Parlamento de Israel vota reforma de Netanyahu que enfraquece o Judiciário; entenda


Reforma apresentada pelo governo israelense prejudica democracia do país, segundo analistas

Por Shira Rubin e Miriam Berger

Envolvido há anos em uma suspeita de corrupção, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, acusa há muito tempo o Judiciário de Israel de conspirar para destruí-lo. Após voltar ao governo, ele foi além e apresentou um plano para reformar o Judiciário e tornar a instituição, segundo disse, mais representativa. A iniciativa, no entanto, provocou uma crise nacional por diminuir o poder da Justiça e pode escalar para a violência.

A primeira parte do projeto deve ir ao plenário do Knesset, o parlamento israelense, para ser votada entre esta quarta-feira, 15, e a próxima segunda, 20, segundo a imprensa israelense. Enquanto isso, os cidadãos ocupam às ruas para se manifestar contra a reforma. Na segunda-feira, 13, cerca de 100 mil israelenses protestaram diante do Knesset, em Jerusalém, com gritos de “Israel não é uma ditadura!”.

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Com o país dividido sobre a proposta, encabeçada por um governo de coalizão com a direita radical, economistas passaram a alertar para os investimentos em risco em Israel, particularmente no setor de tecnologia, e o presidente israelense, Isaac Herzog, falou em “colapso social”.

Visão aérea de Jerusalém mostra israelenses protestando contra a reforma judiciária na frente do Knesset, o parlamento israelense, na segunda-feira, 13 Foto: Ilan Rosenberg/Reuters

Abaixo, entenda o que você precisa saber sobre as mudanças propostas para o Judiciário e por que elas dividiram o país:

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Qual é a proposta de Netanyahu?

A proposta apresentada pelo governo israelense contém vários projetos de lei que alteram as “leis básicas” de Israel – equivalentes às emendas constitucionais, em um país onde não há formalmente uma Carta Magna. As mudanças dariam aos deputados do Knesset o controle sobre as nomeações judiciais; eliminariam a revisão judicial que as leis israelenses são submetidas após aprovadas; e permitiriam que o Parlamento rejeitasse as decisões da Suprema Corte.

Na avaliação do professor de direito constitucional e internacional da Universidade de Tel Avis, Ayeal Gross, as mudanças significam na prática que o governo não terá um limite legal. “Um governo sem limites mina totalmente qualquer noção de democracia”, afirmou.

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No sistema parlamentar de Israel, a Suprema Corte é a única instituição a exercer um contraponto aos deputados e ao primeiro-ministro. Ela analisa recursos de tribunais inferiores e ouve as petições contra o governo e os órgãos públicos. Nos últimos anos, ela derrubou leis relacionadas aos refugiados da guerra na Ucrânia e da África e atrasou o despejo de palestinos que residiam em um bairro disputado em Jerusalém.

Na segunda-feira, o Knesset aprovou preliminarmente dois projetos de lei que dão a permissão para os deputados nomearem juízes e excluírem a revisão judicial. Outro, caso aprovado, muda a composição do Comitê de Seleção Judicial, órgão responsável pelas nomeações judiciais composto hoje por nove membros. A medida efetivamente daria ao governo uma maioria automática ao votar nos nomeados.

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A criação de uma “cláusula de substituição”, um mecanismo raro que permite que uma maioria simples do Knesset anule as decisões da Suprema Corte e que pode significar o fim das proteções legais para grupos não aceitos pela coalizão governista, foi discutida nesta terça-feira, 14. O único país do mundo com uma cláusula de substituição é o Canadá, que tem uma constituição. Israel não tem constituição, apenas “leis básicas”.

“É basicamente tirar o pior de cada país, mas sem os outros contextos e garantias daquele país”, analisa Gross.

Os três projetos precisam ser votados três vezes antes de se tornarem lei. Segundo a imprensa do país, a primeira votação deve acontecer entre esta quarta-feira e o dia 20. A segunda e a terceira podem, se ambas partes concordarem com as negociações, acontecer somente em algumas semanas.

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O ministro da Justiça, Yariv Levin, também apresentou o texto de vários outros projetos de lei, como um que reduz a independência e a supervisão legislativa dos consultores jurídicos dos ministros. Os detalhes finais dessas outras propostas, no entanto, ainda não estão claros.

Por que Netanyahu está fazendo isso?

Binyamin Netanyahu, o político que mais esteve à frente do governo israelense, tem entrado em desacordo frequente com o Judiciário. Ao retornar ao cargo no final do ano passado, passou a chefiar o governo mais à direita da história do país, formado por nacionalistas religiosos, supremacistas judeus e defensores de colonos, que se comprometeram em apoiá-lo na pressão contra o Judiciário para retirar as acusações contra ele em um processo de corrupção.

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Acabar com a supervisão judicial da legislação seria uma grande vitória para a coalizão, cujos membros prometeram priorizar o caráter judaico de Israel sobre o democrático e anexar a Cisjordânia ocupada - a terra que os palestinos reivindicam como parte de seu futuro Estado -, e permitiria que Netanyahu protegesse seus aliados.

Entre eles, está Aryeh Deri, líder do partido ultraortodoxo Shas. Em janeiro, a Suprema Corta do país obrigou Netanyahu a demitir Deri, que ocupava o cargo de ministro da Saúde e Segurança, devido ao “acúmulo de condenações criminais”.

Imagem mostra Binyamin Netanyahu após vencer as eleições de Israel, no ano passado. Premiê é acusado de corrupção em três casos Foto: Ammar Awad / Reuters

O primeiro-ministro também está envolvido em processos criminais em três casos separados. Bibi é acusado de abusar da posição oficial para conceder favores a milionários em troca de presentes que incluem champanhe, charutos e uma cobertura favorável da mídia. As acusações aconteceram quando ele estava no cargo, tornando-se o primeiro premiê de Israel a enfrentar acusações durante o exercício, e provocaram uma crise política longa, que arrastou o país a realizar cinco eleições em menos de cinco anos.

No início deste mês, o procurador-geral israelense Gali Baharav-Miara enviou uma carta a Netanyahu ordenando que se afastasse da reforma judicial devido ao conflito de interesses. Netanyahu disse que considerava a ordem “inaceitável” e que a reforma do Judiciário está separada dos seus problemas com a justiça.

O discurso do líder se contradiz com alegações de membros do seu próprio partido, o Likud. No mês passado, Levin, seu ministro da Justiça, afirmou no plenário do Knesset que “as três acusações” foram necessárias para o líder ser “convencido” de “corrigir o sistema”.

O presidente israelense, Isaac Herzog, apela para que os projetos sejam interrompidos e o governo possa se reunir com a oposição para chegar a um acordo, mas eles continuam avançando. Se for aprovado – e o governo controlar as nomeações judiciais em todos os tribunais em todo o país – isso poderá ter um grande efeito no caso de Netanyahu por ele ser julgado no Tribunal Distrital de Jerusalém e provavelmente ter de apelar para a Suprema Corte se condenado.

Por que isso é um problema em Israel?

Os israelenses liberais consideram a Suprema Corte do país o último bastião de sua democracia. Os membros da coalizão de Netanyahu dizem que a Suprema Corte é povoada por elites de esquerda e oprimiu a vontade de um país que tem ido rapidamente em direção à direita religiosa e nacionalista.

Um sistema livre de freios e contrapesos, alertou a presidente da Suprema Corte, Esther Hayut, no mês passado, levaria a um Israel que “leva o nome da democracia em vão”.

O pesquisador do Instituto de Democracia de Israel, Amir Fuchs, analisa que a aprovação da reforma agravaria a situação de minorias do país. “Os árabes serão discriminados, haverá uma separação entre homens e mulheres, haverá leis e talvez vereditos na Suprema Corte que tirarão direitos da comunidade LGBTQ”, disse.

Manifestantes seguram bandeira dos direitos LGBTQ durante protesto contra a reforma judiciária de Israel, em Jerusalém, na segunda-feira, 13. Minorias serão prejudicadas se reforma for aprovada, dizem especialistas Foto: Maya Alleruzzo/AP

A Suprema Corte de Israel confirmou em 2021 a controversa Lei do Estado-Nação, que declarou Israel uma pátria nacional para o povo judeu e efetivamente codificou os cidadãos palestinos de Israel como de segunda classe. Mas, embora “o sistema judicial não seja favorável ao público árabe”, o legislador israelense palestino Ahmed Tibi disse na segunda-feira que lutaria contra as reformas “porque, no final do dia, a Suprema Corte é o refúgio da minoria”.

Netanyahu e seus aliados afirmam que têm o mandato a seu favor para promulgar as propostas. Eles citam a vitória nas eleições de novembro, nas quais conquistaram 64 dos 120 assentos no Knesset. Mas os legisladores não divulgaram seus planos judiciais antes da votação. Como uma peculiaridade da matemática parlamentar, os partidos que compõem a coalizão representam apenas 50,1% do total de votos.

A oposição israelense até agora rejeitou negociar com o governo com as propostas apresentadas até o momento e pré-estabelece que a reforma deve ser interrompida antes de qualquer conversa. “Vamos conversar sem o chicote da legislação contínua, agressiva e acelerada pairando sobre a cabeça em segundo plano”, escreveu o jornalista israelense Ben Caspit na terça-feira no jornal Maariv. “As pessoas não estão preparadas para aceitar que a democracia está sendo sequestrada e seguir em frente.”

Envolvido há anos em uma suspeita de corrupção, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, acusa há muito tempo o Judiciário de Israel de conspirar para destruí-lo. Após voltar ao governo, ele foi além e apresentou um plano para reformar o Judiciário e tornar a instituição, segundo disse, mais representativa. A iniciativa, no entanto, provocou uma crise nacional por diminuir o poder da Justiça e pode escalar para a violência.

A primeira parte do projeto deve ir ao plenário do Knesset, o parlamento israelense, para ser votada entre esta quarta-feira, 15, e a próxima segunda, 20, segundo a imprensa israelense. Enquanto isso, os cidadãos ocupam às ruas para se manifestar contra a reforma. Na segunda-feira, 13, cerca de 100 mil israelenses protestaram diante do Knesset, em Jerusalém, com gritos de “Israel não é uma ditadura!”.

Com o país dividido sobre a proposta, encabeçada por um governo de coalizão com a direita radical, economistas passaram a alertar para os investimentos em risco em Israel, particularmente no setor de tecnologia, e o presidente israelense, Isaac Herzog, falou em “colapso social”.

Visão aérea de Jerusalém mostra israelenses protestando contra a reforma judiciária na frente do Knesset, o parlamento israelense, na segunda-feira, 13 Foto: Ilan Rosenberg/Reuters

Abaixo, entenda o que você precisa saber sobre as mudanças propostas para o Judiciário e por que elas dividiram o país:

Qual é a proposta de Netanyahu?

A proposta apresentada pelo governo israelense contém vários projetos de lei que alteram as “leis básicas” de Israel – equivalentes às emendas constitucionais, em um país onde não há formalmente uma Carta Magna. As mudanças dariam aos deputados do Knesset o controle sobre as nomeações judiciais; eliminariam a revisão judicial que as leis israelenses são submetidas após aprovadas; e permitiriam que o Parlamento rejeitasse as decisões da Suprema Corte.

Na avaliação do professor de direito constitucional e internacional da Universidade de Tel Avis, Ayeal Gross, as mudanças significam na prática que o governo não terá um limite legal. “Um governo sem limites mina totalmente qualquer noção de democracia”, afirmou.

No sistema parlamentar de Israel, a Suprema Corte é a única instituição a exercer um contraponto aos deputados e ao primeiro-ministro. Ela analisa recursos de tribunais inferiores e ouve as petições contra o governo e os órgãos públicos. Nos últimos anos, ela derrubou leis relacionadas aos refugiados da guerra na Ucrânia e da África e atrasou o despejo de palestinos que residiam em um bairro disputado em Jerusalém.

Na segunda-feira, o Knesset aprovou preliminarmente dois projetos de lei que dão a permissão para os deputados nomearem juízes e excluírem a revisão judicial. Outro, caso aprovado, muda a composição do Comitê de Seleção Judicial, órgão responsável pelas nomeações judiciais composto hoje por nove membros. A medida efetivamente daria ao governo uma maioria automática ao votar nos nomeados.

A criação de uma “cláusula de substituição”, um mecanismo raro que permite que uma maioria simples do Knesset anule as decisões da Suprema Corte e que pode significar o fim das proteções legais para grupos não aceitos pela coalizão governista, foi discutida nesta terça-feira, 14. O único país do mundo com uma cláusula de substituição é o Canadá, que tem uma constituição. Israel não tem constituição, apenas “leis básicas”.

“É basicamente tirar o pior de cada país, mas sem os outros contextos e garantias daquele país”, analisa Gross.

Os três projetos precisam ser votados três vezes antes de se tornarem lei. Segundo a imprensa do país, a primeira votação deve acontecer entre esta quarta-feira e o dia 20. A segunda e a terceira podem, se ambas partes concordarem com as negociações, acontecer somente em algumas semanas.

O ministro da Justiça, Yariv Levin, também apresentou o texto de vários outros projetos de lei, como um que reduz a independência e a supervisão legislativa dos consultores jurídicos dos ministros. Os detalhes finais dessas outras propostas, no entanto, ainda não estão claros.

Por que Netanyahu está fazendo isso?

Binyamin Netanyahu, o político que mais esteve à frente do governo israelense, tem entrado em desacordo frequente com o Judiciário. Ao retornar ao cargo no final do ano passado, passou a chefiar o governo mais à direita da história do país, formado por nacionalistas religiosos, supremacistas judeus e defensores de colonos, que se comprometeram em apoiá-lo na pressão contra o Judiciário para retirar as acusações contra ele em um processo de corrupção.

Acabar com a supervisão judicial da legislação seria uma grande vitória para a coalizão, cujos membros prometeram priorizar o caráter judaico de Israel sobre o democrático e anexar a Cisjordânia ocupada - a terra que os palestinos reivindicam como parte de seu futuro Estado -, e permitiria que Netanyahu protegesse seus aliados.

Entre eles, está Aryeh Deri, líder do partido ultraortodoxo Shas. Em janeiro, a Suprema Corta do país obrigou Netanyahu a demitir Deri, que ocupava o cargo de ministro da Saúde e Segurança, devido ao “acúmulo de condenações criminais”.

Imagem mostra Binyamin Netanyahu após vencer as eleições de Israel, no ano passado. Premiê é acusado de corrupção em três casos Foto: Ammar Awad / Reuters

O primeiro-ministro também está envolvido em processos criminais em três casos separados. Bibi é acusado de abusar da posição oficial para conceder favores a milionários em troca de presentes que incluem champanhe, charutos e uma cobertura favorável da mídia. As acusações aconteceram quando ele estava no cargo, tornando-se o primeiro premiê de Israel a enfrentar acusações durante o exercício, e provocaram uma crise política longa, que arrastou o país a realizar cinco eleições em menos de cinco anos.

No início deste mês, o procurador-geral israelense Gali Baharav-Miara enviou uma carta a Netanyahu ordenando que se afastasse da reforma judicial devido ao conflito de interesses. Netanyahu disse que considerava a ordem “inaceitável” e que a reforma do Judiciário está separada dos seus problemas com a justiça.

O discurso do líder se contradiz com alegações de membros do seu próprio partido, o Likud. No mês passado, Levin, seu ministro da Justiça, afirmou no plenário do Knesset que “as três acusações” foram necessárias para o líder ser “convencido” de “corrigir o sistema”.

O presidente israelense, Isaac Herzog, apela para que os projetos sejam interrompidos e o governo possa se reunir com a oposição para chegar a um acordo, mas eles continuam avançando. Se for aprovado – e o governo controlar as nomeações judiciais em todos os tribunais em todo o país – isso poderá ter um grande efeito no caso de Netanyahu por ele ser julgado no Tribunal Distrital de Jerusalém e provavelmente ter de apelar para a Suprema Corte se condenado.

Por que isso é um problema em Israel?

Os israelenses liberais consideram a Suprema Corte do país o último bastião de sua democracia. Os membros da coalizão de Netanyahu dizem que a Suprema Corte é povoada por elites de esquerda e oprimiu a vontade de um país que tem ido rapidamente em direção à direita religiosa e nacionalista.

Um sistema livre de freios e contrapesos, alertou a presidente da Suprema Corte, Esther Hayut, no mês passado, levaria a um Israel que “leva o nome da democracia em vão”.

O pesquisador do Instituto de Democracia de Israel, Amir Fuchs, analisa que a aprovação da reforma agravaria a situação de minorias do país. “Os árabes serão discriminados, haverá uma separação entre homens e mulheres, haverá leis e talvez vereditos na Suprema Corte que tirarão direitos da comunidade LGBTQ”, disse.

Manifestantes seguram bandeira dos direitos LGBTQ durante protesto contra a reforma judiciária de Israel, em Jerusalém, na segunda-feira, 13. Minorias serão prejudicadas se reforma for aprovada, dizem especialistas Foto: Maya Alleruzzo/AP

A Suprema Corte de Israel confirmou em 2021 a controversa Lei do Estado-Nação, que declarou Israel uma pátria nacional para o povo judeu e efetivamente codificou os cidadãos palestinos de Israel como de segunda classe. Mas, embora “o sistema judicial não seja favorável ao público árabe”, o legislador israelense palestino Ahmed Tibi disse na segunda-feira que lutaria contra as reformas “porque, no final do dia, a Suprema Corte é o refúgio da minoria”.

Netanyahu e seus aliados afirmam que têm o mandato a seu favor para promulgar as propostas. Eles citam a vitória nas eleições de novembro, nas quais conquistaram 64 dos 120 assentos no Knesset. Mas os legisladores não divulgaram seus planos judiciais antes da votação. Como uma peculiaridade da matemática parlamentar, os partidos que compõem a coalizão representam apenas 50,1% do total de votos.

A oposição israelense até agora rejeitou negociar com o governo com as propostas apresentadas até o momento e pré-estabelece que a reforma deve ser interrompida antes de qualquer conversa. “Vamos conversar sem o chicote da legislação contínua, agressiva e acelerada pairando sobre a cabeça em segundo plano”, escreveu o jornalista israelense Ben Caspit na terça-feira no jornal Maariv. “As pessoas não estão preparadas para aceitar que a democracia está sendo sequestrada e seguir em frente.”

Envolvido há anos em uma suspeita de corrupção, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, acusa há muito tempo o Judiciário de Israel de conspirar para destruí-lo. Após voltar ao governo, ele foi além e apresentou um plano para reformar o Judiciário e tornar a instituição, segundo disse, mais representativa. A iniciativa, no entanto, provocou uma crise nacional por diminuir o poder da Justiça e pode escalar para a violência.

A primeira parte do projeto deve ir ao plenário do Knesset, o parlamento israelense, para ser votada entre esta quarta-feira, 15, e a próxima segunda, 20, segundo a imprensa israelense. Enquanto isso, os cidadãos ocupam às ruas para se manifestar contra a reforma. Na segunda-feira, 13, cerca de 100 mil israelenses protestaram diante do Knesset, em Jerusalém, com gritos de “Israel não é uma ditadura!”.

Com o país dividido sobre a proposta, encabeçada por um governo de coalizão com a direita radical, economistas passaram a alertar para os investimentos em risco em Israel, particularmente no setor de tecnologia, e o presidente israelense, Isaac Herzog, falou em “colapso social”.

Visão aérea de Jerusalém mostra israelenses protestando contra a reforma judiciária na frente do Knesset, o parlamento israelense, na segunda-feira, 13 Foto: Ilan Rosenberg/Reuters

Abaixo, entenda o que você precisa saber sobre as mudanças propostas para o Judiciário e por que elas dividiram o país:

Qual é a proposta de Netanyahu?

A proposta apresentada pelo governo israelense contém vários projetos de lei que alteram as “leis básicas” de Israel – equivalentes às emendas constitucionais, em um país onde não há formalmente uma Carta Magna. As mudanças dariam aos deputados do Knesset o controle sobre as nomeações judiciais; eliminariam a revisão judicial que as leis israelenses são submetidas após aprovadas; e permitiriam que o Parlamento rejeitasse as decisões da Suprema Corte.

Na avaliação do professor de direito constitucional e internacional da Universidade de Tel Avis, Ayeal Gross, as mudanças significam na prática que o governo não terá um limite legal. “Um governo sem limites mina totalmente qualquer noção de democracia”, afirmou.

No sistema parlamentar de Israel, a Suprema Corte é a única instituição a exercer um contraponto aos deputados e ao primeiro-ministro. Ela analisa recursos de tribunais inferiores e ouve as petições contra o governo e os órgãos públicos. Nos últimos anos, ela derrubou leis relacionadas aos refugiados da guerra na Ucrânia e da África e atrasou o despejo de palestinos que residiam em um bairro disputado em Jerusalém.

Na segunda-feira, o Knesset aprovou preliminarmente dois projetos de lei que dão a permissão para os deputados nomearem juízes e excluírem a revisão judicial. Outro, caso aprovado, muda a composição do Comitê de Seleção Judicial, órgão responsável pelas nomeações judiciais composto hoje por nove membros. A medida efetivamente daria ao governo uma maioria automática ao votar nos nomeados.

A criação de uma “cláusula de substituição”, um mecanismo raro que permite que uma maioria simples do Knesset anule as decisões da Suprema Corte e que pode significar o fim das proteções legais para grupos não aceitos pela coalizão governista, foi discutida nesta terça-feira, 14. O único país do mundo com uma cláusula de substituição é o Canadá, que tem uma constituição. Israel não tem constituição, apenas “leis básicas”.

“É basicamente tirar o pior de cada país, mas sem os outros contextos e garantias daquele país”, analisa Gross.

Os três projetos precisam ser votados três vezes antes de se tornarem lei. Segundo a imprensa do país, a primeira votação deve acontecer entre esta quarta-feira e o dia 20. A segunda e a terceira podem, se ambas partes concordarem com as negociações, acontecer somente em algumas semanas.

O ministro da Justiça, Yariv Levin, também apresentou o texto de vários outros projetos de lei, como um que reduz a independência e a supervisão legislativa dos consultores jurídicos dos ministros. Os detalhes finais dessas outras propostas, no entanto, ainda não estão claros.

Por que Netanyahu está fazendo isso?

Binyamin Netanyahu, o político que mais esteve à frente do governo israelense, tem entrado em desacordo frequente com o Judiciário. Ao retornar ao cargo no final do ano passado, passou a chefiar o governo mais à direita da história do país, formado por nacionalistas religiosos, supremacistas judeus e defensores de colonos, que se comprometeram em apoiá-lo na pressão contra o Judiciário para retirar as acusações contra ele em um processo de corrupção.

Acabar com a supervisão judicial da legislação seria uma grande vitória para a coalizão, cujos membros prometeram priorizar o caráter judaico de Israel sobre o democrático e anexar a Cisjordânia ocupada - a terra que os palestinos reivindicam como parte de seu futuro Estado -, e permitiria que Netanyahu protegesse seus aliados.

Entre eles, está Aryeh Deri, líder do partido ultraortodoxo Shas. Em janeiro, a Suprema Corta do país obrigou Netanyahu a demitir Deri, que ocupava o cargo de ministro da Saúde e Segurança, devido ao “acúmulo de condenações criminais”.

Imagem mostra Binyamin Netanyahu após vencer as eleições de Israel, no ano passado. Premiê é acusado de corrupção em três casos Foto: Ammar Awad / Reuters

O primeiro-ministro também está envolvido em processos criminais em três casos separados. Bibi é acusado de abusar da posição oficial para conceder favores a milionários em troca de presentes que incluem champanhe, charutos e uma cobertura favorável da mídia. As acusações aconteceram quando ele estava no cargo, tornando-se o primeiro premiê de Israel a enfrentar acusações durante o exercício, e provocaram uma crise política longa, que arrastou o país a realizar cinco eleições em menos de cinco anos.

No início deste mês, o procurador-geral israelense Gali Baharav-Miara enviou uma carta a Netanyahu ordenando que se afastasse da reforma judicial devido ao conflito de interesses. Netanyahu disse que considerava a ordem “inaceitável” e que a reforma do Judiciário está separada dos seus problemas com a justiça.

O discurso do líder se contradiz com alegações de membros do seu próprio partido, o Likud. No mês passado, Levin, seu ministro da Justiça, afirmou no plenário do Knesset que “as três acusações” foram necessárias para o líder ser “convencido” de “corrigir o sistema”.

O presidente israelense, Isaac Herzog, apela para que os projetos sejam interrompidos e o governo possa se reunir com a oposição para chegar a um acordo, mas eles continuam avançando. Se for aprovado – e o governo controlar as nomeações judiciais em todos os tribunais em todo o país – isso poderá ter um grande efeito no caso de Netanyahu por ele ser julgado no Tribunal Distrital de Jerusalém e provavelmente ter de apelar para a Suprema Corte se condenado.

Por que isso é um problema em Israel?

Os israelenses liberais consideram a Suprema Corte do país o último bastião de sua democracia. Os membros da coalizão de Netanyahu dizem que a Suprema Corte é povoada por elites de esquerda e oprimiu a vontade de um país que tem ido rapidamente em direção à direita religiosa e nacionalista.

Um sistema livre de freios e contrapesos, alertou a presidente da Suprema Corte, Esther Hayut, no mês passado, levaria a um Israel que “leva o nome da democracia em vão”.

O pesquisador do Instituto de Democracia de Israel, Amir Fuchs, analisa que a aprovação da reforma agravaria a situação de minorias do país. “Os árabes serão discriminados, haverá uma separação entre homens e mulheres, haverá leis e talvez vereditos na Suprema Corte que tirarão direitos da comunidade LGBTQ”, disse.

Manifestantes seguram bandeira dos direitos LGBTQ durante protesto contra a reforma judiciária de Israel, em Jerusalém, na segunda-feira, 13. Minorias serão prejudicadas se reforma for aprovada, dizem especialistas Foto: Maya Alleruzzo/AP

A Suprema Corte de Israel confirmou em 2021 a controversa Lei do Estado-Nação, que declarou Israel uma pátria nacional para o povo judeu e efetivamente codificou os cidadãos palestinos de Israel como de segunda classe. Mas, embora “o sistema judicial não seja favorável ao público árabe”, o legislador israelense palestino Ahmed Tibi disse na segunda-feira que lutaria contra as reformas “porque, no final do dia, a Suprema Corte é o refúgio da minoria”.

Netanyahu e seus aliados afirmam que têm o mandato a seu favor para promulgar as propostas. Eles citam a vitória nas eleições de novembro, nas quais conquistaram 64 dos 120 assentos no Knesset. Mas os legisladores não divulgaram seus planos judiciais antes da votação. Como uma peculiaridade da matemática parlamentar, os partidos que compõem a coalizão representam apenas 50,1% do total de votos.

A oposição israelense até agora rejeitou negociar com o governo com as propostas apresentadas até o momento e pré-estabelece que a reforma deve ser interrompida antes de qualquer conversa. “Vamos conversar sem o chicote da legislação contínua, agressiva e acelerada pairando sobre a cabeça em segundo plano”, escreveu o jornalista israelense Ben Caspit na terça-feira no jornal Maariv. “As pessoas não estão preparadas para aceitar que a democracia está sendo sequestrada e seguir em frente.”

Envolvido há anos em uma suspeita de corrupção, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, acusa há muito tempo o Judiciário de Israel de conspirar para destruí-lo. Após voltar ao governo, ele foi além e apresentou um plano para reformar o Judiciário e tornar a instituição, segundo disse, mais representativa. A iniciativa, no entanto, provocou uma crise nacional por diminuir o poder da Justiça e pode escalar para a violência.

A primeira parte do projeto deve ir ao plenário do Knesset, o parlamento israelense, para ser votada entre esta quarta-feira, 15, e a próxima segunda, 20, segundo a imprensa israelense. Enquanto isso, os cidadãos ocupam às ruas para se manifestar contra a reforma. Na segunda-feira, 13, cerca de 100 mil israelenses protestaram diante do Knesset, em Jerusalém, com gritos de “Israel não é uma ditadura!”.

Com o país dividido sobre a proposta, encabeçada por um governo de coalizão com a direita radical, economistas passaram a alertar para os investimentos em risco em Israel, particularmente no setor de tecnologia, e o presidente israelense, Isaac Herzog, falou em “colapso social”.

Visão aérea de Jerusalém mostra israelenses protestando contra a reforma judiciária na frente do Knesset, o parlamento israelense, na segunda-feira, 13 Foto: Ilan Rosenberg/Reuters

Abaixo, entenda o que você precisa saber sobre as mudanças propostas para o Judiciário e por que elas dividiram o país:

Qual é a proposta de Netanyahu?

A proposta apresentada pelo governo israelense contém vários projetos de lei que alteram as “leis básicas” de Israel – equivalentes às emendas constitucionais, em um país onde não há formalmente uma Carta Magna. As mudanças dariam aos deputados do Knesset o controle sobre as nomeações judiciais; eliminariam a revisão judicial que as leis israelenses são submetidas após aprovadas; e permitiriam que o Parlamento rejeitasse as decisões da Suprema Corte.

Na avaliação do professor de direito constitucional e internacional da Universidade de Tel Avis, Ayeal Gross, as mudanças significam na prática que o governo não terá um limite legal. “Um governo sem limites mina totalmente qualquer noção de democracia”, afirmou.

No sistema parlamentar de Israel, a Suprema Corte é a única instituição a exercer um contraponto aos deputados e ao primeiro-ministro. Ela analisa recursos de tribunais inferiores e ouve as petições contra o governo e os órgãos públicos. Nos últimos anos, ela derrubou leis relacionadas aos refugiados da guerra na Ucrânia e da África e atrasou o despejo de palestinos que residiam em um bairro disputado em Jerusalém.

Na segunda-feira, o Knesset aprovou preliminarmente dois projetos de lei que dão a permissão para os deputados nomearem juízes e excluírem a revisão judicial. Outro, caso aprovado, muda a composição do Comitê de Seleção Judicial, órgão responsável pelas nomeações judiciais composto hoje por nove membros. A medida efetivamente daria ao governo uma maioria automática ao votar nos nomeados.

A criação de uma “cláusula de substituição”, um mecanismo raro que permite que uma maioria simples do Knesset anule as decisões da Suprema Corte e que pode significar o fim das proteções legais para grupos não aceitos pela coalizão governista, foi discutida nesta terça-feira, 14. O único país do mundo com uma cláusula de substituição é o Canadá, que tem uma constituição. Israel não tem constituição, apenas “leis básicas”.

“É basicamente tirar o pior de cada país, mas sem os outros contextos e garantias daquele país”, analisa Gross.

Os três projetos precisam ser votados três vezes antes de se tornarem lei. Segundo a imprensa do país, a primeira votação deve acontecer entre esta quarta-feira e o dia 20. A segunda e a terceira podem, se ambas partes concordarem com as negociações, acontecer somente em algumas semanas.

O ministro da Justiça, Yariv Levin, também apresentou o texto de vários outros projetos de lei, como um que reduz a independência e a supervisão legislativa dos consultores jurídicos dos ministros. Os detalhes finais dessas outras propostas, no entanto, ainda não estão claros.

Por que Netanyahu está fazendo isso?

Binyamin Netanyahu, o político que mais esteve à frente do governo israelense, tem entrado em desacordo frequente com o Judiciário. Ao retornar ao cargo no final do ano passado, passou a chefiar o governo mais à direita da história do país, formado por nacionalistas religiosos, supremacistas judeus e defensores de colonos, que se comprometeram em apoiá-lo na pressão contra o Judiciário para retirar as acusações contra ele em um processo de corrupção.

Acabar com a supervisão judicial da legislação seria uma grande vitória para a coalizão, cujos membros prometeram priorizar o caráter judaico de Israel sobre o democrático e anexar a Cisjordânia ocupada - a terra que os palestinos reivindicam como parte de seu futuro Estado -, e permitiria que Netanyahu protegesse seus aliados.

Entre eles, está Aryeh Deri, líder do partido ultraortodoxo Shas. Em janeiro, a Suprema Corta do país obrigou Netanyahu a demitir Deri, que ocupava o cargo de ministro da Saúde e Segurança, devido ao “acúmulo de condenações criminais”.

Imagem mostra Binyamin Netanyahu após vencer as eleições de Israel, no ano passado. Premiê é acusado de corrupção em três casos Foto: Ammar Awad / Reuters

O primeiro-ministro também está envolvido em processos criminais em três casos separados. Bibi é acusado de abusar da posição oficial para conceder favores a milionários em troca de presentes que incluem champanhe, charutos e uma cobertura favorável da mídia. As acusações aconteceram quando ele estava no cargo, tornando-se o primeiro premiê de Israel a enfrentar acusações durante o exercício, e provocaram uma crise política longa, que arrastou o país a realizar cinco eleições em menos de cinco anos.

No início deste mês, o procurador-geral israelense Gali Baharav-Miara enviou uma carta a Netanyahu ordenando que se afastasse da reforma judicial devido ao conflito de interesses. Netanyahu disse que considerava a ordem “inaceitável” e que a reforma do Judiciário está separada dos seus problemas com a justiça.

O discurso do líder se contradiz com alegações de membros do seu próprio partido, o Likud. No mês passado, Levin, seu ministro da Justiça, afirmou no plenário do Knesset que “as três acusações” foram necessárias para o líder ser “convencido” de “corrigir o sistema”.

O presidente israelense, Isaac Herzog, apela para que os projetos sejam interrompidos e o governo possa se reunir com a oposição para chegar a um acordo, mas eles continuam avançando. Se for aprovado – e o governo controlar as nomeações judiciais em todos os tribunais em todo o país – isso poderá ter um grande efeito no caso de Netanyahu por ele ser julgado no Tribunal Distrital de Jerusalém e provavelmente ter de apelar para a Suprema Corte se condenado.

Por que isso é um problema em Israel?

Os israelenses liberais consideram a Suprema Corte do país o último bastião de sua democracia. Os membros da coalizão de Netanyahu dizem que a Suprema Corte é povoada por elites de esquerda e oprimiu a vontade de um país que tem ido rapidamente em direção à direita religiosa e nacionalista.

Um sistema livre de freios e contrapesos, alertou a presidente da Suprema Corte, Esther Hayut, no mês passado, levaria a um Israel que “leva o nome da democracia em vão”.

O pesquisador do Instituto de Democracia de Israel, Amir Fuchs, analisa que a aprovação da reforma agravaria a situação de minorias do país. “Os árabes serão discriminados, haverá uma separação entre homens e mulheres, haverá leis e talvez vereditos na Suprema Corte que tirarão direitos da comunidade LGBTQ”, disse.

Manifestantes seguram bandeira dos direitos LGBTQ durante protesto contra a reforma judiciária de Israel, em Jerusalém, na segunda-feira, 13. Minorias serão prejudicadas se reforma for aprovada, dizem especialistas Foto: Maya Alleruzzo/AP

A Suprema Corte de Israel confirmou em 2021 a controversa Lei do Estado-Nação, que declarou Israel uma pátria nacional para o povo judeu e efetivamente codificou os cidadãos palestinos de Israel como de segunda classe. Mas, embora “o sistema judicial não seja favorável ao público árabe”, o legislador israelense palestino Ahmed Tibi disse na segunda-feira que lutaria contra as reformas “porque, no final do dia, a Suprema Corte é o refúgio da minoria”.

Netanyahu e seus aliados afirmam que têm o mandato a seu favor para promulgar as propostas. Eles citam a vitória nas eleições de novembro, nas quais conquistaram 64 dos 120 assentos no Knesset. Mas os legisladores não divulgaram seus planos judiciais antes da votação. Como uma peculiaridade da matemática parlamentar, os partidos que compõem a coalizão representam apenas 50,1% do total de votos.

A oposição israelense até agora rejeitou negociar com o governo com as propostas apresentadas até o momento e pré-estabelece que a reforma deve ser interrompida antes de qualquer conversa. “Vamos conversar sem o chicote da legislação contínua, agressiva e acelerada pairando sobre a cabeça em segundo plano”, escreveu o jornalista israelense Ben Caspit na terça-feira no jornal Maariv. “As pessoas não estão preparadas para aceitar que a democracia está sendo sequestrada e seguir em frente.”

Envolvido há anos em uma suspeita de corrupção, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, acusa há muito tempo o Judiciário de Israel de conspirar para destruí-lo. Após voltar ao governo, ele foi além e apresentou um plano para reformar o Judiciário e tornar a instituição, segundo disse, mais representativa. A iniciativa, no entanto, provocou uma crise nacional por diminuir o poder da Justiça e pode escalar para a violência.

A primeira parte do projeto deve ir ao plenário do Knesset, o parlamento israelense, para ser votada entre esta quarta-feira, 15, e a próxima segunda, 20, segundo a imprensa israelense. Enquanto isso, os cidadãos ocupam às ruas para se manifestar contra a reforma. Na segunda-feira, 13, cerca de 100 mil israelenses protestaram diante do Knesset, em Jerusalém, com gritos de “Israel não é uma ditadura!”.

Com o país dividido sobre a proposta, encabeçada por um governo de coalizão com a direita radical, economistas passaram a alertar para os investimentos em risco em Israel, particularmente no setor de tecnologia, e o presidente israelense, Isaac Herzog, falou em “colapso social”.

Visão aérea de Jerusalém mostra israelenses protestando contra a reforma judiciária na frente do Knesset, o parlamento israelense, na segunda-feira, 13 Foto: Ilan Rosenberg/Reuters

Abaixo, entenda o que você precisa saber sobre as mudanças propostas para o Judiciário e por que elas dividiram o país:

Qual é a proposta de Netanyahu?

A proposta apresentada pelo governo israelense contém vários projetos de lei que alteram as “leis básicas” de Israel – equivalentes às emendas constitucionais, em um país onde não há formalmente uma Carta Magna. As mudanças dariam aos deputados do Knesset o controle sobre as nomeações judiciais; eliminariam a revisão judicial que as leis israelenses são submetidas após aprovadas; e permitiriam que o Parlamento rejeitasse as decisões da Suprema Corte.

Na avaliação do professor de direito constitucional e internacional da Universidade de Tel Avis, Ayeal Gross, as mudanças significam na prática que o governo não terá um limite legal. “Um governo sem limites mina totalmente qualquer noção de democracia”, afirmou.

No sistema parlamentar de Israel, a Suprema Corte é a única instituição a exercer um contraponto aos deputados e ao primeiro-ministro. Ela analisa recursos de tribunais inferiores e ouve as petições contra o governo e os órgãos públicos. Nos últimos anos, ela derrubou leis relacionadas aos refugiados da guerra na Ucrânia e da África e atrasou o despejo de palestinos que residiam em um bairro disputado em Jerusalém.

Na segunda-feira, o Knesset aprovou preliminarmente dois projetos de lei que dão a permissão para os deputados nomearem juízes e excluírem a revisão judicial. Outro, caso aprovado, muda a composição do Comitê de Seleção Judicial, órgão responsável pelas nomeações judiciais composto hoje por nove membros. A medida efetivamente daria ao governo uma maioria automática ao votar nos nomeados.

A criação de uma “cláusula de substituição”, um mecanismo raro que permite que uma maioria simples do Knesset anule as decisões da Suprema Corte e que pode significar o fim das proteções legais para grupos não aceitos pela coalizão governista, foi discutida nesta terça-feira, 14. O único país do mundo com uma cláusula de substituição é o Canadá, que tem uma constituição. Israel não tem constituição, apenas “leis básicas”.

“É basicamente tirar o pior de cada país, mas sem os outros contextos e garantias daquele país”, analisa Gross.

Os três projetos precisam ser votados três vezes antes de se tornarem lei. Segundo a imprensa do país, a primeira votação deve acontecer entre esta quarta-feira e o dia 20. A segunda e a terceira podem, se ambas partes concordarem com as negociações, acontecer somente em algumas semanas.

O ministro da Justiça, Yariv Levin, também apresentou o texto de vários outros projetos de lei, como um que reduz a independência e a supervisão legislativa dos consultores jurídicos dos ministros. Os detalhes finais dessas outras propostas, no entanto, ainda não estão claros.

Por que Netanyahu está fazendo isso?

Binyamin Netanyahu, o político que mais esteve à frente do governo israelense, tem entrado em desacordo frequente com o Judiciário. Ao retornar ao cargo no final do ano passado, passou a chefiar o governo mais à direita da história do país, formado por nacionalistas religiosos, supremacistas judeus e defensores de colonos, que se comprometeram em apoiá-lo na pressão contra o Judiciário para retirar as acusações contra ele em um processo de corrupção.

Acabar com a supervisão judicial da legislação seria uma grande vitória para a coalizão, cujos membros prometeram priorizar o caráter judaico de Israel sobre o democrático e anexar a Cisjordânia ocupada - a terra que os palestinos reivindicam como parte de seu futuro Estado -, e permitiria que Netanyahu protegesse seus aliados.

Entre eles, está Aryeh Deri, líder do partido ultraortodoxo Shas. Em janeiro, a Suprema Corta do país obrigou Netanyahu a demitir Deri, que ocupava o cargo de ministro da Saúde e Segurança, devido ao “acúmulo de condenações criminais”.

Imagem mostra Binyamin Netanyahu após vencer as eleições de Israel, no ano passado. Premiê é acusado de corrupção em três casos Foto: Ammar Awad / Reuters

O primeiro-ministro também está envolvido em processos criminais em três casos separados. Bibi é acusado de abusar da posição oficial para conceder favores a milionários em troca de presentes que incluem champanhe, charutos e uma cobertura favorável da mídia. As acusações aconteceram quando ele estava no cargo, tornando-se o primeiro premiê de Israel a enfrentar acusações durante o exercício, e provocaram uma crise política longa, que arrastou o país a realizar cinco eleições em menos de cinco anos.

No início deste mês, o procurador-geral israelense Gali Baharav-Miara enviou uma carta a Netanyahu ordenando que se afastasse da reforma judicial devido ao conflito de interesses. Netanyahu disse que considerava a ordem “inaceitável” e que a reforma do Judiciário está separada dos seus problemas com a justiça.

O discurso do líder se contradiz com alegações de membros do seu próprio partido, o Likud. No mês passado, Levin, seu ministro da Justiça, afirmou no plenário do Knesset que “as três acusações” foram necessárias para o líder ser “convencido” de “corrigir o sistema”.

O presidente israelense, Isaac Herzog, apela para que os projetos sejam interrompidos e o governo possa se reunir com a oposição para chegar a um acordo, mas eles continuam avançando. Se for aprovado – e o governo controlar as nomeações judiciais em todos os tribunais em todo o país – isso poderá ter um grande efeito no caso de Netanyahu por ele ser julgado no Tribunal Distrital de Jerusalém e provavelmente ter de apelar para a Suprema Corte se condenado.

Por que isso é um problema em Israel?

Os israelenses liberais consideram a Suprema Corte do país o último bastião de sua democracia. Os membros da coalizão de Netanyahu dizem que a Suprema Corte é povoada por elites de esquerda e oprimiu a vontade de um país que tem ido rapidamente em direção à direita religiosa e nacionalista.

Um sistema livre de freios e contrapesos, alertou a presidente da Suprema Corte, Esther Hayut, no mês passado, levaria a um Israel que “leva o nome da democracia em vão”.

O pesquisador do Instituto de Democracia de Israel, Amir Fuchs, analisa que a aprovação da reforma agravaria a situação de minorias do país. “Os árabes serão discriminados, haverá uma separação entre homens e mulheres, haverá leis e talvez vereditos na Suprema Corte que tirarão direitos da comunidade LGBTQ”, disse.

Manifestantes seguram bandeira dos direitos LGBTQ durante protesto contra a reforma judiciária de Israel, em Jerusalém, na segunda-feira, 13. Minorias serão prejudicadas se reforma for aprovada, dizem especialistas Foto: Maya Alleruzzo/AP

A Suprema Corte de Israel confirmou em 2021 a controversa Lei do Estado-Nação, que declarou Israel uma pátria nacional para o povo judeu e efetivamente codificou os cidadãos palestinos de Israel como de segunda classe. Mas, embora “o sistema judicial não seja favorável ao público árabe”, o legislador israelense palestino Ahmed Tibi disse na segunda-feira que lutaria contra as reformas “porque, no final do dia, a Suprema Corte é o refúgio da minoria”.

Netanyahu e seus aliados afirmam que têm o mandato a seu favor para promulgar as propostas. Eles citam a vitória nas eleições de novembro, nas quais conquistaram 64 dos 120 assentos no Knesset. Mas os legisladores não divulgaram seus planos judiciais antes da votação. Como uma peculiaridade da matemática parlamentar, os partidos que compõem a coalizão representam apenas 50,1% do total de votos.

A oposição israelense até agora rejeitou negociar com o governo com as propostas apresentadas até o momento e pré-estabelece que a reforma deve ser interrompida antes de qualquer conversa. “Vamos conversar sem o chicote da legislação contínua, agressiva e acelerada pairando sobre a cabeça em segundo plano”, escreveu o jornalista israelense Ben Caspit na terça-feira no jornal Maariv. “As pessoas não estão preparadas para aceitar que a democracia está sendo sequestrada e seguir em frente.”

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