Analista político e professor de Relações Internacionais da FGV-SP. Escreve quinzenalmente

Opinião|Quem ganha e quem perde se Trump voltar à Casa Branca; leia coluna de Oliver Stuenkel


Vitória do ex-presidente seria festejada em Moscou e Buenos Aires e causaria preocupação em Kyiv, Berlim, Teerã e Caracas

Por Oliver Stuenkel

Governos mundo afora estão começando a considerar um cenário que, a se julgar pelas recentes pesquisas eleitorais, se torna cada vez mais provável: a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos no próximo 5 de novembro. O retorno do ex-presidente à Casa Branca teria profundas consequências globais. Afinal, apesar do deslocamento de poder para a Ásia, os EUA ainda são a nação de mais influência geopolítica do planeta. Além disso, embora o país já não tenha o mesmo peso econômico que tinha algumas décadas atrás, sua vasta influência política e cultural segue intacta: tendências que tiveram origem nos EUA, como o trumpismo, a cultura woke e movimentos como Black Lives Matter e MeToo, impactam debates políticos globais como as de nenhuma outra nação, e não há dúvida de que a volta de Trump inspiraria candidatos parecidos em diversos países.

Vale lembrar que Trump tem uma visão de mundo muito distinta da de Joe Biden: enquanto o consenso pós-1945 em Washington foi de que os EUA devem manter presença militar na Europa para garantir estabilidade no velho continente – inclusive para evitar a ascensão de uma potência hostil aos Estados Unidos, como foi o caso da Alemanha nazista –, Trump prefere um posicionamento mais isolacionista e já sugeriu que retiraria os EUA da Otan em seu segundo mandato. Os principais perdedores, portanto, seriam a União Europeia e a Ucrânia, a qual depende da ajuda militar americana para se defender da invasão russa.

Cético em relação ao sistema multilateral que estruturou as relações internacionais ao longo das últimas décadas, Trump parece preferir um arranjo informal no qual grandes potências têm suas respectivas zonas de influência: sinaliza, por exemplo, que está mais aberto à narrativa de Vladimir Putin de que a Ucrânia faz parte da zona de influência russa.

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Donald Trump fala com apoiadores em New Hampshire após vitória em primária do partido Republicano. Foto: Jabin Botsford/The Washington Post

Da mesma forma, Trump defende explicitamente a Doutrina Monroe, articulada pelo ex-presidente americano James Monroe em 1823, segundo a qual os EUA detêm direitos e responsabilidades especiais na América Latina – ideia frequentemente utilizada para justificar intervenções nos assuntos internos de países da região. Trump já defendeu, por exemplo, intervir militarmente no México para combater cartéis de drogas no país vizinho, embora isso dificilmente passe de estratégia eleitoral. Em 2019, descreveu uma intervenção militar na Venezuela como “uma opção” para derrubar o presidente Nicolás Maduro, proposta rejeitada pelas Forças Armadas americanas. No entanto, Trump muito provavelmente reverteria a atual estratégia de Biden de aliviar as sanções econômicas contra a Venezuela. É provável também que os EUA ampliassem suas sanções não só contra o regime de Caracas, mas também de Cuba e Nicarágua. Da mesma forma, Washington voltaria a pressionar países latino-americanos, de modo mais explícito, a reduzirem seus laços com a China.

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Além da Europa e da América Latina, os aliados dos EUA na Ásia – entre eles o Japão, a Coreia do Sul e Taiwan – também se encontrariam em uma situação incerta: enquanto presidentes americanos ofereciam garantias incondicionais de segurança no contexto de alianças formais, Trump deve adotar uma postura mais ambígua e tentar renegociar os acordos atuais.

No Oriente Médio, o país que mais deve torcer contra a vitória de Trump é o Irã, alvo provável de sanções econômicas americanas ainda mais amplas se o ex-presidente vencer o pleito de novembro. Diferentemente de Barack Obama, que buscou iniciar um processo de normalização com Teerã, Trump saiu do acordo nuclear costurado por seu antecessor. Por outro lado, a vitória de Trump seria vista com bons olhos pela Arábia Saudita, com a qual a família Trump mantém múltiplas relações de negócios, e por Israel, que se beneficiaria de um governo americano ainda mais alinhado com a política de Binyamin Netanyahu.

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No fim das contas, os principais beneficiados com a volta de Trump à Casa Branca seriam mesmo a Rússia e a China. Afinal, apesar de ter adotado uma retórica anti-China e iniciado uma guerra comercial contra Pequim, o ex-presidente é visto pelos chineses como um mal menor: Trump limitou-se a tentar renegociar a relação comercial entre os dois países, ignorando as ambições tradicionais americanas de promover a democracia mundo afora, inclusive na China. A Rússia, por sua vez, contaria com uma redução drástica do apoio americano à Ucrânia, tornando um triunfo militar de Putin no país vizinho mais provável.

Por fim, os dois líderes que já devem ter guardada na geladeira uma garrafa de espumante para a possível vitória de Trump são o presidente argentino Javier Milei e o primeiro-ministro húngaro Viktor Orban, que, em seus respectivos continentes, se tornariam os principais aliados ideológicos do presidente dos EUA.

Governos mundo afora estão começando a considerar um cenário que, a se julgar pelas recentes pesquisas eleitorais, se torna cada vez mais provável: a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos no próximo 5 de novembro. O retorno do ex-presidente à Casa Branca teria profundas consequências globais. Afinal, apesar do deslocamento de poder para a Ásia, os EUA ainda são a nação de mais influência geopolítica do planeta. Além disso, embora o país já não tenha o mesmo peso econômico que tinha algumas décadas atrás, sua vasta influência política e cultural segue intacta: tendências que tiveram origem nos EUA, como o trumpismo, a cultura woke e movimentos como Black Lives Matter e MeToo, impactam debates políticos globais como as de nenhuma outra nação, e não há dúvida de que a volta de Trump inspiraria candidatos parecidos em diversos países.

Vale lembrar que Trump tem uma visão de mundo muito distinta da de Joe Biden: enquanto o consenso pós-1945 em Washington foi de que os EUA devem manter presença militar na Europa para garantir estabilidade no velho continente – inclusive para evitar a ascensão de uma potência hostil aos Estados Unidos, como foi o caso da Alemanha nazista –, Trump prefere um posicionamento mais isolacionista e já sugeriu que retiraria os EUA da Otan em seu segundo mandato. Os principais perdedores, portanto, seriam a União Europeia e a Ucrânia, a qual depende da ajuda militar americana para se defender da invasão russa.

Cético em relação ao sistema multilateral que estruturou as relações internacionais ao longo das últimas décadas, Trump parece preferir um arranjo informal no qual grandes potências têm suas respectivas zonas de influência: sinaliza, por exemplo, que está mais aberto à narrativa de Vladimir Putin de que a Ucrânia faz parte da zona de influência russa.

Donald Trump fala com apoiadores em New Hampshire após vitória em primária do partido Republicano. Foto: Jabin Botsford/The Washington Post

Da mesma forma, Trump defende explicitamente a Doutrina Monroe, articulada pelo ex-presidente americano James Monroe em 1823, segundo a qual os EUA detêm direitos e responsabilidades especiais na América Latina – ideia frequentemente utilizada para justificar intervenções nos assuntos internos de países da região. Trump já defendeu, por exemplo, intervir militarmente no México para combater cartéis de drogas no país vizinho, embora isso dificilmente passe de estratégia eleitoral. Em 2019, descreveu uma intervenção militar na Venezuela como “uma opção” para derrubar o presidente Nicolás Maduro, proposta rejeitada pelas Forças Armadas americanas. No entanto, Trump muito provavelmente reverteria a atual estratégia de Biden de aliviar as sanções econômicas contra a Venezuela. É provável também que os EUA ampliassem suas sanções não só contra o regime de Caracas, mas também de Cuba e Nicarágua. Da mesma forma, Washington voltaria a pressionar países latino-americanos, de modo mais explícito, a reduzirem seus laços com a China.

Além da Europa e da América Latina, os aliados dos EUA na Ásia – entre eles o Japão, a Coreia do Sul e Taiwan – também se encontrariam em uma situação incerta: enquanto presidentes americanos ofereciam garantias incondicionais de segurança no contexto de alianças formais, Trump deve adotar uma postura mais ambígua e tentar renegociar os acordos atuais.

No Oriente Médio, o país que mais deve torcer contra a vitória de Trump é o Irã, alvo provável de sanções econômicas americanas ainda mais amplas se o ex-presidente vencer o pleito de novembro. Diferentemente de Barack Obama, que buscou iniciar um processo de normalização com Teerã, Trump saiu do acordo nuclear costurado por seu antecessor. Por outro lado, a vitória de Trump seria vista com bons olhos pela Arábia Saudita, com a qual a família Trump mantém múltiplas relações de negócios, e por Israel, que se beneficiaria de um governo americano ainda mais alinhado com a política de Binyamin Netanyahu.

No fim das contas, os principais beneficiados com a volta de Trump à Casa Branca seriam mesmo a Rússia e a China. Afinal, apesar de ter adotado uma retórica anti-China e iniciado uma guerra comercial contra Pequim, o ex-presidente é visto pelos chineses como um mal menor: Trump limitou-se a tentar renegociar a relação comercial entre os dois países, ignorando as ambições tradicionais americanas de promover a democracia mundo afora, inclusive na China. A Rússia, por sua vez, contaria com uma redução drástica do apoio americano à Ucrânia, tornando um triunfo militar de Putin no país vizinho mais provável.

Por fim, os dois líderes que já devem ter guardada na geladeira uma garrafa de espumante para a possível vitória de Trump são o presidente argentino Javier Milei e o primeiro-ministro húngaro Viktor Orban, que, em seus respectivos continentes, se tornariam os principais aliados ideológicos do presidente dos EUA.

Governos mundo afora estão começando a considerar um cenário que, a se julgar pelas recentes pesquisas eleitorais, se torna cada vez mais provável: a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos no próximo 5 de novembro. O retorno do ex-presidente à Casa Branca teria profundas consequências globais. Afinal, apesar do deslocamento de poder para a Ásia, os EUA ainda são a nação de mais influência geopolítica do planeta. Além disso, embora o país já não tenha o mesmo peso econômico que tinha algumas décadas atrás, sua vasta influência política e cultural segue intacta: tendências que tiveram origem nos EUA, como o trumpismo, a cultura woke e movimentos como Black Lives Matter e MeToo, impactam debates políticos globais como as de nenhuma outra nação, e não há dúvida de que a volta de Trump inspiraria candidatos parecidos em diversos países.

Vale lembrar que Trump tem uma visão de mundo muito distinta da de Joe Biden: enquanto o consenso pós-1945 em Washington foi de que os EUA devem manter presença militar na Europa para garantir estabilidade no velho continente – inclusive para evitar a ascensão de uma potência hostil aos Estados Unidos, como foi o caso da Alemanha nazista –, Trump prefere um posicionamento mais isolacionista e já sugeriu que retiraria os EUA da Otan em seu segundo mandato. Os principais perdedores, portanto, seriam a União Europeia e a Ucrânia, a qual depende da ajuda militar americana para se defender da invasão russa.

Cético em relação ao sistema multilateral que estruturou as relações internacionais ao longo das últimas décadas, Trump parece preferir um arranjo informal no qual grandes potências têm suas respectivas zonas de influência: sinaliza, por exemplo, que está mais aberto à narrativa de Vladimir Putin de que a Ucrânia faz parte da zona de influência russa.

Donald Trump fala com apoiadores em New Hampshire após vitória em primária do partido Republicano. Foto: Jabin Botsford/The Washington Post

Da mesma forma, Trump defende explicitamente a Doutrina Monroe, articulada pelo ex-presidente americano James Monroe em 1823, segundo a qual os EUA detêm direitos e responsabilidades especiais na América Latina – ideia frequentemente utilizada para justificar intervenções nos assuntos internos de países da região. Trump já defendeu, por exemplo, intervir militarmente no México para combater cartéis de drogas no país vizinho, embora isso dificilmente passe de estratégia eleitoral. Em 2019, descreveu uma intervenção militar na Venezuela como “uma opção” para derrubar o presidente Nicolás Maduro, proposta rejeitada pelas Forças Armadas americanas. No entanto, Trump muito provavelmente reverteria a atual estratégia de Biden de aliviar as sanções econômicas contra a Venezuela. É provável também que os EUA ampliassem suas sanções não só contra o regime de Caracas, mas também de Cuba e Nicarágua. Da mesma forma, Washington voltaria a pressionar países latino-americanos, de modo mais explícito, a reduzirem seus laços com a China.

Além da Europa e da América Latina, os aliados dos EUA na Ásia – entre eles o Japão, a Coreia do Sul e Taiwan – também se encontrariam em uma situação incerta: enquanto presidentes americanos ofereciam garantias incondicionais de segurança no contexto de alianças formais, Trump deve adotar uma postura mais ambígua e tentar renegociar os acordos atuais.

No Oriente Médio, o país que mais deve torcer contra a vitória de Trump é o Irã, alvo provável de sanções econômicas americanas ainda mais amplas se o ex-presidente vencer o pleito de novembro. Diferentemente de Barack Obama, que buscou iniciar um processo de normalização com Teerã, Trump saiu do acordo nuclear costurado por seu antecessor. Por outro lado, a vitória de Trump seria vista com bons olhos pela Arábia Saudita, com a qual a família Trump mantém múltiplas relações de negócios, e por Israel, que se beneficiaria de um governo americano ainda mais alinhado com a política de Binyamin Netanyahu.

No fim das contas, os principais beneficiados com a volta de Trump à Casa Branca seriam mesmo a Rússia e a China. Afinal, apesar de ter adotado uma retórica anti-China e iniciado uma guerra comercial contra Pequim, o ex-presidente é visto pelos chineses como um mal menor: Trump limitou-se a tentar renegociar a relação comercial entre os dois países, ignorando as ambições tradicionais americanas de promover a democracia mundo afora, inclusive na China. A Rússia, por sua vez, contaria com uma redução drástica do apoio americano à Ucrânia, tornando um triunfo militar de Putin no país vizinho mais provável.

Por fim, os dois líderes que já devem ter guardada na geladeira uma garrafa de espumante para a possível vitória de Trump são o presidente argentino Javier Milei e o primeiro-ministro húngaro Viktor Orban, que, em seus respectivos continentes, se tornariam os principais aliados ideológicos do presidente dos EUA.

Opinião por Oliver Stuenkel

Analista político e Professor de Relações Internacionais da FGV-SP

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