Para críticos de Ortega, rompimento com Lula reforça isolamento e aposta no autoritarismo


Ditador da Nicarágua expulsou embaixador brasileiro em meio às tensões regionais após a eleição na Venezuela

Por Jéssica Petrovna

Daniel Ortega não tem meio termo na escolha de aliados. O regime fechou as portas para governos, até mesmo os de esquerda, que expressam qualquer nível de moderação ou preocupação com democracia e direitos humanos. O alvo mais recente foi o seu antigo aliado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se viu com a expulsão dos embaixadores entre Brasil e Nicarágua.

Nesta semana, a ditadura fechou 1.500 organizações sem fins lucrativos no país. Na lista, que inclui de grupos católicos a organizações de esquerda, está presente a Câmara de Comércio Brasil-Nicarágua que atuava no país desde o início dos anos 2010.

O fechamento e a expulsão dos embaixadores é mais um passo no que a analista Elvira Cuadra Lira chama de “isolamento seletivo”. Nicaraguense, a socióloga viu os centros de pesquisa onde trabalhava em investigações na área de segurança serem fechados pelo regime. Ela faz parte do grupo de 94 opositores que tiveram a nacionalidade retirada pela ditadura no ano passado.

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A lista inclui acadêmicos, jornalistas, religiosos, defensores dos direitos humanos, diplomatas, dissidentes sandinistas... “Ortega nos despojou da nacionalidade, confiscou propriedades e nos declarou foragidos da Justiça. Um processo absolutamente arbitrário porque não houve denúncia, julgamento, nada”, relata ela que hoje vive na Costa Rica, destino frequente dos exilados da Nicarágua.

Daniel Ortega na celebração da independência da Nicarágua. Foto: Cesar Perez/Presidência da Nivarágua

“Ele tem avançado em um processo de radicalização e isolamento, mas é um isolamento seletivo. Porque enquanto fecha as portas a qualquer governo que faça cobranças em relação a direitos humanos, democracia, se aproxima mais de regimes que são claramente autocráticos, não só na América Latina ― Cuba e Venezuela ― mas também Rússia, China, Irã, que são alguns de seus aliados mais próximos”, explica.

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No caso do Brasil, Daniel Ortega não só expulsou o embaixador em Manágua Breno de Souza Dias, como se antecipou à reposta do governo Lula e retirou a sua representante em Brasília Fulvia Castro sob o argumento que ela seria promovida na estrutura do regime, como mostrou o Estadão.

O argumento oficial foi a ausência de Breno Souza Dias na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. O pano de fundo é o esfriamento de relações entre Ortega e Lula, que se intensificou depois que o brasileiro se propôs a interceder pela liberação do bispo Rolando Álvarez, condenado a 26 prisão após se recusar a deixar o país.

O pedido para que o presidente brasileiro conversasse com o ditador nicaraguense partiu do papa Francisco, como antecipou o Estadão à época da viagem de Lula a Roma.

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“Ortega está dizendo a Lula que não o aceita como intermediário junto a comunidade internacional para encontrar uma saída democrática para a crise na Nicarágua. Essa é a mensagem direta de Ortega e sua esposa, Rosario Murillo”, afirma ex-deputado nicaraguense Elíseo Nunez, referindo-se à primeira-dama que é também vice-presidente e chefe da Suprema Corte.

Forçado a deixar o país, ele vive na Costa Rica e integra a Concertação Democrática Nicaraguense, movimento político criado por exilados do regime, que defendem a transição pacífica de poder em Manágua.

Além do estremecimento das relações envolvendo a igreja Católica, Nunez acredita que a reação desproporcional de Daniel Ortega à ausência do embaixador brasileiro na celebração sandinista está relacionada à outro regime autoritário na região: a Venezuela.

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Aliado a Colômbia e México, o Brasil se propõe a facilitar o diálogo e ainda não reconhece o resultado das eleições. A posição oficial do grupo é cobrar o chavismo pela divulgação das atas, que comprovariam os resultados, mas essa perspectiva parece cada vez mais distante. A portas fechadas, o governo Lula discute a possibilidade de nova votação para superar a crise.

‘Ortega considera (a posição brasileira) uma traição porque acredita que ser de esquerda, ser anti-imperialista, ou seja, apenas por gritar “morte aos americanos”, deveria ter o direito de massacrar o seu povo, roubar eleições... Essa é a mentalidade de Ortega. Então, quando ele se depara com uma esquerda mais democrática, considera uma traição. A mensagem é: o que você está tentando na Venezuela, comigo não funciona”, especula Nunez.

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Ainda que Caracas não forneça apoio material a Manágua em razão do debacle econômico que espalhou quase 8 milhões de imigrantes venezuelanos, a continuidade de Nicolás Maduro no Palácio de Miraflores contribui para sustentação política do regime Daniel Ortega.

“Se Maduro sai do poder, isso representa uma perda para Daniel Ortega porque tira um dos seus aliados mais importantes. Vale ressaltar que o regime da Nicarágua é muito fraco, não conta com nenhum tipo de respaldo da população, nem da comunidade latino-americana”, reforça Elvira Cuadra Lira.

Daniel Ortega chegou à presidência pela primeira vez em 1979, com o triunfo da Revolução Sandinista sobre a ditadura dos Somoza. Depois de sucessivas derrotas eleitorais na década de 1990, voltou ao poder em 2007 e assumiu cada vez mais controle sobre o Estado.

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A repressão passou a ser brutal quando a Nicarágua, dependente do petróleo da Venezuela, sentiu os efeitos do debacle econômico do regime Nicolás Maduro. Os protestos massivos no país, em 2018, terminaram com centenas de mortos. Milhares de pessoas foram presas, assim como praticamente todos os candidatos que poderiam desafiar o ditador na eleição seguinte.

A lista de violações é longa. Inclui execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação da nacionalidade ou do direito de permanecer no próprio país, como aconteceu como Elvira e Elíseo.

Lula recebe Daniel Ortega em Brasília em 2010.  Foto: Eraldo Peres/Associated Press

Antes do rompimento, o Brasil chegou a expressar preocupação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora tenha se recusado a assinar a declaração de 55 países que condenava crimes contra humanidade da ditadura nicaraguense. Nos bastidores governo Lula chegou a defender a “posição construtiva” com a Nicarágua, mas a ditadura esticou a corda.

“Daniel Ortega quer tornar a situação na Nicarágua tão complexa que a única saída seja o uso da força. Porque, se a única saída for a força — e essa também é parte da estratégia de Maduro —, a comunidade internacional fica imediatamente paralisada porque essa possibilidade não está sendo considerada, alerta Nunez.

Daniel Ortega não tem meio termo na escolha de aliados. O regime fechou as portas para governos, até mesmo os de esquerda, que expressam qualquer nível de moderação ou preocupação com democracia e direitos humanos. O alvo mais recente foi o seu antigo aliado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se viu com a expulsão dos embaixadores entre Brasil e Nicarágua.

Nesta semana, a ditadura fechou 1.500 organizações sem fins lucrativos no país. Na lista, que inclui de grupos católicos a organizações de esquerda, está presente a Câmara de Comércio Brasil-Nicarágua que atuava no país desde o início dos anos 2010.

O fechamento e a expulsão dos embaixadores é mais um passo no que a analista Elvira Cuadra Lira chama de “isolamento seletivo”. Nicaraguense, a socióloga viu os centros de pesquisa onde trabalhava em investigações na área de segurança serem fechados pelo regime. Ela faz parte do grupo de 94 opositores que tiveram a nacionalidade retirada pela ditadura no ano passado.

A lista inclui acadêmicos, jornalistas, religiosos, defensores dos direitos humanos, diplomatas, dissidentes sandinistas... “Ortega nos despojou da nacionalidade, confiscou propriedades e nos declarou foragidos da Justiça. Um processo absolutamente arbitrário porque não houve denúncia, julgamento, nada”, relata ela que hoje vive na Costa Rica, destino frequente dos exilados da Nicarágua.

Daniel Ortega na celebração da independência da Nicarágua. Foto: Cesar Perez/Presidência da Nivarágua

“Ele tem avançado em um processo de radicalização e isolamento, mas é um isolamento seletivo. Porque enquanto fecha as portas a qualquer governo que faça cobranças em relação a direitos humanos, democracia, se aproxima mais de regimes que são claramente autocráticos, não só na América Latina ― Cuba e Venezuela ― mas também Rússia, China, Irã, que são alguns de seus aliados mais próximos”, explica.

No caso do Brasil, Daniel Ortega não só expulsou o embaixador em Manágua Breno de Souza Dias, como se antecipou à reposta do governo Lula e retirou a sua representante em Brasília Fulvia Castro sob o argumento que ela seria promovida na estrutura do regime, como mostrou o Estadão.

O argumento oficial foi a ausência de Breno Souza Dias na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. O pano de fundo é o esfriamento de relações entre Ortega e Lula, que se intensificou depois que o brasileiro se propôs a interceder pela liberação do bispo Rolando Álvarez, condenado a 26 prisão após se recusar a deixar o país.

O pedido para que o presidente brasileiro conversasse com o ditador nicaraguense partiu do papa Francisco, como antecipou o Estadão à época da viagem de Lula a Roma.

“Ortega está dizendo a Lula que não o aceita como intermediário junto a comunidade internacional para encontrar uma saída democrática para a crise na Nicarágua. Essa é a mensagem direta de Ortega e sua esposa, Rosario Murillo”, afirma ex-deputado nicaraguense Elíseo Nunez, referindo-se à primeira-dama que é também vice-presidente e chefe da Suprema Corte.

Forçado a deixar o país, ele vive na Costa Rica e integra a Concertação Democrática Nicaraguense, movimento político criado por exilados do regime, que defendem a transição pacífica de poder em Manágua.

Além do estremecimento das relações envolvendo a igreja Católica, Nunez acredita que a reação desproporcional de Daniel Ortega à ausência do embaixador brasileiro na celebração sandinista está relacionada à outro regime autoritário na região: a Venezuela.

Aliado a Colômbia e México, o Brasil se propõe a facilitar o diálogo e ainda não reconhece o resultado das eleições. A posição oficial do grupo é cobrar o chavismo pela divulgação das atas, que comprovariam os resultados, mas essa perspectiva parece cada vez mais distante. A portas fechadas, o governo Lula discute a possibilidade de nova votação para superar a crise.

‘Ortega considera (a posição brasileira) uma traição porque acredita que ser de esquerda, ser anti-imperialista, ou seja, apenas por gritar “morte aos americanos”, deveria ter o direito de massacrar o seu povo, roubar eleições... Essa é a mentalidade de Ortega. Então, quando ele se depara com uma esquerda mais democrática, considera uma traição. A mensagem é: o que você está tentando na Venezuela, comigo não funciona”, especula Nunez.

Ainda que Caracas não forneça apoio material a Manágua em razão do debacle econômico que espalhou quase 8 milhões de imigrantes venezuelanos, a continuidade de Nicolás Maduro no Palácio de Miraflores contribui para sustentação política do regime Daniel Ortega.

“Se Maduro sai do poder, isso representa uma perda para Daniel Ortega porque tira um dos seus aliados mais importantes. Vale ressaltar que o regime da Nicarágua é muito fraco, não conta com nenhum tipo de respaldo da população, nem da comunidade latino-americana”, reforça Elvira Cuadra Lira.

Daniel Ortega chegou à presidência pela primeira vez em 1979, com o triunfo da Revolução Sandinista sobre a ditadura dos Somoza. Depois de sucessivas derrotas eleitorais na década de 1990, voltou ao poder em 2007 e assumiu cada vez mais controle sobre o Estado.

A repressão passou a ser brutal quando a Nicarágua, dependente do petróleo da Venezuela, sentiu os efeitos do debacle econômico do regime Nicolás Maduro. Os protestos massivos no país, em 2018, terminaram com centenas de mortos. Milhares de pessoas foram presas, assim como praticamente todos os candidatos que poderiam desafiar o ditador na eleição seguinte.

A lista de violações é longa. Inclui execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação da nacionalidade ou do direito de permanecer no próprio país, como aconteceu como Elvira e Elíseo.

Lula recebe Daniel Ortega em Brasília em 2010.  Foto: Eraldo Peres/Associated Press

Antes do rompimento, o Brasil chegou a expressar preocupação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora tenha se recusado a assinar a declaração de 55 países que condenava crimes contra humanidade da ditadura nicaraguense. Nos bastidores governo Lula chegou a defender a “posição construtiva” com a Nicarágua, mas a ditadura esticou a corda.

“Daniel Ortega quer tornar a situação na Nicarágua tão complexa que a única saída seja o uso da força. Porque, se a única saída for a força — e essa também é parte da estratégia de Maduro —, a comunidade internacional fica imediatamente paralisada porque essa possibilidade não está sendo considerada, alerta Nunez.

Daniel Ortega não tem meio termo na escolha de aliados. O regime fechou as portas para governos, até mesmo os de esquerda, que expressam qualquer nível de moderação ou preocupação com democracia e direitos humanos. O alvo mais recente foi o seu antigo aliado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se viu com a expulsão dos embaixadores entre Brasil e Nicarágua.

Nesta semana, a ditadura fechou 1.500 organizações sem fins lucrativos no país. Na lista, que inclui de grupos católicos a organizações de esquerda, está presente a Câmara de Comércio Brasil-Nicarágua que atuava no país desde o início dos anos 2010.

O fechamento e a expulsão dos embaixadores é mais um passo no que a analista Elvira Cuadra Lira chama de “isolamento seletivo”. Nicaraguense, a socióloga viu os centros de pesquisa onde trabalhava em investigações na área de segurança serem fechados pelo regime. Ela faz parte do grupo de 94 opositores que tiveram a nacionalidade retirada pela ditadura no ano passado.

A lista inclui acadêmicos, jornalistas, religiosos, defensores dos direitos humanos, diplomatas, dissidentes sandinistas... “Ortega nos despojou da nacionalidade, confiscou propriedades e nos declarou foragidos da Justiça. Um processo absolutamente arbitrário porque não houve denúncia, julgamento, nada”, relata ela que hoje vive na Costa Rica, destino frequente dos exilados da Nicarágua.

Daniel Ortega na celebração da independência da Nicarágua. Foto: Cesar Perez/Presidência da Nivarágua

“Ele tem avançado em um processo de radicalização e isolamento, mas é um isolamento seletivo. Porque enquanto fecha as portas a qualquer governo que faça cobranças em relação a direitos humanos, democracia, se aproxima mais de regimes que são claramente autocráticos, não só na América Latina ― Cuba e Venezuela ― mas também Rússia, China, Irã, que são alguns de seus aliados mais próximos”, explica.

No caso do Brasil, Daniel Ortega não só expulsou o embaixador em Manágua Breno de Souza Dias, como se antecipou à reposta do governo Lula e retirou a sua representante em Brasília Fulvia Castro sob o argumento que ela seria promovida na estrutura do regime, como mostrou o Estadão.

O argumento oficial foi a ausência de Breno Souza Dias na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. O pano de fundo é o esfriamento de relações entre Ortega e Lula, que se intensificou depois que o brasileiro se propôs a interceder pela liberação do bispo Rolando Álvarez, condenado a 26 prisão após se recusar a deixar o país.

O pedido para que o presidente brasileiro conversasse com o ditador nicaraguense partiu do papa Francisco, como antecipou o Estadão à época da viagem de Lula a Roma.

“Ortega está dizendo a Lula que não o aceita como intermediário junto a comunidade internacional para encontrar uma saída democrática para a crise na Nicarágua. Essa é a mensagem direta de Ortega e sua esposa, Rosario Murillo”, afirma ex-deputado nicaraguense Elíseo Nunez, referindo-se à primeira-dama que é também vice-presidente e chefe da Suprema Corte.

Forçado a deixar o país, ele vive na Costa Rica e integra a Concertação Democrática Nicaraguense, movimento político criado por exilados do regime, que defendem a transição pacífica de poder em Manágua.

Além do estremecimento das relações envolvendo a igreja Católica, Nunez acredita que a reação desproporcional de Daniel Ortega à ausência do embaixador brasileiro na celebração sandinista está relacionada à outro regime autoritário na região: a Venezuela.

Aliado a Colômbia e México, o Brasil se propõe a facilitar o diálogo e ainda não reconhece o resultado das eleições. A posição oficial do grupo é cobrar o chavismo pela divulgação das atas, que comprovariam os resultados, mas essa perspectiva parece cada vez mais distante. A portas fechadas, o governo Lula discute a possibilidade de nova votação para superar a crise.

‘Ortega considera (a posição brasileira) uma traição porque acredita que ser de esquerda, ser anti-imperialista, ou seja, apenas por gritar “morte aos americanos”, deveria ter o direito de massacrar o seu povo, roubar eleições... Essa é a mentalidade de Ortega. Então, quando ele se depara com uma esquerda mais democrática, considera uma traição. A mensagem é: o que você está tentando na Venezuela, comigo não funciona”, especula Nunez.

Ainda que Caracas não forneça apoio material a Manágua em razão do debacle econômico que espalhou quase 8 milhões de imigrantes venezuelanos, a continuidade de Nicolás Maduro no Palácio de Miraflores contribui para sustentação política do regime Daniel Ortega.

“Se Maduro sai do poder, isso representa uma perda para Daniel Ortega porque tira um dos seus aliados mais importantes. Vale ressaltar que o regime da Nicarágua é muito fraco, não conta com nenhum tipo de respaldo da população, nem da comunidade latino-americana”, reforça Elvira Cuadra Lira.

Daniel Ortega chegou à presidência pela primeira vez em 1979, com o triunfo da Revolução Sandinista sobre a ditadura dos Somoza. Depois de sucessivas derrotas eleitorais na década de 1990, voltou ao poder em 2007 e assumiu cada vez mais controle sobre o Estado.

A repressão passou a ser brutal quando a Nicarágua, dependente do petróleo da Venezuela, sentiu os efeitos do debacle econômico do regime Nicolás Maduro. Os protestos massivos no país, em 2018, terminaram com centenas de mortos. Milhares de pessoas foram presas, assim como praticamente todos os candidatos que poderiam desafiar o ditador na eleição seguinte.

A lista de violações é longa. Inclui execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação da nacionalidade ou do direito de permanecer no próprio país, como aconteceu como Elvira e Elíseo.

Lula recebe Daniel Ortega em Brasília em 2010.  Foto: Eraldo Peres/Associated Press

Antes do rompimento, o Brasil chegou a expressar preocupação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora tenha se recusado a assinar a declaração de 55 países que condenava crimes contra humanidade da ditadura nicaraguense. Nos bastidores governo Lula chegou a defender a “posição construtiva” com a Nicarágua, mas a ditadura esticou a corda.

“Daniel Ortega quer tornar a situação na Nicarágua tão complexa que a única saída seja o uso da força. Porque, se a única saída for a força — e essa também é parte da estratégia de Maduro —, a comunidade internacional fica imediatamente paralisada porque essa possibilidade não está sendo considerada, alerta Nunez.

Daniel Ortega não tem meio termo na escolha de aliados. O regime fechou as portas para governos, até mesmo os de esquerda, que expressam qualquer nível de moderação ou preocupação com democracia e direitos humanos. O alvo mais recente foi o seu antigo aliado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se viu com a expulsão dos embaixadores entre Brasil e Nicarágua.

Nesta semana, a ditadura fechou 1.500 organizações sem fins lucrativos no país. Na lista, que inclui de grupos católicos a organizações de esquerda, está presente a Câmara de Comércio Brasil-Nicarágua que atuava no país desde o início dos anos 2010.

O fechamento e a expulsão dos embaixadores é mais um passo no que a analista Elvira Cuadra Lira chama de “isolamento seletivo”. Nicaraguense, a socióloga viu os centros de pesquisa onde trabalhava em investigações na área de segurança serem fechados pelo regime. Ela faz parte do grupo de 94 opositores que tiveram a nacionalidade retirada pela ditadura no ano passado.

A lista inclui acadêmicos, jornalistas, religiosos, defensores dos direitos humanos, diplomatas, dissidentes sandinistas... “Ortega nos despojou da nacionalidade, confiscou propriedades e nos declarou foragidos da Justiça. Um processo absolutamente arbitrário porque não houve denúncia, julgamento, nada”, relata ela que hoje vive na Costa Rica, destino frequente dos exilados da Nicarágua.

Daniel Ortega na celebração da independência da Nicarágua. Foto: Cesar Perez/Presidência da Nivarágua

“Ele tem avançado em um processo de radicalização e isolamento, mas é um isolamento seletivo. Porque enquanto fecha as portas a qualquer governo que faça cobranças em relação a direitos humanos, democracia, se aproxima mais de regimes que são claramente autocráticos, não só na América Latina ― Cuba e Venezuela ― mas também Rússia, China, Irã, que são alguns de seus aliados mais próximos”, explica.

No caso do Brasil, Daniel Ortega não só expulsou o embaixador em Manágua Breno de Souza Dias, como se antecipou à reposta do governo Lula e retirou a sua representante em Brasília Fulvia Castro sob o argumento que ela seria promovida na estrutura do regime, como mostrou o Estadão.

O argumento oficial foi a ausência de Breno Souza Dias na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. O pano de fundo é o esfriamento de relações entre Ortega e Lula, que se intensificou depois que o brasileiro se propôs a interceder pela liberação do bispo Rolando Álvarez, condenado a 26 prisão após se recusar a deixar o país.

O pedido para que o presidente brasileiro conversasse com o ditador nicaraguense partiu do papa Francisco, como antecipou o Estadão à época da viagem de Lula a Roma.

“Ortega está dizendo a Lula que não o aceita como intermediário junto a comunidade internacional para encontrar uma saída democrática para a crise na Nicarágua. Essa é a mensagem direta de Ortega e sua esposa, Rosario Murillo”, afirma ex-deputado nicaraguense Elíseo Nunez, referindo-se à primeira-dama que é também vice-presidente e chefe da Suprema Corte.

Forçado a deixar o país, ele vive na Costa Rica e integra a Concertação Democrática Nicaraguense, movimento político criado por exilados do regime, que defendem a transição pacífica de poder em Manágua.

Além do estremecimento das relações envolvendo a igreja Católica, Nunez acredita que a reação desproporcional de Daniel Ortega à ausência do embaixador brasileiro na celebração sandinista está relacionada à outro regime autoritário na região: a Venezuela.

Aliado a Colômbia e México, o Brasil se propõe a facilitar o diálogo e ainda não reconhece o resultado das eleições. A posição oficial do grupo é cobrar o chavismo pela divulgação das atas, que comprovariam os resultados, mas essa perspectiva parece cada vez mais distante. A portas fechadas, o governo Lula discute a possibilidade de nova votação para superar a crise.

‘Ortega considera (a posição brasileira) uma traição porque acredita que ser de esquerda, ser anti-imperialista, ou seja, apenas por gritar “morte aos americanos”, deveria ter o direito de massacrar o seu povo, roubar eleições... Essa é a mentalidade de Ortega. Então, quando ele se depara com uma esquerda mais democrática, considera uma traição. A mensagem é: o que você está tentando na Venezuela, comigo não funciona”, especula Nunez.

Ainda que Caracas não forneça apoio material a Manágua em razão do debacle econômico que espalhou quase 8 milhões de imigrantes venezuelanos, a continuidade de Nicolás Maduro no Palácio de Miraflores contribui para sustentação política do regime Daniel Ortega.

“Se Maduro sai do poder, isso representa uma perda para Daniel Ortega porque tira um dos seus aliados mais importantes. Vale ressaltar que o regime da Nicarágua é muito fraco, não conta com nenhum tipo de respaldo da população, nem da comunidade latino-americana”, reforça Elvira Cuadra Lira.

Daniel Ortega chegou à presidência pela primeira vez em 1979, com o triunfo da Revolução Sandinista sobre a ditadura dos Somoza. Depois de sucessivas derrotas eleitorais na década de 1990, voltou ao poder em 2007 e assumiu cada vez mais controle sobre o Estado.

A repressão passou a ser brutal quando a Nicarágua, dependente do petróleo da Venezuela, sentiu os efeitos do debacle econômico do regime Nicolás Maduro. Os protestos massivos no país, em 2018, terminaram com centenas de mortos. Milhares de pessoas foram presas, assim como praticamente todos os candidatos que poderiam desafiar o ditador na eleição seguinte.

A lista de violações é longa. Inclui execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação da nacionalidade ou do direito de permanecer no próprio país, como aconteceu como Elvira e Elíseo.

Lula recebe Daniel Ortega em Brasília em 2010.  Foto: Eraldo Peres/Associated Press

Antes do rompimento, o Brasil chegou a expressar preocupação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora tenha se recusado a assinar a declaração de 55 países que condenava crimes contra humanidade da ditadura nicaraguense. Nos bastidores governo Lula chegou a defender a “posição construtiva” com a Nicarágua, mas a ditadura esticou a corda.

“Daniel Ortega quer tornar a situação na Nicarágua tão complexa que a única saída seja o uso da força. Porque, se a única saída for a força — e essa também é parte da estratégia de Maduro —, a comunidade internacional fica imediatamente paralisada porque essa possibilidade não está sendo considerada, alerta Nunez.

Daniel Ortega não tem meio termo na escolha de aliados. O regime fechou as portas para governos, até mesmo os de esquerda, que expressam qualquer nível de moderação ou preocupação com democracia e direitos humanos. O alvo mais recente foi o seu antigo aliado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se viu com a expulsão dos embaixadores entre Brasil e Nicarágua.

Nesta semana, a ditadura fechou 1.500 organizações sem fins lucrativos no país. Na lista, que inclui de grupos católicos a organizações de esquerda, está presente a Câmara de Comércio Brasil-Nicarágua que atuava no país desde o início dos anos 2010.

O fechamento e a expulsão dos embaixadores é mais um passo no que a analista Elvira Cuadra Lira chama de “isolamento seletivo”. Nicaraguense, a socióloga viu os centros de pesquisa onde trabalhava em investigações na área de segurança serem fechados pelo regime. Ela faz parte do grupo de 94 opositores que tiveram a nacionalidade retirada pela ditadura no ano passado.

A lista inclui acadêmicos, jornalistas, religiosos, defensores dos direitos humanos, diplomatas, dissidentes sandinistas... “Ortega nos despojou da nacionalidade, confiscou propriedades e nos declarou foragidos da Justiça. Um processo absolutamente arbitrário porque não houve denúncia, julgamento, nada”, relata ela que hoje vive na Costa Rica, destino frequente dos exilados da Nicarágua.

Daniel Ortega na celebração da independência da Nicarágua. Foto: Cesar Perez/Presidência da Nivarágua

“Ele tem avançado em um processo de radicalização e isolamento, mas é um isolamento seletivo. Porque enquanto fecha as portas a qualquer governo que faça cobranças em relação a direitos humanos, democracia, se aproxima mais de regimes que são claramente autocráticos, não só na América Latina ― Cuba e Venezuela ― mas também Rússia, China, Irã, que são alguns de seus aliados mais próximos”, explica.

No caso do Brasil, Daniel Ortega não só expulsou o embaixador em Manágua Breno de Souza Dias, como se antecipou à reposta do governo Lula e retirou a sua representante em Brasília Fulvia Castro sob o argumento que ela seria promovida na estrutura do regime, como mostrou o Estadão.

O argumento oficial foi a ausência de Breno Souza Dias na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. O pano de fundo é o esfriamento de relações entre Ortega e Lula, que se intensificou depois que o brasileiro se propôs a interceder pela liberação do bispo Rolando Álvarez, condenado a 26 prisão após se recusar a deixar o país.

O pedido para que o presidente brasileiro conversasse com o ditador nicaraguense partiu do papa Francisco, como antecipou o Estadão à época da viagem de Lula a Roma.

“Ortega está dizendo a Lula que não o aceita como intermediário junto a comunidade internacional para encontrar uma saída democrática para a crise na Nicarágua. Essa é a mensagem direta de Ortega e sua esposa, Rosario Murillo”, afirma ex-deputado nicaraguense Elíseo Nunez, referindo-se à primeira-dama que é também vice-presidente e chefe da Suprema Corte.

Forçado a deixar o país, ele vive na Costa Rica e integra a Concertação Democrática Nicaraguense, movimento político criado por exilados do regime, que defendem a transição pacífica de poder em Manágua.

Além do estremecimento das relações envolvendo a igreja Católica, Nunez acredita que a reação desproporcional de Daniel Ortega à ausência do embaixador brasileiro na celebração sandinista está relacionada à outro regime autoritário na região: a Venezuela.

Aliado a Colômbia e México, o Brasil se propõe a facilitar o diálogo e ainda não reconhece o resultado das eleições. A posição oficial do grupo é cobrar o chavismo pela divulgação das atas, que comprovariam os resultados, mas essa perspectiva parece cada vez mais distante. A portas fechadas, o governo Lula discute a possibilidade de nova votação para superar a crise.

‘Ortega considera (a posição brasileira) uma traição porque acredita que ser de esquerda, ser anti-imperialista, ou seja, apenas por gritar “morte aos americanos”, deveria ter o direito de massacrar o seu povo, roubar eleições... Essa é a mentalidade de Ortega. Então, quando ele se depara com uma esquerda mais democrática, considera uma traição. A mensagem é: o que você está tentando na Venezuela, comigo não funciona”, especula Nunez.

Ainda que Caracas não forneça apoio material a Manágua em razão do debacle econômico que espalhou quase 8 milhões de imigrantes venezuelanos, a continuidade de Nicolás Maduro no Palácio de Miraflores contribui para sustentação política do regime Daniel Ortega.

“Se Maduro sai do poder, isso representa uma perda para Daniel Ortega porque tira um dos seus aliados mais importantes. Vale ressaltar que o regime da Nicarágua é muito fraco, não conta com nenhum tipo de respaldo da população, nem da comunidade latino-americana”, reforça Elvira Cuadra Lira.

Daniel Ortega chegou à presidência pela primeira vez em 1979, com o triunfo da Revolução Sandinista sobre a ditadura dos Somoza. Depois de sucessivas derrotas eleitorais na década de 1990, voltou ao poder em 2007 e assumiu cada vez mais controle sobre o Estado.

A repressão passou a ser brutal quando a Nicarágua, dependente do petróleo da Venezuela, sentiu os efeitos do debacle econômico do regime Nicolás Maduro. Os protestos massivos no país, em 2018, terminaram com centenas de mortos. Milhares de pessoas foram presas, assim como praticamente todos os candidatos que poderiam desafiar o ditador na eleição seguinte.

A lista de violações é longa. Inclui execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação da nacionalidade ou do direito de permanecer no próprio país, como aconteceu como Elvira e Elíseo.

Lula recebe Daniel Ortega em Brasília em 2010.  Foto: Eraldo Peres/Associated Press

Antes do rompimento, o Brasil chegou a expressar preocupação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora tenha se recusado a assinar a declaração de 55 países que condenava crimes contra humanidade da ditadura nicaraguense. Nos bastidores governo Lula chegou a defender a “posição construtiva” com a Nicarágua, mas a ditadura esticou a corda.

“Daniel Ortega quer tornar a situação na Nicarágua tão complexa que a única saída seja o uso da força. Porque, se a única saída for a força — e essa também é parte da estratégia de Maduro —, a comunidade internacional fica imediatamente paralisada porque essa possibilidade não está sendo considerada, alerta Nunez.

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