Para a Otan, a Turquia se torna uma pedra no sapato; leia a análise


Autoritário, Erdogan está disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso

Por Michael Crowley e Steven Erlanger

THE NEW YORK TIMES — Quando o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou neste mês bloquear a adesão da Finlândia e da Suécia à Otan, as autoridades ocidentais se mostraram exasperadas — mas não ficaram nada chocadas.

Dentro de uma aliança que opera por meio de consenso, o homem-forte turco tornou-se um artista marginal. Em 2009, ele bloqueou a nomeação de um novo chefe da Otan na Dinamarca, reclamando que o país foi tolerante demais em relação a cartuns do profeta Maomé e simpático demais em relação aos “terroristas curdos” com base na Turquia. Foram necessárias horas de bajulações de líderes ocidentais, assim como a promessa feita cara a cara pelo ex-presidente Barack Obama de que a Otan nomearia um turco para uma posição de liderança, para satisfazer Erdogan.

Após um rompimento de relações entre Turquia e Israel no ano seguinte, Erdogan não permitiu que a aliança trabalhasse em conjunto com os israelenses por seis anos. Posteriormente, Erdogan adiou por meses o plano de fortificar os países do Leste Europeu contra a Rússia, citando outra vez militantes curdos e exigindo que a aliança classificasse os curdos que operam na Síria como terroristas. Em 2020, Erdogan enviou um navio de prospecção de gás natural para águas gregas sob a escolta de caças de combate, fazendo com que a França enviasse navios em apoio à Grécia, que também é membro da Otan.

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Agora, o líder turco reassume um papel obstrucionista e volta a invocar os curdos, ao acusar Suécia e Finlândia de simpatizar com os militantes curdos que ele nomeou como seus principais inimigos.

“Esses países praticamente se tornaram hospedarias de organizações terroristas”, afirmou Erdogan este mês. “Não é possível para nós sermos favoráveis.”

A posição de Erdogan é um lembrete de um problema que há muito envenena as entranhas da Otan, que atualmente possui 30 membros. A invasão russa à Ucrânia pode ter dado à aliança um novo senso de missão, mas a Otan ainda tem de lidar com um líder autoritário disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso — pelo menos por algum tempo.

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Esta situação favorece o presidente russo, Vladimir Putin, que tem se aproximado de Erdogan nos anos recentes. Para o líder russo, a rejeição da solicitação de adesão da Suécia e da Finlândia à Otan representaria uma vitória significativa.

O presidente dos EUA Joe Biden, conversa com a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, após uma reunião na Casa Branca Foto: Mandel Ngan/AFP

O dilema seria mais simples se a Turquia não fosse tão importante para a aliança. O país aderiu à Otan em 1952, após alinhar-se ao Ocidente em oposição à União Soviética; a Turquia fornece uma posição estratégica crucial na intersecção entre Europa e Ásia, cobrindo tanto o Oriente Médio quanto o Mar Negro. O país hospeda uma grande base aérea militar dos Estados Unidos, onde armas nucleares americanas ficam estacionadas, e Erdogan bloqueou a passagem de navios de guerra russos a caminho da Ucrânia.

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Mas sob Erdogan a Turquia se tornou cada vez mais um problema a ser administrado. Como primeiro-ministro e posteriormente presidente, Erdogan afastou seu país da Europa ao mesmo tempo em que colocou em prática um jeito autoritário e populista de política islamista, especialmente após uma tentativa fracassada de golpe em 2016.

Erdogan comprou dos russos um avançado sistema de mísseis, que as autoridades da Otan classificam como uma ameaça para seus sistemas de defesa integrados, e em 2019 organizou uma incursão militar para combater curdos, no norte da Síria, que auxiliavam na luta contra o Estado Islâmico com apoio dos EUA.

“Nos meus quatro anos por lá, com frequência o placar era 27 a 1″, afirmou Ivo Daalder, que atuou como embaixador americano na Otan durante o governo Obama, quando a aliança tinha 28 membros.

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As objeções de Erdogan à adesão da Suécia e da Finlândia até renovaram questões sobre a Otan estar em melhor posição sem a Turquia em seu quadro.

Um ensaio de opinião publicado este mês, coescrito por Joseph Lieberman, um ex-senador independente dos EUA por Connecticut, argumenta que a Turquia de Erdogan poderia desestimular futuros candidatos a adesão a atender padrões de governança democrática. O ensaio, publicado pelo The Wall Street Journal, alerta que as políticas de Ancara, incluindo o aconchego com Putin, minaram interesses da Otan e aconselha a aliança a considerar maneiras de expulsar a Turquia.

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O governo americano destacou que não vai tolerar nenhuma agressão contra a Finlândia ou a Suécia durante o processo.

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“A Turquia é membro da Otan, mas sob Erdogan o país deixou de subscrever aos valores que fundamentam esta grande aliança”, escreveu Lieberman com Mark Wallace, diretor-executivo do Projeto Democracia Turca, um grupo crítico a Erdogan.

Alguns membros do Congresso expressaram a mesma posição. “A Turquia sob Erdogan não pode nem deveria ser considerada um aliado”, afirmou o senador Bob Menendez, de Nova Jersey, democrata mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, após a incursão militar da Turquia na Síria, em 2019.

Mas a Otan é uma aliança militar, e a Turquia, com o segundo maior Exército entre os membros da organização, uma avançada indústria de defesa e sua posição geográfica crucial, desempenha um papel vital.

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Autoridades ocidentais afirmam que a Turquia causaria mais problemas enquanto um país ressentido por ter sido retirado da Otan — e poderia se aproximar mais da Rússia.

“A Turquia minou sua própria imagem”, afirmou Alper Coskun, ex-diplomata turco que agora atua como pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para a Paz Internacional. Contudo, afirmou ele, “não deixa de ser um membro crucial da aliança”.

Outra vez, a dúvida é o que apaziguará Erdogan e garantirá seu apoio à adesão da Suécia e da Finlândia.

O presidente Joe Biden enfatizou o apoio dos EUA à manobra quando recebeu líderes dos dois países na Casa Branca este mês e louvou a ampliação da Otan enquanto defesa contra o poder da Rússia. “Biden assumiu uma posição absolutamente explícita, de enorme visibilidade, ao convidá-los a Washington”, afirmou James Jeffrey, que atuou como embaixador americano na Turquia durante o governo Obama.

A maioria dos analistas acredita que Erdogan não bloqueará definitivamente a adesão da Suécia e da Finlândia, mas que ele pretende ressaltar as preocupações de segurança da Turquia e obter ganhos políticos domésticos antes das eleições em seu país, marcadas para o próximo ano.

A principal preocupação de Erdogan em relação à Suécia é o antigo apoio do país ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que luta pela formação de um Estado curdo independente dentro das fronteiras da Turquia.

O PKK, que já atacou alvos não militares e matou civis na Turquia, é ilegal no país e foi designado pelos EUA e pela União Europeia como organização terrorista; apesar de alguns governos, o sueco entre eles, considerarem o grupo com mais simpatia, como um movimento nacionalista curdo.

Os EUA também deram apoio a um grupo afiliado ao PKK na Síria, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que ajudaram a combater o Estado Islâmico e foram atacadas por Erdogan em 2019, na incursão turca em território sírio. O presidente turco quer que as YPG também sejam designadas como organização terrorista.

Erdogan acusa Finlândia e Suécia de dar abrigo a seguidores de Fethullah Gulen, clérigo turco que vive em exílio nos EUA, a quem o presidente turco culpa pela tentativa de golpe de Estado em 2016. A Turquia pede a extradição de aproximadamente 35 pessoas, que acusa de envolvimento com separatistas curdos ou Gulen.

Erdogan também se queixa do embargo de armas que Suécia e Finlândia impõem contra seu país, aplicado depois da incursão de 2019 na Síria. Dados os atuais acontecimentos na Ucrânia, a Suécia já considera levantar o embargo.

Alguns analistas afirmam que o governo de Erdogan considera o PKK em grande medida da mesma maneira que Washington considerava a Al-Qaeda 20 anos atrás, e que o Ocidente não pode desprezar essas preocupações se pretende negociar com a Turquia.

Autoridades do governo Biden minimizam a importância desse impasse e esperam que Erdogan alcance concessões mútuas com Finlândia e Suécia. Autoridades turcas reuniram-se em Ancara com homólogos finlandeses e suecos por várias horas na semana passada.

A embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, afirmou em entrevista que “isso parece um assunto que os turcos têm para tratar com Suécia e Finlândia, então, deixaremos que eles mesmos se acertem”. Ela afirmou que os EUA ajudarão caso seja necessário.

Em uma aparição pública ao lado do ministro de Relações Exteriores finlandês em Washington, na sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou estar “confiante de que concluiremos esse processo rapidamente — e de que as coisas avançarão para os dois países”.

Emre Peker, diretor com base em Londres do Eurasia Group, uma firma privada de consultoria, afirmou não acreditar que Erdogan esteja em busca de concessões de Washington. Ele disse estar confiante de que a Turquia poderá entrar em acordo com Suécia e Finlândia com a mediação do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

As principais prioridades de Erdogan são fazer com que as preocupações de segurança de seu país em relação aos curdos sejam ouvidas e que os embargos de armas sejam levantados, afirmou Peker.

Alguns analistas americanos estão céticos. Eric Edelman, ex-embaixador americano na Turquia e na Finlândia, alertou que Erdogan poderia estar tentando bajular Putin — ou no mínimo aliviar a fúria em Moscou pelo fato de uma empresa turca ter vendido drones letais às Forças Armadas da Ucrânia.

Ibrahim Kalin, porta-voz do presidente Recep Tayyip Erdogan,conversa com a delegação finlandesa chefiada por Jukka Salovaara durante reunião em Ancara, na Turquia Foto: AP

“Ele tem de preservar uma relação com Putin que já é bastante complicada”, afirmou Edelman. “Esta é uma boa maneira de dar uma pequena gorjeta para Putin: ‘Ainda sou útil para você’.”

Outros acreditam que o líder turco quer barganhar com Washington. Erdogan está enfurecido em razão dos EUA terem negado à Turquia acesso a caças furtivos de combate F-35, após ele ter comprado dos russos um sistema de mísseis S-400, em 2017. Agora, a Turquia está fazendo lobby para conseguir comprar jatos F-16 atualizados, mas enfrenta dura resistência no Congresso por parte dos que sustentam posições como as de Menendez.

Erdogan também pode estar em busca de atenção presidencial. Ele manteve uma relação cordial com o ex-presidente Donald Trump, mas Biden o manteve à distância.

“Trata-se de um homem que tem necessidade de estar no centro das atenções”, afirmou Daalder, o ex-embaixador americano na Otan. “Esta é uma maneira de dizer: ‘Ei, eu ainda estou por aqui. Vocês precisam dar atenção aos meus problemas’.”

Peker acredita que um acordo pode ser alcançado entre a Turquia e os países nórdicos antes da cúpula da Otan que ocorrerá em Madri no próximo mês, o que permitiria que os acordos de adesão fossem assinados durante o encontro.

Alguns analistas afirmam, porém ser mais provável que Biden tenha de expressar sua anuência a Erdogan em Madri para consolidar a concordância do líder turco em relação à manobra, como Obama fez na cúpula de 2009 da Otan, para garantir a nomeação de Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da aliança.

Em uma palestra organizada pelo Council on Foreign Relations na semana passada, o deputado federal Adam Smith, democrata de Washington e presidente da Comissão de Serviços Armados da Câmara, sugeriu que os interesses envolvidos na adesão da Suécia e da Finlândia são grandes o suficiente para determinar o envolvimento direto dos EUA.

“Precisamos nos sentar à mesa e forjar um acordo”, afirmou Smith. “E precisamos ser agressivos em relação a isso neste momento.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES — Quando o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou neste mês bloquear a adesão da Finlândia e da Suécia à Otan, as autoridades ocidentais se mostraram exasperadas — mas não ficaram nada chocadas.

Dentro de uma aliança que opera por meio de consenso, o homem-forte turco tornou-se um artista marginal. Em 2009, ele bloqueou a nomeação de um novo chefe da Otan na Dinamarca, reclamando que o país foi tolerante demais em relação a cartuns do profeta Maomé e simpático demais em relação aos “terroristas curdos” com base na Turquia. Foram necessárias horas de bajulações de líderes ocidentais, assim como a promessa feita cara a cara pelo ex-presidente Barack Obama de que a Otan nomearia um turco para uma posição de liderança, para satisfazer Erdogan.

Após um rompimento de relações entre Turquia e Israel no ano seguinte, Erdogan não permitiu que a aliança trabalhasse em conjunto com os israelenses por seis anos. Posteriormente, Erdogan adiou por meses o plano de fortificar os países do Leste Europeu contra a Rússia, citando outra vez militantes curdos e exigindo que a aliança classificasse os curdos que operam na Síria como terroristas. Em 2020, Erdogan enviou um navio de prospecção de gás natural para águas gregas sob a escolta de caças de combate, fazendo com que a França enviasse navios em apoio à Grécia, que também é membro da Otan.

Agora, o líder turco reassume um papel obstrucionista e volta a invocar os curdos, ao acusar Suécia e Finlândia de simpatizar com os militantes curdos que ele nomeou como seus principais inimigos.

“Esses países praticamente se tornaram hospedarias de organizações terroristas”, afirmou Erdogan este mês. “Não é possível para nós sermos favoráveis.”

A posição de Erdogan é um lembrete de um problema que há muito envenena as entranhas da Otan, que atualmente possui 30 membros. A invasão russa à Ucrânia pode ter dado à aliança um novo senso de missão, mas a Otan ainda tem de lidar com um líder autoritário disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso — pelo menos por algum tempo.

Esta situação favorece o presidente russo, Vladimir Putin, que tem se aproximado de Erdogan nos anos recentes. Para o líder russo, a rejeição da solicitação de adesão da Suécia e da Finlândia à Otan representaria uma vitória significativa.

O presidente dos EUA Joe Biden, conversa com a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, após uma reunião na Casa Branca Foto: Mandel Ngan/AFP

O dilema seria mais simples se a Turquia não fosse tão importante para a aliança. O país aderiu à Otan em 1952, após alinhar-se ao Ocidente em oposição à União Soviética; a Turquia fornece uma posição estratégica crucial na intersecção entre Europa e Ásia, cobrindo tanto o Oriente Médio quanto o Mar Negro. O país hospeda uma grande base aérea militar dos Estados Unidos, onde armas nucleares americanas ficam estacionadas, e Erdogan bloqueou a passagem de navios de guerra russos a caminho da Ucrânia.

Mas sob Erdogan a Turquia se tornou cada vez mais um problema a ser administrado. Como primeiro-ministro e posteriormente presidente, Erdogan afastou seu país da Europa ao mesmo tempo em que colocou em prática um jeito autoritário e populista de política islamista, especialmente após uma tentativa fracassada de golpe em 2016.

Erdogan comprou dos russos um avançado sistema de mísseis, que as autoridades da Otan classificam como uma ameaça para seus sistemas de defesa integrados, e em 2019 organizou uma incursão militar para combater curdos, no norte da Síria, que auxiliavam na luta contra o Estado Islâmico com apoio dos EUA.

“Nos meus quatro anos por lá, com frequência o placar era 27 a 1″, afirmou Ivo Daalder, que atuou como embaixador americano na Otan durante o governo Obama, quando a aliança tinha 28 membros.

As objeções de Erdogan à adesão da Suécia e da Finlândia até renovaram questões sobre a Otan estar em melhor posição sem a Turquia em seu quadro.

Um ensaio de opinião publicado este mês, coescrito por Joseph Lieberman, um ex-senador independente dos EUA por Connecticut, argumenta que a Turquia de Erdogan poderia desestimular futuros candidatos a adesão a atender padrões de governança democrática. O ensaio, publicado pelo The Wall Street Journal, alerta que as políticas de Ancara, incluindo o aconchego com Putin, minaram interesses da Otan e aconselha a aliança a considerar maneiras de expulsar a Turquia.

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O governo americano destacou que não vai tolerar nenhuma agressão contra a Finlândia ou a Suécia durante o processo.

“A Turquia é membro da Otan, mas sob Erdogan o país deixou de subscrever aos valores que fundamentam esta grande aliança”, escreveu Lieberman com Mark Wallace, diretor-executivo do Projeto Democracia Turca, um grupo crítico a Erdogan.

Alguns membros do Congresso expressaram a mesma posição. “A Turquia sob Erdogan não pode nem deveria ser considerada um aliado”, afirmou o senador Bob Menendez, de Nova Jersey, democrata mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, após a incursão militar da Turquia na Síria, em 2019.

Mas a Otan é uma aliança militar, e a Turquia, com o segundo maior Exército entre os membros da organização, uma avançada indústria de defesa e sua posição geográfica crucial, desempenha um papel vital.

Autoridades ocidentais afirmam que a Turquia causaria mais problemas enquanto um país ressentido por ter sido retirado da Otan — e poderia se aproximar mais da Rússia.

“A Turquia minou sua própria imagem”, afirmou Alper Coskun, ex-diplomata turco que agora atua como pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para a Paz Internacional. Contudo, afirmou ele, “não deixa de ser um membro crucial da aliança”.

Outra vez, a dúvida é o que apaziguará Erdogan e garantirá seu apoio à adesão da Suécia e da Finlândia.

O presidente Joe Biden enfatizou o apoio dos EUA à manobra quando recebeu líderes dos dois países na Casa Branca este mês e louvou a ampliação da Otan enquanto defesa contra o poder da Rússia. “Biden assumiu uma posição absolutamente explícita, de enorme visibilidade, ao convidá-los a Washington”, afirmou James Jeffrey, que atuou como embaixador americano na Turquia durante o governo Obama.

A maioria dos analistas acredita que Erdogan não bloqueará definitivamente a adesão da Suécia e da Finlândia, mas que ele pretende ressaltar as preocupações de segurança da Turquia e obter ganhos políticos domésticos antes das eleições em seu país, marcadas para o próximo ano.

A principal preocupação de Erdogan em relação à Suécia é o antigo apoio do país ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que luta pela formação de um Estado curdo independente dentro das fronteiras da Turquia.

O PKK, que já atacou alvos não militares e matou civis na Turquia, é ilegal no país e foi designado pelos EUA e pela União Europeia como organização terrorista; apesar de alguns governos, o sueco entre eles, considerarem o grupo com mais simpatia, como um movimento nacionalista curdo.

Os EUA também deram apoio a um grupo afiliado ao PKK na Síria, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que ajudaram a combater o Estado Islâmico e foram atacadas por Erdogan em 2019, na incursão turca em território sírio. O presidente turco quer que as YPG também sejam designadas como organização terrorista.

Erdogan acusa Finlândia e Suécia de dar abrigo a seguidores de Fethullah Gulen, clérigo turco que vive em exílio nos EUA, a quem o presidente turco culpa pela tentativa de golpe de Estado em 2016. A Turquia pede a extradição de aproximadamente 35 pessoas, que acusa de envolvimento com separatistas curdos ou Gulen.

Erdogan também se queixa do embargo de armas que Suécia e Finlândia impõem contra seu país, aplicado depois da incursão de 2019 na Síria. Dados os atuais acontecimentos na Ucrânia, a Suécia já considera levantar o embargo.

Alguns analistas afirmam que o governo de Erdogan considera o PKK em grande medida da mesma maneira que Washington considerava a Al-Qaeda 20 anos atrás, e que o Ocidente não pode desprezar essas preocupações se pretende negociar com a Turquia.

Autoridades do governo Biden minimizam a importância desse impasse e esperam que Erdogan alcance concessões mútuas com Finlândia e Suécia. Autoridades turcas reuniram-se em Ancara com homólogos finlandeses e suecos por várias horas na semana passada.

A embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, afirmou em entrevista que “isso parece um assunto que os turcos têm para tratar com Suécia e Finlândia, então, deixaremos que eles mesmos se acertem”. Ela afirmou que os EUA ajudarão caso seja necessário.

Em uma aparição pública ao lado do ministro de Relações Exteriores finlandês em Washington, na sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou estar “confiante de que concluiremos esse processo rapidamente — e de que as coisas avançarão para os dois países”.

Emre Peker, diretor com base em Londres do Eurasia Group, uma firma privada de consultoria, afirmou não acreditar que Erdogan esteja em busca de concessões de Washington. Ele disse estar confiante de que a Turquia poderá entrar em acordo com Suécia e Finlândia com a mediação do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

As principais prioridades de Erdogan são fazer com que as preocupações de segurança de seu país em relação aos curdos sejam ouvidas e que os embargos de armas sejam levantados, afirmou Peker.

Alguns analistas americanos estão céticos. Eric Edelman, ex-embaixador americano na Turquia e na Finlândia, alertou que Erdogan poderia estar tentando bajular Putin — ou no mínimo aliviar a fúria em Moscou pelo fato de uma empresa turca ter vendido drones letais às Forças Armadas da Ucrânia.

Ibrahim Kalin, porta-voz do presidente Recep Tayyip Erdogan,conversa com a delegação finlandesa chefiada por Jukka Salovaara durante reunião em Ancara, na Turquia Foto: AP

“Ele tem de preservar uma relação com Putin que já é bastante complicada”, afirmou Edelman. “Esta é uma boa maneira de dar uma pequena gorjeta para Putin: ‘Ainda sou útil para você’.”

Outros acreditam que o líder turco quer barganhar com Washington. Erdogan está enfurecido em razão dos EUA terem negado à Turquia acesso a caças furtivos de combate F-35, após ele ter comprado dos russos um sistema de mísseis S-400, em 2017. Agora, a Turquia está fazendo lobby para conseguir comprar jatos F-16 atualizados, mas enfrenta dura resistência no Congresso por parte dos que sustentam posições como as de Menendez.

Erdogan também pode estar em busca de atenção presidencial. Ele manteve uma relação cordial com o ex-presidente Donald Trump, mas Biden o manteve à distância.

“Trata-se de um homem que tem necessidade de estar no centro das atenções”, afirmou Daalder, o ex-embaixador americano na Otan. “Esta é uma maneira de dizer: ‘Ei, eu ainda estou por aqui. Vocês precisam dar atenção aos meus problemas’.”

Peker acredita que um acordo pode ser alcançado entre a Turquia e os países nórdicos antes da cúpula da Otan que ocorrerá em Madri no próximo mês, o que permitiria que os acordos de adesão fossem assinados durante o encontro.

Alguns analistas afirmam, porém ser mais provável que Biden tenha de expressar sua anuência a Erdogan em Madri para consolidar a concordância do líder turco em relação à manobra, como Obama fez na cúpula de 2009 da Otan, para garantir a nomeação de Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da aliança.

Em uma palestra organizada pelo Council on Foreign Relations na semana passada, o deputado federal Adam Smith, democrata de Washington e presidente da Comissão de Serviços Armados da Câmara, sugeriu que os interesses envolvidos na adesão da Suécia e da Finlândia são grandes o suficiente para determinar o envolvimento direto dos EUA.

“Precisamos nos sentar à mesa e forjar um acordo”, afirmou Smith. “E precisamos ser agressivos em relação a isso neste momento.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES — Quando o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou neste mês bloquear a adesão da Finlândia e da Suécia à Otan, as autoridades ocidentais se mostraram exasperadas — mas não ficaram nada chocadas.

Dentro de uma aliança que opera por meio de consenso, o homem-forte turco tornou-se um artista marginal. Em 2009, ele bloqueou a nomeação de um novo chefe da Otan na Dinamarca, reclamando que o país foi tolerante demais em relação a cartuns do profeta Maomé e simpático demais em relação aos “terroristas curdos” com base na Turquia. Foram necessárias horas de bajulações de líderes ocidentais, assim como a promessa feita cara a cara pelo ex-presidente Barack Obama de que a Otan nomearia um turco para uma posição de liderança, para satisfazer Erdogan.

Após um rompimento de relações entre Turquia e Israel no ano seguinte, Erdogan não permitiu que a aliança trabalhasse em conjunto com os israelenses por seis anos. Posteriormente, Erdogan adiou por meses o plano de fortificar os países do Leste Europeu contra a Rússia, citando outra vez militantes curdos e exigindo que a aliança classificasse os curdos que operam na Síria como terroristas. Em 2020, Erdogan enviou um navio de prospecção de gás natural para águas gregas sob a escolta de caças de combate, fazendo com que a França enviasse navios em apoio à Grécia, que também é membro da Otan.

Agora, o líder turco reassume um papel obstrucionista e volta a invocar os curdos, ao acusar Suécia e Finlândia de simpatizar com os militantes curdos que ele nomeou como seus principais inimigos.

“Esses países praticamente se tornaram hospedarias de organizações terroristas”, afirmou Erdogan este mês. “Não é possível para nós sermos favoráveis.”

A posição de Erdogan é um lembrete de um problema que há muito envenena as entranhas da Otan, que atualmente possui 30 membros. A invasão russa à Ucrânia pode ter dado à aliança um novo senso de missão, mas a Otan ainda tem de lidar com um líder autoritário disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso — pelo menos por algum tempo.

Esta situação favorece o presidente russo, Vladimir Putin, que tem se aproximado de Erdogan nos anos recentes. Para o líder russo, a rejeição da solicitação de adesão da Suécia e da Finlândia à Otan representaria uma vitória significativa.

O presidente dos EUA Joe Biden, conversa com a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, após uma reunião na Casa Branca Foto: Mandel Ngan/AFP

O dilema seria mais simples se a Turquia não fosse tão importante para a aliança. O país aderiu à Otan em 1952, após alinhar-se ao Ocidente em oposição à União Soviética; a Turquia fornece uma posição estratégica crucial na intersecção entre Europa e Ásia, cobrindo tanto o Oriente Médio quanto o Mar Negro. O país hospeda uma grande base aérea militar dos Estados Unidos, onde armas nucleares americanas ficam estacionadas, e Erdogan bloqueou a passagem de navios de guerra russos a caminho da Ucrânia.

Mas sob Erdogan a Turquia se tornou cada vez mais um problema a ser administrado. Como primeiro-ministro e posteriormente presidente, Erdogan afastou seu país da Europa ao mesmo tempo em que colocou em prática um jeito autoritário e populista de política islamista, especialmente após uma tentativa fracassada de golpe em 2016.

Erdogan comprou dos russos um avançado sistema de mísseis, que as autoridades da Otan classificam como uma ameaça para seus sistemas de defesa integrados, e em 2019 organizou uma incursão militar para combater curdos, no norte da Síria, que auxiliavam na luta contra o Estado Islâmico com apoio dos EUA.

“Nos meus quatro anos por lá, com frequência o placar era 27 a 1″, afirmou Ivo Daalder, que atuou como embaixador americano na Otan durante o governo Obama, quando a aliança tinha 28 membros.

As objeções de Erdogan à adesão da Suécia e da Finlândia até renovaram questões sobre a Otan estar em melhor posição sem a Turquia em seu quadro.

Um ensaio de opinião publicado este mês, coescrito por Joseph Lieberman, um ex-senador independente dos EUA por Connecticut, argumenta que a Turquia de Erdogan poderia desestimular futuros candidatos a adesão a atender padrões de governança democrática. O ensaio, publicado pelo The Wall Street Journal, alerta que as políticas de Ancara, incluindo o aconchego com Putin, minaram interesses da Otan e aconselha a aliança a considerar maneiras de expulsar a Turquia.

Seu navegador não suporta esse video.

O governo americano destacou que não vai tolerar nenhuma agressão contra a Finlândia ou a Suécia durante o processo.

“A Turquia é membro da Otan, mas sob Erdogan o país deixou de subscrever aos valores que fundamentam esta grande aliança”, escreveu Lieberman com Mark Wallace, diretor-executivo do Projeto Democracia Turca, um grupo crítico a Erdogan.

Alguns membros do Congresso expressaram a mesma posição. “A Turquia sob Erdogan não pode nem deveria ser considerada um aliado”, afirmou o senador Bob Menendez, de Nova Jersey, democrata mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, após a incursão militar da Turquia na Síria, em 2019.

Mas a Otan é uma aliança militar, e a Turquia, com o segundo maior Exército entre os membros da organização, uma avançada indústria de defesa e sua posição geográfica crucial, desempenha um papel vital.

Autoridades ocidentais afirmam que a Turquia causaria mais problemas enquanto um país ressentido por ter sido retirado da Otan — e poderia se aproximar mais da Rússia.

“A Turquia minou sua própria imagem”, afirmou Alper Coskun, ex-diplomata turco que agora atua como pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para a Paz Internacional. Contudo, afirmou ele, “não deixa de ser um membro crucial da aliança”.

Outra vez, a dúvida é o que apaziguará Erdogan e garantirá seu apoio à adesão da Suécia e da Finlândia.

O presidente Joe Biden enfatizou o apoio dos EUA à manobra quando recebeu líderes dos dois países na Casa Branca este mês e louvou a ampliação da Otan enquanto defesa contra o poder da Rússia. “Biden assumiu uma posição absolutamente explícita, de enorme visibilidade, ao convidá-los a Washington”, afirmou James Jeffrey, que atuou como embaixador americano na Turquia durante o governo Obama.

A maioria dos analistas acredita que Erdogan não bloqueará definitivamente a adesão da Suécia e da Finlândia, mas que ele pretende ressaltar as preocupações de segurança da Turquia e obter ganhos políticos domésticos antes das eleições em seu país, marcadas para o próximo ano.

A principal preocupação de Erdogan em relação à Suécia é o antigo apoio do país ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que luta pela formação de um Estado curdo independente dentro das fronteiras da Turquia.

O PKK, que já atacou alvos não militares e matou civis na Turquia, é ilegal no país e foi designado pelos EUA e pela União Europeia como organização terrorista; apesar de alguns governos, o sueco entre eles, considerarem o grupo com mais simpatia, como um movimento nacionalista curdo.

Os EUA também deram apoio a um grupo afiliado ao PKK na Síria, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que ajudaram a combater o Estado Islâmico e foram atacadas por Erdogan em 2019, na incursão turca em território sírio. O presidente turco quer que as YPG também sejam designadas como organização terrorista.

Erdogan acusa Finlândia e Suécia de dar abrigo a seguidores de Fethullah Gulen, clérigo turco que vive em exílio nos EUA, a quem o presidente turco culpa pela tentativa de golpe de Estado em 2016. A Turquia pede a extradição de aproximadamente 35 pessoas, que acusa de envolvimento com separatistas curdos ou Gulen.

Erdogan também se queixa do embargo de armas que Suécia e Finlândia impõem contra seu país, aplicado depois da incursão de 2019 na Síria. Dados os atuais acontecimentos na Ucrânia, a Suécia já considera levantar o embargo.

Alguns analistas afirmam que o governo de Erdogan considera o PKK em grande medida da mesma maneira que Washington considerava a Al-Qaeda 20 anos atrás, e que o Ocidente não pode desprezar essas preocupações se pretende negociar com a Turquia.

Autoridades do governo Biden minimizam a importância desse impasse e esperam que Erdogan alcance concessões mútuas com Finlândia e Suécia. Autoridades turcas reuniram-se em Ancara com homólogos finlandeses e suecos por várias horas na semana passada.

A embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, afirmou em entrevista que “isso parece um assunto que os turcos têm para tratar com Suécia e Finlândia, então, deixaremos que eles mesmos se acertem”. Ela afirmou que os EUA ajudarão caso seja necessário.

Em uma aparição pública ao lado do ministro de Relações Exteriores finlandês em Washington, na sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou estar “confiante de que concluiremos esse processo rapidamente — e de que as coisas avançarão para os dois países”.

Emre Peker, diretor com base em Londres do Eurasia Group, uma firma privada de consultoria, afirmou não acreditar que Erdogan esteja em busca de concessões de Washington. Ele disse estar confiante de que a Turquia poderá entrar em acordo com Suécia e Finlândia com a mediação do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

As principais prioridades de Erdogan são fazer com que as preocupações de segurança de seu país em relação aos curdos sejam ouvidas e que os embargos de armas sejam levantados, afirmou Peker.

Alguns analistas americanos estão céticos. Eric Edelman, ex-embaixador americano na Turquia e na Finlândia, alertou que Erdogan poderia estar tentando bajular Putin — ou no mínimo aliviar a fúria em Moscou pelo fato de uma empresa turca ter vendido drones letais às Forças Armadas da Ucrânia.

Ibrahim Kalin, porta-voz do presidente Recep Tayyip Erdogan,conversa com a delegação finlandesa chefiada por Jukka Salovaara durante reunião em Ancara, na Turquia Foto: AP

“Ele tem de preservar uma relação com Putin que já é bastante complicada”, afirmou Edelman. “Esta é uma boa maneira de dar uma pequena gorjeta para Putin: ‘Ainda sou útil para você’.”

Outros acreditam que o líder turco quer barganhar com Washington. Erdogan está enfurecido em razão dos EUA terem negado à Turquia acesso a caças furtivos de combate F-35, após ele ter comprado dos russos um sistema de mísseis S-400, em 2017. Agora, a Turquia está fazendo lobby para conseguir comprar jatos F-16 atualizados, mas enfrenta dura resistência no Congresso por parte dos que sustentam posições como as de Menendez.

Erdogan também pode estar em busca de atenção presidencial. Ele manteve uma relação cordial com o ex-presidente Donald Trump, mas Biden o manteve à distância.

“Trata-se de um homem que tem necessidade de estar no centro das atenções”, afirmou Daalder, o ex-embaixador americano na Otan. “Esta é uma maneira de dizer: ‘Ei, eu ainda estou por aqui. Vocês precisam dar atenção aos meus problemas’.”

Peker acredita que um acordo pode ser alcançado entre a Turquia e os países nórdicos antes da cúpula da Otan que ocorrerá em Madri no próximo mês, o que permitiria que os acordos de adesão fossem assinados durante o encontro.

Alguns analistas afirmam, porém ser mais provável que Biden tenha de expressar sua anuência a Erdogan em Madri para consolidar a concordância do líder turco em relação à manobra, como Obama fez na cúpula de 2009 da Otan, para garantir a nomeação de Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da aliança.

Em uma palestra organizada pelo Council on Foreign Relations na semana passada, o deputado federal Adam Smith, democrata de Washington e presidente da Comissão de Serviços Armados da Câmara, sugeriu que os interesses envolvidos na adesão da Suécia e da Finlândia são grandes o suficiente para determinar o envolvimento direto dos EUA.

“Precisamos nos sentar à mesa e forjar um acordo”, afirmou Smith. “E precisamos ser agressivos em relação a isso neste momento.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES — Quando o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou neste mês bloquear a adesão da Finlândia e da Suécia à Otan, as autoridades ocidentais se mostraram exasperadas — mas não ficaram nada chocadas.

Dentro de uma aliança que opera por meio de consenso, o homem-forte turco tornou-se um artista marginal. Em 2009, ele bloqueou a nomeação de um novo chefe da Otan na Dinamarca, reclamando que o país foi tolerante demais em relação a cartuns do profeta Maomé e simpático demais em relação aos “terroristas curdos” com base na Turquia. Foram necessárias horas de bajulações de líderes ocidentais, assim como a promessa feita cara a cara pelo ex-presidente Barack Obama de que a Otan nomearia um turco para uma posição de liderança, para satisfazer Erdogan.

Após um rompimento de relações entre Turquia e Israel no ano seguinte, Erdogan não permitiu que a aliança trabalhasse em conjunto com os israelenses por seis anos. Posteriormente, Erdogan adiou por meses o plano de fortificar os países do Leste Europeu contra a Rússia, citando outra vez militantes curdos e exigindo que a aliança classificasse os curdos que operam na Síria como terroristas. Em 2020, Erdogan enviou um navio de prospecção de gás natural para águas gregas sob a escolta de caças de combate, fazendo com que a França enviasse navios em apoio à Grécia, que também é membro da Otan.

Agora, o líder turco reassume um papel obstrucionista e volta a invocar os curdos, ao acusar Suécia e Finlândia de simpatizar com os militantes curdos que ele nomeou como seus principais inimigos.

“Esses países praticamente se tornaram hospedarias de organizações terroristas”, afirmou Erdogan este mês. “Não é possível para nós sermos favoráveis.”

A posição de Erdogan é um lembrete de um problema que há muito envenena as entranhas da Otan, que atualmente possui 30 membros. A invasão russa à Ucrânia pode ter dado à aliança um novo senso de missão, mas a Otan ainda tem de lidar com um líder autoritário disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso — pelo menos por algum tempo.

Esta situação favorece o presidente russo, Vladimir Putin, que tem se aproximado de Erdogan nos anos recentes. Para o líder russo, a rejeição da solicitação de adesão da Suécia e da Finlândia à Otan representaria uma vitória significativa.

O presidente dos EUA Joe Biden, conversa com a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, após uma reunião na Casa Branca Foto: Mandel Ngan/AFP

O dilema seria mais simples se a Turquia não fosse tão importante para a aliança. O país aderiu à Otan em 1952, após alinhar-se ao Ocidente em oposição à União Soviética; a Turquia fornece uma posição estratégica crucial na intersecção entre Europa e Ásia, cobrindo tanto o Oriente Médio quanto o Mar Negro. O país hospeda uma grande base aérea militar dos Estados Unidos, onde armas nucleares americanas ficam estacionadas, e Erdogan bloqueou a passagem de navios de guerra russos a caminho da Ucrânia.

Mas sob Erdogan a Turquia se tornou cada vez mais um problema a ser administrado. Como primeiro-ministro e posteriormente presidente, Erdogan afastou seu país da Europa ao mesmo tempo em que colocou em prática um jeito autoritário e populista de política islamista, especialmente após uma tentativa fracassada de golpe em 2016.

Erdogan comprou dos russos um avançado sistema de mísseis, que as autoridades da Otan classificam como uma ameaça para seus sistemas de defesa integrados, e em 2019 organizou uma incursão militar para combater curdos, no norte da Síria, que auxiliavam na luta contra o Estado Islâmico com apoio dos EUA.

“Nos meus quatro anos por lá, com frequência o placar era 27 a 1″, afirmou Ivo Daalder, que atuou como embaixador americano na Otan durante o governo Obama, quando a aliança tinha 28 membros.

As objeções de Erdogan à adesão da Suécia e da Finlândia até renovaram questões sobre a Otan estar em melhor posição sem a Turquia em seu quadro.

Um ensaio de opinião publicado este mês, coescrito por Joseph Lieberman, um ex-senador independente dos EUA por Connecticut, argumenta que a Turquia de Erdogan poderia desestimular futuros candidatos a adesão a atender padrões de governança democrática. O ensaio, publicado pelo The Wall Street Journal, alerta que as políticas de Ancara, incluindo o aconchego com Putin, minaram interesses da Otan e aconselha a aliança a considerar maneiras de expulsar a Turquia.

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O governo americano destacou que não vai tolerar nenhuma agressão contra a Finlândia ou a Suécia durante o processo.

“A Turquia é membro da Otan, mas sob Erdogan o país deixou de subscrever aos valores que fundamentam esta grande aliança”, escreveu Lieberman com Mark Wallace, diretor-executivo do Projeto Democracia Turca, um grupo crítico a Erdogan.

Alguns membros do Congresso expressaram a mesma posição. “A Turquia sob Erdogan não pode nem deveria ser considerada um aliado”, afirmou o senador Bob Menendez, de Nova Jersey, democrata mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, após a incursão militar da Turquia na Síria, em 2019.

Mas a Otan é uma aliança militar, e a Turquia, com o segundo maior Exército entre os membros da organização, uma avançada indústria de defesa e sua posição geográfica crucial, desempenha um papel vital.

Autoridades ocidentais afirmam que a Turquia causaria mais problemas enquanto um país ressentido por ter sido retirado da Otan — e poderia se aproximar mais da Rússia.

“A Turquia minou sua própria imagem”, afirmou Alper Coskun, ex-diplomata turco que agora atua como pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para a Paz Internacional. Contudo, afirmou ele, “não deixa de ser um membro crucial da aliança”.

Outra vez, a dúvida é o que apaziguará Erdogan e garantirá seu apoio à adesão da Suécia e da Finlândia.

O presidente Joe Biden enfatizou o apoio dos EUA à manobra quando recebeu líderes dos dois países na Casa Branca este mês e louvou a ampliação da Otan enquanto defesa contra o poder da Rússia. “Biden assumiu uma posição absolutamente explícita, de enorme visibilidade, ao convidá-los a Washington”, afirmou James Jeffrey, que atuou como embaixador americano na Turquia durante o governo Obama.

A maioria dos analistas acredita que Erdogan não bloqueará definitivamente a adesão da Suécia e da Finlândia, mas que ele pretende ressaltar as preocupações de segurança da Turquia e obter ganhos políticos domésticos antes das eleições em seu país, marcadas para o próximo ano.

A principal preocupação de Erdogan em relação à Suécia é o antigo apoio do país ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que luta pela formação de um Estado curdo independente dentro das fronteiras da Turquia.

O PKK, que já atacou alvos não militares e matou civis na Turquia, é ilegal no país e foi designado pelos EUA e pela União Europeia como organização terrorista; apesar de alguns governos, o sueco entre eles, considerarem o grupo com mais simpatia, como um movimento nacionalista curdo.

Os EUA também deram apoio a um grupo afiliado ao PKK na Síria, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que ajudaram a combater o Estado Islâmico e foram atacadas por Erdogan em 2019, na incursão turca em território sírio. O presidente turco quer que as YPG também sejam designadas como organização terrorista.

Erdogan acusa Finlândia e Suécia de dar abrigo a seguidores de Fethullah Gulen, clérigo turco que vive em exílio nos EUA, a quem o presidente turco culpa pela tentativa de golpe de Estado em 2016. A Turquia pede a extradição de aproximadamente 35 pessoas, que acusa de envolvimento com separatistas curdos ou Gulen.

Erdogan também se queixa do embargo de armas que Suécia e Finlândia impõem contra seu país, aplicado depois da incursão de 2019 na Síria. Dados os atuais acontecimentos na Ucrânia, a Suécia já considera levantar o embargo.

Alguns analistas afirmam que o governo de Erdogan considera o PKK em grande medida da mesma maneira que Washington considerava a Al-Qaeda 20 anos atrás, e que o Ocidente não pode desprezar essas preocupações se pretende negociar com a Turquia.

Autoridades do governo Biden minimizam a importância desse impasse e esperam que Erdogan alcance concessões mútuas com Finlândia e Suécia. Autoridades turcas reuniram-se em Ancara com homólogos finlandeses e suecos por várias horas na semana passada.

A embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, afirmou em entrevista que “isso parece um assunto que os turcos têm para tratar com Suécia e Finlândia, então, deixaremos que eles mesmos se acertem”. Ela afirmou que os EUA ajudarão caso seja necessário.

Em uma aparição pública ao lado do ministro de Relações Exteriores finlandês em Washington, na sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou estar “confiante de que concluiremos esse processo rapidamente — e de que as coisas avançarão para os dois países”.

Emre Peker, diretor com base em Londres do Eurasia Group, uma firma privada de consultoria, afirmou não acreditar que Erdogan esteja em busca de concessões de Washington. Ele disse estar confiante de que a Turquia poderá entrar em acordo com Suécia e Finlândia com a mediação do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

As principais prioridades de Erdogan são fazer com que as preocupações de segurança de seu país em relação aos curdos sejam ouvidas e que os embargos de armas sejam levantados, afirmou Peker.

Alguns analistas americanos estão céticos. Eric Edelman, ex-embaixador americano na Turquia e na Finlândia, alertou que Erdogan poderia estar tentando bajular Putin — ou no mínimo aliviar a fúria em Moscou pelo fato de uma empresa turca ter vendido drones letais às Forças Armadas da Ucrânia.

Ibrahim Kalin, porta-voz do presidente Recep Tayyip Erdogan,conversa com a delegação finlandesa chefiada por Jukka Salovaara durante reunião em Ancara, na Turquia Foto: AP

“Ele tem de preservar uma relação com Putin que já é bastante complicada”, afirmou Edelman. “Esta é uma boa maneira de dar uma pequena gorjeta para Putin: ‘Ainda sou útil para você’.”

Outros acreditam que o líder turco quer barganhar com Washington. Erdogan está enfurecido em razão dos EUA terem negado à Turquia acesso a caças furtivos de combate F-35, após ele ter comprado dos russos um sistema de mísseis S-400, em 2017. Agora, a Turquia está fazendo lobby para conseguir comprar jatos F-16 atualizados, mas enfrenta dura resistência no Congresso por parte dos que sustentam posições como as de Menendez.

Erdogan também pode estar em busca de atenção presidencial. Ele manteve uma relação cordial com o ex-presidente Donald Trump, mas Biden o manteve à distância.

“Trata-se de um homem que tem necessidade de estar no centro das atenções”, afirmou Daalder, o ex-embaixador americano na Otan. “Esta é uma maneira de dizer: ‘Ei, eu ainda estou por aqui. Vocês precisam dar atenção aos meus problemas’.”

Peker acredita que um acordo pode ser alcançado entre a Turquia e os países nórdicos antes da cúpula da Otan que ocorrerá em Madri no próximo mês, o que permitiria que os acordos de adesão fossem assinados durante o encontro.

Alguns analistas afirmam, porém ser mais provável que Biden tenha de expressar sua anuência a Erdogan em Madri para consolidar a concordância do líder turco em relação à manobra, como Obama fez na cúpula de 2009 da Otan, para garantir a nomeação de Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da aliança.

Em uma palestra organizada pelo Council on Foreign Relations na semana passada, o deputado federal Adam Smith, democrata de Washington e presidente da Comissão de Serviços Armados da Câmara, sugeriu que os interesses envolvidos na adesão da Suécia e da Finlândia são grandes o suficiente para determinar o envolvimento direto dos EUA.

“Precisamos nos sentar à mesa e forjar um acordo”, afirmou Smith. “E precisamos ser agressivos em relação a isso neste momento.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES — Quando o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou neste mês bloquear a adesão da Finlândia e da Suécia à Otan, as autoridades ocidentais se mostraram exasperadas — mas não ficaram nada chocadas.

Dentro de uma aliança que opera por meio de consenso, o homem-forte turco tornou-se um artista marginal. Em 2009, ele bloqueou a nomeação de um novo chefe da Otan na Dinamarca, reclamando que o país foi tolerante demais em relação a cartuns do profeta Maomé e simpático demais em relação aos “terroristas curdos” com base na Turquia. Foram necessárias horas de bajulações de líderes ocidentais, assim como a promessa feita cara a cara pelo ex-presidente Barack Obama de que a Otan nomearia um turco para uma posição de liderança, para satisfazer Erdogan.

Após um rompimento de relações entre Turquia e Israel no ano seguinte, Erdogan não permitiu que a aliança trabalhasse em conjunto com os israelenses por seis anos. Posteriormente, Erdogan adiou por meses o plano de fortificar os países do Leste Europeu contra a Rússia, citando outra vez militantes curdos e exigindo que a aliança classificasse os curdos que operam na Síria como terroristas. Em 2020, Erdogan enviou um navio de prospecção de gás natural para águas gregas sob a escolta de caças de combate, fazendo com que a França enviasse navios em apoio à Grécia, que também é membro da Otan.

Agora, o líder turco reassume um papel obstrucionista e volta a invocar os curdos, ao acusar Suécia e Finlândia de simpatizar com os militantes curdos que ele nomeou como seus principais inimigos.

“Esses países praticamente se tornaram hospedarias de organizações terroristas”, afirmou Erdogan este mês. “Não é possível para nós sermos favoráveis.”

A posição de Erdogan é um lembrete de um problema que há muito envenena as entranhas da Otan, que atualmente possui 30 membros. A invasão russa à Ucrânia pode ter dado à aliança um novo senso de missão, mas a Otan ainda tem de lidar com um líder autoritário disposto a usar seu poder de influência para obter ganhos políticos domésticos bloqueando o consenso — pelo menos por algum tempo.

Esta situação favorece o presidente russo, Vladimir Putin, que tem se aproximado de Erdogan nos anos recentes. Para o líder russo, a rejeição da solicitação de adesão da Suécia e da Finlândia à Otan representaria uma vitória significativa.

O presidente dos EUA Joe Biden, conversa com a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, após uma reunião na Casa Branca Foto: Mandel Ngan/AFP

O dilema seria mais simples se a Turquia não fosse tão importante para a aliança. O país aderiu à Otan em 1952, após alinhar-se ao Ocidente em oposição à União Soviética; a Turquia fornece uma posição estratégica crucial na intersecção entre Europa e Ásia, cobrindo tanto o Oriente Médio quanto o Mar Negro. O país hospeda uma grande base aérea militar dos Estados Unidos, onde armas nucleares americanas ficam estacionadas, e Erdogan bloqueou a passagem de navios de guerra russos a caminho da Ucrânia.

Mas sob Erdogan a Turquia se tornou cada vez mais um problema a ser administrado. Como primeiro-ministro e posteriormente presidente, Erdogan afastou seu país da Europa ao mesmo tempo em que colocou em prática um jeito autoritário e populista de política islamista, especialmente após uma tentativa fracassada de golpe em 2016.

Erdogan comprou dos russos um avançado sistema de mísseis, que as autoridades da Otan classificam como uma ameaça para seus sistemas de defesa integrados, e em 2019 organizou uma incursão militar para combater curdos, no norte da Síria, que auxiliavam na luta contra o Estado Islâmico com apoio dos EUA.

“Nos meus quatro anos por lá, com frequência o placar era 27 a 1″, afirmou Ivo Daalder, que atuou como embaixador americano na Otan durante o governo Obama, quando a aliança tinha 28 membros.

As objeções de Erdogan à adesão da Suécia e da Finlândia até renovaram questões sobre a Otan estar em melhor posição sem a Turquia em seu quadro.

Um ensaio de opinião publicado este mês, coescrito por Joseph Lieberman, um ex-senador independente dos EUA por Connecticut, argumenta que a Turquia de Erdogan poderia desestimular futuros candidatos a adesão a atender padrões de governança democrática. O ensaio, publicado pelo The Wall Street Journal, alerta que as políticas de Ancara, incluindo o aconchego com Putin, minaram interesses da Otan e aconselha a aliança a considerar maneiras de expulsar a Turquia.

Seu navegador não suporta esse video.

O governo americano destacou que não vai tolerar nenhuma agressão contra a Finlândia ou a Suécia durante o processo.

“A Turquia é membro da Otan, mas sob Erdogan o país deixou de subscrever aos valores que fundamentam esta grande aliança”, escreveu Lieberman com Mark Wallace, diretor-executivo do Projeto Democracia Turca, um grupo crítico a Erdogan.

Alguns membros do Congresso expressaram a mesma posição. “A Turquia sob Erdogan não pode nem deveria ser considerada um aliado”, afirmou o senador Bob Menendez, de Nova Jersey, democrata mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, após a incursão militar da Turquia na Síria, em 2019.

Mas a Otan é uma aliança militar, e a Turquia, com o segundo maior Exército entre os membros da organização, uma avançada indústria de defesa e sua posição geográfica crucial, desempenha um papel vital.

Autoridades ocidentais afirmam que a Turquia causaria mais problemas enquanto um país ressentido por ter sido retirado da Otan — e poderia se aproximar mais da Rússia.

“A Turquia minou sua própria imagem”, afirmou Alper Coskun, ex-diplomata turco que agora atua como pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para a Paz Internacional. Contudo, afirmou ele, “não deixa de ser um membro crucial da aliança”.

Outra vez, a dúvida é o que apaziguará Erdogan e garantirá seu apoio à adesão da Suécia e da Finlândia.

O presidente Joe Biden enfatizou o apoio dos EUA à manobra quando recebeu líderes dos dois países na Casa Branca este mês e louvou a ampliação da Otan enquanto defesa contra o poder da Rússia. “Biden assumiu uma posição absolutamente explícita, de enorme visibilidade, ao convidá-los a Washington”, afirmou James Jeffrey, que atuou como embaixador americano na Turquia durante o governo Obama.

A maioria dos analistas acredita que Erdogan não bloqueará definitivamente a adesão da Suécia e da Finlândia, mas que ele pretende ressaltar as preocupações de segurança da Turquia e obter ganhos políticos domésticos antes das eleições em seu país, marcadas para o próximo ano.

A principal preocupação de Erdogan em relação à Suécia é o antigo apoio do país ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que luta pela formação de um Estado curdo independente dentro das fronteiras da Turquia.

O PKK, que já atacou alvos não militares e matou civis na Turquia, é ilegal no país e foi designado pelos EUA e pela União Europeia como organização terrorista; apesar de alguns governos, o sueco entre eles, considerarem o grupo com mais simpatia, como um movimento nacionalista curdo.

Os EUA também deram apoio a um grupo afiliado ao PKK na Síria, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que ajudaram a combater o Estado Islâmico e foram atacadas por Erdogan em 2019, na incursão turca em território sírio. O presidente turco quer que as YPG também sejam designadas como organização terrorista.

Erdogan acusa Finlândia e Suécia de dar abrigo a seguidores de Fethullah Gulen, clérigo turco que vive em exílio nos EUA, a quem o presidente turco culpa pela tentativa de golpe de Estado em 2016. A Turquia pede a extradição de aproximadamente 35 pessoas, que acusa de envolvimento com separatistas curdos ou Gulen.

Erdogan também se queixa do embargo de armas que Suécia e Finlândia impõem contra seu país, aplicado depois da incursão de 2019 na Síria. Dados os atuais acontecimentos na Ucrânia, a Suécia já considera levantar o embargo.

Alguns analistas afirmam que o governo de Erdogan considera o PKK em grande medida da mesma maneira que Washington considerava a Al-Qaeda 20 anos atrás, e que o Ocidente não pode desprezar essas preocupações se pretende negociar com a Turquia.

Autoridades do governo Biden minimizam a importância desse impasse e esperam que Erdogan alcance concessões mútuas com Finlândia e Suécia. Autoridades turcas reuniram-se em Ancara com homólogos finlandeses e suecos por várias horas na semana passada.

A embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, afirmou em entrevista que “isso parece um assunto que os turcos têm para tratar com Suécia e Finlândia, então, deixaremos que eles mesmos se acertem”. Ela afirmou que os EUA ajudarão caso seja necessário.

Em uma aparição pública ao lado do ministro de Relações Exteriores finlandês em Washington, na sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou estar “confiante de que concluiremos esse processo rapidamente — e de que as coisas avançarão para os dois países”.

Emre Peker, diretor com base em Londres do Eurasia Group, uma firma privada de consultoria, afirmou não acreditar que Erdogan esteja em busca de concessões de Washington. Ele disse estar confiante de que a Turquia poderá entrar em acordo com Suécia e Finlândia com a mediação do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

As principais prioridades de Erdogan são fazer com que as preocupações de segurança de seu país em relação aos curdos sejam ouvidas e que os embargos de armas sejam levantados, afirmou Peker.

Alguns analistas americanos estão céticos. Eric Edelman, ex-embaixador americano na Turquia e na Finlândia, alertou que Erdogan poderia estar tentando bajular Putin — ou no mínimo aliviar a fúria em Moscou pelo fato de uma empresa turca ter vendido drones letais às Forças Armadas da Ucrânia.

Ibrahim Kalin, porta-voz do presidente Recep Tayyip Erdogan,conversa com a delegação finlandesa chefiada por Jukka Salovaara durante reunião em Ancara, na Turquia Foto: AP

“Ele tem de preservar uma relação com Putin que já é bastante complicada”, afirmou Edelman. “Esta é uma boa maneira de dar uma pequena gorjeta para Putin: ‘Ainda sou útil para você’.”

Outros acreditam que o líder turco quer barganhar com Washington. Erdogan está enfurecido em razão dos EUA terem negado à Turquia acesso a caças furtivos de combate F-35, após ele ter comprado dos russos um sistema de mísseis S-400, em 2017. Agora, a Turquia está fazendo lobby para conseguir comprar jatos F-16 atualizados, mas enfrenta dura resistência no Congresso por parte dos que sustentam posições como as de Menendez.

Erdogan também pode estar em busca de atenção presidencial. Ele manteve uma relação cordial com o ex-presidente Donald Trump, mas Biden o manteve à distância.

“Trata-se de um homem que tem necessidade de estar no centro das atenções”, afirmou Daalder, o ex-embaixador americano na Otan. “Esta é uma maneira de dizer: ‘Ei, eu ainda estou por aqui. Vocês precisam dar atenção aos meus problemas’.”

Peker acredita que um acordo pode ser alcançado entre a Turquia e os países nórdicos antes da cúpula da Otan que ocorrerá em Madri no próximo mês, o que permitiria que os acordos de adesão fossem assinados durante o encontro.

Alguns analistas afirmam, porém ser mais provável que Biden tenha de expressar sua anuência a Erdogan em Madri para consolidar a concordância do líder turco em relação à manobra, como Obama fez na cúpula de 2009 da Otan, para garantir a nomeação de Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da aliança.

Em uma palestra organizada pelo Council on Foreign Relations na semana passada, o deputado federal Adam Smith, democrata de Washington e presidente da Comissão de Serviços Armados da Câmara, sugeriu que os interesses envolvidos na adesão da Suécia e da Finlândia são grandes o suficiente para determinar o envolvimento direto dos EUA.

“Precisamos nos sentar à mesa e forjar um acordo”, afirmou Smith. “E precisamos ser agressivos em relação a isso neste momento.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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