A carpa-salmão gigante do Mekong tem cerca de 1,2 metro de comprimento e pesa 29,9 quilogramas. Ela é tão esquiva — registrada apenas 30 vezes por cientistas — que eles a apelidaram de “fantasma do Mekong”, em homenagem ao rio do Sudeste Asiático que era seu habitat.
Esta espécie de carpa - que não é um salmão, mas parece com um - não tinha sido avistada por ninguém desde 2005. Os pesquisadores temiam que tivesse sido extinta.
Mas um homem continuou procurando: Chan Sokheng, que teve uma carreira de quase 30 anos na Administração de Pesca do Camboja e morreu no ano passado. Em 2020, de acordo com colegas de conservação com quem trabalhou, ele recebeu o chamado que esperava: um pescador no norte do Camboja capturou um peixe com um dorso prateado e elegante, um raio de amarelo no olho e uma mandíbula curva pronunciada. Era o fantasma do Mekong.
O peixe foi vendido para comerciantes no Vietnã, mas outros pescadores na mesma parte do país relataram seus próprios avistamentos em 2022 e 2023. Sokheng conseguiu coletar para estudo esses dois animais, que foram encontrados na bacia hidrográfica do Mekong, de acordo com um artigo publicado no mês passado no periódico Biological Conservation, informado pelo trabalho de Sokheng, que anunciou a redescoberta da espécie.
“Era seu sonho ver aquele peixe e seu sonho se tornou realidade”, disse Zeb Hogan, ecologista aquático da Universidade de Nevada, Reno, e autor do artigo. A notícia da sobrevivência da carpa gigante do Mekong se tornou “um chamado à ação” para a comunidade de conservação pesqueira no Camboja e no Sudeste Asiático começar os esforços para encontrar e proteger a espécie, ele acrescentou.
“Nós só vimos esse peixe em guias de campo”, disse Heng Kong, diretor do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Pesqueiro Interior e um dos autores do estudo. “Gostaríamos de identificar áreas onde essa espécie ainda esteja presente e, então, trabalhar com as comunidades locais para obter sua forte participação na conservação.”
O megapeixe mais ameaçado do rio
Originário da China e serpenteando por cerca de 4.350 quilômetros do Sudeste Asiático, o rio Mekong é a terceira hidrovia mais biodiversa do mundo. Mas, como muitos outros ecossistemas de água doce, ele enfrenta inúmeras ameaças, como represas rio acima na China, Tailândia e Laos, bem como sobrepesca e poluição.
O WWF estima que 19% das mais de 1.100 espécies de peixes no rio Mekong estão ameaçadas de extinção.
Se a carpa-salmão gigante do Mekong tivesse sido extinta, ela teria sido a primeira das mais de uma dúzia de espécies de megapeixes do rio — aquelas que pesam mais de 29,9 kg — a sucumbir a esse destino. Com sua redescoberta, agora é considerada o peixe mais ameaçado do rio.
Como a carpa-salmão gigante do Mekong era considerada extinta, ela não era listada como uma espécie protegida no Camboja nem era amplamente conhecida entre os pescadores.
“A maioria dos cambojanos nunca viu ou ouviu falar sobre essa espécie de peixe”, disse Chhut Chheana, autor do estudo e coordenador de divulgação da Wonders of the Mekong, um projeto apoiado pela Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional que visa manter a integridade ecológica, cultural e econômica do baixo rio Mekong.
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‘Ameaçada diversidade de peixes de água doce’
Após a redescoberta da carpa-salmão, Heng Kong a adicionou à lista de espécies protegidas do país. Mas as proteções legais serão efetivas, ele disse, apenas com a adesão das comunidades pesqueiras do Camboja. “Temos nossa lei de pesca, mas entendemos que precisamos estabelecer boas colaborações com os pescadores”, disse Kong.
O ressurgimento da carpa-salmão gigante do Mekong serve como um símbolo da “vasta e ameaçada diversidade de peixes de água doce” do rio Mekong como um todo e da necessidade urgente de proteções, disse Michele Thieme, vice-diretora de água doce do WWF-US, que não está envolvida no projeto.
A carpa-salmão foi redescoberta na província de Stung Treng, no curso principal do rio Mekong e em um de seus principais afluentes. Esses locais estão mais ao sul do que onde o peixe era historicamente conhecido por habitar. Sua descoberta nesses lugares sugere que o alcance da espécie pode ser maior do que os cientistas pensavam anteriormente.
A questão, agora, é se o Camboja representa “a última esperança” para a espécie, disse o ecologista aquático Zeb Hogan, ou se a carpa-salmão, que é migratória, persiste em outros lugares. Hogan acha que há uma grande probabilidade de que isso aconteça.
Ele e seus colegas estão organizando uma busca por populações sobreviventes no Camboja, Laos e Tailândia. Seus esforços incluirão a realização de pesquisas ambientais de DNA para detectar evidências da espécie em amostras de água. “Teremos equipes saindo para procurar esse peixe de uma forma mais séria do que nunca”, disse Hogan. “Não me surpreenderia se encontrássemos peixes em todos os três países.”
c.2024 The New York Times Company
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