Analista político e professor de Relações Internacionais da FGV-SP. Escreve quinzenalmente

Opinião|Golpe no Níger amplia crise no Sahel, uma nova ameaça global; leia a coluna de Oliver Stuenkel


Golpe militar no Níger é reflexo da impotência de governos frente a grupos terroristas na região

Por Oliver Stuenkel

O golpe militar no Níger no fim de julho encerrou um dos poucos capítulos esperançosos no Sahel, a vasta faixa árida ao sul do deserto do Saara que vai desde o Oceano Atlântico a oeste até o Mar Vermelho a leste. A região inclui dez nações, várias das quais figuram entre as mais pobres do mundo, que sofrem com disputas por pastos, acirradas pelas mudanças climáticas.

O presidente nigerino, Mohamed Bazoum, mantido em cativeiro pelos golpistas, havia tomado posse em 2021, no que foi a primeira transição democrática do Níger.

No ano passado, militares assumiram o poder em circunstâncias semelhantes em Burkina Faso, que faz fronteira com o Níger. Outro golpe ocorreu em Mali, também vizinho, bem como no Chade e na Guiné. A instabilidade política é reflexo das dificuldades dos governos do Sahel em conter o avanço da violência jihadista, que matou mais de 20.000 africanos na região ao longo dos últimos 12 meses.

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Se o governo golpista nigerino se mantiver no poder, tudo indica que a situação de segurança vai piorar: tanto em Burkina Faso quanto em Mali, o golpe enfraqueceu o combate contra o terrorismo, e milhares de malineses fugiram para Níger por causa da violência dos extremistas.

Cidadãos do Níger protestam em frente à embaixada da França com placas com os dizeres: "abaixo a França, vida longa a Putin" Foto: Sam Mednick/AP

Além disso, a permanência da junta militar na capital nigerina provavelmente levaria o país a perder acesso à ajuda econômica ocidental, e outros países que fazem parte da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) já anunciaram sanções contra o Níger, o sexto maior produtor de urânio do mundo. Em resposta ao golpe, a Nigéria, que também faz fronteira com o Níger, decidiu cortar o fornecimento de energia ao país vizinho.

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O Protocolo de Democracia e Boa Governança do Cedeao prevê uma suspensão automática de membros em casos de ruptura constitucional, e o Níger é o quarto integrante do bloco a sofrer a suspensão ao longo dos últimos anos. Vários países do Cedeao chegaram a sinalizar que estão dispostos a participar de uma intervenção militar para reconduzir o presidente nigerino deposto. Afinal, há dois temores tanto na Nigéria quanto em outros países-membros. O primeiro é que os golpes militares recentes possam criar precedentes e incentivar generais nos seus próprios países. O segundo é que o golpe possa facilitar a expansão de grupos extremistas, complicando ainda mais o combate ao terrorismo na região. Devido à atuação do Boko Haram (grupo às vezes chamado “Estado Islâmico na África Ocidental”) no norte da Nigéria, em torno de 200,000 pessoas já fugiram para o Niger.

Uma intervenção militar por parte dos presidentes do Cedeao tem, de fato, o potencial de reconduzir Bazoum ao poder e resgatar a democracia nigerina. No entanto, os riscos seriam enormes. Diferente de Gâmbia, onde uma mobilização militar por países da região conseguiu lidar com uma ameaça golpista em 2017, uma intervenção no Níger poderia facilmente levar a uma guerra de três frentes: entre (1) os governos do Cedeao, 2) o regime no Níger e os governos militares de Mali e Burkina Faso – os quais anunciaram que qualquer interferência militar no Níger seria entendida como “declaração de guerra” —; (3) e os grupos jihadistas, que se beneficiariam do caos no país. Para complicar o cenário ainda mais, a junta militar nigerina chegou a pedir apoio do grupo mercenário russo Wagner, que já colabora com vários governos militares da região, inclusive no Mali.

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General Abdourahmane Tchiani assumiu o comando do Níger após golpe de estado no fim de julho.  Foto: ORTN / AP

Um confronto entre um grupo de países liderado pela Nigéria e outro grupo em defesa do governo militar do Níger – apoiado por mercenários russos – poderia produzir uma guerra regional com enorme custo humano e uma crise de refúgio sem precedentes.

Há mais uma razão pela qual seria um equívoco acreditar que as possíveis consequências da crise no Sahel se limitariam à África Ocidental: a consolidação de grupos como Al-Qaeda e o Estado Islâmico fazem com que o Sahel corra o risco de se tornar uma nova base a partir da qual ataques terroristas ao redor do mundo seriam planejados. Esse, aliás, foi o caso do Afeganistão, onde houve o planejamento dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Em função disso, numerosos governos ocidentais, entre eles a França, os EUA e a Alemanha, têm tropas estacionadas no Níger para ajudar no combate ao terrorismo.

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Agora, com um novo governo nigerino de retórica mais anti-ocidental e pró-Rússia, resta saber se será possível manter a cooperação com o Níger, que tem sido um dos principais parceiros do Ocidente no Sahel.

O golpe militar no Níger no fim de julho encerrou um dos poucos capítulos esperançosos no Sahel, a vasta faixa árida ao sul do deserto do Saara que vai desde o Oceano Atlântico a oeste até o Mar Vermelho a leste. A região inclui dez nações, várias das quais figuram entre as mais pobres do mundo, que sofrem com disputas por pastos, acirradas pelas mudanças climáticas.

O presidente nigerino, Mohamed Bazoum, mantido em cativeiro pelos golpistas, havia tomado posse em 2021, no que foi a primeira transição democrática do Níger.

No ano passado, militares assumiram o poder em circunstâncias semelhantes em Burkina Faso, que faz fronteira com o Níger. Outro golpe ocorreu em Mali, também vizinho, bem como no Chade e na Guiné. A instabilidade política é reflexo das dificuldades dos governos do Sahel em conter o avanço da violência jihadista, que matou mais de 20.000 africanos na região ao longo dos últimos 12 meses.

Se o governo golpista nigerino se mantiver no poder, tudo indica que a situação de segurança vai piorar: tanto em Burkina Faso quanto em Mali, o golpe enfraqueceu o combate contra o terrorismo, e milhares de malineses fugiram para Níger por causa da violência dos extremistas.

Cidadãos do Níger protestam em frente à embaixada da França com placas com os dizeres: "abaixo a França, vida longa a Putin" Foto: Sam Mednick/AP

Além disso, a permanência da junta militar na capital nigerina provavelmente levaria o país a perder acesso à ajuda econômica ocidental, e outros países que fazem parte da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) já anunciaram sanções contra o Níger, o sexto maior produtor de urânio do mundo. Em resposta ao golpe, a Nigéria, que também faz fronteira com o Níger, decidiu cortar o fornecimento de energia ao país vizinho.

O Protocolo de Democracia e Boa Governança do Cedeao prevê uma suspensão automática de membros em casos de ruptura constitucional, e o Níger é o quarto integrante do bloco a sofrer a suspensão ao longo dos últimos anos. Vários países do Cedeao chegaram a sinalizar que estão dispostos a participar de uma intervenção militar para reconduzir o presidente nigerino deposto. Afinal, há dois temores tanto na Nigéria quanto em outros países-membros. O primeiro é que os golpes militares recentes possam criar precedentes e incentivar generais nos seus próprios países. O segundo é que o golpe possa facilitar a expansão de grupos extremistas, complicando ainda mais o combate ao terrorismo na região. Devido à atuação do Boko Haram (grupo às vezes chamado “Estado Islâmico na África Ocidental”) no norte da Nigéria, em torno de 200,000 pessoas já fugiram para o Niger.

Uma intervenção militar por parte dos presidentes do Cedeao tem, de fato, o potencial de reconduzir Bazoum ao poder e resgatar a democracia nigerina. No entanto, os riscos seriam enormes. Diferente de Gâmbia, onde uma mobilização militar por países da região conseguiu lidar com uma ameaça golpista em 2017, uma intervenção no Níger poderia facilmente levar a uma guerra de três frentes: entre (1) os governos do Cedeao, 2) o regime no Níger e os governos militares de Mali e Burkina Faso – os quais anunciaram que qualquer interferência militar no Níger seria entendida como “declaração de guerra” —; (3) e os grupos jihadistas, que se beneficiariam do caos no país. Para complicar o cenário ainda mais, a junta militar nigerina chegou a pedir apoio do grupo mercenário russo Wagner, que já colabora com vários governos militares da região, inclusive no Mali.

General Abdourahmane Tchiani assumiu o comando do Níger após golpe de estado no fim de julho.  Foto: ORTN / AP

Um confronto entre um grupo de países liderado pela Nigéria e outro grupo em defesa do governo militar do Níger – apoiado por mercenários russos – poderia produzir uma guerra regional com enorme custo humano e uma crise de refúgio sem precedentes.

Há mais uma razão pela qual seria um equívoco acreditar que as possíveis consequências da crise no Sahel se limitariam à África Ocidental: a consolidação de grupos como Al-Qaeda e o Estado Islâmico fazem com que o Sahel corra o risco de se tornar uma nova base a partir da qual ataques terroristas ao redor do mundo seriam planejados. Esse, aliás, foi o caso do Afeganistão, onde houve o planejamento dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Em função disso, numerosos governos ocidentais, entre eles a França, os EUA e a Alemanha, têm tropas estacionadas no Níger para ajudar no combate ao terrorismo.

Agora, com um novo governo nigerino de retórica mais anti-ocidental e pró-Rússia, resta saber se será possível manter a cooperação com o Níger, que tem sido um dos principais parceiros do Ocidente no Sahel.

O golpe militar no Níger no fim de julho encerrou um dos poucos capítulos esperançosos no Sahel, a vasta faixa árida ao sul do deserto do Saara que vai desde o Oceano Atlântico a oeste até o Mar Vermelho a leste. A região inclui dez nações, várias das quais figuram entre as mais pobres do mundo, que sofrem com disputas por pastos, acirradas pelas mudanças climáticas.

O presidente nigerino, Mohamed Bazoum, mantido em cativeiro pelos golpistas, havia tomado posse em 2021, no que foi a primeira transição democrática do Níger.

No ano passado, militares assumiram o poder em circunstâncias semelhantes em Burkina Faso, que faz fronteira com o Níger. Outro golpe ocorreu em Mali, também vizinho, bem como no Chade e na Guiné. A instabilidade política é reflexo das dificuldades dos governos do Sahel em conter o avanço da violência jihadista, que matou mais de 20.000 africanos na região ao longo dos últimos 12 meses.

Se o governo golpista nigerino se mantiver no poder, tudo indica que a situação de segurança vai piorar: tanto em Burkina Faso quanto em Mali, o golpe enfraqueceu o combate contra o terrorismo, e milhares de malineses fugiram para Níger por causa da violência dos extremistas.

Cidadãos do Níger protestam em frente à embaixada da França com placas com os dizeres: "abaixo a França, vida longa a Putin" Foto: Sam Mednick/AP

Além disso, a permanência da junta militar na capital nigerina provavelmente levaria o país a perder acesso à ajuda econômica ocidental, e outros países que fazem parte da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) já anunciaram sanções contra o Níger, o sexto maior produtor de urânio do mundo. Em resposta ao golpe, a Nigéria, que também faz fronteira com o Níger, decidiu cortar o fornecimento de energia ao país vizinho.

O Protocolo de Democracia e Boa Governança do Cedeao prevê uma suspensão automática de membros em casos de ruptura constitucional, e o Níger é o quarto integrante do bloco a sofrer a suspensão ao longo dos últimos anos. Vários países do Cedeao chegaram a sinalizar que estão dispostos a participar de uma intervenção militar para reconduzir o presidente nigerino deposto. Afinal, há dois temores tanto na Nigéria quanto em outros países-membros. O primeiro é que os golpes militares recentes possam criar precedentes e incentivar generais nos seus próprios países. O segundo é que o golpe possa facilitar a expansão de grupos extremistas, complicando ainda mais o combate ao terrorismo na região. Devido à atuação do Boko Haram (grupo às vezes chamado “Estado Islâmico na África Ocidental”) no norte da Nigéria, em torno de 200,000 pessoas já fugiram para o Niger.

Uma intervenção militar por parte dos presidentes do Cedeao tem, de fato, o potencial de reconduzir Bazoum ao poder e resgatar a democracia nigerina. No entanto, os riscos seriam enormes. Diferente de Gâmbia, onde uma mobilização militar por países da região conseguiu lidar com uma ameaça golpista em 2017, uma intervenção no Níger poderia facilmente levar a uma guerra de três frentes: entre (1) os governos do Cedeao, 2) o regime no Níger e os governos militares de Mali e Burkina Faso – os quais anunciaram que qualquer interferência militar no Níger seria entendida como “declaração de guerra” —; (3) e os grupos jihadistas, que se beneficiariam do caos no país. Para complicar o cenário ainda mais, a junta militar nigerina chegou a pedir apoio do grupo mercenário russo Wagner, que já colabora com vários governos militares da região, inclusive no Mali.

General Abdourahmane Tchiani assumiu o comando do Níger após golpe de estado no fim de julho.  Foto: ORTN / AP

Um confronto entre um grupo de países liderado pela Nigéria e outro grupo em defesa do governo militar do Níger – apoiado por mercenários russos – poderia produzir uma guerra regional com enorme custo humano e uma crise de refúgio sem precedentes.

Há mais uma razão pela qual seria um equívoco acreditar que as possíveis consequências da crise no Sahel se limitariam à África Ocidental: a consolidação de grupos como Al-Qaeda e o Estado Islâmico fazem com que o Sahel corra o risco de se tornar uma nova base a partir da qual ataques terroristas ao redor do mundo seriam planejados. Esse, aliás, foi o caso do Afeganistão, onde houve o planejamento dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Em função disso, numerosos governos ocidentais, entre eles a França, os EUA e a Alemanha, têm tropas estacionadas no Níger para ajudar no combate ao terrorismo.

Agora, com um novo governo nigerino de retórica mais anti-ocidental e pró-Rússia, resta saber se será possível manter a cooperação com o Níger, que tem sido um dos principais parceiros do Ocidente no Sahel.

O golpe militar no Níger no fim de julho encerrou um dos poucos capítulos esperançosos no Sahel, a vasta faixa árida ao sul do deserto do Saara que vai desde o Oceano Atlântico a oeste até o Mar Vermelho a leste. A região inclui dez nações, várias das quais figuram entre as mais pobres do mundo, que sofrem com disputas por pastos, acirradas pelas mudanças climáticas.

O presidente nigerino, Mohamed Bazoum, mantido em cativeiro pelos golpistas, havia tomado posse em 2021, no que foi a primeira transição democrática do Níger.

No ano passado, militares assumiram o poder em circunstâncias semelhantes em Burkina Faso, que faz fronteira com o Níger. Outro golpe ocorreu em Mali, também vizinho, bem como no Chade e na Guiné. A instabilidade política é reflexo das dificuldades dos governos do Sahel em conter o avanço da violência jihadista, que matou mais de 20.000 africanos na região ao longo dos últimos 12 meses.

Se o governo golpista nigerino se mantiver no poder, tudo indica que a situação de segurança vai piorar: tanto em Burkina Faso quanto em Mali, o golpe enfraqueceu o combate contra o terrorismo, e milhares de malineses fugiram para Níger por causa da violência dos extremistas.

Cidadãos do Níger protestam em frente à embaixada da França com placas com os dizeres: "abaixo a França, vida longa a Putin" Foto: Sam Mednick/AP

Além disso, a permanência da junta militar na capital nigerina provavelmente levaria o país a perder acesso à ajuda econômica ocidental, e outros países que fazem parte da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) já anunciaram sanções contra o Níger, o sexto maior produtor de urânio do mundo. Em resposta ao golpe, a Nigéria, que também faz fronteira com o Níger, decidiu cortar o fornecimento de energia ao país vizinho.

O Protocolo de Democracia e Boa Governança do Cedeao prevê uma suspensão automática de membros em casos de ruptura constitucional, e o Níger é o quarto integrante do bloco a sofrer a suspensão ao longo dos últimos anos. Vários países do Cedeao chegaram a sinalizar que estão dispostos a participar de uma intervenção militar para reconduzir o presidente nigerino deposto. Afinal, há dois temores tanto na Nigéria quanto em outros países-membros. O primeiro é que os golpes militares recentes possam criar precedentes e incentivar generais nos seus próprios países. O segundo é que o golpe possa facilitar a expansão de grupos extremistas, complicando ainda mais o combate ao terrorismo na região. Devido à atuação do Boko Haram (grupo às vezes chamado “Estado Islâmico na África Ocidental”) no norte da Nigéria, em torno de 200,000 pessoas já fugiram para o Niger.

Uma intervenção militar por parte dos presidentes do Cedeao tem, de fato, o potencial de reconduzir Bazoum ao poder e resgatar a democracia nigerina. No entanto, os riscos seriam enormes. Diferente de Gâmbia, onde uma mobilização militar por países da região conseguiu lidar com uma ameaça golpista em 2017, uma intervenção no Níger poderia facilmente levar a uma guerra de três frentes: entre (1) os governos do Cedeao, 2) o regime no Níger e os governos militares de Mali e Burkina Faso – os quais anunciaram que qualquer interferência militar no Níger seria entendida como “declaração de guerra” —; (3) e os grupos jihadistas, que se beneficiariam do caos no país. Para complicar o cenário ainda mais, a junta militar nigerina chegou a pedir apoio do grupo mercenário russo Wagner, que já colabora com vários governos militares da região, inclusive no Mali.

General Abdourahmane Tchiani assumiu o comando do Níger após golpe de estado no fim de julho.  Foto: ORTN / AP

Um confronto entre um grupo de países liderado pela Nigéria e outro grupo em defesa do governo militar do Níger – apoiado por mercenários russos – poderia produzir uma guerra regional com enorme custo humano e uma crise de refúgio sem precedentes.

Há mais uma razão pela qual seria um equívoco acreditar que as possíveis consequências da crise no Sahel se limitariam à África Ocidental: a consolidação de grupos como Al-Qaeda e o Estado Islâmico fazem com que o Sahel corra o risco de se tornar uma nova base a partir da qual ataques terroristas ao redor do mundo seriam planejados. Esse, aliás, foi o caso do Afeganistão, onde houve o planejamento dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Em função disso, numerosos governos ocidentais, entre eles a França, os EUA e a Alemanha, têm tropas estacionadas no Níger para ajudar no combate ao terrorismo.

Agora, com um novo governo nigerino de retórica mais anti-ocidental e pró-Rússia, resta saber se será possível manter a cooperação com o Níger, que tem sido um dos principais parceiros do Ocidente no Sahel.

O golpe militar no Níger no fim de julho encerrou um dos poucos capítulos esperançosos no Sahel, a vasta faixa árida ao sul do deserto do Saara que vai desde o Oceano Atlântico a oeste até o Mar Vermelho a leste. A região inclui dez nações, várias das quais figuram entre as mais pobres do mundo, que sofrem com disputas por pastos, acirradas pelas mudanças climáticas.

O presidente nigerino, Mohamed Bazoum, mantido em cativeiro pelos golpistas, havia tomado posse em 2021, no que foi a primeira transição democrática do Níger.

No ano passado, militares assumiram o poder em circunstâncias semelhantes em Burkina Faso, que faz fronteira com o Níger. Outro golpe ocorreu em Mali, também vizinho, bem como no Chade e na Guiné. A instabilidade política é reflexo das dificuldades dos governos do Sahel em conter o avanço da violência jihadista, que matou mais de 20.000 africanos na região ao longo dos últimos 12 meses.

Se o governo golpista nigerino se mantiver no poder, tudo indica que a situação de segurança vai piorar: tanto em Burkina Faso quanto em Mali, o golpe enfraqueceu o combate contra o terrorismo, e milhares de malineses fugiram para Níger por causa da violência dos extremistas.

Cidadãos do Níger protestam em frente à embaixada da França com placas com os dizeres: "abaixo a França, vida longa a Putin" Foto: Sam Mednick/AP

Além disso, a permanência da junta militar na capital nigerina provavelmente levaria o país a perder acesso à ajuda econômica ocidental, e outros países que fazem parte da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) já anunciaram sanções contra o Níger, o sexto maior produtor de urânio do mundo. Em resposta ao golpe, a Nigéria, que também faz fronteira com o Níger, decidiu cortar o fornecimento de energia ao país vizinho.

O Protocolo de Democracia e Boa Governança do Cedeao prevê uma suspensão automática de membros em casos de ruptura constitucional, e o Níger é o quarto integrante do bloco a sofrer a suspensão ao longo dos últimos anos. Vários países do Cedeao chegaram a sinalizar que estão dispostos a participar de uma intervenção militar para reconduzir o presidente nigerino deposto. Afinal, há dois temores tanto na Nigéria quanto em outros países-membros. O primeiro é que os golpes militares recentes possam criar precedentes e incentivar generais nos seus próprios países. O segundo é que o golpe possa facilitar a expansão de grupos extremistas, complicando ainda mais o combate ao terrorismo na região. Devido à atuação do Boko Haram (grupo às vezes chamado “Estado Islâmico na África Ocidental”) no norte da Nigéria, em torno de 200,000 pessoas já fugiram para o Niger.

Uma intervenção militar por parte dos presidentes do Cedeao tem, de fato, o potencial de reconduzir Bazoum ao poder e resgatar a democracia nigerina. No entanto, os riscos seriam enormes. Diferente de Gâmbia, onde uma mobilização militar por países da região conseguiu lidar com uma ameaça golpista em 2017, uma intervenção no Níger poderia facilmente levar a uma guerra de três frentes: entre (1) os governos do Cedeao, 2) o regime no Níger e os governos militares de Mali e Burkina Faso – os quais anunciaram que qualquer interferência militar no Níger seria entendida como “declaração de guerra” —; (3) e os grupos jihadistas, que se beneficiariam do caos no país. Para complicar o cenário ainda mais, a junta militar nigerina chegou a pedir apoio do grupo mercenário russo Wagner, que já colabora com vários governos militares da região, inclusive no Mali.

General Abdourahmane Tchiani assumiu o comando do Níger após golpe de estado no fim de julho.  Foto: ORTN / AP

Um confronto entre um grupo de países liderado pela Nigéria e outro grupo em defesa do governo militar do Níger – apoiado por mercenários russos – poderia produzir uma guerra regional com enorme custo humano e uma crise de refúgio sem precedentes.

Há mais uma razão pela qual seria um equívoco acreditar que as possíveis consequências da crise no Sahel se limitariam à África Ocidental: a consolidação de grupos como Al-Qaeda e o Estado Islâmico fazem com que o Sahel corra o risco de se tornar uma nova base a partir da qual ataques terroristas ao redor do mundo seriam planejados. Esse, aliás, foi o caso do Afeganistão, onde houve o planejamento dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Em função disso, numerosos governos ocidentais, entre eles a França, os EUA e a Alemanha, têm tropas estacionadas no Níger para ajudar no combate ao terrorismo.

Agora, com um novo governo nigerino de retórica mais anti-ocidental e pró-Rússia, resta saber se será possível manter a cooperação com o Níger, que tem sido um dos principais parceiros do Ocidente no Sahel.

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