender a democracia – mas é justamente nesse quesito que os EUA hoje carecem de legitimidade, tendo recentemente evitado, por pouco, uma ruptura de seu próprio estado democrático de direito.

Por fim, os profundos desafios econômicos na região e a ascensão de líderes populistas “antiglobalistas” no México e no Brasil inviabilizam hoje qualquer projeto sério de fomentar a cooperação regional nas Américas. Da mesma forma, a erosão da democracia em um número crescente de países da região – mais recentemente Nicarágua e El Salvador, ambos regimes autoritários no momento – limitam ainda mais o espaço para o diálogo.

A frustração com a falta de resultados concretos das Cúpulas das Américas e com os preparativos caóticos do encontro em Los Angeles levou Dan Restrepo, que atuou como assessor do ex-presidente Obama para assuntos do Hemisfério Ocidental, a recomendar, em recente artigo no Los Angeles Times, abrir mão do atual formato da cúpula, argumentando que seria melhor organizar encontros com grupos menores de presidentes da região. É improvável que a Cúpula das Américas deixe de existir. Tudo indica, porém, que ela continuará tendo pouca relevância para o cotidiano de 1 bilhão de pessoas que vivem entre o Alasca e a Terra do Fogo.

É ANALISTA POLÍTICO E COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FGV-SP

A Cúpula das Américas, que começa hoje em Los Angeles, na Califórnia, e reunirá a maioria dos chefes de Estado do Hemisfério Ocidental, marca o fim de uma era nas relações interamericanas. O cenário político e econômico das Américas diverge profundamente daquele de 1994, quando o presidente Bill Clinton convidou todos os líderes da região, exceto Fidel Castro, para a primeira Cúpula das Américas em Miami e para o lançamento de sua campanha à Alca, uma expansão do Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta) para toda a região.

Apesar da ideia nunca ter vingado, os EUA, uma nação confiante na época, chegou a assinar, nas décadas seguintes, tratados de livre-comércio com dez países latino-americanos – entre eles Colômbia, Peru e Chile – e buscou pautar a agenda regional.

Várias das cúpulas seguintes – essas cimeiras acontecem de três em três anos – não são lembradas pelas ideias apresentadas ou pelos resultados negociados, mas acima de tudo por desentendimentos, como o encontro de 2005, em Mar del Plata, na Argentina, quando os líderes Nestor Kirchner e Hugo Chávez fizeram frente a George W. Bush.

Milhares marcham com faixa com os retratos dos presidentes de esquerda na América Latina na época (da esq. para a direita) Fidel Castro, Hugo Chávez, Néstor Kirchner, Luiz Inácio Lula da Silva e Tabaré Vázquez, durante um protesto contra a presença de George W. Bush na 4ª Cúpula das Américas, em Mar del Plata, em 4 de novembro de 2005 Foto: David Mercado/Reuters

Mesmo assim, nenhuma delas mostrou de forma tão nítida, como deverá mostrar a cúpula de Los Angeles, que a influência americana atingiu seu ponto mais baixo nas Américas desde o fim da Guerra Fria – situação que levou Michael Shifter, um dos latino-americanistas mais influentes dos EUA, a cunhar o termo “América Latina pós-estadunidense”.

Três motivos explicam a transformação na política regional – e por que, nas atuais condições, o encontro em Los Angeles dificilmente produzirá resultados concretos.

Em primeiro lugar, no contexto da desindustrialização da América Latina, o comércio inter-regional torna-se menos relevante, sendo substituído cada vez mais pelo comércio com a China. Enquanto os EUA eram o parceiro econômico dominante em toda a América Latina, durante os anos de 1990, a China vem ganhando espaço há duas décadas e hoje é o principal parceiro comercial de países como o Brasil, a Argentina, o Chile e o Peru.

A decisão de vários líderes latino-americanos de deixar em aberto, ao longo das últimas semanas, se iriam à cúpula nos EUA foi humilhante para o governo Biden, mas é reflexo de uma nova realidade na qual a América Latina depende menos dos EUA do que em qualquer momento ao longo das últimas décadas.

Isso explica por que Jair Bolsonaro pode zombar publicamente do presidente americano e, em interferência direta nos assuntos internos dos EUA, questionar sua legitimidade – alegando supostas fraudes na eleição, sem apresentar evidências – despreocupado em relação a possíveis críticas da elite empresarial brasileira. Fazer ataques semelhantes contra o governo chinês causou reação bem diferente, como o ex-chanceler Ernesto Araújo sabe muito bem.

Ferramentas

Em segundo, com a opinião pública americana cética em relação à globalização, as condições políticas domésticas nos EUA dificultam negociar novos acordos comerciais com os países da América Latina. A China, por outro lado, negocia atualmente com vários países, entre eles Equador e Uruguai, para consolidar sua parceria com a região.

Sem poder oferecer acesso privilegiado ao mercado dos EUA e incapaz de competir com o financiamento chinês de infraestrutura na América Latina, restaria a Washington a cooperação para defender a democracia – mas é justamente nesse quesito que os EUA hoje carecem de legitimidade, tendo recentemente evitado, por pouco, uma ruptura de seu próprio estado democrático de direito.

Por fim, os profundos desafios econômicos na região e a ascensão de líderes populistas “antiglobalistas” no México e no Brasil inviabilizam hoje qualquer projeto sério de fomentar a cooperação regional nas Américas. Da mesma forma, a erosão da democracia em um número crescente de países da região – mais recentemente Nicarágua e El Salvador, ambos regimes autoritários no momento – limitam ainda mais o espaço para o diálogo.

A frustração com a falta de resultados concretos das Cúpulas das Américas e com os preparativos caóticos do encontro em Los Angeles levou Dan Restrepo, que atuou como assessor do ex-presidente Obama para assuntos do Hemisfério Ocidental, a recomendar, em recente artigo no Los Angeles Times, abrir mão do atual formato da cúpula, argumentando que seria melhor organizar encontros com grupos menores de presidentes da região. É improvável que a Cúpula das Américas deixe de existir. Tudo indica, porém, que ela continuará tendo pouca relevância para o cotidiano de 1 bilhão de pessoas que vivem entre o Alasca e a Terra do Fogo.

É ANALISTA POLÍTICO E COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FGV-SP

A Cúpula das Américas, que começa hoje em Los Angeles, na Califórnia, e reunirá a maioria dos chefes de Estado do Hemisfério Ocidental, marca o fim de uma era nas relações interamericanas. O cenário político e econômico das Américas diverge profundamente daquele de 1994, quando o presidente Bill Clinton convidou todos os líderes da região, exceto Fidel Castro, para a primeira Cúpula das Américas em Miami e para o lançamento de sua campanha à Alca, uma expansão do Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta) para toda a região.

Apesar da ideia nunca ter vingado, os EUA, uma nação confiante na época, chegou a assinar, nas décadas seguintes, tratados de livre-comércio com dez países latino-americanos – entre eles Colômbia, Peru e Chile – e buscou pautar a agenda regional.

Várias das cúpulas seguintes – essas cimeiras acontecem de três em três anos – não são lembradas pelas ideias apresentadas ou pelos resultados negociados, mas acima de tudo por desentendimentos, como o encontro de 2005, em Mar del Plata, na Argentina, quando os líderes Nestor Kirchner e Hugo Chávez fizeram frente a George W. Bush.

Milhares marcham com faixa com os retratos dos presidentes de esquerda na América Latina na época (da esq. para a direita) Fidel Castro, Hugo Chávez, Néstor Kirchner, Luiz Inácio Lula da Silva e Tabaré Vázquez, durante um protesto contra a presença de George W. Bush na 4ª Cúpula das Américas, em Mar del Plata, em 4 de novembro de 2005 Foto: David Mercado/Reuters

Mesmo assim, nenhuma delas mostrou de forma tão nítida, como deverá mostrar a cúpula de Los Angeles, que a influência americana atingiu seu ponto mais baixo nas Américas desde o fim da Guerra Fria – situação que levou Michael Shifter, um dos latino-americanistas mais influentes dos EUA, a cunhar o termo “América Latina pós-estadunidense”.

Três motivos explicam a transformação na política regional – e por que, nas atuais condições, o encontro em Los Angeles dificilmente produzirá resultados concretos.

Em primeiro lugar, no contexto da desindustrialização da América Latina, o comércio inter-regional torna-se menos relevante, sendo substituído cada vez mais pelo comércio com a China. Enquanto os EUA eram o parceiro econômico dominante em toda a América Latina, durante os anos de 1990, a China vem ganhando espaço há duas décadas e hoje é o principal parceiro comercial de países como o Brasil, a Argentina, o Chile e o Peru.

A decisão de vários líderes latino-americanos de deixar em aberto, ao longo das últimas semanas, se iriam à cúpula nos EUA foi humilhante para o governo Biden, mas é reflexo de uma nova realidade na qual a América Latina depende menos dos EUA do que em qualquer momento ao longo das últimas décadas.

Isso explica por que Jair Bolsonaro pode zombar publicamente do presidente americano e, em interferência direta nos assuntos internos dos EUA, questionar sua legitimidade – alegando supostas fraudes na eleição, sem apresentar evidências – despreocupado em relação a possíveis críticas da elite empresarial brasileira. Fazer ataques semelhantes contra o governo chinês causou reação bem diferente, como o ex-chanceler Ernesto Araújo sabe muito bem.

Ferramentas

Em segundo, com a opinião pública americana cética em relação à globalização, as condições políticas domésticas nos EUA dificultam negociar novos acordos comerciais com os países da América Latina. A China, por outro lado, negocia atualmente com vários países, entre eles Equador e Uruguai, para consolidar sua parceria com a região.

Sem poder oferecer acesso privilegiado ao mercado dos EUA e incapaz de competir com o financiamento chinês de infraestrutura na América Latina, restaria a Washington a cooperação para defender a democracia – mas é justamente nesse quesito que os EUA hoje carecem de legitimidade, tendo recentemente evitado, por pouco, uma ruptura de seu próprio estado democrático de direito.

Por fim, os profundos desafios econômicos na região e a ascensão de líderes populistas “antiglobalistas” no México e no Brasil inviabilizam hoje qualquer projeto sério de fomentar a cooperação regional nas Américas. Da mesma forma, a erosão da democracia em um número crescente de países da região – mais recentemente Nicarágua e El Salvador, ambos regimes autoritários no momento – limitam ainda mais o espaço para o diálogo.

A frustração com a falta de resultados concretos das Cúpulas das Américas e com os preparativos caóticos do encontro em Los Angeles levou Dan Restrepo, que atuou como assessor do ex-presidente Obama para assuntos do Hemisfério Ocidental, a recomendar, em recente artigo no Los Angeles Times, abrir mão do atual formato da cúpula, argumentando que seria melhor organizar encontros com grupos menores de presidentes da região. É improvável que a Cúpula das Américas deixe de existir. Tudo indica, porém, que ela continuará tendo pouca relevância para o cotidiano de 1 bilhão de pessoas que vivem entre o Alasca e a Terra do Fogo.

É ANALISTA POLÍTICO E COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FGV-SP

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